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Crônicas gastronômicas: histórias, lugares e sabores

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Academic year: 2021

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Unisul Jornalismo

Karla Regina de Souza

Crônicas Gastronômicas: Histórias, Lugares e Sabores

Trabalho de Conclusão de Curso

Palhoça

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Karla Regina de Souza

Crônicas Gastronômicas: Histórias, Lugares e Sabores

Trabalho de Conclusão de Curso, apresen-tado ao Curso de Jornalismo, da Universi-dade do Sul de Santa Catarina.

Orientadora: Solange Gallo

Palhoça

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Dedico o presente trabalho aos professores do curso de jornalismo, que ao longo dos anos compartilharam seu tempo e conhecimento comigo e à

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Agradecimentos

Agradeço aos meus amigos por sempre estarem ao meu lado, sempre dando força para continuar. Aos que participaram do trabalho me recebendo e compartilhando suas histórias, sem vocês nenhuma linha deste trabalho seria escrita.

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“Vim, vi, comi” Kayaboop

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Sumário 1 Introdução . . . . 7 1.1 Crônica Jornalística . . . . 8 1.2 Crônica Gastronômica . . . . 8 1.3 Cultura e Gastronomia . . . . 9 2 Desenvolvimento . . . . 12 2.1 O Fusca . . . 12 2.2 O trabalho . . . 13 2.3 Encontrando os personagens . . . 14 2.4 Os gastos . . . 16 2.5 Trabalho em equipe . . . 16 3 Conclusão . . . . 18 3.1 Conclusão pessoal . . . 19 Referências . . . . 21 ANEXOS 22

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7 1 Introdução

Este projeto teve como objetivo a produção de um livro de crônicas gastronômi-cas, apresentando pessoas que contribuem com o resgate histórico-cultural em Santa Catarina, através da gastronomia. Pessoas, que cozinhando ou comendo, contam boas histórias das colônias, origens das receitas, fotos e curiosidades pessoais e locais. O trabalho de pesquisa para a elaboração do livro foi feito usando o método discursivo da escola francesa, de Michel Pêcheux.

Produção de um livro de crônicas gastronômicas com considerações sobre o contexto social e discursivo no qual a interlocução se dá para a criação das receitas. Nessa interlocução são atualizados aspectos da memória social constitutiva.

O discurso

A análise de discurso relativiza o sentido da língua e problematiza as maneiras de ler, de escrever e as diferentes manifestações da linguagem. Não há neutralidade nem mesmo nos signos mais comuns. Busca compreender os sentidos da língua (objeto simbólico) e os significados para seus locutores.

Para Eni Orlandi, na análise de discurso, procura-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e de sua história. O discurso é a palavra em movimento, a linguagem na prática, a observação da fala.

O dispositivo analítico é definido pela questão posta pelo analista, o material que analisa e sua finalidade, incluindo seu contexto sócio-histórico e ideológico. Estuda o sujeito e a situação, a memória como interdiscurso.

Na formação discursiva o discurso se constitui em sentidos, e a evidência do sentido não deixa perceber o caráter material, a historicidade de sua construção. Não há sentido sem interpretação. A ideologia é a condição para a constituição do sujeito e dos sentidos.

A análise de discurso não procura o sentido “verdadeiro”, mas o real sentido em sua materialidade linguística e histórica. O dispositivo de análise tem o objetivo de descrever a relação do sujeito com sua memória e suas bases podem se apresentar em diferentes formas: oral, imagem, som, letra, objetos, escrita, . . .

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Capítulo 1. Introdução 8 1.1 Crônica Jornalística

A palavra crônica vem do grego “cronos” (chronus), que significa personificação do tempo. Como revela à própria etimologia, a crônica é uma escritura moderna que fala das coisas do seu tempo.

Ela se volta para o cotidiano, para a cidade, para as sensações, para as pessoas e suas histórias. O texto é rápido como a fala cotidiana, muitas vezes com traços de humor.

Surgiu no século XIX, ocupando espaço na seção chamada “folhetim” (do francês, feuilleton), era o roda pé da primeira página, espaço destinado ao entretenimento. Chegou ao Brasil entre os séculos XIX e XX, fazendo uma ponte entre o jornalismo e a literatura, sendo inaugurada por Machado de Assis.

Antônio Cândido (1992, p.13), afirma que a crônica não é um gênero maior. Diz que os assuntos tratados nas crônicas possuem composição aparentemente solta, pairando sobre a mesma “um ar de coisa sem necessidade”, porém encanta, porque trata geralmente do cotidiano.

Segundo Pólvora (1975, p.49), temos a seguinte definição:

Se tentarmos definir a crônica como possível gênero subordinado a certas regras fundamentais veremos que ela se assenta em bases flutuantes. Situa-se bem dizer, numa terra de ninguém, no território comum banhado pelos extravazamentos do conto, do poema e do artigo de jornal. Seus limites avançam pelos lindes alheios ou por estes se deixam penetrar.

Martins (1985, p.3) nos diz que a crônica é um fazer em trânsito entre o jorna-lismo e a literatura, e ainda “nutre-se do instigante diálogo com o leitor”. Diferente de outras narrativas curtas, a crônica carrega o circunstancial e o subjetivo.

Apesar de não aparecer sempre a “primeira pessoa” é uma característica do gênero, mesmo de forma impessoal. Ela não tem regras, não segue um padrão ela é faceira, se molda com o tempo com o peculiar, com o pessoal com a experiência cotidiana.

1.2 Crônica Gastronômica

Embora à crítica gastronômica seja comum na mídia, sendo encontrada nos cadernos de cultura dos jornais e em revistas especializadas (impressas e digitais), pouco se fala em crônica gastronômica.

No jornalismo cultural o espaço é dedicado à música, cinema, teatro e literatura com um pequeno espaço para a gastronomia.

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Capítulo 1. Introdução 9

A crônica gastronômica ainda é uma incógnita. Sem literatura específica, sem conceitos, pode ser confundida com a crítica gastronômica, muitas vezes restrita às receitas, modos de preparo, dicas do chef, propagandas de restaurantes, utensílios e insumos.

A mídia atual deixa de lado à alimentação como parte da cultura, não vai além. Esquece que a gastronomia é intimamente ligada à cultura.

A cozinha é a linguagem na qual cada sociedade codifica mensagens que lhe permitem significar pelo menos uma parte do que ela é.

LÉVI-STRAUSS apud GIARD, 2002, p.246

Na crítica percebemos a função de indicar para o leitor as novidades do mercado cultural e expor a opinião do autor sobre o produto. Na crônica encontra-mos a ligação dos fatos com a literatura, textos que se inspiram no cotidiano, sem a preocupação de objetividade.

A crônica se associa ao sentido de memória, ou até mesmo ao presente que em breve se tornará um documento de um tempo passado. O cronista é sempre uma espécie de historiador do cotidiano, ainda que não esteja preocupado em fazer história. Ele não tem regras, não se sujeita, não é subordinado.

É livre! Escreve a realidade com jeito de fantasia. Apega-se aos detalhes, aos rostos, encontra a beleza e a poesia no comum, no que não é extraordinário, no que não chama a atenção. José de Alencar chama a crônica de “conversa divertida”. Ela é fácil, despretensiosa, faz rir, dá vida aos personagens improváveis.

Só ela tem essa liberdade de contar a vida como ela é, não é ou poderia ser. Das histórias de boteco, do futebol, das traições, da saudade, dos amores e desamores tão presentes nos textos de Nelson Rodrigues.

A crônica seria para a gastronomia o feijão com arroz de todo dia ou o café da manhã, rápido ou preguiçoso, às vezes quase almoço. É o sorvete das tardes quentes, a cerveja gelada das noites de verão. A crônica é para todo dia.

1.3 Cultura e Gastronomia

Cultura é hábito, é identidade, é diferença, é cultivo.

A cultura interage com o social, se adequa e se transforma, sem perder sua essência. Ela mistura o presente, o passado e o futuro.

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Capítulo 1. Introdução 10

Edward B.Tylor (1871, p.1) descreve a cultura como “conjunto complexo, a totali-dade de conhecimentos, crenças, artes, leis, moral, costumes e qualquer capacitotali-dade e hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro de uma sociedade”.

A história da gastronomia é a própria história da evolução do homem.

Através da alimentação podemos identificar hábitos, cultura, origem, estruturas sociais, a organização e evolução de um povo.

Narrada das mais diversas maneiras, a gastronomia acompanha a história da humanidade, poemas, cartas, manuscritos, romances e até mesmo na bíblia. A comida é o que reúne as pessoas, desde relatos anteriores à Santa Ceia até os dias atuais, das comemorações aos milagres. Da escassez aos momentos de fartura. Num passado não tão distante, Pero Vaz de Caminha descreve o primeiro contato dos índios com os alimentos europeus :

Mostraram-lhes um carneiro: não fizeram caso dele; uma galinha, quase tiveram medo dela – não lhe queriam tocar, para logo depois tomá-la com grande espanto nos olhos. . . Não lavram, nem criam; não há aqui boi ou vaca, cabra, ovelha ou galinha e não comem senão deste inhame, de que aqui há muito e dessas sementes e frutas que as árvores de si deitam.

SCHOTT, Bem, p.31

Sem uma data exata, mas próxima ao descobrimento do Brasil, Leonardo Da Vinci também fazia relatos da arte culinária. O chamado CODEX ROMANOFF, escrito por Da Vinci, narra suas experiências gastronômicas, receitas e invenções destinadas à cozinha. O caderno de culinária de Leonardo é um registro de memórias, banquetes, opiniões sobre os alimentos e histórias pessoais, assim como um diário. Em seus manuscritos é possível perceber o “novo”, os modos os sentimentos os afetos, medos, pensamentos e até os atos de reprovação:

Parece-me indigno dos tempos presentes o costume de Meu Senhor Ludovico de amarrar coelhos à cadeira de seus convidados para que estes possam limpar a gordura das mãos nas costas dos animais. DA VINCI, 2005, p. 189

Leonardo, depois destas observações, parece ter encontrado a solução. É atribuída a ele a invenção do guardanapo.

O escritor francês Marcel Proust criou o conceito de “memória involuntária”, onde a saudade da infância em Combray é resgatada pela memória gastronômica. Publicado no romance “Em busca do tempo perdido”, o trecho a seguir revela de onde vem sua inspiração.

Mas no mesmo instante em que esse gole, misturado com os farelos do biscoito, tocou meu paladar, estremeci, atento ao que se passava de

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Capítulo 1. Introdução 11

extraordinário em mim. Invadira-me um prazer delicioso, isolado, sem a noção de sua causa. . . . E de súbito a lembrança me apareceu. Aquele

gosto era o do pedacinho de madeleine que minha tia Léonie me dava aos domingos pela manhã em Combray (porque nesse dia eu não saía antes da hora da missa), quando ia lhe dar bom-dia no seu quarto, depois de mergulhá-lo em sua infusão de chá ou de tília.

Fonte: https://lembraria.com/2016/10/07/as-madeleines-de-proust-e-d e-todo-mundo/

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12 2 Desenvolvimento

Depois de muitos anos andando de moto, pegando chuva, correndo riscos e ficando doente, pensei em vender a moto e comprar um carro. Nada caro, nada de muito conforto, acessórios, impostos, seguro e prestações para pagar.

Eu sou uma estudante quase em tempo integral, não tenho dinheiro sobrando para andar de carro zero, e se tivesse, também não gastaria com essas coisas.

Quando comecei o projeto do TCC, ainda não havia um fusca pra chamar de meu. Ele surgiu na minha vida em abril deste ano (2017) e começou a participar da minha história de muitas maneiras. Posso dizer que nosso relacionamento começou quando vi a foto dele numa rede social: era lindo, tinha estilo, uma certa idade e um telefone para contato. Confesso que a idade me deixou um pouco apreensiva, fiquei com medo de investir nesse relacionamento e ele me deixar sozinha.

Tomei coragem e liguei, marcamos o primeiro encontro para o dia seguinte. Levei meu pai comigo por segurança, afinal, a gente escuta histórias de relacionamentos virtuais que eram uma cilada.

2.1 O Fusca

Foi amor à primeira vista, ele era perfeito pra mim. As primeiras semanas foram um pouco complicadas, era um relacionamento totalmente novo pra mim. Meus amigos deram uma força para que esse amor vingasse. Com calma, fomos nos conhecendo melhor e entrando em sintonia. Me acostumei com o ronco, com o cheiro, com as tre-medeiras. Ele me ensinou sobre paciência, sobre admiração, sobre a hora de acelerar e sobre a hora de parar. Me ensina todo dia que é melhor consertar o que está errado, do que simplesmente partir pra outra.

Ele não tem frescuras, vamos para todos os lugares. Assim como eu, também adora viajar e fica feliz quando vamos mais longe, sem hora pra voltar.

Não temos pressa de chegar e vamos fazendo amigos por onde passamos, ele é muito simpático. Todo mundo quer chegar perto, passar a mão, sair com ele. . .

Às vezes tenho que controlar meu ciúme, não é fácil ter um companheiro que chama tanta atenção! Estamos sempre juntos, inclusive vamos juntos para à faculdade. . . Ele sempre me animando, me dando ideias e participando dos trabalhos.

O que eu queria fazer do trabalho mais importante de todo o curso de jorna-lismo

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es-Capítulo 2. Desenvolvimento 13

quecidas. Por acaso, descobri que a maioria das pessoas com quem eu conversava, também tinham uma memória afetiva ligada ao fusca. Foi quando tive a certeza que ele seria um personagem importante e participaria de quase todas as histórias, das mais engraçadas as mais carinhosas, do carro velho ao carro de quem tem estilo.

Ele foi o primeiro carro da família de muitas pessoas com quem conversei e tam-bém foi o carro da polícia. Foi para o deserto, para a guerra e tamtam-bém teve seu espaço em Hollywood. Novelas, filmes, comerciais, era o “carro do povo” (Volkswagen). O carro mais vendido do mundo ganhou muitas versões ao longo dos anos: melhorias no câmbio, motores mais potentes, conversíveis,. . . Virou música “. . . feito de aço, com seu ronco maldito”, ele circulava entre histórias de amor e ciúme. . .

É tudo bem simples: não tem ar-condicionado, não tem direção hidráulica, faz muito barulho e só tem quatro marchas. Ele é valente, nunca pede água (radiador é pros fracos). Aqui a refrigeração é a ar. Sem vidros elétricos, sem desembaçador, sem travas, ele é seco! Tem uma chave para cada coisa, e como se não bastasse, cada chave só funciona se colocada do lado certo.

Mas nem tudo é só simplicidade, ele tem um bagageiro diferente em formato de onda. Tem câmera de ré, o que muitos novinhos não tem! Os pneus estão novos e com aquela faixa branca, as rodas são vermelhas e as calotas cromadas, combinando com os retrovisores. Adesivos nas portas selaram nosso relacionamento: Kayaboop & Johnny Bigudis

2.2 O trabalho

A ideia era simples, procurar pessoas que gostassem de cozinhar e tivessem boas histórias para contar. E não tem lugar melhor para ouvir histórias que uma cozinha, sem pressa, à vontade, tomando um café e conversando. Eu precisava testar minha ideia de escrever “crônicas gastronômicas”, antes de levá-la adiante. Fui buscar nas mi-nhas próprias memórias coisas que fizessem sentido, que fossem divertidas e tivessem sabor.Coisas que as pessoas se identificassem, independentemente das diferenças culturais, coisas que fossem comuns e que geralmente vão sendo esquecidas.

Eu queria descobrir o “gosto” das memórias.

O primeiro ensaio foi feito com minha avó, não consegui pensar em alguém que tivesse mais histórias para contar. Foram quatro horas de vídeo, fotos, café e muitas histórias para contar nesses 93 anos de vida.

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Capítulo 2. Desenvolvimento 14

Deu bastante trabalho para escrever, eram muitas histórias e muito tempo de vídeo para analisar. Daria para escrever um livro só dela, sem dúvida!

O trabalho é feito em três etapas:

1º Passar um dia com a pessoa e escrever uma crônica

2º Fazer o relato de como cheguei até a pessoa, geralmente de fusca 3º Escrever a receita que foi feita neste dia

Me preocupei em deixar os personagens totalmente à vontade, não fiquei fazendo perguntas e nem anotei nada. Levei uma câmera fotográfica profissional, um tripé, um celular e alguns cartões de memória. Quando chegava aos lugares ligava a câmera e deixava gravando a conversa, sem a intenção de fazer nenhum material de vídeo posteriormente. Gravar as conversas facilita o trabalho na hora de escrever, eu posso assistir várias vezes, procurar os detalhes e observar coisas que talvez fugissem ao meu olhar enquanto conversávamos.

Gravar, tanto em áudio quanto vídeo, deixa as mãos livres e a atenção é toda para o personagem. Nada pior que estar conversando e anotando ao mesmo tempo, para quem está no lugar do jornalista ou para quem se dispõem á doar seu tempo para você.

2.3 Encontrando os personagens

A ideia era boa e estava testada, agora eu tinha um problema para resolver. . . Eu não queria fazer escrever só sobre pessoas próximas, precisava encontrar bons personagens. Meu trabalho está na categoria de literatura de não-ficção, ou jornalismo literário, se preferir. Isso envolve pesquisa, apuração de fatos, fontes, registros fotográ-ficos e muita disposição para não ser uma jornalista que faz matérias pelo telefone. Para encontrar estes personagens coloquei um anúncio, bem simples e eficaz, nas redes sociais: Instagram e Facebook.

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Capítulo 2. Desenvolvimento 15

Figura 1 – Cartaz publicado nasredes sociais

Logo, comecei a receber mensagens de pessoas que queriam saber do que se tratava. . . Eu explicava o que estava fazendo e a importância do trabalho, muitos quiseram participar. Eu mantive uma conversa pela internet com os escolhidos, antes de combinar o dia da visita. Uma maneira de quebrar o gelo e mostrar que sou uma pessoa confiável, não queria chegar de repente e ir embora com o material que fui buscar.

Nem tudo deu certo, algumas pessoas desmarcaram em cima da hora, outras sim-plesmente sumiram, sem nem desmarcar. Situações de agendar, ir até o local e ser surpreendida com uma pessoa que não quer aparecer, não gosta de conversar e muito menos permitia que eu gravasse a conversa. Sim, as pessoas mudam de ideia e

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Capítulo 2. Desenvolvimento 16

esquecessem de nos avisar, uma pena.

Meu objetivo inicial era ter no mínimo dez bons capítulos, foram reduzidos para apenas oito. É complicado trabalhar com prazos quando dependemos de outras pessoas, um trabalho que tinha previsão de durar três meses se estendeu. Nem sempre o tempo colaborava, o que também fazia adiar as visitas. Alguns lugares eram de difícil acesso e distantes da cidade, tempo bom e estradas sem lama era fundamental.

Ainda tive problemas com o carro e problemas de saúde, me afastando dos meus objetivos, mas em nenhum momento pensei em desistir.

Quando tinha algum problema ou alguma desistência, logo lembrava de outra história que merecia estar no livro. Com isso, surgiram as histórias de pessoas que eu não vejo mais e outras que já partiram deste plano. Também percebi que não teria tanto tempo disponível para viajar e buscar essas histórias de imigrantes. Ficar na Grande Florianópolis também era um problema, a maioria das pessoas que me procuram tem a mesma origem, inevitavelmente, as mesmas receitas e histórias parecidas.

Em virtude do pouco tempo, o livro que seria impresso, ganhou uma versão online.

2.4 Os gastos

Para conseguir me dedicar ao trabalho tive que parar de trabalhar com enco-mendas ( de comida), o que me tomava muito tempo. Tive uma conversa com meu pai e ele entendeu a importância do que eu queria fazer, me dando o suporte financeiro para cobrir as despesas de casa e também os custos de viagem. Eu chamo isso de “VISAPAI”, é como um cheque especial que nunca será cobrado.

Basicamente os gastos em viajar com o fusca não são muito altos: gasolina, óleo, pneus bons e um dinheiro extra para alguma eventualidade (às vezes alimentação pelo caminho, outras pedágio nas rodovias).

Eu também costumo levar alguma coisa para quem eu visito, pode ser um presente, uma sobremesa, um vinho para acompanhar o prato,. . . Uma forma de agradecer por me aceitar, abrir sua vida para uma pessoa completament estranha, sem parecer que seja um suborno (risos).

Foram gastos em média 5 mil reais para produzir o trabalho, nos últimos 4 meses. P.S: Eu sei que um dia essa fatura do VISAPAI vai chegar, por enquanto ele considera um investimento na minha carreira de jornalista.

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Capítulo 2. Desenvolvimento 17

O que me atraiu para a crônica foi a liberdade. Poder escrever com simplici-dade, transitar pelo jornalismo e pela literatura, sem precisar escolher entre um e outro. Eu poderia escrever sobre qualquer coisa, e até mesmo, sobre a falta de assunto. Meus gatos poderiam virar um bom texto, assim como o Johnny (meu fusca) virou. Falar sobre minhas memórias; ser um brinquedo, uma árvore ou uma flor. Quando pensei em Crônicas Gastronômicas foi pra falar de pessoas, não de celebridades, de alta gastronomia ou de chefes famosos. Eu queria os desconhecidos, as pessoas comuns com boas histórias. Eu queria ouvir!

Eu poderia criar todas elas, inventar os personagens e fazer uma boa crônica, sem dúvida. Mas, eu sou jornalista! Daquela que não se contenta em escrever o trivial, que não se importa em ir longe, em esperar para contar uma boa história. Eu pesquiso sobre cada lugar e cada assunto. Não me contento com entrevistas de perguntas prontas, com padrões de escrita, com normas.

Cada capítulo foi surpreendente, e foi assim, porque eram pessoas de verdade. Pes-soas dispostas a participar da minha vida e abrindo espaço para que eu também participasse da vida delas. Hoje elas fazem parte da minha história e eu da delas, um trabalho em equipe. São coautoras das histórias e eu virei personagem da história delas.

Mais que uma troca de saberes e sabores, trocamos emoções.

Todo o material produzido (fotos, vídeos, textos e o próprio livro online) está disponível para quem participou dos capítulos. Podendo ser usado como forma de divulgação dos trabalhos que realizam ou para o simples compartilhamento com os amigos.

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18 3 Conclusão

O produto final foi uma decisão conjunta com minha orientadora: a publicação do material seria feita no site, conforme estará publicada em livro. A atual versão online traz oito capítulos exemplares e constituem a matriz do trabalho.

A escolha do site de suporte neste momento do tcc foi motivo de estudo e a versão no “wattpad”, já resultante de experiências não bem sucedidas em diferentes sites, como o Wix e Wordpress. O Wix não permitia a unidade do trabalho como um livro, o Wordpress fica entre um site de notícias e um blog, nenhum dos dois com as características de simplicidade que eu buscava.

O Wattpad é exclusivo para publicações em formato de livro digital, cada material publicado fica automaticamente como um novo capítulo e conta com espaço para fotos e vídeos. Os leitores/seguidores podem acompanhar a evolução do livro e participar fazendo comentários, deixando mensagens, etc. Diferente de outros formatos, o Watt-pad é fácil de ler. Para fins de arquivo na faculdade, a atual versão estará disponível também na forma impressa.

Este projeto envolveu vários conhecimentos, constituindo-se em um trabalho multidisci-plinar, onde o fio condutor é o conhecimento jornalístico: a curiosidade, a pesquisa, a fotografia, o olhar e acima de tudo, o saber ouvir.

No entanto, o conhecimento em gastronomia e a experiência de vida também foram fatores determinantes para a construção das crônicas.

Muitas vezes fui questionada: isso é jornalismo ou literatura? E respondia: isso é jornalismo literário!

“Por jornalismo literário não se deve entender o jornalismo que se ocupe de assuntos literários; e sim o que se caracteriza pela potência literária do jornalista-escritor. Um característico relativamente fácil de ser captado: contanto que se dê tempo ao tempo. O escritor-jornalista ou escritor-jornalista-escritor é o que sobrevive ao jornal: ao momento jornalístico. Ao tempo jornalístico. Pode resistir à prova tremenda de passar do jornal ao livro.”

GILBERTO FREIRE apud BENDER, 1993, p.50

Quanto à perspectiva discursiva adotada, esta também foi responsável pela tomada de decisão contextualizada. Ou seja, os textos tem contexto explícito, a sessão no caminho materializa o contexto e dá ao leitor condições de interpretar a crônica de um modo polêmico.

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Capítulo 3. Conclusão

19 3.1 Conclusão pessoal

Minha preocupação com tudo que produzi durante o curso de jornalismo sempre foi em fazer coisas que fizessem bem ao leitor, a quem participa das histórias e a mim mesma.. Fazer jornalismo pra mim era poder viajar, conhecer pessoas e suas histórias. Fotografar, registrar os momentos e torná-los inesquecíveis. Nunca cogitei a hipótese de escrever sobre economia, política ou segurança.

Eu queria falar de coisas boas, dos lugares que ninguém vai (e quando vai não vê). Das coisas simples, das pessoas comuns, das histórias que estão se perdendo porque ninguém se interessou em registra-las.

Quantas pessoas temos por perto que querem nos contar alguma coisa, uma lembrança qualquer de um passado talvez não muito distante?

Nestes últimos anos percebi que estamos cada vez mais conectados, sabemos de tudo que acontece no mundo e tudo muito rápido. Temos amigos espalhados pelo mundo e podemos vê-los e conversar com eles a qualquer momento. Estamos próximos, não importa a distância. Mas quando olhamos ao redor estamos sozinhos, não temos tempo para tomar um café com as pessoas que gostamos.

Quando conseguimos algum tempo livre, antes mesmo de cumprimentar nossos ami-gos, perguntamos a senha do wi-fi.

Quando pensei em escrever “crônicas gastronômicas” foi refletindo minhas próprias histórias, em anos de cozinha. Um prato cheio de personagens, cheiros, sabores, coisas engraçadas e outras nem tanto. Cada dia de trabalho poderia ser uma crônica. Fui amadurecendo a ideia durante o semestre passado, se eu tinha muitas histórias para contar imaginei todas as pessoas lá fora. Cada uma de um lugar, de uma família diferente, com objetivos diferentes dos meus, seria um cardápio infinito de histórias para contar.

Fui buscar essas histórias de vida, primeiramente pensando no meu trabalho de conclusão de curso e em como seria legal juntar jornalismo e gastronomia.

Depois percebi que poderia ser um projeto de vida e todas as possibilidades bacanas que viriam com ele.

Me preparei para ouvir e para escrever, me preparei para viajar e conhecer pessoas. A cada capítulo eu sentia que recebia muito mais do que fui buscar, era uma entrega recíproca: eu encontrava pessoas que queriam me contar e elas encontravam alguém que queria ouvi-las. Assim as histórias começaram a surgir, sem pressa, sem pressão, sem uma lista de perguntas, elas foram surgindo com naturalidade.

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Capítulo 3. Conclusão

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Algumas pessoas que ficavam sabendo do meu trabalho diziam que eu só queria comer de graça. . . Eu ria, a comida era só um pretexto para chegar às histórias, ela quebra o gelo e deixa um clima de afeto no ar.

E sim, eu comi! Provei coisas que nunca havia imaginado, comi coisas que eu nunca gostei e vi que eram uma delícia.

Escrevi sobre tudo que vi, sobre as sensações e sobre essas pessoas que queriam me ajudar a fazer um bom trabalho. Conheci um pouco de quem não estava lá também: o pai do Uwe, que me mandou um chucrute lá de Porto Alegre; a tia Estefânia, que um dia eu ainda vou encontrar; o Eduardo, namorado da Suzana e dono do barco; a Mariana, filha da Fátima que também é cozinheira; o pai do Caio que o ensinou a cozinhar e está tão presente na casa dele (mesmo não estando mais aqui).

Parecia que havia uma conspiração do universo para que meu trabalho ficasse lindo, que tocasse as pessoas que participaram e as que ainda vão se emocionar com a leitura.

A cada visita (não encontrei palavra melhor para definir o que estava fazendo) era recebida como uma velha amiga. Pessoas que eu nunca tinha visto me esperavam como se me conhecessem. Sempre com muito carinho e admiração pelo meu projeto. E se deixei um pouco do meu tempo com cada um, ganhei muito mais:

Voltei pra casa um pouco Estefânia, um pouco Drácula, um pouco gaúcha, um pouco marinheira, um pouco mais viajante, um pouco mais feliz!

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21 Referências

COUTINHO, Afrânio. A filosofia de Machado de Assis e outros ensaios. Rio

de Janeiro: Livraria São José, 1959.

DUTRA, Lenise Ribeiro. Crônica: nos limites da lteratura. UNIFSJ

MOURA, Eloisa.Estudo da crônica. PUC- RS

ORLANDI, Eni. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Pontes

Editores, 2015.

PÓLVORA, Hélio.Graciliano, Machado, Drummond e outros. Rio de Janeiro:

Francisco Alves, 1975.

SALDANHA, Roberta Malta. Histórias, lendas e curiosidades da gastrono-mia. Rio de Janeiro: Ed. Senac Rio, 2011.

SCHOTT, Bem.A miscelânea da boa mesa. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2006.

BENDER, Flora Christina.Crônica: história, teoria e prática. São Paulo:

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Referências

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