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Relações entre protocolos de tratamento para a leucemia linfoide aguda e efeitos neurocognitivos tardios

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

(PPGPSI/UFRN) NÍVEL MESTRADO

RELAÇÕES ENTRE PROTOCOLOS DE TRATAMENTO PARA A LEUCEMIA LINFOIDE AGUDA E EFEITOS

NEUROCOGNITIVOS TARDIOS

Cyndiane Mary Antero Cavalcanti

Natal 2018

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Cyndiane Mary Antero Cavalcanti

RELAÇÕES ENTRE PROTOCOLOS DE TRATAMENTO PARA A LEUCEMIA LINFOIDE AGUDA E EFEITOS

NEUROCOGNITIVOS TARDIOS

Natal 2018

Dissertação elaborada sob orientação da Profa. Dra. Izabel Hazin e apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Psicologia da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Psicologia.

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA Cavalcanti, Cyndiane Mary Antero.

Relações entre protocolos de tratamento para a leucemia linfoide aguda e efeitos neurocognitivos tardios / Cyndiane Mary

Antero Cavalcanti. - 2019. 106f.: il.

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de

pós-graduação em Psicologia. Natal, RN, 2018. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Izabel Augusta Hazin Pires. 1. Leucemia Linfoide Aguda - Dissertação. 2. Infância - Dissertação. 3. Neuropsicologia - Dissertação. I. Pires, Izabel

Augusta Hazin. II. Título.

RN/UF/BS-CCHLA CDU 159.9:616.159.392

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Todos nascemos filhos de mil pais e de mais mil mães, e a solidão é sobretudo a incapacidade de ver qualquer pessoa como nos pertencendo, para que nos pertença de verdade e se gere um cuidado mútuo. Como se os nossos mil pais e mais as nossas mil mães coincidissem em parte, como se fôssemos por aí irmãos, irmãos uns dos outros. Somos o resultado de tanta gente, de tanta história, tão grandes sonhos que vão passando de pessoa a pessoa, que nunca estaremos sós.

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Às vezes a vida se distrai e deixa passar de forma despercebida uma negligência, um abuso, uma doença, um câncer na vida daqueles que ainda são miúdos... Dedico este trabalho a todas as crianças que sentem dores. Que a ciência e a sociedade possam caminhar juntas para ajudar a amenizá-las.

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Agradecimentos

Aprendi que pessoas são lugares. Ora os melhores, ora os piores. A minha gratidão à Deus, é olhar para os lados e perceber que estou cercada dos melhores lugares para onde alguém poderia ir. O lugar da confiança e da determinação, eu encontrei na professora Izabel Hazin. Mais que professora, uma mãe acadêmica que abraça seus filhos com seus oito tentáculos de mãe polvo. O lugar do cuidado, que me preparou desde o começo para chegar até aqui – com leite, amor, educação, com tudo. Obrigada por todo o esforço, mama Mary. O lugar mais novo que eu conheci e aprendi a me sentir confortável com ele, foi o da segurança. Olhar para alguém e saber que lá é seguro de se estar não é o meu forte. Paulo Wanderley me mostrou que esse lugar existe e que eu posso, ali, nele, me sentir segura.

Me sinto viajante ao passar por tantos lugares. Em alguns, consegui ficar. Em outros, aprendi. Por isso, sou grata ao LAPEN, por ser o lugar de crescimento e construção de conhecimento a muitas mãos. No LAPEN, encontrei o grupo que seria minha paixão! A Oncolapen me apresentou à Ediana Gomes e à Danielle Garcia, verdadeiras co-orientadoras, amigas, pesquisadoras implicadas com a saúde e transmissoras de paixão pelo trabalho.Graças a vocês, encontrei meu lugar na Neuropsicologia. Sou grata também à Leilani, Natália, Jennifer e Laura, por tornarem nossas reuniões produtivas e divertidas, pelas companhias maravilhosas de plantão.

Aos meus lugares de felicidades, sorrisos e desabafos acadêmicos, amigas que chegaram junto com a pós-graduação, Laura, Silvia, Carol e Priscila. Vocês tornaram tudo mais leve. Mostraram que amigos não são somente os do tempo da escola.

O meu lugar de gratidão, tem vários nomes:Nathália Toscano, irmã que a vida me deu, amizade sem prazo de validade. Rhavenna, Jéssica Patrícia, Socorro Góis, Juliana Malveira, Jullyane Damasceno, Louyse Diniz, Jéssica Diniz e Vanessa Aparecida, Celismar, Alcineide, Symone Melo, Elza Dutra, Clara Santos, Sirley Rochele. Nomes que inspiram força, coragem

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e sentido. Cada uma de vocês, mulheres, me mostraram o lugar da força, da superação. Aprendi com cada uma o que é vencer e ultrapassar limites.

Enfim, às mães, pais, avôs, avós, tios, tias, das quais sinto-me filha de mil famílias, que abriram as portas não somente para uma pesquisa, mas para a pura experiência do amor, da dor, da esperança e empatia. Mais que isso. É além. À cada uma destas famílias pelas quais passei, gratidão.

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SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS ... 10 LISTA DE TABELAS ... 11 RESUMO ... 13 ABSTRACT ... 14 1. INTRODUÇÃO ... 15

2. DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DA LLA ... 24

2.1. O tratamento da LLA ... 27

2.2. Protocolos de tratamento quimioterápicos e a profilaxia do Sistema Nervoso Central ... 29

3. NEURODESENVOLVIMENTO E VULNERABILIDADE A AGENTES NEUROTÓXICOS ... 36

3.1. Metotrexato e o impacto sobre a Substância Branca ... 39

3.2. Efeitos neurocognitivos associados ao tratamento quimioterápico infantil ... 50

4.OBJETIVOS: ... 53

4.1. Objetivo Geral ... 53

4.2. Objetivos Específicos ... 53

5. METODOLOGIA ... 53

5.1. Delineamento do estudo ... 53

5.2. Instituição participante e Procedimentos éticos: ... 54

5.3. Participantes: ... 55

5.4. Procedimento de coleta de dados: ... 56

5.6. Avaliação Neuropsicológica: ... 57

5.7. Descrição dos testes neuropsicológicos utilizados: ... 59

5.8. Procedimento de análise de dados: ... 64

6. RESULTADOS ... 65

6.1. Capacidade Intelectual ... 67

6.1.1 Análise estatística descritiva ... 67

6.1.2. Análise estatística inferencial ... 71

6.2. Atenção e Funções Executivas ... 75

6.2.1. Análise estatística descritiva ... 75

6.2.2. Análise estatística inferencial... 79

7. DISCUSSÃO ... 83

7.1. Maiores dosagens de MTX associados com maiores impactos sobre o funcionamento neurocognitivo ... 86 7.2. Diferentes padrões de interferência da variável Idade ao Diagnóstico em função dos protocolos

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de tratamento ... 92

7.3. Efeitos progressivos associados as dosagens de MTX ... 95

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 105

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Proliferação anormal das células brancas ... 25 Figura 2: Incidência do câncer infantil entre 0 e 14 anos de idade com destaque para a LLA (Plas, 2015). ... 26 Figura 3: Introdução da profilaxia do SNC nos protocolos de tratamento e aumento das taxas de sobrevivência (em Plas, 2015). ... 30 Figura 4: Incidência da LLA por faixa etária (Plas et al, 2015). ... 39 Figura 5: Mecanismo de ação do MTX para a inibição da síntese de DNA e conseqüentemente limitaçãoda proliferação de células cancerígenas (Plas et al., 2015)... 44 Figura 6: Neurotixicidade pelo metotrexato intrateca em criança com LLA (Naidich, 2015). ... 46 Figura 7: Gráfico indicando qualidade de coesão e separação entre os clusters da WISC-IV. 68 Figura 8: Gráfico indicando a importância dos preditores para a formação dos grupos em Capacidade Intelectiva. ... 70 Figura 9: Gráfico indicando qualidade de coesão e separação entre os clusters da bateria de Atenção e Funções Executivas do Nepsy-II. ... 76 Figura 10: Gráfico indicando a importância dos preditores para a formação dos grupos em Atenção e Funções Executivas. ... 79

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Doses dos componentes da combinação MADIT ajustadas à idade dos pacientes. . 33

Tabela 2: Doses do Metotrexato IT ajustadas à idade dos pacientes de baixo risco BFM-2002. ... 35

Tabela 3: Doses dos componentes da terapia intratecal ajustadas à idade dos pacientes de alto risco BFM-2002. ... 36

Tabela 4: Dosagem de MTX em função dos Protocolos de Tratamento . ... 36

Tabela 5: Protocolo de Avaliação Neuropsicológica ... 58

Tabela 6: Distribuição frequencial dos participantes. ... 67

Tabela 7: Distribuição dos grupos na análise de Cluster em Capacidade Intelectiva. ... 69

Tabela 8: Distribuição frequencial dos participantes em função da variável Protocolo de tratamento em relação à classificação dos seus desempenhos nos Índices fatoriais e QI Total da WISC-IV. ... 71

Tabela 9: Distribuição frequencial dos participantes do grupo GBTLI – LLA 99 em função da variável Idade ao diagnóstico em relação à classificação dos seus desempenhos nos Índices fatoriais e QI Total da WISC-IV. ... 72

Tabela 10: Distribuição frequencial dos participantes do grupo BFM – 2002 em função da variável Idade ao diagnóstico em relação à classificação dos seus desempenhos nos Índices fatoriais e QI Total da WISC-IV ... 73

Tabela 11: Distribuição frequencial dos participantes do grupo GBTLI – LLA 99 em função da variável Tempo fora de tratamento em relação à classificação dos seus desempenhos nos Índices fatoriais e QI Total da WISC-IV. ... 74

Tabela 12: Distribuição frequencial dos participantes do grupo BFM - 2002 em função da variável Tempo fora de tratamento em relação à classificação dos seus desempenhos nos Índices fatoriais e QI Total da WISC-IV. ... 74

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Tabela 13: Distribuição dos grupos na análise de Cluster em Atenção e Funções Executivas. ... 76 Tabela 14: Distribuição frequencial dos participantes em função da variável Protocolo de tratamento em relação à classificação dos seus desempenhos nos subtestes da Nepsy II. ... 80 Tabela 15: Distribuição frequencial dos participantes do grupo GBTLI – LLA 99 em função da variável Idade ao diagnóstico em relação à classificação dos seus desempenhos nos subtestes da Nepsy II. ... 81 Tabela 16: Distribuição frequencial dos participantes do grupo BFM – 2002 em função da variável Idade ao diagnóstico em relação à classificação dos seus desempenhos nos subtestes da Nepsy II. ... 81 Tabela 17: Distribuição frequencial dos participantes do grupo GBTLI – LLA 99 em função da variável Tempo fora de tratamento em relação à classificação dos seus desempenhos nos subtestes aplicados a todos os participantes da Nepsy II. ... 82 Tabela 18: Distribuição frequencial dos participantes do grupo BFM - 2002 em função da variável Tempo fora de tratamento em relação à classificação dos seus desempenhos nos subtestes aplicados a todos os participantes da Nepsy II. ... 82

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RESUMO

Identifica-se nos últimos anos a intensificação de esforços conjuntos da oncologia pediátrica e da neuropsicologia na busca pelo equilíbrio entre o aumento da taxa de sobrevida e a redução de déficits cognitivos e de comportamento, comumente identificados entre os sobreviventes da Leucemia Linfoide Aguda (LLA). Nesse sentido, o presente estudo objetivou investigar os perfis cognitivos de crianças e adolescentes sobreviventes de LLA submetidas a dois protocolos de tratamento distintos, a saber, GBTLI LLA 1999 e BFM 2002, considerando ainda duas variáveis clínicas: a idade da criança no momento do diagnóstico e o tempo fora de tratamento. Tais protocolos divergem essencialmente em função das dosagens do fármaco Metotrexato (MTX), agente principal que compõe a fase de prevenção de infiltração das células leucêmicas no Sistema Nervoso Central. Participaram desta pesquisa 31 crianças que já haviam finalizado o tratamento para LLA, com idades entre 6 e 12 anos, acompanhadas em serviço público de referência para o câncer infantil no estado do Rio Grande do Norte. Estas compuseram dois grupos em função do protocolo de tratamento ao qual foram submetidas. O protocolo de avaliação neuropsicológica contemplou as seguintes habilidades cognitivas: Capacidade Intelectual, Funções Executivas, Atenção, Visoespacialidade e Visoconstrução. Os dados foram analisados a partir de estatística descritiva, bem como de medidas de análise multidimensional do tipo cluster e análise estatística inferencial através do teste Qui-Quadrado de Pearson. De maneira geral, os dados apontaram que as crianças e adolescentes submetidas ao protocolo com maiores dosagens de MTX, com idade abaixo dos cinco anos no momento do diagnóstico e fora de tratamento há mais de dois anos obtiveram piores resultados na avaliação neuropsicológica.

PALAVRAS-CHAVE: Leucemia Linfoide Aguda;Infância, Neuropsicologia; Efeitos Neurocognitivos;Quimioterapia; Metotrexato.

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ABSTRACT

Combined efforts in the context of pediatric oncology towards establishing a balance between the increase of surviving rates and the reduction of cognitive deficits and behavioral troubles among ALL (acute lymphoblastic leukemia) survivors have been identified during the last years. The present research effort aimed to investigate cognitive profiles of children and teenagers ALL survivors, previously submitted to two distinct treatment protocols, GBTLI LLA 1999 and BFM 2002. Two other independent variables were considered - the ages of participants when diagnosed and the amount of time after treatment. Treatment protocols differ essentially due to Methotrexate (MTX) dosage; this drug is the main agent in preventing central nervous system cells infiltration. Thirty-one children having finalized ALL treatment have participated in the present research; ages varied from six to twelve years, and all participants were under medical supervision by public community reference oncology services from the Brazilian state of Rio Grande do Norte. Two groups of subjects were constituted, taking into account treatment protocols and the other independent variables mentioned above. Neuropsychological evaluation covered the following cognitive abilities: intellectual capacity, executive functions, attention, visuospatial processing and visuo-construction. Data were categorized and analyzed with the support of statistical descriptive (uni and multidimensional cluster analysis) and inferential (Pearson Qui2) tools. Results showed that participants submitted to bigger MTX dosage, age level under five years at diagnosis and out of treatment for two or more years are more liable to develop cognitive deficits that could be associated to ALL and its medical treatment.

Key-words: acute lymphoblastic leukemia, childhood, neurocognitive disorders, methotrexate, chemotherapy intrathecal.

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1. INTRODUÇÃO

Efeitos neurocognitivos relacionados ao tratamento para a Leucemia Linfoide Aguda– LLA, têm afetado a qualidade de vida dos sobreviventes. Dessa forma, a delicada equação entre sobrevivência e sequelas precisa ser melhor compreendida no domínio da LLA, possibilitando a proposição e implementação de intervenções de caráter preventivo e remediativo. Considerando que na atualidade existe relativo consenso a respeito da neurotoxicidade do tratamento antineoplásico direcionado ao Sistema Nervoso Central - SNC, a direção deste trabalho vai para além da identificação dos prejuízos cognitivos associados à terapêutica a que são submetidas as crianças diagnosticadas com LLA.

Nesse sentido, o presente estudo objetiva compreender os mecanismos

neurofisiológicos subjacentes às lesões e às perdas cognitivas decorrentes do tratamento, a partir da problematização do mecanismo de ação dos fármacos sobre o SNC, mais especificamente, do Metotrexato - MTX. A polêmica em torno da compreensão dos mecanismos neurofuncionais subjacentes às queixas de aprendizagem presentes entre as crianças sobreviventes de LLA, da neurotoxicidade de variadas dosagens do MTX prevista na quimioterapia intratecal - IT, assim como a escassez de dados brasileiros neste domínio, justificam a proposição da presente pesquisa.

Ademais, o câncer é um problema de saúde pública, especialmente entre os países em desenvolvimento. As doenças e agravos não transmissíveis são a principal causa de adoecimento e morte no mundo. Estima-se que em 2018 serão 36 milhões de óbitos, dos quais 21% serão causados pelo câncer (INCA, 2018). Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2014), estima-se que em 2030, aproximadamente 22 milhões de pessoas, entre homens, mulheres e crianças, serão diagnosticadas com câncer e 13,2 milhões irão a óbito em decorrência da doença.

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casos, baseados nos dados gerados pelos Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP). Deste número, aproximadamente 3% (em torno de 12.500 casos) atingirá a faixa etária da infância e adolescência, com destaque para as regiões Sudeste e Nordeste, com 5.300 e 2.900 diagnósticos, respectivamente, constituindo as maiores prevalências do país.

O Instituto alega ainda que o aumento da incidência deve-se às mudanças que o país vem sofrendo em seu perfil sociodemográfico, a saber, processo de urbanização populacional, industrialização e avanços da ciência e da tecnologia, atreladas às transformações nas relações entre as pessoas e seu ambiente. Este novo padrão de comportamento e de contextos de vida tem sido responsável pela diminuição nas ocorrências das doenças infectocontagiosas e pelo consequente aumento das doenças crônico-degenerativas, sendo estas o novo centro de atenção dos problemas de doença e morte da população brasileira (INCA, 2018).

De acordo com o Nacional Cancer Institute – NCI (2014), 25% dos casos de câncer infantil são diagnosticados antes dos 15 anos de idade. Com relação à população infantojuvenil a Leucemia é o tipo de câncer mais comum, afetando entre 25% e 35% deste grupo etário (Cazé, Bueno & Santos, 2010). As leucemias são doenças clonais resultantes da transformação neoplásica de células progenitoras hematopoéticas da medula óssea, que adquirem alterações genéticas que lhes conferem uma vantagem proliferativa e de sobrevivência ou um prejuízo da diferenciação. Esse clone neoplásico prolifera-se até substituir o tecido medular normal, com prejuízo da formação e desenvolvimento das células sanguíneas e posterior disseminação pelo organismo (Pui, Carroll, Meschinchi e Arceci, 2011). Dentre as Leucemias, a LLA é o subtipo de maior incidência, com prevalência aproximada de 75% dos casos, em especial, indivíduos com idade inferior a 15 anos (Cazé, Bueno & Santos, 2010).

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do esperado para a média nacional, apresentando uma média de 105 óbitos por ano entre 2000 e 2013, para uma população com cerca de 56 milhões de pessoas, configurando-se assim como uma das regiões mais afetadas pela doença (Cazé, Bueno & Santos, 2010). Tal cenário parece associar-se ao diagnóstico tardio que, consequentemente, leva ao agravamento dos quadros clínicos, implicando a necessidade de tratamentos mais agressivos (Gomes, 2017; Hazin et al., 2011; Lins, 2005).

De forma geral, as crianças respondem bem às modalidades de intervenção. Contudo, a variação na intensidade, a quantidade elevada de fármacos adicionados durante as diversas etapas do tratamento, torna necessário avaliar as interações potenciais diretas entre os medicamentos e os possíveis efeitos sinérgicos e/ou antagônicos ligados à sua administração. Nesta circunstância a toxicidade relacionada ao tratamento representa a maior preocupação para com as crianças diagnosticadas com LLA, pelo risco de tal processo acabar por incluir estes sujeitos em subgrupo de crianças com alto risco para emergência de disfunções cognitivas e dificuldades de aprendizagem (ElAlfy et al., 2014).

Até a década de 60, havia pouca preocupação com os efeitos subjacentes ao tratamento para o câncer infantil, tendo em vista as altas taxas de mortalidade (Moleski, 2000). Contudo, é importante destacar que no final do século passado, em especial na última década, a LLA começou a ser considerada uma das doenças mais compreendidas e curáveis, uma vez que o grupo de sobreviventes passou a ser composto por cerca de 80% dos casos (Essig et al., 2014; Gomes, 2011; Gomes, 2017; Pui, Robison, & Look, 2008; INCA, 2016). Dentre os vários fatores que podem auxiliar na compreensão deste progresso estão: os avanços da farmacologia nos protocolos terapêuticos (Pedrosa & Lins, 2002), bem como a utilização de tratamentos mais eficazes direcionados à profilaxia do SNC, notadamente a quimioterapia IT (Jacola et al., 2016).

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Dessa forma, constata-se que existem mais sobreviventes do câncer infantil nos dias de hoje, como nunca registrado anteriormente. Lamentavelmente, isto se tornou evidente a partir dos eventos experimentados por muitos destes sobreviventes, que passaram a apresentar queixas tardias relativas à saúde mental, rendimento escolar e atividades laborais (Gomes, 2017).

A princípio, tais queixas eram relacionadas ao trauma provocado pelo enfrentamento da doença com risco de morte e seu tratamento ambulatorial doloroso, longos períodos de hospitalização e a separação de familiares e amigos ao longo dos cuidados hospitalares. De fato, tais fatores exercem influência importante no prognóstico e condição do paciente (Kellerman, 1980; Koocher & O’Malley, 1981 em Plas et al., 2015).

Todavia, sabe-se na atualidade que os prejuízos em termos do desenvolvimento cognitivo que acompanham a sobrevida destes sujeitos, cujos índices podem atingir em média 60% dos sobreviventes (Plas et al, 2015), têm sido diretamente associados à terapêutica utilizada, ao fármaco MTX, regime de tratamento IT, tipos de esteroides utilizados no protocolo (ElAlfy et al., 2013) e à idade da criança quando exposta ao tratamento (Lopes, Camargo & Bianchi, 2000). A terapia para o câncer acarreta consequências tardias e, déficits em funções executivas têm sido comumente apontados entre crianças sobreviventes da LLA (Nathan et al., 2007; Peterson et al., 2008). Tais prejuízos podem manifestar-se mais precocemente ou a longo prazo, como apontado pelo estudo de Krull e colaboradores (2016), no qual uma substancial proporção de sobreviventes da LLA apresentou disfunções neurocognitivas após cinco anos do diagnóstico, exercendo potenciais impactos negativos sobre a qualidade de vida destes sobreviventes.

Estes agravos têm sido apontados pela literatura como fenômenos associados à neurotoxicidade decorrente da administração de uma modalidade específica da quimioterapia,

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denominada intratecal (IT, referida anteriormente). Esta é caracterizada pelo lançamento do fármaco alvo, o MTX, diretamente no canal medular como forma de prevenção da infiltração de células leucêmicas no Sistema Nervoso Central, atravessando facilmente a barreira hematoencefálica e a barreira encéfalo-líquor, tornando-se útil no tratamento e na prevenção de doença, tendo em vista que a enfermidade apresenta tendência metastática para o SNC (Naidich et al., 2015).

Dentre os fármacos utilizados nesta etapa do tratamento, destaca-se aqui o MTX, apontado por muitos estudos como o principal responsável pelas sequelas cognitivas deste grupo clínico (Butler & Haser, 2006), mas também pela elevação da sobrevida destes pacientes. A associação entre o MTX e os principais efeitos neurocognitivos tardios associados à LLA é atribuída, em parte, à exposição dos pacientes ao MTX através de várias vias de administração: oral, intravenosa e intratecal (Plas et al., 2015).

Adicionalmente, em estudos com animais e humanos, acumulam-se evidências de que agentes quimioterapêuticos estão associados a danos estruturais e funcionais ao tecido cerebral, expressos através de redução de volume e prejuízos microestruturais à substância branca -SB (Gomes, 2017; ElAlfy et al., 2014; Reddick et al., 2014). A SB é composta pela bainha de mielina, que em condições normais garante a velocidade na transmissão sináptica. Por essa razão, prejuízos à SB provocados pela alta dosagem de MTX podem resultar em declínios importantes na velocidade de processamento (Gomes, 2017; Reddick et al., 2014; Aukema et al., 2009), o que por sua vez resulta em lentificação na aquisição de novas informações, bem como no desenvolvimento e funcionamento de habilidades cognitivas, o que consequentemente ocasiona um ritmo de aprendizagem diferente daquele encontrado em crianças em desenvolvimento típico de mesma idade e escolaridade (Noggle & Dean, 2013; Palmer, 2008).

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É sabido que a SB possui alta atividade metabólica e baixa estabilidade nos primeiros estágios maturacionais, de modo que os danos potenciais, decorrentes de altas dosagens de MTX, são fortemente associados à idade ao tratamento: quanto mais precoce a submissão às altas doses administradas, maiores são as complicações cognitivas resultantes (Moxon-Emre et al., 2014). Por isso, o impacto sobre a SB manifesta-se de formas variadas em diferentes idades.

Sofisticadas técnicas de imagem têm sido utilizadas na investigação de alterações microestruturais na substância branca após o tratamento do câncer. Para este fim, a Imagem por Tensão de Difusão (Diffusion Tensor Imaging – DTI) tem permitido a análise de integridade da SB, utilizando como parâmetro características locais da difusão da água nos tecidos cerebrais (Hua et al., 2012; Ojemann et al., 2013).

Pretende-se alcançar o objetivo deste estudo através do refinamento dos dados, em termos da caracterização, diferenciação e quantificação do impacto cognitivo da LLA em função da dosagem do MTX prevista nas diferentes modalidades de quimioterapia das quais faz parte; entre os sobreviventes que receberam o tratamento de diferentes protocolos, a saber, o protocolo elaborado pelo Intercontinental Group Berlin-Frankfurt-Munster 2002 e o protocolo fruto do Grupo Brasileiro de Tratamento para Leucemia Infantil de 1999. Adicionalmente, destaca-se aqui a importância de considerar a dosagem de MTX utilizada na quimioterapia IT, uma vez que nesta reside a variação maior dos protocolos de tratamento, sendo este adaptado em função da classificação de risco da doença.

O tratamento profilático do SNC, atualmente realizado através da quimioterapia IT preferencialmente, constitui-se como insulto cerebral adquirido, uma vez que configura alterações na disposição do tecido nervoso, decorrentes da alta sensibilidade microestrutural aos agentes neurotóxicos lançados diretamente no líquor cefalorraquidiano, mais especificamente do MTX, cujos efeitos tóxicos consistem em lesões necrosantes bilaterais,

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astrogliose reativa, desmielinização, necrose ou trombose dos vasos sanguíneos (Leke, 2005), além da observação de degeneração das substâncias branca e cinzenta (Gregorios et al., 1989; Linnebank et al., 2005 em Leke, 2005).

As alterações do tecido cerebral são associadas ao aumento nos déficts de atenção, inteligência e rendimento acadêmico (ElAlfy, 2013). Diante do exposto, faz-se importante ressaltar que as alterações relacionadas ao tratamento para a LLA ocorrem paralelamente às mudanças inerentes à condição de desenvolvimento na qual os sujeitos são comumente diagnosticados.

Nesse contexto, a neuropsicologia do desenvolvimento se configura enquanto área específica da neuropsicologia que estuda a interação entre o comportamento e seu substrato cerebral, bem como o desenvolvimento ontogenético do cérebro em condições típicas e patológicas. O resultado dos exames neurocognitivos entre os sobreviventes de LLA fornecem uma abertura para o campo das neurociências acerca das interações ambientais e genéticas, que contribuem para a complexidade do fenômeno (Plas et al., 2015).

Tal complexidade do quadro disparado pelo diagnóstico da LLA na primeira infância exige a compreensão dos processos de neurodesenvolvimento, nos quais eventos neurobiológicos e histórico-culturais interagem e alteram, tanto o perfil maturacional, quanto o funcionamento cognitivo ao longo do desenvolvimento infantil (Glozman, 2014; Muszkat, 2008). Somado a isto, considera-se o atravessamento deste processo por uma condição patológica, da qual decorrerão desvios fundamentais no percurso esperado de neurodesenvolvimento através da incorporação de mecanismos de reorganização (Barnes & Raghubar, 2014; Mello et. al., 2006).

O cérebro infantil é marcado por transformações intensas ao longo de seu desenvolvimento estrutural-anatômico, fisiológico e neuroquímico (Garcia, 2011; Gomes, 2017; Mello et. al., 2006), corroborando com o exposto por Rosselli, Matute & Ardilla

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(2010), que a diferença mais importante entre a neuropsicologia do adulto e a neuropsicologia infantil se refere à dinamicidade e às mudanças constantes no cérebro de uma criança, enquanto o cérebro adulto permanece relativamente estável. Em consequência desse arranjo, as expressões clínicas do sintoma infantil ganham particularidade importante, uma vez que a topografia funcional do cérebro ainda não está plenamente estabelecida e, por essa razão, as alterações cognitivas resultantes de dano cerebral na infância dependerão da interação complexa de diversos fatores (Garcia, 2011).

Espera-se que os resultados oriundos deste estudo possam contribuir para uma maior robustez das intervenções junto a esta população, a partir de uma melhor caracterização do impacto do câncer e seus tratamentos sobre as esferas cognitiva, afetiva e comportamental das crianças e adolescentes sobreviventes do câncer infantil, que vem se constituindo como uma condição médica na qual os avanços do tratamento tem resultado na elevação da taxa de sobrevivência dos pacientes, contudo, os efeitos neurocognitivos relacionadas ao tratamento têm representado um novo desafio ao campo das ciências da saúde, que tem a missão de garantir a cura e promover a qualidade de vida através da redução de dados causados pelo tratamento (Plas et al., 2015).

Assim sendo, espera-se que esta pesquisa, que trata dos efeitos tardios relacionados ao tratamento da LLA, ofereça subsídios que fomentem a busca pelo desenvolvimento e utilização de estratégias terapêuticas menos danosas, capazes de reduzir os riscos cognitivos aos quais estas crianças e adolescentes se encontram submetidos, proporcionando novas ocasiões para colaboração no cuidado e pesquisa neste campo que abrange as neurociências, a bioquímica, a farmacologia, psicologia e medicina.

Desta forma, inicialmente, o quadro da Leucemia é apresentado ao leitor em seus principais aspectos característicos e diagnósticos, além de seu respectivo tratamento, momento em que se dá a interseção entre a enfermidade e o campo da neuropsicologia. É a

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partir da explanação do tratamento da LLA que é possível compreender como os mecanismos subjacentes ao tratamento acarretam efeitos relacionados ao funcionamento neurocognitivo do sujeito, implicando diretamente na qualidade de vida das crianças e adolescentes sobreviventes.

Posteriormente, é realizada uma breve aproximação com o referencial teórico que sustenta este estudo, expondo a perspectiva pela qual se entende o desenvolvimento e como agentes neurotóxicos externos podem interferir no curso esperado para o avanço das habilidades cognitivas. Este mesmo referencial teórico irá auxiliar na descrição, interpretação e discussão das informações fornecidas pelo processo metodológico executado nesta pesquisa.

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2. DESCRIÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DA LLA

As leucemias são doenças clonais decorrentes da transformação maligna de células progenitoras hematopoiéticas da medula óssea, representando um grupo heterogêneo de doenças que diferem umas das outras no que se refere à etiologia, patogênese, prognóstico e resposta ao tratamento. Com relação à população infantojuvenil, as leucemias consistem na neoplasia pediátrica mais frequente, correspondendo a 25% dos casos em todo o mundo e apresentam maior magnitude no sexo masculino e na faixa etária de 0 a 4 anos (Bain, 2003; Logetto & Benites, 2008; Gomes, 2011; Gomes, 2017; Silva, 2014; Pui, Carroll, Meshinchi, & Arceci, 2011; Silva, Mattos, & Teixeira, 2013).

A Leucemia é classificada em grupos de acordo com critérios clínicos e patológicos, sendo considerada linfoide a leucemia que atinge as células da medula óssea conhecidas como linfócitos; ou mieloide quando tem origem nas células granulocíticas e monocíticas. De acordo com a fisiopatologia da doença, a leucemia pode ser denominada aguda, caracterizada pelo crescimento rápido de células imaturas do sangue; ou crônica, quando há o aumento excessivo na quantidade de células maduras anormais da série branca do sangue. Da combinação dessas duas categorias de classificação decorrem quatro tipos da doença: a)

Leucemia Mieloide Aguda - LMA; b) Leucemia Mieloide Crônica - LMC; c) Leucemia Linfoide Crônica - LLC e; d) Leucemia Linfoide Aguda - LLA (INCA, 2015; Gomes, 2011;

Gomes, 2017), caso específico abordado por este estudo.

A LLA desenvolve-se como uma proliferação clonal de células leucêmicas denominadas linfoblastos, constituindo-se uma doença maligna resultante de sucessivos defeitos genéticos de células progenitoras da linhagem linfoide. Dessa forma, os linfoblastos substituem as células normais do sangue resultando no prejuízo da produção normal de células sanguíneas, dando lugar as células leucêmicas, cuja infiltração nos demais órgãos resulta em elevado risco de vida (Cazé, Bueno & Santos, 2010; Gomes, 2017; INCA, 2015;

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Oliveira, Lins, Pedrosa, Cabral, & Barbosa, 2013; Plas et al., 2015; Pui, 2010). Na figura 1 é possível visualizar, à esquerda,a imagem representativa de uma medula normal, enquanto a segunda imagem, à direita, representa a lâmina de uma medula com LLA, em que há a presença excessiva de linfócitos imaturos (linfoblastos) no parênquima medular.

Figura 1: Proliferação anormal das células brancas

A LLA é o subtipo de maior incidência dos casos de leucemia, acometendo cerca de 75% dos casos, como demonstrado na figura 2 em que é possível observar a incidência do quadro, representado pela cor vermelha, entre as leucemias que acometem, em especial, indivíduos com idade inferior a 15 anos de idade. O pico de incidência da LLA infantil ocorre entre crianças dedoisaos sete anos de idade (NCI, 2014), faixa etária que corresponde ao tempo de maiores mudanças no desenvolvimento cerebral (O’Muircheartaigh et al., 2014).

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Figura 2: Incidência do câncer infantil entre 0 e 14 anos de idade com destaque para a LLA (Plas, 2015).

A etiologia da LLA não é totalmente estabelecida, pois se acredita ser pouco provável a existência de um fator explicativo para a manifestação do quadro. Contudo, a sua origem parece estar associada à interação de fatores genéticos e ambientais, em que as diversas alterações cromossômicas e moleculares das célulasleucêmicas, bem como a sua presença restrita nos clones leucêmicos, sugerem que as leucemias são adquiridas e não herdadas. Alguns exames são realizados para o diagnóstico da LLA, como a biopsia da medula óssea ou mielograma, imunofenotipagem, critérios morfológicos, citogenéticos, clínicos e biológicos (Cristofani, 2012; Gomes, 2017).

A imunofenotipagem tem importância particular, uma vez que permite identificar a linhagem celular, o estágio de diferenciação e, em alguns casos, a origem clonal da célula leucêmica, consistindo em um elemento crucial para o diagnóstico e a escolha terapêutica adotada. A linhagem de linfoblastos da LLA pode ser classificada como linfoide T ou B. No caso da leucemia precursora de célula B, esta pode apresentar diferentes estágios de diferenciação, denominados pró-B, pré-B, pré-B de transição e B madura. Os pacientes diagnosticados com LLA de linhagem B-derivada correspondem a 80-85% dos casos, sendo a

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faixa etária entre 1-5 anos considerada favorável ao tratamento, com a taxa de sobrevida livre de eventos ao redor de 80%. Por outro lado, aqueles com LLA T-derivada apresentam sobrevida livre de eventos em torno de 58% e o seu prognóstico não guarda relação com a idade (Cristofani, 2012; Gomes, 2011; Gomes, 2017).

Outro parâmetro de diferenciação entre a Leucemia Linfocítica Aguda é a classificação de acordo com os grupos de risco. Atualmente, são utilizados os critérios do National Cancer Institute (NCI, Estados Unidos), como padrão de classificação, na tentativa de possibilitar a comparação dos vários protocolos de tratamento utilizados em todo o mundo.

Desse modo, são classificados como de Risco Básico (ou baixo risco de recidiva) os pacientes na faixa etária entre um e nove anos e que apresentam leucometria menor que 50.000/mm³ ao diagnóstico. Os demais são considerados como de alto risco para recidiva (Cristofani, 2014; Pui, Carroll, Meshinchi, & Arceci, 2011, em Gomes 2017).

A análise acerca do risco é, portanto, de grande relevância para a escolha do protocolo de tratamento. Para isso, são utilizadas técnicas de citologia, citometria de fluxo e técnica de laboratório baseada no princípio da reação em cadeia da polimerase (PCR) para multiplicar ácidos nucleicos e quantificar o DNA, com a finalidade de verificar a velocidade de resposta ao tratamento, conferindo a possibilidade de inclusão do sujeito em classificação de risco diferente, ao longo do tratamento (Brandalise et al., 2010; Cazé, Bueno & Santos, 2010; Cristofani, 2012; Gao et al., 2012; Stary et al., 2013).

2.1.O tratamento da LLA

Atualmente o tratamento para a LLA é basicamente constituído pelas diferentes modalidades de quimioterapia, cujo objetivo é o de eliminar as células leucêmicas na medula óssea, em diferentes órgãos e no líquido cefalorraquidiano, bem como inibir a metástase da doença no SNC. A modalidade do tratamento quimioterápico consiste no tratamento do

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câncer através da administração de substâncias capazes de interferir na proliferação das células neoplásicas, impedindo o processo de divisão celular. A principal via de administração de agentes quimioterápicos é a endovenosa ou sistêmica (INCA, 2015).

O protocolo de tratamento quimioterapêutico deve ser selecionado de acordo com uma classificação de riscos padronizados, tais como índice do ácido desoxirribonucléico (DNA), citogenética, resposta precoce à terapia, imunofenotipagem e presença de doença no sistema nervoso central (INCA, 2015).

Os protocolos contemporâneos para o tratamento da LLA são basicamente compostos por uma combinação de agentes quimioterápicos incluindo glicocorticoides, vincristina, l-asparaginase, antraciclinas e MTX, excluindo da maioria dos casos a radiação cranial, que permanece sendo usada em uma pequena parcela de pacientes com LLA (Gomes, 2017; Greenen et al., 2007; Pui et al., 2009; Spiegler et al., 2006). Embora o tratamento exclusivamente quimioterápico seja considerado menos danoso quando comparado à radiação cranial, efeitos neurocognitivos ainda podem ser associados à administração de agentes como os glicocorticoides e o MTX, com atenção para este último, que permanece como agente chave do tratamento para a LLA desde a sua introdução em 1950 (Moleski, 2000; Chabner & Roberts, 2005; Simone, 2006 em Plas et al., 2015).

O tratamento da LLA é constituído por fases que obedecem a um protocolo bastante extenso, com variações em seu esquema terapêutico. O tempo de desenvolvimento deste processo varia em média de 2 a 3 anos, o que pode acarretar graves consequências para a vida social e acadêmica dos pacientes (Gomes et al., 2012; Pedrosa & Lins, 2002). Apesar da existência de inúmeros protocolos quimioterapêuticos ao redor do mundo, de acordo com Cristofani (2012), as etapas correspondem ao mesmo processo, descrito a seguir.

No primeiro momento, os pacientes são submetidos à Indução da Remissão, cujo o objetivo é eliminar mais de 99% das células leucêmicas e restaurar a hematopoese normal,

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bem como o estado clínico do paciente. Por esse motivo, é considerada a fase mais intensa do tratamento na qual é reportada uma série de eventos colaterais (Baytan, Evim, Guler & Okan, 2015). Essa fase inclui o uso de glicocorticoides (dexametasona, prednisona), vincristina e pelo menos um terceiro agente, como asparaginase e/ou antraciclina.

A segunda etapa, denominada de Intensificação e Consolidação Tardia, é iniciada quando a hematopoese é restaurada, esta temcomo intuito ampliar a sobrevida livre de eventos. Os fármacos comumente utilizados nesta etapa são o MTX em altas doses e 6-mercaptopurina, altas doses de asparaginase e esquemas semelhantes àqueles previstos na etapa de indução.

A Manutenção compreende o período mais extenso do tratamento, no qual os pacientes com LLA devem receber a terapia, basicamente constituída da combinação de 6-mercaptopurina e MTX, administrados à máxima tolerância, após a fase de intensificação, pelo período entre 18 e 30 meses.

O Transplante Alogênico de Medula Óssea é uma modalidade terapêutica geralmente realizada em pacientes com histórico de segunda remissão da doença ou entre aqueles que não apresentam boas respostas às fases iniciais do tratamento.

A etapa de Profilaxia do Sistema Nervoso Central consiste em prevenir que as células leucêmicas alcancem o SNC, tendo em vista que este sistema é o sítio metastático preferencial na LLA. Dessa forma, a administração dos agentes antineoplásicos é feita à base de quimioterapia IT e, em alguns casos, combinada à radioterapia craniana.

2.2.Protocolos de tratamento quimioterápicos e a profilaxia do Sistema Nervoso Central

Como destacado anteriormente, o principal local para a recaída da LLA é o SNC. A leucemia quando acomete o SNC tem o diagnóstico estabelecido através da identificação de

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blastos no líquido cefalorraquidiano. Embora os avanços no tratamento da LLA sejam notáveis, o risco de infiltração da doença no SNC continua sendo um desafio para a terapêutica e um dos fatores que dificultam substancialmente a cura dos pacientes pediátricos.

A terapia profilática para o SNC passou a ser parte integrante dos protocolos de tratamento para LLA infantil no início da década de 1970, elevando de forma significativa a taxa de sobrevida deste quadro nos últimos anos. Atualmente, a taxa esperada de recidiva entre os pacientes da LLA corresponde de 2% a 10%, ganhando extrema notoriedade diante do cenário anterior, em que até 70% das crianças em remissão da doença na medula óssea, apresentavam recidivas no SNC (Cancela, 2010; McCormick & Noggle, 2013; Temming & Jenney, 2010). A figura 3 abaixo demonstra a porcentagem das taxas de sobrevivência relativa a cinco anos sem intercorrências, desde que o tratamento voltado para a profilaxia do SNC foi introduzido nos protocolos de tratamento.

Figura 3: Introdução da profilaxia do SNC nos protocolos de tratamento e aumento das taxas de sobrevivência (em Plas, 2015).

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Na atualidade, a quimioterapia consiste no tratamento padrão da LLA, através da administração de substâncias capazes de interferir na proliferação das células neoplásicas, impedindo o processo de divisão celular. A profilaxia direcionada ao SNC, realizada exclusivamente através de quimioterapia, é composta de quimioterapia IT somada à quimioterapia sistêmica. No procedimento IT os fármacos são lançados diretamente no líquido cefalorraquidiano, sendo utilizado o MTX, isoladamente ou em combinação com citarabina, na quimioterapia IT dupla, ou ainda, esses dois fármacos adicionados à hidrocortisona, na quimioterapia intratecal tripla (Gomes, 2011; Gomes, 2017; Kwong, Yeung, & Chan, 2009; Pui, Robison, & Look, 2008).

A quimioterapia IT tripla tem sido frequentemente utilizada em substituição à radioterapia craniana, tendo sido considerada o tratamento profilático padrão para crianças diagnosticadas com LLA nos atuais protocolos, mesmo em pacientes diagnosticados com LLA de Alto Risco (Gomes, 2011; Gomes, 2017; Lin et al., 2008; Pieters & Carrol, 2008). A quimioterapia IT profilática ocorre em todas as etapas do protocolo terapêutico, mas são necessários ajustes específicos na intensidade da dosagem de sua administração, visando evitar ou reduzir eventos ligados à toxicidade dos fármacos utilizados. No entanto, alguns relatos na literatura têm discutido a neurotoxicidade associada à administração de quimioterapia intratecal, como lesões na medula espinhal, convulsões e encefalopatia (Kwong, Yeung, & Chan, 2009).

A literatura tem apontado elevado nível de toxicidade com relação ao uso intravenoso da citarabina e dentre os seus efeitos, destacam-se as disfunções cerebelares relacionadas ao tempo de exposição ao fármaco, em detrimento da intensidade da dose (Cole & Kamen, 2006; Spiegler et al., 2006). Todos os protocolos terapêuticos possuem a administração oral dos corticoesteróides, podendo ser a prednisona ou a dexametasona e na modalidade IT, a hidrocortisona, sendo esta última associada a déficits neurocognitivos tardios (Waber et al.,

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2000).

A quimioterapia sistêmica, por sua vez, é realizada através da administração de altas doses intravenosas de MTX e corticoide sistêmico, no qual o uso da dexametasona tem sido considerado mais eficaz que o da prednisona, comumente utilizada em protocolos anteriores (Buizer et al., 2009). Tal modalidade também é de grande importância para a prevenção da recaída no SNC, sendo o MTX endovenoso o medicamento mais estudado para esse fim. Contudo, sua dose ideal no tratamento da LLA infantil ainda não está completamente estabelecida. Os estudos acerca da quimioterapia sistêmica profilática, em sua maioria, revelam redução de recidivas fora do SNC e aumento da sobrevida livre de eventos, entretanto, menor eficácia em relação às recidivas no SNC se comparada com as modalidades profiláticas anteriormente abordadas, como quimioterapia IT e a radioterapia (Cancela, 2010). Apesar da implementação de modernos protocolos terapêuticos, prejuízos no domínio cognitivo ainda podem ser observados meses após o tratamento da LLA, fomentando a discussão de que a quimioterapia direcionada ao SNC em substituição à radiação craniana, também pode acarretar prejuízos no funcionamento neurocognitivo, visto que é potencialmente neurotóxica, sendo o MTX apontado como o principal fármaco relacionado a tal neurotoxicidade (Buizer et al., 2009; Cole & Kamen, 2006; McCormick & Noggle, 2013).

Os protocolos variam entre instituições quanto aos tipos e quantidades de agentes quimioterápicos administrados. Assim, as diferenças nos resultados entre as crianças podem estar associadas às diferenças na quantidade e tipo de quimioterapia que receberam (Moleski, 2000).

Neste estudo, os grupos de participantes receberam o tratamento para a LLA através de diferentes protocolos. O primeiro grupo foi submetido ao tratamento instituído pelo Grupo Brasileiro de Tratamento para a Leucemia Infantil desenvolvido em 1999 (GBTLI-99), atualizado em 12 de dezembro de 2001. A abordagem terapêutica do protocolo GBTLI

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LLA-99foi baseada em uma terapia com o conceito de intensificação precoce, a partir do uso de doses com 2g/m² de MTX, seguida da fase de consolidação tardia (Brandalise et al., 2010).

De acordo com o estudo realizado por Brandalise e colaboradores (2010), um dos principais objetivos do protocolo GBTLI LLA-99 foi diminuir a taxa de mortalidade de 6% dos pacientes em remissão clínica completa, quando comparado ao protocolo anterior, a saber, o GBLT LLA-93. Com base nos resultados obtidos pelo estudo em questão, o Protocolo do Grupo de Estudo de Câncer e Leucemia Infantil GBTLI LLA-99, proporcionou o uso intermitente de MTX e de 6-Mercaptopurina (6-MP) durante a terapia de manutenção para os pacientes de Baixo Risco, fornecendo menos toxicidade ao longo do tratamento e melhores taxas de sobrevivência livre de eventos.

No Brasil, o aprimoramento deste protocolo proporcionou maior índice de cura para a criança diagnosticada com LLA, culminando com a elevação da taxa de sobrevida livre de eventos para os dois grupos de risco, da ordem de 50% no GBTLI-LLA-80, e de 70% no GBTLI-LLA-93. Nesse sentido, foi possível verificar que a administração do protocolo GBTLI-LLA-99 alcançou taxa de remissão em torno de 95,3%, taxa de sobrevida geral de 88,1% e sobrevida livre de eventos em cinco anos de 80,2% (Cazé, Bueno & Santos, 2010).

A quimioterapia IT administrada neste protocolo é formada pela combinação de MTX, citarabina e dexametasona, cujas doses de cada fármaco são aplicadas de acordo com a idade do paciente e identificada no protocolo pela sigla MADIT (Cazé et al., 2010), como exposto na Tabela 1. O uso da combinação MADIT (MTX, citarabina e dexametasona IT) é indicado para a profilaxia e tratamento da leucemia no SNC e está presente em todas as etapas do protocolo terapêutico.

Tabela 1: Doses dos componentes da combinação MADIT ajustadas à idade dos pacientes.

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<1 ano 1-3 anos 3-8 anos >9 anos

Metotrexato (mg) 8 10 12 15

Citarabina (mg) 16 20 24 30

Dexametasona 2mg/m² com máximo de 2mg

O segundo grupo de participantes foram submetidos ao protocolo de tratamento para a LLA preconizado pelo grupo cooperativo alemão Berlim-Frankfurt-Munique em 2002, o ALL IC-BFM 2002.O protocolo ALL IC-BFM 2002 sofreu várias modificações ao longo dos anos até tornar-se o que tem sido administrado atualmente entre os pacientes diagnosticados com LLA. As mudanças implicaram em refinamentos, considerando as especificidades da doença, tais como o tipo de célula precursora da LLA, a classificação de risco, bem como a resposta ao tratamento verificada periodicamente através de vários exames, incluindo a imunofenotipagem, a contagem de glóbulos brancos, entre outros. Tais medidas foram tomadas para a redução dos níveis de toxicidade, bem como garantir a sobrevivência livre de eventos durante e após a terapia antileucêmica (Volejnikova et al., 2016).

As mudanças para a constituição do protocolo ALL IC-BFM 2002 foram realizadas a partir da redução na dose de MTX intravenoso de 5g/m² para 3 g/m² no Protocolo M, destinado ao tratamento de pacientes com LLA de células precursoras B e sua substituição por uma dose IT de MTX; retirada da Citarabina para o pacientes com LLA de células precursoras B; alocação aleatória dos participantes no grupo de risco básico no início do tratamento e introdução de protocolo breve número III, com redução da intensidade de quimioterapia para os grupos de menor risco (Baixo Risco e Risco Intermediário); retorno à terapia de 24 meses em manutenção contados do diagnóstico inicial para os meninos (realizada em 36 meses no protocolo anterior); e evolução de tratamento diferenciado para lactentes menores de 1 ano de idade (Volejnikova et al., 2016).

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Em ambos os protocolos os pacientes são distribuídos em grupos de risco, a partir de achados diagnósticos e fatores de prognóstico, utilizando-se dos critérios previstos pelo NCI (Estados Unidos), descritos em sessão anterior. Atualmente, existem os grupos de Baixo Risco, Risco Intermediário e Alto Risco. Vale ressaltar que pacientes que são inicialmente incluídos no grupo de baixo risco e que no decorrer do tratamento apresentam características de alto risco, são automaticamente incluídos sob o regime de tratamento ideal para a nova condição apresentada (Cazé, Bueno & Santos, 2010).

No protocolo ALL IC-BFM 2002, a terapia da LLA nas crianças é altamente bem sucedida, atigindo taxas de sobrevivência que se aproximam de 90% entre os levantamentos feitos ao redor do mundo (Conter et al., 2010; Hunger et al., 2012).Este resultado é atribuído pela administração de múltiplos agentes quimioterápicos, com dosagem ajustada ao prognóstico para equilibrar,tanto o risco de recaída, quanto a toxicidade do tratamento. Além disso, as melhorias são referidas como consequências da cooperação a nível nacional e internacional, do Grupo de Estudos Internacional de Berlim-Frankfurt-Münster.

Para este protocolo, a terapia intratecal é diferente entre as estratificações de risco, de acordo com a Tabela 2 e 3 abaixo:

Tabela 2: Doses do Metotrexato IT ajustadas à idade dos pacientes de baixo risco BFM-2002.

Fármacos

Idades

<1 ano 1 ano 2 anos > 3 anos

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Tabela 3: Doses dos componentes da terapia intratecal ajustadas à idade dos pacientes de alto risco BFM-2002.

Fármacos

Idades

<1 ano 1-2 anos 2-3 anos > 3 anos

Metotrexato (mg) 6 8 10 12

Citarabina (mg) 16 20 26 30

Predinisona (mg) 4 6 8 10

Na Tabela 4 observa-se as diferenças de dosagens de MTX previstas nos protocolos terapêuticos GBTLI – LLA 99 e o IC – BFM 2002, administrados aos grupos de participantes desta pesquisa.

Tabela 4: Dosagem de MTX em função dos Protocolos de Tratamento .

Protocolos de Tratamento (para todos os grupos de risco)

GBTLI – LLA 99 BFM – 2002 MADIT < 1 ano – 8 mg 1- 3 anos – 10 mg 2- 8 anos – 12 mg > 9 anos – 15 mg < 1 ano – 6mg  1 e < 2 anos – 8 mg  > 2 e < 3 anos – 10 mg  > 3 anos – 12 mg

3. NEURODESENVOLVIMENTO E VULNERABILIDADE A AGENTES NEUROTÓXICOS

O sistema nervoso se transforma de forma intensa no período da infância e adolescência, através da interação de mecanismos neurobiológicos e socioculturais que proporcionam a emergência de sistemas funcionais que abrangem desde as funções elementares até as funções mais complexas, tanto na esfera cognitiva, quanto no que diz respeito à afetividade e ao comportamento (Flores, Lázaro & Ostrosky-Shejet, 2012).

Após a formação inicial do sistema nervoso, ainda em etapas intrauterinas, o desenvolvimento se segue através da arborização dendrítica, da sinaptogênese, do

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desenvolvimento axonal, da mielinização e do desenvolvimento de sistemas de neurotransmissão. Durante a sinaptogênese são estabelecidas as conexões sinápticas e a comunicação entre os inúmeros neurônios. Porém, esse número é reduzido através da eliminação seletiva de conexões em desuso, sendo mantidas aquelas que desempenham importante papel no desenvolvimento funcional.

Após a consolidação deste processo seletivo, os neurônios remanescentes passam a ter seus axônios revestidos por uma camada, a saber, bainha de mielina, também chamada de substância branca, cujo papel principal está intimamente relacionado ao aumento da velocidade de condução dos impulsos nervosos que conectam as diferentes regiões cerebrais. O resultado deste processo, chamado de mielinização, é o refinamento do funcionamento cognitivo, o aumento da eficiência e especialização funcional das diversas áreas do córtex cerebral (Flores Lázaro & Ostrosky-Shejet, 2012).

Vale destacar que o Sistema Nervoso Central possui diferentes ritmos de maturação para cada região específica, sendo estes associados ao desenvolvimento funcional. Dessa forma, a mielinização de áreas sensitivas e motoras ocorre nos primeiros meses após o nascimento, enquanto a mielinização de áreas associativas, como o córtex pré-frontal, continua até a adolescência (Flores Lázaro & Ostrosky-Shejet, 2012). Nessa mesma direção, os pressupostos teóricos de Luria (1981) identificaram três unidades funcionais para melhor compreender a organização cerebral na participação de atividades mentais, organizadas hierarquicamente em zonas corticais primária, secundária e terciária, presentes nas três unidades funcionais. Tanto as zonas corticais quanto as unidades funcionais desenvolvem-se respeitando um ritmo próprio, formado por estágios importantes que seguem o percurso de desenvolvimento descrito a seguir (Ciasca, Guimarães & Tabaquim, 2006), que seguem:

1. Áreas primárias: 0 – 12 meses; 2. Áreas secundárias: 0 – 5 anos;

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3. Áreas terciárias iniciais: 5 – 8 anos

4. Áreas terciárias finais: adolescência – 24 anos

Dessa forma, o desenvolvimento é marcado por períodos específicos de acentuada maturação estrutural e funcional de distintas regiões cerebrais, durantes os quais, está em curso o máximo potencial para o desenvolvimento das funções a estas associadas, caracterizando os chamados períodos críticos de desenvolvimento. Em condições de desenvolvimento típico, tal processo permite a emergência de funções cognitivas refinadas, flexibilidade e abertura aos fatores não biológicos, o que implica dizer que neste momento as variáveis associadas à dimensão histórico-cultural ganham expressão máxima sobre o desenvolvimento das funções cognitivas (Andrade &Bueno, 2006).

Porém, em condições de desenvolvimento atípico, tais como no caso das lesões tratadas neste estudo, a interferência não programada exerce impacto sobre o processo de maturação cerebral, no qual podem ocorrer alterações, tanto positivas quanto negativas, na rota empreendida pelo sistema nervoso em desenvolvimento.

Como mencionado anteriormente, a LLA acomete especialmente indivíduos entre 0 e 15 anos de idade, destacando-se o período entre o primeiro e o quinto ano de vida que se constitui o maior pico de incidência da doença, graficamente representado pela figura 4. É importante salientar que a incidência da LLA neste período do desenvolvimento infantojuvenil, implica em particularidade importante se comparada à fase adulta, a saber, a exposição a agentes neurotóxicos durante o desenvolvimento do sistema nervoso. Como mencionado anteriormente, nesta fase o processo de mielinização das fibras nervosas está em plena atividade, conferindo às estruturas deste sistema maior suscetibilidade aos efeitos tóxicos da quimioterapia (Plas et al, 2015; Nieman & Schachar, 2015).

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Figura 4: Incidência da LLA por faixa etária (Plas et al, 2015).

Nessa fase, a topografia funcional do cérebro ainda não se encontra plenamente estabelecida. Nesse sentido, a doença e seu tratamento constituem-se enquanto variáveis intervenientes que podem ocasionar desvios significativos no processo normal de maturação cerebral (Mello et. al., 2006), ocasionando a emergência de alterações neurocognitivas significativas entre sobreviventes de LLA, que podem ser explicadas pelos danos relacionados ao tratamento direcionado ao tecido cerebral durante os estágios iniciais de desenvolvimento. Exemplificando, lesões que comprometam a SB existente e a sua formação futura podem prejudicar a adaptabilidade e o próprio processo de reorganização do sistema nervoso em desenvolvimento, cujos efeitos tardios podem incidir sobre funções que ainda não se desenvolveram (Chapman & McKinnon, 2000).

3.1.Metotrexato e o impacto sobre a Substância Branca

Estudos conduzidos nas últimas décadas apontam para alterações no

neurodesenvolvimento associadas aos efeitos neurotóxicos dos fármacos e da radiação ionizante (REFS). A principal hipótese utilizada para explicar as alterações neurocognitivas

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encontradas em sobreviventes do câncer é a de que danos difusos de substância branca, induzidos pelo tratamento antineoplásico direcionado ao SNC, causam prejuízos em funções cognitivas fundamentais. Corroborando tais achados, dados de neuroimagem quantitativa apontam para a presença de alterações estruturais no cérebro de pacientes sobreviventes, como atrofia devido à perda de substância branca (Reddick et al., 2014; Riggs et al., 2014; Palmer et al., 2012; Aukema et al., 2009; Mabbot et al., 2008).

A quimioterapia tem sido apontada como uma importante fonte de danos ao SNC, notadamente no contexto do neurodesenvolvimento. Alguns estudos buscam relacionar declínios neurocognitivos ao uso de fármacos específicos nas diferentes etapas do tratamento quimioterápico profilático, dando destaque à citarabina, aos corticoesteróides e ao MTX. Entretanto, a necessidade do uso combinado dos fármacos dificulta o estabelecimento de relações precisas entre um agente químico específico e um déficit neurocognitivo tardio peculiar associado à sua administração (Nathan et al., 2007). Contudo, acumulam-se evidências científicas que sugerem a associação do MTX a danos estruturais e funcionais no tecido cerebral, expressos na redução de volume e nos prejuízos microestruturais às substâncias branca e cinzenta (Jacola et al, 2016; Kaiser, Bledowski, & Dietrich, 2014).

No tocante à fisiopatologia deste fármaco, tem-se a consideração das diversas vias metabólicas pelas quais o MTX é administrado e, por isso, compreendido como principal responsável pela neurotoxicidade do tratamento. A toxicidade por MTX em crianças tratadas para LLA oscila entre 3% e 18%, de acordo com a dose e via de administração, sendo as modalidades de introdução do fármaco no organismo pelo meio intravenoso e IT as mais relatadas pela literatura enquanto fontes de danos. Soma-se a esta variável, a idade do paciente (precocidade aumenta o risco) e irradiação craniana associada. Em um estudo que investigou pacientes tratados para linfoma primário no SNC, a incidência de neurotoxicidade entre aquelas que receberam quimioterapia à base de MTX foi de 30% (Naidich et al., 2015).

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No que diz respeito ao MTX, sabe-se que este é um agente quimioterápico ciclo-específico, classificado como antagonista do ácido fólico (ou folato) pertencente à classe dos antimetabólicos, utilizado no tratamento de uma série de neoplasias, incluindo a LLA. O seu uso remete à década de 50, quando passou a ser utilizado em diversas terapias, além dos tratamentos direcionados às neoplasias. A sua administração pode ser feita pelas vias oral, subcutânea, intramuscular, intravenosa e intratecal. A atuação do fármaco consiste no

bloqueio da replicação celular através da inibição de componentes (DFRH1) que impedem a

síntese de DNA, o que pode prejudicar a síntese de diversas macromoléculas, incluindo as proteínas mielina e os lipídios (Naidich et al., 2015). Além disso, a inibição da DHFR leva à deficiência de S-adenosilmetionina, importante na manutenção da bainha de mielina e no acúmulo de homocisteína, que se acredita ser diretamente tóxica ao endotélio vascular. O MTX pode elevar ainda níveis de adenosina no líquido cerebrospinal, podendo assim interferir na síntese de neurotransmissores. A consequência de um ou mais desses processos parece ser a desmielinização ou os microinfartos (Leke, 2005; Naidich et al., 2015).

O MTX constitui a base de toda terapia antileucêmica, principalmente para o controle sistemático da leucemia na profilaxia e tratamento dos sítios de proliferação, incluindo o SNC, todavia, apontado pela literatura como um dos maiores responsáveis pela neurotoxicidade aguda, subaguda e tardia, associando-se a efeitos cognitivos a curto e longo prazo em crianças com neoplasias hematológicas (Bhojwani et al., 2014a; Roy, Ghosh, Saha, & Chatterjee, 2013), notadamente quando há associação do uso intravenoso em baixas, intermediárias e altas doses ou após administração IT (Moleski, 2000). A manifestação clínica do quadro de neurotoxicidade imediata expressa-se nas primeiras horas após a infusão de altas

1 DFHR: enzima di-hidrofolato reductase. O MTX evita a conversão de ácido fólico para tetraidrofólico pela

enzima di-hidrofolato redutase, um passo necessário para a síntese do DNA (Naidich et al., 2015), impedindo as reações de transferência de unidades de carbono, afetando dessa forma a síntese de DNA, RNA e divisão celular (Leke, 2005).

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doses pela via intravenosa ou IT, podendo surgir meningite asséptica, mielite transversa ou manifestações semelhantes ao infarto isquêmico cerebral. Já a neurotoxicidade subaguda ocorre em qualquer momento, desde alguns dias a várias semanas após a administração de MTX e geralmente resulta em crises epilépticas ou manifestações semelhantes ao infarto isquêmico cerebral (incluindo afasia, fraqueza, déficit sensorial e ataxia). Ambas as manifestações são usualmente transitórias e superadas em aproximadamente uma semana.

Com relação à expressão clínica tardia dos efeitos relacionados ao tratamento, os sintomas aparecem vários meses, ou mesmo anos, após a terapia e são caracterizados por uma série de alterações cognitivas, como a redução dos valores de QI, associada a dificuldades na aquisição de novas informações e desenvolvimento de habilidades, bem como a prejuízos na memória e na atenção (Pecham et al., 1988; Langer et al., 2002; Correa et al., 2004 em Leke, 2005).

As alterações supracitadas, são descritas principalmente em estudos que se referem à administração dos protocolos de tratamento que combinam irradiação de crânio e neuroeixo e quimioterapia à base de MTX. O tempo médio de início da terapia com MTX até a manifestação dos efeitos tardios é de aproximadamente quinze meses e, até o momento, não existe terapia efetiva para os sintomas tardios (Naidich et al., 2015).Acredita-se que a manifestação tardia dos sintomas de neurotoxicidade, como o rebaixamento cognitivo, esteja relacionada com a angeíte necrosante, quadro que pode levar à isquemia, infarto e necrose, com eventual desenvolvimento de calcificação, mais frequente em terapia combinada, mas também presente em pacientes tratados exclusivamente com MTX. As lesões demonstraram necrose extensa ou desmielinização com edema circundante e aumento do número de astrócitos próximos às lesões degenerativas, nas quais os axônios das áreas afetadas apresentam-se inchados, mas não destruídos, além de alterações inflamatórias geralmente não

Referências

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