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Panorama Macroeconômico

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FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS

ISSN 1234-5678

Nº 311 Agosto / 2006

Simão Davi Silber destaca a reversão da trajetória explosiva da relação dívida/PIB, e a necessidade de melhoria da qualidade das despesas do governo.

Cláudia Assunção dos Santos Viegas, no segundo artigo da série iniciada em julho, explica a metodologia adotada pelo modelo empírico usado para tratar o processo de fusões e aquisições na indústria de alimentos e bebidas.

Rogério Nagamine Costanzi analisa a retomada do emprego na indústria de transformação e o processo de relocalização da produção industrial.

Edgard Almeida Pimentel e Juliana Domingues Zucchi testam a presença de discriminação – entre brancos e negros – na formação de salários, entrada no mercado de trabalho e acesso à escola.

Daniela Corrêa analisa os limites institucionais ao crescimento da Tailândia, o processo de reformas e a reação do país diante da crise asiática.

Segundo a Carta Fipe, para desvalorizar a taxa de câmbio é preciso mudar a combinação das políticas fiscal, monetária e comercial. Rodrigo Celoto analisa os resultados das contas públicas do primeiro semestre do

ano, com destaque para o crescimento da receita total do Tesouro em comparação com o mesmo período de 2005. Roberto Luis Troster comenta, depois de nova redução da taxa Selic, os demais fa-tores que mantêm o custo do crédito no País entre os mais elevados do mundo. Hélio Nogueira da Cruz avalia os resultados do setor externo e coloca uma

eventual desaceleração da economia mundial como principal ameaça de longo prazo ao desempenho do setor. Bruno Varella Miranda comenta algumas contradições da agricultura brasileira, e o

papel da cultura de endividamento freqüente entre os agricultores. Antonio Lanzana analisa os indicadores relativos ao nível de atividade, destacando

o crescimento no primeiro semestre e as perspectivas para o resto do ano.

Panorama Macroeconômico

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INFORMAÇÕES FIPE É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DE CONJUNTURA ECONÔMICA DA FUNDAÇÃO

ISSN 1234-5678

CONSELHO CURADOR

Hélio Nogueira da Cruz (Presidente) André Franco Montoro Filho Andrea Sandro Calabi Joaquim José Martins Guilhoto Ricardo Abramovay Maria Cristina Cacciamali Simão Davi Silber DIRETORIA

DIRETOR PRESIDENTE

Carlos Antonio Luque DIRETOR DE PESQUISA

Eduardo Haddad DIRETOR DE CURSOS

Paulo Picchetti PÓS-GRADUAÇÃO

Dante Mendes Aldrighi SECRETARIA EXECUTIVA

Domingos Pimentel Bortoletto COORDENAÇÃO DE PUBLICAÇÕES - SUPERVISÃO EDITORIAL E PRODUÇÃO

Eny Elza Ceotto EDITOR CHEFE

Gilberto Tadeu Lima CONSELHO EDITORIAL

Ivo Torres Lenina Pomeranz Luiz Martins Lopes José Paulo Z. Chahad Maria Cristina Cacciamali Maria Helena Pallares Zockun Simão Davi Silber ASSISTENTES

Maria de Jesus Soares Luis Dias Pereira PROGRAMAÇÃO VISUAL E COMPOSIÇÃO

Nº 311 AGOSTO DE 2006

AS IDÉIAS E OPINIÕES EXPOSTAS NOS ARTIGOS SÃO DE RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DOS AUTORES, NÃO REFLETINDO A OPINIÃO DA FIPE PANORAMA MACROECONÔMICO

carta Fipe ... 3 finanças públicas ... 4

RodRigo RodRigues Celoto

política monetária ... 6

RobeRto luis tRosteR

setor externo ... 8

Hélio NogueiRada CRuz

agricultura ... 9

bRuNo VaRella MiRaNda

nível de atividade ... 11

aNtoNio laNzaNa

ARTIGOS 13 ... o controle sobre a expansão das despesas do governo

siMão daVi silbeR 17 ... fusões e aquisições na indústria brasileira de alimentos e bebidas

Cláudia assuNçãodos saNtos Viegas 21 ... emprego industrial: como explicar a retomada e a relocalização?

RogéRio NagaMiNe CostaNzi 28 ... raça no Brasil: métodos consistentes gerando evidências coerentes

edgaRd alMeida PiMeNtel, JuliaNa doMiNgues zuCCHi 32 ... Tailândia: limites institucionais ao crescimento, reformas e crise

daNiela CoRRêa 37 ... não-linearidade nos ciclos de negócios no Brasil

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agosto de 2006

panorama macroeconômico

carta Fipe

te, o exuberante crescimento da economia mundial não somente aumentou a demanda pelos nossos produtos, como contribuiu para o aumento de seus preços. Também as mudanças tributárias de 2002 e 2003 (PIS/COFINS) equalizaram a tributação de produtos nacionais e importados, além de desonerar as exportações.

A política monetária apertada no Brasil foi decorrente do próprio dinamismo do setor externo, que manteve elevadas taxas de crescimento das exportações líqui-das. Já a política fiscal não pára de ser expansionista e o crédito ao consumo tem sido muito sensível a pe-quenos alívios da política monetária. Por isso, o cum-primento das metas de inflação com essas variáveis de contorno passa necessariamente por uma política monetária muito apertada, pressionando ainda mais a valorização do câmbio.

O que poderia ser feito, então, com a taxa de câmbio? Forçar uma desvalorização seria jogar fora todo o esforço deflacionário dos últimos anos. O que pode-ria ser feito é uma diferente combinação de políticas fiscal, monetária e comercial que desvalorizaria a taxa de câmbio ao longo de um certo tempo. Poderíamos praticar uma política fiscal contracionista, o que per-mitiria o afrouxamento da política monetária. No contexto de uma nova política comercial, poderíamos aproveitar o momento para reduzir drasticamente as atuais tarifas de importação (o País ainda é muito fechado), o que ajudaria a reduzir mais rapidamente o superávit comercial brasileiro.

A desaceleração do crescimento das exportações físi-cas brasileiras, o contrário ocorrendo com as impor-tações, está provocando a retomada do debate sobre a apreciação de nossa taxa de câmbio. A quantidade exportada pelo Brasil cresceu 19% em 2004, 9% em 2005 e apenas 3,2% nos primeiros sete meses deste ano. Para as importações físicas, o crescimento foi de 5,4% em 2005 e de 14% nos primeiros sete meses deste ano.

Uma taxa de câmbio valorizada não é saudável para o crescimento econômico de um país com instituições fracas de garantias de contratos e de direitos de proprie-dade. Ao contrário, uma taxa de câmbio desvalorizada o suficiente mantém o retorno de todo um segmento (co-mercializáveis) suficientemente alto para remunerar o risco de se investir no Brasil. Este segmento acaba por se tornar o setor dinâmico da economia. Adicionalmente, uma taxa de câmbio desvalorizada aumenta o comércio indefinidamente (ao contrário da valorizada) e traz benefícios enormes para o País ao permitir importações de bens e tecnologia (maior produtividade).

Nossa taxa de câmbio se valorizou nos últimos anos por dois motivos: pela enorme virada do déficit de transações correntes e pela apertadíssima política fis-cal. O País saiu de um déficit em transações correntes de US$ 35 bilhões em 1998 para um superávit superior a US$ 10 bilhões em 2005 (previsão de US$ 9 bilhões em 2006 e outra de US$ 4,1 bilhões em 2007).

A taxa de câmbio desvalorizada do período 1999-2004 em muito contribuiu para essa virada.

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Adicionalmen-agosto de 2006

RodRigo RodRigues Celoto (*)

finanças públicas

1. Necessidades de Financiamento do Setor Público

O resultado primário no primeiro semestre do ano foi de R$ 57.2 bilhões (5,77% do PIB) de superávit contra R$ 59,9 bilhões (6,53% do PIB) do mesmo período do ano passado. O governo central obteve um superávit de R$ 57,6 bilhões (5,82% do PIB) no primeiro semestre contra R$ 56,48 bilhões (6,15% do PIB) no mesmo período de 2005. Os governos regionais tiveram um superávit de R$ 11,5 bilhões (1,17% do PIB) e as empresas estatais aumentaram seu superávit primário de R$ 5,8 bilhões (0,64% do PIB) para R$ 7 bilhões (0,71% do PIB). Os juros nominais saíram de R$ 80,12 bilhões (8,72% do PIB) no primeiro semestre do ano passado para R$ 81,64 bilhões (8,25% do PIB) neste ano. As despesas com juros do governo central subiram de R$ 62,04 bilhões (6,76% do PIB) para R$ 69,06 bilhões (6,98% do PIB). As despesas dos governos regionais foram de R$ 13,64 bilhões (1,38% do PIB) contra R$ 16,43 bilhões (1,79% do PIB) de 2005.

O resultado nominal do setor público de janeiro a junho deste ano corresponde a um déficit de R$ 24,48 bilhões (2,47% do PIB) contra R$ 20,17 bilhões (2,2% do PIB) no mesmo período do ano passado. O governo central teve um déficit de R$ 30,53 bilhões (3,08% do PIB) contra R$ 21,63 bilhões (2,36% do PIB) no primeiro semestre do ano anterior. Os governos regionais tiveram um déficit no primeiro semestre de R$ 2,08 bilhões (0,21% do PIB), contra R$ 2,72 bilhões (0,30% do PIB) no mesmo período do ano passado. As

empresas estatais, por sua vez, alcançaram no primei-ro semestre um superávit de R$ 8,12 milhões (0,82% do PIB) contra um superávit de R$ 4,18 bilhões (0,46% do PIB) no mesmo período de 2005.

2. Resultado do Tesouro Nacional

A receita total do Tesouro Nacional no primeiro se-mestre foi de R$ 261,12 bilhões, representando um crescimento de 11,0% em termos nominais em rela-ção ao mesmo período de 2005. A receita subiu como proporção do PIB e ficou em 26,35% contra 25,62% no ano passado.

A receita do Tesouro cresceu 10,7% e a receita da pre-vidência cresceu 12,6%. As transferências tiveram um acréscimo de 10,2% no primeiro semestre em relação ao mesmo período do ano passado.

As despesas aumentaram 14% no primeiro semestre, chegando a R$ 177,04 bilhões, sendo de 11,4% o cres-cimento das despesas com pessoal e encargos, 13,9% o crescimento com benefícios previdenciários e 16,9% o crescimento em custeio e capital.

O resultado primário do governo central no primeiro semestre foi de R$ 38,34 bilhões, um crescimento zero em relação ao mesmo período de 2005. O Tesouro contribuiu com um superávit de R$ 57,41 bilhões, um crescimento de 5,5%, e a previdência contribuiu para um déficit de R$ 18,97 bilhões, um acréscimo de 17,9% em relação ao mesmo período do ano anterior.

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agosto de 2006   Jan-Jun     2005 2006 % 06/05 Receita Total 235.143 261.120 11,0% Receitas do Tesouro  185.346  205.176  10,7% Receita da Previdência  49.029  55.226  12,6% Receita do Banco Central  767  718  -6,3% Transferências 41.507 45.727 10,2% Receita Líquida 193.636 215.393 11,2% Despesa Total 155.267 177.044 14,0% Despesas do Tesouro 89.398 102.033 14,1%    Pessoal e encargos  43.584  48.543  11,4%    Custeio e Capital  45.494  53.192  16,9% Transfer. ao Banco Central  321  297  -7,3%

Desp. da Previdência Social  65.119  74.201  13,9%

Despesas do Banco Central  750  810  7,9%

Result. Primário Governo Central 38.369 38.349 -0,1%

   Tesouro Nacional  54.441  57.416  5,5%    Previdência Social (16.089)  (18.975) 17,9%

Banco Central  17   (91) -646,7%

Resultado Primário Governo/PIB 4,18% 3,87% -7,4% tabela 2 - resultado do Tesouro Nacional - R$ milhões

(*) Economista – Participante do Grupo de Conjuntura da FIPE.

 

R$ milhões Correntes % PIB

2005  2006  2005  2006 

Discriminação Jan-Jun Ano Jan-Jun Jan-Jun Ano Jan-Jun

Nominal 20 179 63 641 24 486 2,20 3,28 2,47    Governo central 21 634  73 284  30 530  2,36  3,78  3,08        Governo federal1/ 21 567  74 106  25 371  2,35  3,82  2,56        Bacen  67  - 822  5 159  0,01  -0,04  0,52     Governos regionais 2 728  5 416  2 085  0,30  0,28  0,21        Governos estaduais  2 878  4 755  1 370  0,31  0,25  0,14        Governos municipais - 150   661   715  -0,02  0,03  0,07     Empresas estatais -4 183  -15 060  -8 129  -0,46  -0,78  -0,82        Empresas estatais federais -2 963  -14 248  -6 701  -0,32  -0,74  -0,68        Empresas estatais estaduais -1 270  - 940  -1 523  -0,14  -0,05  -0,15        Empresas estatais municipais  49   128   95  0,01  0,01  0,01  Juros nominais 80 128 157 146 81 640 8,72 8,11 8,25    Governo central 62 045  129 025  69 061  6,76  6,66  6,98        Governo federal1/ 61 961  130 159  63 994  6,75  6,72  6,46        Bacen  84  -1 134  5 067  0,01  -0,06  0,51     Governos regionais 16 432  26 739  13 642  1,79  1,38  1,38        Governos estaduais 13 671  21 949  11 254  1,49  1,13  1,14        Governos municipais 2 762  4 790  2 388  0,30  0,25  0,24     Empresas estatais 1 651  1 381  -1 063  0,18  0,07  -0,11        Empresas estatais federais  851  -1 070  -2 082  0,09  -0,06  -0,21        Empresas estatais estaduais  700  2 220   912  0,08  0,11  0,09        Empresas estatais municipais  100   230   107  0,01  0,01  0,01  Primário -59 950 -93 505 -57 154 -6,53 -4,83 -5,77    Governo central -40 411  -55 741  -38 531  -4,40  -2,88  -3,89        Governo federal -56 483  -93 629  -57 598  -6,15  -4,83  -5,82        Bacen - 17   312   92  0,00  0,02  0,01        INSS 16 089  37 576  18 975  1,75  1,94  1,92     Governos regionais -13 704  -21 323  -11 557  -1,49  -1,10  -1,17        Governos estaduais -10 792  -17 194  -9 885  -1,18  -0,89  -1,00        Governos municipais -2 912  -4 129  -1 673  -0,32  -0,21  -0,17     Empresas estatais -5 834  -16 440  -7 066  -0,64  -0,85  -0,71        Empresas estatais federais -3 814  -13 178  -4 619  -0,42  -0,68  -0,47        Empresas estatais estaduais -1 969  -3 160  -2 435  -0,21  -0,16  -0,25        Empresas estatais municipais - 51  - 102  - 12  -0,01  -0,01  0,00 

tabela 1 - necessidades de financiamento do setor público

Fonte: BCB.

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agosto de 2006

Com a queda da taxa Selic para patamares mais baixo, é preemente atuar nos demais fatores que mantêm o custo do crédito elevado, um dos mais altos do mundo. É um despropósito que um sistema bancário sofisticado e eficiente, como o brasileiro, tenha taxas de empréstimos tão elevadas como tem. A causa é uma soma de distorções: uma tributação inadequa-da, um quadro institucional obsoleto, uma dinâmica macroeconômica precária, depósitos compulsórios abstrusos e, principalmente, a ausência de um diag-nóstico correto.

Numa situação ideal em que o lucro dos bancos fosse eliminado, que as instituições operassem sem custos e sem inadimplência, que a taxa Selic fosse zero e com aplicadores que não exigissem remuneração, numa operação de intermediação de um mês, a taxa para o tomador, em razão do PIS, Cofins, IOF, CPMF, compulsório, IRF e FGC, seria de 29,40% ao ano. Um absurdo!

É fato corriqueiro que com um bom cadastro e cópia do CIC, RG e prova de residência o financiamento de um automóvel é concedido em menos de uma hora, enquanto que o financiamento de uma casa do mesmo valor demora mais de um mês para ser aprovado, e exige certidões, impostos e registros adicionais que custam cerca de 5% do preço do imóvel. É um con-tra-senso.

De cada R$ 1,00 em depósitos a vista, o banco só pode emprestar livremente R$ 0,20; os R$ 0,80 restantes têm que ser aplicados da seguinte forma: R$ 0,45 em espécie no Banco Central, R$ 0,08 em títulos, R$ 0,02 em microcrédito e R$ 0,25 em crédito rural a taxas subsidiadas. Essas aplicações a taxas abaixo do custo funcionam como um imposto indireto que incide sobre os tomadores de crédito.

O Brasil tem uma das taxas mais elevadas de concen-tração de renda do mundo, mesmo assim tributa-se diretamente, com impostos, e indiretamente, com depósitos compulsórios, os tomadores de crédito dos bancos, encarecendo seu custo. É um despautério. Atualmente os depósitos compulsórios no Banco Central do Brasil, de R$ 155 bilhões, são superiores ao total de empréstimos à indústria, ou ao total dos créditos ao setor rural e imobiliário, juntos. Não se deve estranhar que os créditos industrial, rural e imobiliário sejam caros e escassos.

É surpreendente que a taxa de juros básica brasileira, a taxa Selic, reduzida, hoje, ao nível mais baixo em mais de três décadas, e mesmo assim, quando cote-jada com as taxas de juros básicas de outros países, continua sendo uma das mais elevadas do mundo. É insensato.

O quadro fiscal brasileiro assusta. As vinculações de receita tributária, a prodigalidade, as despesas supér-fluas e a racionalidade discutível dos gastos públicos colocam, por um lado, a dívida pública numa dinâmi-ca precária, que inviabiliza a redução expressiva da taxa de juros básica, e por outro, emperra a aceleração da taxa de crescimento do PIB.

A execução de contratos no Brasil é excessivamente formalista e tem uma estrutura normativa defasada, cheia de recursos protelatórios, fazendo com que centenas de milhares de horas de advogados talen-tosos sejam desperdiçadas, encarecendo o custo do crédito. Estatísticas do Ministério da Justiça apontam que o custo de execução de um contrato de até R$ 500, quando é solucionado na justiça em menos de três anos é, em média, de 97,2% de seu valor. O número fala por si.

RobeRto luis tRosteR (*)

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agosto de 2006 O Brasil tem condições para crescer sustentadamente

a taxas de crescimento altas. Para tanto, tem uma agenda extensa a cumprir, que inclui superar a bar-reira do crédito.

Não é razoável esperar de uma política bancária, que aumenta os depósitos compulsórios e que eleva a alíquota do PIS Cofins, uma redução expressiva das taxas de crédito. Da mesma forma, não é justo culpar a Selic e o lucro dos bancos pelos empréstimos caros no Brasil, ignorando as demais causas. A superação da barreira do crédito demanda um diagnóstico realista

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agosto de 2006

Os seguidos anos de prosperidade na economia mundial, impulsionada, principalmente, pelo expres-sivo desempenho das economias norte-americana e chinesa, têm proporcionado resultados favoráveis em muitas economias, entre elas a dos países da América Latina e do Brasil.

Durante os sete primeiros meses do ano as exporta-ções brasileiras totalizaram US$ 74,522 bilhões, com crescimento de 15,1% em relação a igual período de 2005 e o valor de US$ 128,091 bilhões nos últimos doze meses. Em julho as exportações alcançaram US$ 13,622 bilhões, com expansão de 23,1% em relação ao mesmo período do ano passado. O alto ritmo de expansão internacional tem provocado a elevação da demanda de inúmeros produtos da pauta de expor-tação brasileira, com preços em forte elevação, como ocorre, por exemplo, com o minério de ferro, petróleo e soja. O governo, entretanto, não alterou a meta anual de exportações de US$ 132 bilhões, embora isto deva ocorrer. Observa-se, contudo, que esta expansão pode ser limitada pelo valor da taxa de câmbio, tendo ocor-rido redução do número de empresas exportadoras nos últimos meses.

As importações também apresentaram o expressivo aumento de 23,1% neste ano. As importações foram de US$ 49,352 bilhões no ano e no acumulado de doze meses foram de US$ 82,863 bilhões. Em julho as importações foram de US$ 7,984 bilhões, com crescimento de 31,8% em relação a igual mês de 2005. Nos últimos meses do ano as importações devem se elevar, mas a baixa taxa de crescimento da economia doméstica inibe uma maior expansão.

O superávit comercial de julho foi de US$ 5,638 bi-lhões, um novo recorde para o mês. Com o resultado de julho, o superávit soma US$ 25,170 bilhões no ano e no acumulado dos últimos doze meses US$ 45,228 bilhões. As autoridades governamentais estabele-ceram a meta de saldo comercial de US$ 41 bilhões

O cenário interno permanece positivo. A inflação está sob controle, seguindo a trajetória esperada. As taxas de juros apresentam queda, embora permane-çam em patamar elevado em termos reais. A taxa de câmbio, apesar da grande disponibilidade de moeda estrangeira, tem permanecido no patamar de 2,10 a 2,20 dólares por real nas últimas semanas, com intervenções pontuais do Banco Central para evitar uma valorização da moeda local mais expressiva. A valorização do real nos últimos anos tem afetado negativamente as exportações, estimulando as im-portações. Alguns setores, como calçados e têxtil, têm sofrido com a competição chinesa no mercado doméstico e internacional. O quadro eleitoral também parece oferecer horizontes tranqüilos, pois, seja com a vitória de Lula ou de Alckmin, não deverá ocorrer nenhuma mudança brusca na política econômica. Nos últimos meses de 2006 não devem ocorrer alterações mais significativas na economia brasileira, que deverá crescer pouco menos que 4%.

Há que se esperar as diretrizes econômicas do pró-ximo governo federal para que se crie um horizonte que possa favorecer um surto mais significativo de investimentos e que provoque a elevação do cresci-mento do País.

A desaceleração da economia mundial é a principal ameaça num prazo mais longo. Aguarda-se que as mu-danças estruturais em curso criem um País mais justo e moderno. A lenta evolução do quadro populacional brasileiro, que deverá apresentar menor crescimento e maior envelhecimento, o aprofundamento da mo-dernização do capital fixo e a melhoria da infra-es-trutura do País por meio de investimentos, que têm apresentado desempenho muito abaixo do padrão histórico e de suas necessidades de crescimento, são os fatores determinantes da evolução da estrutura produtiva do Brasil.

Hélio NogueiRada CRuz (*)

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agosto de 2006

Contradições da Agricultura Brasileira

Ao anunciar sua estimativa para a renda agrícola de 2006, o Ministério da Agricultura garantiu munição extra aos defensores de medidas de auxílio mais dire-tas aos agricultores. Entre outros dados, o levantamen-to aponlevantamen-tou a queda da renda das lavouras de soja em cerca de 9% em relação ao ano anterior. No entanto, não foram todos os setores atingidos por essa queda. No segmento da cana, por exemplo, é observado um crescimento na receita de cerca de 17%. Café e celulose são outros dois sistemas que estão apresentando bom desempenho vis-à-vis aos anos anteriores. De qualquer maneira, os dados globais ainda refletem os efeitos da crise de 2005, causadora de uma considerável retração na renda agrícola brasileira.

renda agrícola – 20 principais lavouras do País (US$ bilhões)

Fonte: Ministério da Agricultura (2006 – estimativa).

Por outro lado, o mesmo Ministério anunciou o recor-de recor-de exportações e superávit no campo. No último mês de julho, as exportações brasileiras do agronegó-cio atingiram a marca de US$ 5,237 bilhões, superando o valor do mesmo mês de 2005 em cerca de 28,6%. Apesar do importante aumento nas importações, o superávit do setor chegou a US$ 4,65 bilhões, ou seja,

aumento de cerca de 27% em relação ao mesmo mês do ano passado.

O crescimento nas exportações foi observado mesmo naqueles setores considerados em crise, como a soja, cujo volume vendido segue em alta apesar dos preços mais baixos e o câmbio desfavorável. Em outros, como o de carnes, a retração nas exportações foi compen-sada pelos melhores preços praticados, que em parte aliviaram a queda nas receitas resultante da crise de aftosa ocorrida no Brasil.

Entre todos os setores analisados, o que mais chama a atenção é o robusto crescimento das vendas conjuntas de álcool e açúcar, cerca de 123% superiores ao mês de julho de 2005. O aumento da demanda por bio-combustível deverá sustentar o crescimento do setor da cana nos próximos anos, em uma tendência que já é acompanhada pelo avanço da área plantada e os planos de construção de novas usinas nos próximos anos.

exportações do agronegócio (US$ bilhões)

Fonte: Ministério da Agricultura (2006 – estimativa).

Os dados apresentados acima mostram que a situação do agronegócio, apesar de ser prejudicada por fatores como o câmbio e a falta de infra-estrutura, tampouco bRuNo VaRella MiRaNda (*)

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agosto de 2006

pode ser considerada calamitosa. Em relação às lavou-ras mais afetadas pela crise de 2005, nota-se que em geral estas se beneficiaram de um contexto bastante favorável nos anos anteriores, sendo o caso da soja o mais visível. Dessa maneira, uma reflexão acerca da situação agrícola deve necessariamente levar em conta o papel dos agricultores neste quadro.

Muito se comentou sobre a crise da agricultura ao longo do ano de 2005, sendo em muitos casos notável a dramaticidade empregada no discurso dos repre-sentantes do setor. A atuação do governo, baseada na disponibilização de recursos e renegociação das dívidas, seguiu roteiros já conhecidos em nosso país, e que possuem efeitos paliativos. Certamente, a exemplo de quadros já observados anteriormente, medidas como a supracitada estimulam a manutenção de uma cultura de endividamento freqüente entre os agricultores. O próprio ex-ministro Rodrigues, ao reconhecer que o “otimismo” dos produtores rurais se reflete em compras de máquinas e expansão da produção nos tempos favoráveis, corrobora a tese de que há uma tendência ao endividamento por parte dos agricultores.

Em comparação com outros países, como os EUA e o Canadá, o Brasil dispõe de ineficientes mecanismos de apoio aos agricultores em períodos desfavoráveis. Tal instrumento depende não apenas de maior agilidade governamental, como também de um engajamento diferenciado por parte do setor agrícola, acostumado ao velho recurso de prorrogação das dívidas e pedidos por maior crédito. Dessa maneira, a implementação de um sistema de seguro rural financiado pelos pró-prios agricultores em anos favoráveis constitui uma das principais prioridades para o setor agrícola. De alguma forma é necessário que os agricultores pou-pem mais, prevenindo-se de quebras na safra ou de quedas nos preços internacionais.

Obviamente, o governo também tem culpa da má situação de determinados setores, como o de soja, sendo isto evidente principalmente na carência de in-fra-estrutura nas regiões produtoras, o que prejudica

o escoamento da produção e aumenta os custos. Neste sentido, os investimentos em transportes no Brasil deveriam ser encarados com maior interesse pelas autoridades federais, respeitando planos bem formu-lados e não apenas operações “tapa-buracos” levadas a cabo em anos eleitorais. No entanto, determinadas práticas dos agricultores – tais como, endividamento para aquisição de máquinas/equipamentos e terras em períodos de preços irreais – devem ser evitadas de modo a garantir que o drama empregado no discurso atual seja minimizado futuramente. O produtor bra-sileiro precisa aprender a se preparar nos momentos de bonança.

(*) Bacharel em Relações Internacionais pela USP e pesquisador do PENSA. E-mail: bvarella@yahoo.com.br

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agosto de 2006 Os indicadores relativos ao desempenho do nível de

atividade revelam três pontos importantes: a) queda da produção industrial em junho, a qual, no entanto, deve ser analisada com ressalvas; b) crescimento no primeiro semestre, que embora generalizado, é ainda comandado pelo setor de bens de consumo duráveis; e c) perspectiva de manutenção do crescimento no segundo semestre do ano.

De acordo com o IBGE, a produção industrial, em junho, registrou queda dessazonalizada de 1,7% em relação a maio, invertendo a tendência que se vinha observando nos meses recentes. Relativamente ao mesmo mês de 2005, também se observa queda (–0,6%).

indicadores da produção industrial por categoria de uso – Brasil – junho/2006

Categorias de Uso  Variação (%) Mês/Mês(*) Mensal Acumulado No  Ano Meses12  Bens de Capital -1,0 -2,0 5,0 4,1 Bens Intermediários -1,9 -0,5 1,7 0,6 Bens de Consumo -1,7 0,2 3,8 3,7 - Duráveis -1,1 -4,3 7,5 7,2 - Não-Duráveis -1,0 1,6 2,7 2,8 Indústria Geral -1,7 -0,6 2,6 2,0

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Indústria. (*) Série com ajuste sazonal.

É importante destacar dois fatores que afetaram os resultados de junho e as conseqüentes comparações. De um lado, a realização dos jogos da Copa do Mundo de futebol, que reduziu a jornada de trabalho nesse mês, e de outro, a diferença de dias úteis (21 em 2006 contra 22 em 2005).

O efeito dessas variáveis é muito mais forte na in-dústria do que no comércio, dado que o consumo é simplesmente transferido em razão dos jogos, e no final de semana as vendas continuam ocorrendo nor-malmente (principalmente aos sábados). Os dados da Associação Comercial de São Paulo confirmam esta perspectiva: no mês de junho, o número de consultas ao SCPC, no Município de São Paulo, cresceu 3,4% em relação ao mesmo mês de 2005; para a mesma compa-ração, o número de consultas ao Sistema Usecheque aumentou 5,0%.

Quando se analisa o primeiro semestre como um todo, nota-se que há variáveis impulsionando o nível de atividade. De fato, a produção industrial no período janeiro-junho mostrou expansão de 2,6%, em relação ao mesmo período do ano passado. E como se observa na tabela, embora o crescimento seja comandado pelos bens de consumo duráveis (+7,5%), todos os setores apresentaram taxas positivas de variação.

Setorialmente, é importante ainda destacar o cresci-mento da produção de bens de capital (+5,0%), com destaque para a fabricação de máquinas para escritório e equipamentos de informática, e também de máqui-nas, aparelhos e material elétrico.

Analisando-se os componentes da demanda agregada, verifica-se que a dinâmica do crescimento industrial no semestre foi dada pela demanda doméstica, já que as importações cresceram em ritmo superior às exportações. Entre os fatores que estariam “puxando” a demanda doméstica, cabe destacar: a) expansão do rendimento real médio, derivado não somente de elevações nominais, mas também da redução da taxa de inflação (o rendimento real médio cresceu 6,7% em junho deste ano, relativamente ao mesmo mês do ano passado); esse comportamento explica o crescimento aNtoNio laNzaNa (*)

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do setor produtor de bens de consumo não duráveis; b) redução das taxas de juros e aumento do crédito impactando positivamente o setor de bens de consu-mo duráveis; c) expansão dos gastos públicos, com a despesa do Tesouro Nacional crescendo mais de 10%, em termos reais, no primeiro semestre do ano, em relação ao mesmo período de 2005.

Os primeiros indicadores disponíveis para o início do segundo semestre mostram manutenção da ten-dência de crescimento do nível de atividade. Dados da Associação Comercial de São Paulo mostraram crescimento de 6,6% no número de consultas ao Sis-tema Usecheque e de 2,8% no número de consultas ao SCPC em julho, relativamente ao mesmo mês do ano passado (ver gráfico).

indicadores do comércio – município de São Paulo

(var. % em relação ao mesmo período do ano anterior)

Fonte: Associação Comercial de São Paulo.

É possível esperar a manutenção desse processo de crescimento no segundo semestre, dado que: a) em-bora haja dúvidas quanto à manutenção do processo de queda das taxas de juros, em razão da defasagem entre redução de juros e impacto sobre o consumo,

é possível esperar ampliação do consumo tendo em vista as decisões já tomadas sobre a SELIC, bem como pela manutenção da expansão do crédito; b) o aumento do salário mínimo deve ter impacto mais pronunciado no segundo semestre; e c) as medidas tomadas quanto à expansão do gasto público no pri-meiro semestre têm efeito contínuo, o que significa dizer que não haverá contração do gasto público na segunda metade do ano.

Nesse cenário, pode-se esperar um aumento do PIB entre 3,5% e 4,0% em 2006, superior, portanto, à me-dia de 2,5% a. a. registrada desde a implantação do Plano Real.

(*) Professor da FEA-USP. E-mail: lzn.tln@terra.com.br

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agosto de 2006

1. Introdução

As mudanças ocorridas na política fiscal brasileira a partir de 1999, com a implementação de superávits pri-mários elevados, têm possibilitado reverter a trajetória explosiva da relação dívida do governo como propor-ção do PIB. Trata-se de um resultado extremamente importante para garantir a consistência intertemporal da trajetória da dívida, mas ainda falta uma tarefa fundamental para consolidar um novo regime fiscal: o de melhorar a qualidade das despesas do governo. Até hoje não houve nenhum esforço consistente nesta direção, e os gastos públicos como proporção do PIB no Brasil estão acima do padrão internacional dos países em desenvolvimento.

É fundamental melhorar a qualidade do gasto público. Se isto for atingido, os recursos adicionais advindos

do crescimento da economia poderão ser repassados para o setor privado por meio de diminuição da carga tributária ou aumentar a capacidade de investimento do governo. Em ambos os casos haverá aumento da poupança interna e isto é fundamental para o desem-penho econômico de longo prazo da economia.

2. As Despesas de Consumo do Governo na Última Década

Dada a heterogeneidade das informações estatísticas sobre gastos públicos nas três esferas de governo, optou-se por trabalhar com um único agregado de despesas governamentais. Como existem estatísticas confiáveis sobre receita do governo, gastos previden-ciários, superávit primário e investimentos públicos, as demais despesas do governo podem ser obtidas como resíduo, de acordo com a seguinte identidade:1

siMão daVi silbeR (*)

o controle sobre a expansão

das despesas do governo

artigos

Outras Receita   Superávit Despesas com   Investimento da Despesas = Primária  (-)  Primário (+) Benefícios (+)  Administração do Governo do Governo

[

Previdenciários Pública

]

Este conceito de despesas do governo é idêntico ao das Contas Nacionais, representado pelos gastos de consumo do governo (G), excluindo, portanto, as transferências e os investimentos realizados pela administração pública.

Após a estabilização da inflação ocorrida a partir de 1994, a despeito de avanços nos controles sobre os gastos públicos (como a Lei de Responsabilidade Fiscal), observa-se expansão das despesas de custeio do governo como proporção do PIB. Dez anos atrás,

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tais despesas representavam 18,0% do PIB e em 2005 chegaram em 21,09% do PIB. Os detalhes são apre-sentados na tabela seguinte.

despesas do governo (% do PIB)

(*) exclui empresas estatais. (a) Carga Tributária + Outras Receitas do Governo como dividendos e renda de propriedade. Fonte: IPEA Boletim de Conjuntura, junho de 2006: Séries Históricas

e Boletim do Banco Central.

Este crescimento das despesas públicas até poderia ser festejado se a qualidade destes gastos se refletisse em indicadores sociais compatíveis com tal dispên-dio. Mas isto não ocorreu, como se verá no próximo item.

3. A Eficiência na Gestão das Despesas do Governo

Uma maneira de avaliar a qualidade do gasto do governo brasileiro é via comparações internacionais. Podem ser identificadas, de um lado, as prioridades do gasto público e, de outro, os resultados alcançados. Foram escolhidos dois setores que representam par-cela importante das despesas do governo: educação e saúde.

O padrão dos gastos com educação no Brasil pode ser avaliado comparando a intensidade dos gastos nos três níveis de ensino: o ensino fundamental, o médio e o universitário. O perfil que surge não é dos mais adequados: pelos padrões internacionais, há no Brasil pouca ênfase no ensino fundamental e médio e um excesso de gastos no ensino universitário. Para medir a intensidade do gasto público na educação

utilizou-se como indicador o gasto público per capita como proporção da renda per capita dos países inclu-ídos nas comparações internacionais.2

Com relação ao gasto per capita no ensino fundamen-tal, dado o nível de renda per capita do país, o Brasil gasta 20% a menos do que deveria; para o ensino médio, este desvio é mais dramático: o Brasil gasta 45% a menos do que deveria, dado o padrão médio mundial. Finalmente, completando a distorção, o gas-to per capita no ensino universitário está 20% acima do padrão internacional. O Brasil dá uma ênfase menor do que deveria ao ensino fundamental e médio e tem um gasto excessivo com ensino universitário. Os países bem-sucedidos em política educacional usaram o modelo oposto do brasileiro, que é elitista: universalizaram o ensino fundamental e médio de boa qualidade e fizeram com isso uma revolução educacional, que muito contribuiu para o sucesso econômico destas nações. O gasto em educação, pela experiência mundial, deve ser piramidal, com con-centração dos gastos no ensino fundamental e médio. Além disto, a eficiência do gasto público na educação não é adequada. Dado o gasto per capita com o ensino fundamental, a proporção de alunos que completam esse nível de educação no Brasil está 5% abaixo do que se esperaria pelo padrão médio internacional; com relação ao ensino universitário, o desempenho é decepcionante: com o gasto per capita feito pelo Brasil, o número de alunos matriculados no ensino universi-tário deveria ser o dobro do que se observa.

Resultado mais dramático se observa na área da saúde: o Brasil, dado o seu nível de renda per capita, tem um gasto com saúde acima da média mundial, porém com uma qualidade abaixo da média, já que a mortalidade infantil é alta e a esperança de vida ao nascer é menor do que se esperaria pelos gastos efetuados pelo governo.

Pelo padrão mundial, o gasto público com saúde no Brasil está 30% acima do que se esperaria pelo nível de renda per capita do país. Em princípio, esta poderia ser uma boa notícia, já que se estaria dando

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priorida-agosto de 2006 de à saúde da população nas políticas públicas. Mas

a produtividade destes gastos é muito baixa. Com base em comparações internacionais, dados os gastos com saúde per capita do Brasil, a mortalidade infantil deveria ser a metade da atual e a esperança de vida ao nascer deveria ser de mais cinco anos.

4. Propostas para Estabilizar o Gasto Real do Governo

Como se viu na seção anterior, um dos desafios do governo brasileiro é o de melhorar a qualidade do gasto público, de modo a obter melhores resultados, ao mesmo tempo que se mantém constante o gasto real per capita. As propostas que serão apresentadas tem o objetivo de indicar caminhos que levem os gastos de consumo do governo a crescer, em termos reais, à mesma taxa de crescimento da população brasileira A proposta envolve crescente austeridade fiscal, que deve ser acompanhada pela melhoria na qualidade do gasto público. Se isto for atingido, os recursos adicionais advindos do crescimento da economia poderão ser repassados para o setor privado por meio da diminuição da carga tributária e do aumento na capacidade de investimento do governo.

Na última década houve significativa expansão das despesas de custeio do governo como proporção do PIB. Tal evolução não poderá se repetir no futuro, sob pena de impossibilitar o crescimento da economia a taxas mais elevadas. A despesa real do governo (exclusive previdência, despesas financeiras e in-vestimentos) cresceu a uma taxa de 5,5% ao ano na última década. Se o crescimento do PIB for o da última década (2,5% a.a.), pode-se concluir que em 20 anos a carga tributária total deverá ser de 54% do PIB para acomodar somente esta expansão do gasto público. Para que isto não aconteça, é fundamental manter os gastos per capita constantes no futuro. As medidas a seguir contribuiriam para alcançar esse objetivo: (a) Um item decisivo para o controle do gasto público

está no aprimoramento no acompanhamento das despesas definido na Lei de Responsabilidade Fis-cal (LRF). Esta lei fixa limites para endividamento

do setor público e parâmetros para despesas com pessoal ativo e inativo. A primeira medida a ser implementada é a de definir o limite de endivida-mento para o governo federal: até hoje só existem estes limites para estados e municípios, mas não para o governo federal.

(b) Desde a sua promulgação, em maio de 2000, che-gou-se a um momento importante da vigência da lei, que é aquele em que a gestão completa de uma esfera de governo – a municipal – vai ser avaliada com base nos parâmetros da LRF. Não pode haver a menor dúvida de que esta lei tem que ser cumprida e os desvios punidos pela Lei dos Crimes de Res-ponsabilidade Fiscal. Não se pode, por exemplo, flexibilizar a interpretação dos limites de endivi-damento de prefeituras e estados definidos pela Resolução 40 do Senado, como o governo federal tentou fazer em janeiro de 2005, para acomodar o descumprimento dos limites intermediários de endividamento da prefeitura de São Paulo. (c) É fundamental a criação do Conselho de Gestão

Fiscal previsto na LRF. Este Conselho tem, entre suas atribuições, definir com grande detalhe meto-dológico os parâmetros de avaliação da gestão dos recursos públicos. Isto aumentaria a transparência, facilitaria a fiscalização, e evitaria as “maquiagens” na apresentação dos relatórios de gestão fiscal. Existem indicações de que vários estados registram parte da receita do ICMS em fundos extra-orça-mentários para reduzir repasses aos municípios, reduzir os encargos da dívida com o governo federal ou para evitar despesas obrigatórias com educação e saúde. Alguns estados, para burlar os limites de gasto com pessoal, omitem gastos com inativos e com o imposto de renda retido na fonte de seus funcionários. É prática comum, em final de mandato, o cancelamento de empenhos de bens e serviços efetivamente adquiridos, bem como a não contabilização de despesas como água e eletricidade.

(d) É necessário implementar cortes graduais nos gastos públicos e melhorar a gestão dos recursos disponíveis. Freqüentemente têm surgido

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propos-agosto de 2006

tas de desvinculação de receitas do governo como forma milagrosa e única para controlar os gastos públicos. Isto não é o suficiente, já que grande parte das despesas é obrigatória (64%) e já existe certa flexibilização nas vinculações, pela permissão de pagamentos de despesas obrigatórias, como a de pessoal, com estes recursos. Hoje existe a Desvinculação temporária de Recursos da União (DRU) que atinge 20% das receitas do governo federal. Uma ampliação desta desvinculação de receita para 40%, sem dúvida alguma, reduziria a rigidez orçamentária.

(e) Existem limites mínimos para gastos com educa-ção e saúde, que devem ser flexibilizados. A área de saúde, em particular, passou a ter uma regra rígida de alocação intertemporal de recursos, por meio da qual os gastos do governo devem crescer pela taxa de variação do PIB nominal, o que não é adequado.

(f) Para promover ganhos de eficiência é preciso re-duzir as vinculações de receita. Vinculações de Receita e gastos mínimos elevados representam um enorme desestímulo à eficiência no gasto público, já que os recursos estão garantidos. Adicionalmen-te, esta rigidez garante que o crescimento da econo-mia no longo prazo transforme automaticamente o aumento de receita do governo em despesa, o que inviabiliza a proposta de reforma fiscal definida neste trabalho.

(g) A medida adequada é reduzir gastos com pessoal e as fraudes com relação às despesas públicas. Re-dução do número de ministérios, órgãos públicos, secretarias e corte de pessoal por insuficiência de desempenho ou excesso de contingente, como está estabelecido na Reforma Administrativa. Um exemplo de fraude é o que está acontecendo com as despesas destinadas ao auxílio-doença. Nos últi-mos dois anos houve um enorme crescimento dos gastos nesta rubrica por falta de fiscalização. (h) Para racionalizar despesas com pessoal, o governo

Federal, dos Estados e dos Municípios, inclusive os

Poderes Legislativo e Judiciário, devem adequar a folha de pagamentos do funcionalismo público aos padrões de mercado e reduzir o elevado absen-teísmo no serviço público. A título de ilustração, pesquisa recente publicada pelo IBGE3 constatou

que no período de 1999 a 2002 houve aumento de 20% no número de funcionários públicos muni-cipais e que quanto menor o município maior a proporção de servidores por habitante.

(i) Ampliar a cobertura das compras governamentais por meio de leilões eletrônicos; experiências na administração pública do Estado de São Paulo in-dicam economia de até 27% nas compras de bens e serviços efetuadas por esse meio. O “governo eletrônico” também pode reduzir custos com pessoal. Outro exemplo do Estado de São Paulo é bem ilustrativo de aumento da produtividade com o uso de tecnologia: a substituição da audiência de presos por videoconferência trouxe redução significativa de custos.

1 A receita primária é a soma da receita tributária com outras recei-tas do governo, tais como dividendos e renda de propriedade; o cálculo exclui empresas estatais.

2 Informações estatísticas extraídas do World Development Indicators – 2005, do Banco Mundial.

3 Pesquisa de Informações Básicas Municipais – Gestão Pública (2005).

(*) Professor da FEA-USP. E-mail: sdsilber@usp.br

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agosto de 2006

1. Introdução

Este é o segundo artigo da série de três que resume a tese de doutorado defendida no Departamento de Economia da FEA-USP em maio de 2006. O artigo anterior contextualizou a oferta e a demanda da in-dústria brasileira de alimentos e bebidas. Este artigo oferece explicações sobre a metodologia adotada pelo modelo empírico (artigo 3) para o tratamento das fu-sões e aquisições ocorridas na indústria de alimentos e bebidas.

O objetivo principal do artigo é oferecer explicações sobre as hipóteses adotadas para a definição dos grupos de tratamento e de controle, construídos para o teste de diferenças em diferenças (DID), que será apresentado no próximo artigo.

2. Sobre as Fusões e Aquisições

A questão principal a ser respondida pelo modelo proposto é se fusões e aquisições afetam os preços ao consumidor.

Da revisão da literatura pode-se concluir que o resul-tado aponresul-tado tanto pela teoria quanto pelos experi-mentos empíricos não são homogêneos. Há exercícios que apontam para um aumento no nível de preços diante de um aumento da concentração, como Dick-son e Sun (2004), e outros experimentos que sugerem o contrário, como Lopez et alii (2002).1

Para o presente estudo, pretende-se dividir a indústria de alimentos e bebidas em dois grupos, um que apre-senta F&A (grupo de tratamento) e outro em que isto não se verifica (grupo de controle). Fazer a distinção entre os grupos significa criar uma variável dummy

(dfea) que atribui 1 (um) para as classes da CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas), pertencentes à “Fabricação de Produtos Alimentícios e Bebidas”, que observam fusão e aquisição (grupo de tratamento) e zero caso contrário (grupo controle). O item “Fabricação de Produtos Alimentícios e Bebi-das” é formado por 36 classes. A variável-alvo do estu-do aqui proposto é o índice de preços ao consumiestu-dor. Dessa forma, foram descartadas da análise as classes sem referência direta no IPC-FIPE.2 O mesmo foi

feito para classes que não tratam de itens comestíveis, estando, portanto, fora do grupo “Alimentação” do IPC-FIPE.3 Com esses critérios, quatro classes foram

retiradas do estudo.

A PIA (Produção Industrial Anual) fornece infor-mações sobre “Mudanças Estruturais”, que indicam fusão ou cisão total, cisão parcial, incorporação de/por outra empresa. Caso fosse adotado como critério para dfea=1 classes que apresentam alguma transação nes-se item, praticamente todas as clasnes-ses da CNAE nes-seriam tratadas como grupo de tratamento (dfea=1). A correta separação dos grupos é fundamental para que se possa captar possíveis diferenças nas variações do IPC-FIPE por conta das F&A. Além disso, o critério de seleção para o estudo proposto neste artigo deve ser apenas “fusão e aquisição”. A variável “mudanças estruturais” envolve outras transações que, muitas vezes, podem significar apenas uma mudança na organização societária.

Dessa forma, buscaram-se critérios na SEAE (Secre-taria de Acompanhamento Econômico) do Ministério da Fazenda, para a melhor distinção entre os grupos de tratamento e de controle.

Cláudia assuNçãodos saNtos Viegas (*)

fusões e aquisições na indústria

brasileira de alimentos e bebidas

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agosto de 2006

Segundo dados da SEAE/MF, de 1994 até março de 2005 a indústria de alimentos e bebidas brasileira observou 109 atos de concentração. Da análise desses atos percebe-se que a maioria dos produtos do setor de alimentos e bebidas observou pelo menos um ato de concentração. Daí a necessidade de fixar critérios para a distinção dos grupos. Foram estabelecidos quatro critérios para a definição dos grupos de controle e de tratamento, explicados a seguir.

Adotou-se como primeiro critério que casos em que não houve a presença de concentração horizontal não seriam considerados como grupo de tratamento, ou seja, teriam dfea=0.4

Portanto, para ser classificada como “grupo de trata-mento” (dfea=1) as operações devem ser realizadas entre empresas que já atuavam anteriormente no mesmo ramo, ofertando o mesmo tipo de produto (ocorrência de concentração horizontal), ou situações com integração vertical, pois as chances de haver im-pactos no ambiente competitivo são maiores, tornando possível uma distinção mais clara entre os grupos.5

Há casos que, mesmo com concentração horizontal e/ou integração vertical, não foram considerados no presente estudo porque tratam de produtos sem cor-respondência com os grupos CNAE da PIA-IBGE e/ou o IPC-FIPE. Por exemplo, lecitina de soja e produtos químicos utilizados no processo de industrialização de alimentos (fermentos biológicos, insumos para aromas, por exemplo). Portanto, o segundo critério adotado para a distinção dos grupos é que o produto-alvo da F&A tenha correspondência clara no IPC-FIPE e na CNAE.

O terceiro critério é que só foram consideradas as fusões e aquisições de alcance mundial ou em todo o território nacional. Aquelas em que os efeitos foram só regionais não foram consideradas. Como os preços ao consumidor usados neste estudo são do IPC-FIPE, que é calculado para o município de São Paulo, atos de concentração que não tenham alcance nacional dificilmente seriam captados por essa série.

Segundo os critérios estabelecidos para que uma F&A classifique como “grupo de tratamento” a classe da CNAE a que pertencem as empresas envolvidas no ato de concentração, a F&A deve: (i) apresentar concentração horizontal ou vertical; (ii) ter corres-pondência clara tanto na classe CNAE quanto na série IPC-FIPE; (iii) ser de alcance mundial ou nacional; e (iv) ter efeitos significativos na classe CNAE. Neste último critério levou-se em consideração a freqüência (número de casos) e as alterações na participação de mercado, comparando-se a situação inicial das empre-sas envolvidas com o resultado esperado da F&A. Espera-se que os efeitos resultantes de um ato de con-centração sejam permanentes, ou seja, a variável dfea não deve ser tratada como um “choque” no tempo, pois se de fato houve efeitos nos preços ao consumidor, tal resultado não deve ser restrito apenas ao ano em que a operação foi consolidada. Diante disto, alguns grupos da CNAE receberam dfea=1 mesmo quando o ato ocor-reu em ano anterior ao início da amostra (1998). Com esses critérios foi feita a correspondência dos produtos envolvidos6 nos atos de concentração e o

código CNAE. Sobre essa relação de produtos apli-cou-se o critério (iv) para que se identificasse o grupo de tratamento (dfea=1), formado pelas doze classes CNAE mostradas na Tabela 1.7

Um caso que ilustra bem a aplicação do critério (iv) é a F&A entre a Sadia e a Só Frango, da classe “abate de aves e outros pequenos animais e preparação de produtos de carne” (15.12-1). Em 2003, o faturamento da Só Frango na linha de produtos industrializados representava 1,1% do faturamento da Sadia.8 Para

frangos inteiros e em cortes, principal atividade da Sadia, a quantidade vendida da Só Frango represen-tava apenas 6,6% da quantidade vendida da Sadia. Como esta é a única F&A registrada para essa classe da CNAE, no período de análise, que atende aos critérios de (i) a (iii), as modificações no ambiente competitivo e produtivo não foram consideradas relevantes o su-ficiente para categorizar essa classe da CNAE como “grupo de tratamento”.9

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agosto de 2006 A classe “preparação de produtos dietéticos, alimentos

para crianças e outros alimentos conservados” (15.86-5) foi retirada da amostra porque a sua classificação como grupo de tratamento ou grupo de controle é ambígua. O mesmo ocorreu com a classe “fabricação de café solúvel” (15.72-5). Essas classes registraram F&A que atendem aos critérios de (i) a (iii). Porém, pelo critério (iv), as mudanças na participação de mercado não são pequenas o suficiente que possam ser ignoradas, classificando as classes como “grupo de controle” (dfea=0), nem são grandes o suficiente, como o verificado nos demais grupos, que justifiquem classificá-las como “grupo de tratamento” (dfea=1). Ou seja, tanto como grupo de tratamento quanto como grupo de controle as classes teriam comportamento distinto do verificado nas demais classes categori-zadas neste trabalho. Portanto, para que a distinção entre grupo de tratamento e controle pudesse ser feita com a menor distorção possível, optou-se por excluir essas duas classes da amostra, sem prejuízo para os graus de liberdade do modelo.

A correspondência entre as classes CNAE com os itens do grupo “Alimentação” do IPC-FIPE foi feita respeitando-se a divisão entre os grupos de trata-mento e controle. Ou seja, se a classe foi classificada como “grupo de tratamento” (dfea=1), então apenas os preços dos produtos envolvidos na F&A foram agrupados pela ponderação do IPC-FIPE. Por isso a classe “fabricação de produtos do laticínio” (15.42-3) tem como correspondência no IPC-FIPE a média ponderada das séries “petit suisse”, “leite fermentado” e “iogurte”. Demais produtos ou não estão envolvidos em atos de concentração ou, quando presentes numa F&A, não atenderam a um dos critérios de (i) a (iv) definidos acima.10

Seguindo a mesma lógica, a classe “fabricação de pro-dutos de padaria, confeitaria e pastelaria” (15.81-4) foi associada ao item “pão de forma” do IPC-FIPE, pois este foi o produto que teve os impactos mais relevan-tes das F&A dessa classe. Pelo mesmo critério, para a classe “refino de óleos vegetais” (15.32-6), utilizou-se a série “óleo de soja” e para “fabricação de refrige-rantes e refrescos” a série associada do IPC-FIPE foi “refrigerantes”.

tabela 1 – classes da CNAE classificadas como grupo de tratamento (dfea=1)

Código 

CNAE Classe

15.32-6 Refino de óleos vegetais 15.41-5 Preparação de leite 15.42-3 Fabricação de produtos do laticínio 15.71-7 Torrefação e moagem de café 15.81-4 Fabricação de produtos de padaria, confeitaria e pastelaria 15.82-2 Fabricação de biscoitos e bolachas 15.83-0 Produção de derivados do cacau e elaboração de choco-lates, balas, gomas de mascar 15.84-9 Fabricação de massas alimentícias 15.85-7 Prepar. de especiarias, molhos, temperos e condimentos 15.89-0 Fabricação de outros produtos alimentícios 15.93-8 Fabricação de malte, cervejas e chopes 15.95-4 Fabricação de refrigerantes e refrescos

Fonte: Elaboração Própria.

Já se a classe da CNAE foi classificada como “grupo de controle” (dfea=0), todos os preços dos produtos dessa classe foram utilizados na ponderação do IPC-FIPE.11 No caso da classe “fabricação, retificação,

homogeneização e mistura de aguardentes e outras bebidas destiladas” (15.91-1), o item “uísque” foi retirado da média ponderada do IPC-FIPE porque houve uma F&A envolvendo esse produto mas, pelo critério (iv), essa classe foi categorizada como “grupo de controle”.

Esse procedimento para as médias ponderadas do IPC-FIPE foi adotado visando distinguir de forma adequada os grupos. Caso contrário, poderíamos ter entre as classes classificadas como grupo de tratamen-to séries de preços que, mesmo fazendo parte da classe da CNAE, não observaram F&A dentro dos critérios aqui estabelecidos.

3. Conclusões

O objetivo deste artigo foi explicar os critérios ado-tados para a distinção feita entre os grupos de trata-mento e os grupos de controle neste trabalho. Esses critérios são fundamentais em virtude da escassez de informações para replicar experimentos internacio-nais ao caso brasileiro. Assim, a adoção de critérios bem fundamentados é crucial para o sucesso do expe-rimento que visa isolar o efeito das fusões e aquisições

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agosto de 2006

nos preços ao consumidor. O próximo artigo oferece os resultados empíricos com as considerações finais do trabalho.

1 Para mais referências sobre o tema, ver:

Azzam, A. M; Andersson, H. Market power and cost-efficiency – effects of

concentration in a mixed oligopoly. University of Nebraska.

Depart-ment of Agricultural Economics,12 de julho de 2001.

Azzam, A. M. Measuring market power and cost-efficiency effects of industrial concentration. Journal of Industrial Economics 45, p. 377-386, 1997.

Azzam, A. M.; Schroeter, J. Tradeoffs between oligopsony power and cost-efficiency from horizontal consolidation: an example from beef packing. American Journal of Agricultural Economics 77, p. 822-836, 1995.

Azzam, A. M. Testing the competitiveness of food price spreads.

Journal of Agricultural Economics 43, p. 248-56, 1992.

Lopez, R. A. C.; Lirón-España. Social welfare and the market power-efficiency tradeoff in the U.S. food processing: a note.

Jornal of Agriculture & Food Industrial Organization 1, 2003: Article

5. Disponível http://www.bepress.com/jafio/vol1/iss1/art5 (aces-sado 21/06/2005).

2 A saber: “produção de óleos vegetais em bruto” (15.31-8) e “usinas de açúcar” (15.61-0).

3 A saber: “preparação de margarina e outras gorduras vegetais e de óleos de origem animal não comestíveis” (15.33-4) e “fabricação de rações balanceadas para animais” (15.56-3).

4 Por exemplo, a compra da Seara pela Cargill em 2004 não atribuiu à classe a que pertencem as empresas dfea=1, pois a Cargill não participava dos mercados de atuação da empresa adquirida no Brasil.

5 É de se esperar que nos casos de fusão e aquisição, ou joint venture, mesmo na ausência de integração vertical ou concentração hori-zontal, possa haver ganhos de eficiência pela nova organização entre a compradora e a empresa adquirida, o mesmo pode ser esperado quando há apenas mudança na composição societária nas empresas. Mas, por hipótese, este trabalho considera que economias de escala ou de escopo têm efeitos mais significativos. Outro fator que reforça a adoção dessa hipótese é que, como os dados são apresentados por “classe”, segundo o código da CNAE, os efeitos de economias de escala e escopo serão captados de forma “diluída”, entre todas as empresas participantes da classe e não só aquelas envolvidas com o ato de concentração. Isto reforça a adoção do critério para separar os grupos apenas concentração horizontal ou integração vertical, pois tais efeitos devem se fazer sentir de forma mais significativa entre as empresas participantes do mesmo código CNAE do que apenas mudanças na composição societária das empresas.

6 Um ato de concentração que envolva mais de um produto pode não ter efeitos homogêneos sobre os distintos mercados que afeta e, conseqüentemente, pode impactar de forma distinta a separação feita neste exercício entre os grupos tratamento e de controle.

7 Sabe-se que nem todos os atos de concentração passam pelo SBDC (Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência). Porém, acredita-se que nenhum caso que possa ter burlado o sistema seja grande o suficiente para alterar a classificação feita neste exercí-cio. Casos expressivos acabam por ser noticiados na imprensa e, conseqüentemente, notificados no SBDC.

Portaria Conjunta nº 8 SEAE/SDE, de 2 de fevereiro de 2004, que acrescentou inciso ao art. 6º da Portaria Conjunta nº 1/2003/SEAE/ SDE.

9 Pela mesma razão do caso Sadia e Só Frango, outras seis classes CNAE foram classificadas como “grupo de controle”, mesmo tendo obedecido aos critérios de (i) a (iii), a saber: “preparação e preservação do pescado e fabricação de conservas de peixe, crustáceos e moluscos” (15.14-8); “processamento, preservação e produção de conservas de legumes e outros vegetais” (15.22-9); “produção de sucos de frutas e legumes” (15.23-7); “beneficia-mento, moagem e preparação de outros alimentos de origem vegetal” (15.59-8); “refino e moagem de açúcar” (15.62-8) e “fa-bricação, retificação, homogeneização e mistura de aguardentes e outras bebidas destiladas” (15.91-1).

10 O produto “queijo”, por exemplo, foi alvo na operação entre a B.G Brasil e a Gessy Lever Ltda. Mas tal operação não criou nem elevou o poder de mercado, tendo em vista que a parcela do faturamento adquirida pela B.G. Brasil (R$ 4,9 milhões) rep-resentava 0,1% do mercado de queijos. Além disso, a análise da SEAE constatou que a demanda encontrava condições de reação às tentativas de imposição de aumento de preços e que o nível de barreiras à entrada era baixo. Portanto, “queijo”, mesmo sendo um produto da classe “fabricação de produtos do laticínio” (grupo de tratamento) e tendo sido alvo de uma F&A não fez parte da média ponderada do IPC-FIPE para essa classe.

11 Como a POF até 1999 não contém alguns produtos que se tor-naram relevantes para o consumo nos anos posteriores, os pesos para a média ponderada foram ajustados de forma a levar isto em consideração. Por exemplo, para a classe “fabricação de malte, cervejas e chopes” (15.93-8) usou-se apenas o item “cerveja” do IPC-FIPE até 1999, passando-se a incluir a série “chope” a partir de 2000, por meio de média ponderada. Não foram incluídos na análise alimentos in natura que possuem uma dinâmica de preço distinta dos produtos industrializados, o que poderia acusar uma diferença de média por conta de outros fatores que não os de ato de concentração. Por isto, para a classe “preparação e preservação do pescado e fabricação de conservas de peixe, crustáceos e mo-luscos” (15.14-8), utilizaram-se as séries do IPC-FIPE sardinha em lata e atum em lata.

Referências Bibliográficas

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Industrial Organization, v. 2, issue 1, p. 1103-1103, 2004.

Lopez, R. A; Azzam, A. M.; Lirón, C. Market power and/or effi-ciency: a structural approach. Review of Industrial Organization, p. 115-126, 2002.

Viegas, C. A. S. V. Fusões e aquisições na indústria de alimentos e bebidas

do Brasil: análise dos efeitos nos preços ao consumidor. 2006a. Tese

(Doutorado em Teoria Econômica), apresentada ao Departamento de Economia da FEA-USP, Orientador: Prof. Dr. Paulo Picchetti. ______. Transformações recentes na oferta e na demanda da indús-tria brasileira de alimentos e bebidas. Boletim Informações FIPE, p 16-19, Julho de 2006b.

(*) Doutora em Teoria Econômica pela FEA-USP, Secretária-Adjunta de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda

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(SEAE-agosto de 2006

1 - Introdução

Durante a década de 1990 o emprego industrial passou por um período de retração que levou à criação de um cenário no qual a indústria deixaria de ser importan-te fonimportan-te de postos de trabalho, como havia sido ao longo do processo de substituição de importações, durante as décadas de 1930 a 1970 no Brasil. O ajuste do setor fabril à abertura comercial, às mudanças na economia brasileira e ao avanço da globalização exigiu da indústria doméstica um forte processo de ajuste estrutural baseado na redução dos custos e aumento da produtividade. Muitas vezes este ajuste se deu por adoção de tecnologias mais intensivas em capital e por mudanças organizacionais visando à redução do pessoal empregado.

Contudo, nos últimos anos o emprego industrial for-mal tem apresentando um desempenho extremamen-te favorável, de tal sorextremamen-te que no período de dezembro de 2002 a dezembro de 2004, conforme dados da Relação Anual de Informações Sociais – RAIS, foram gerados mais empregos na indústria de transformação do que no período compreendido entre dezembro de 1985 a dezembro de 2002. Como explicar esta retoma-da? Com o objetivo de analisar esta e outras questões, o presente artigo está assim organizado: a) na primeira parte é feita uma análise descritiva da evolução do emprego formal na indústria de transformação a partir dos dados da RAIS para o período de 1985 a 2004 (último dado disponível); b) na segunda parte são feitas as considerações finais, inclusive a análise das causas que explicam o desempenho das ocupações formais no setor fabril de 1985 a 2004.

2 - Análise Descritiva da Evolução do Emprego Formal na Indústria de Transformação

Como pode ser visto pela Tabela 1, de acordo com os dados da Relação Anual de Informações Sociais

– RAIS houve crescimento pouco expressivo do em-prego formal na indústria de transformação no perí-odo dezembro de 1985 a dezembro de 2004, quando foram gerados apenas 713 mil empregos formais no referido setor, cifra que corresponde a um incremen-to acumulado da ordem de 13,7% (+0,7%a.a.). Na realidade, em 2002 o estoque de emprego formal na indústria de transformação era praticamente o mesmo que em 1985, o que demonstra a estagnação dos pos-tos de trabalho no setor, estagnação que foi atenuada pelo forte crescimento em 2004. Nos anos de 2003 e 2004 foram gerados mais empregos na indústria de transformação do que no período dez/1985 a dez/2002 (+717 mil contra –4 mil).

Como resultado, o incremento do emprego no setor fabril se deu em ritmo inferior à média dos setores (0,7%a.a. contra 2,3%a.a.) e a participação da indústria de transformação no emprego formal total caiu de 25,4% em 1985 para 18,9% em 2004, tendo chegado a 18,1% nos anos de 2003 e 1998.

Claramente, podem ser observadas distintas fases: a) 1985 a 1989 – prevaleceu tendência de crescimento

do emprego formal, em especial pelo forte incre-mento da demanda agregada no ano de 1986 por conta do Plano Cruzado e a recuperação nos anos de 1988 e 1989, sendo que neste último ano o es-toque de emprego atingiu o seu pico (6,2 milhões) que até 2004 não tinha voltado a ser atingido. Nesse período foram gerados 938 mil empregos;

b) 1990 a 1992 – forte retração do emprego em vir-tude da recessão pela qual passou a economia em decorrência do Plano Collor e também pelo início dos ajustes ao processo de abertura comercial. Nesse período foram destruídos 1,4 milhão de empregos;

RogéRio NagaMiNe CostaNzi (*)

emprego industrial: como explicar

a retomada e a relocalização?

(22)

agosto de 2006

c) 1993-1994 – crescimento do emprego em conseqüên-cia da recuperação da economia, em especonseqüên-cial no segundo semestre de 1994, por conta do início de vi-gência do Plano Real e do aumento das exportações. Nesse período foram gerados 343 mil empregos; d) 1995-1998 – retração em razão do baixo

crescimen-to econômico e da valorização da taxa de câmbio real, que parece ter promovido uma nova série de

ajustes à abertura comercial. Nesse período foram destruídos 626 mil empregos;

e) 1999 a 2004 – melhora que parece ter sido influen-ciada, entre outros fatores, pela desvalorização da taxa de câmbio real, que possibilitou um forte aumento das exportações e menor competitividade das importações. Nesse período foram gerados 1,5 milhão de empregos.

tabela 1 – estoque de emprego formal na indústria de transformação – Rais Brasil 1985-2004

ANO Estoque de  Empregos  Formais em  31.12 Variação  Absoluta  Anual Variação  Absoluta  Acumulada  desde 1985 Variação  Relativa  Anual em % Variação em  relação a  1985 em % Variação Média  Anual em relação a  1985 em % Participação no  Estoque Total de  Emprego Formal 1985 5.213.804 --- --- --- --- --- 25,4 % 1986 5.998.106 784.302 784.302 + 15,0 % + 15,0 % + 15,0 % 27,1 % 1987 5.837.800 -160.306 623.996 -2,7 % + 12,0 % + 5,8 % 25,8 % 1988 5.870.602 32.802 656.798 + 0,6 % + 12,6 % + 4,0 % 24,8 % 1989 6.151.654 281.052 937.850 + 4,8 % + 18,0 % + 4,2 % 25,1 % 1990 5.464.436 -687.218 250.632 - 11,2 % + 4,8 % + 0,9 % 23,6 % 1991 5.106.018 -358.418 -107.786 - 6,6 % - 2,1 % - 0,3 % 22,2 % 1992 4.713.262 -392.756 -500.542 - 7,7 % - 9,6 % - 1,4 % 21,2 % 1993 4.771.353 58.091 -442.451 + 1,2 % - 8,5 % - 1,1 % 20,6 % 1994 5.056.583 285.230 -157.221 + 6,0 % - 3,0 % - 0,3 % 21,4 % 1995 4.897.517 -159.066 -316.287 - 3,1 % - 6,1 % - 0,6 % 20,6 % 1996 4.797.385 -100.132 -416.419 - 2,0 % - 8,0 % - 0,8 % 20,1 % 1997 4.703.756 -93.629 -510.048 - 2,0 % - 9,8 % - 0,9 % 19,5 % 1998 4.430.929 -272.827 -782.875 - 5,8 % - 15,0 % - 1,2 % 18,1 % 1999 4.603.893 172.964 -609.911 + 3,9 % - 11,7 % - 0,9 % 18,4 % 2000 4.885.361 281.468 -328.443 + 6,1 % - 6,3 % - 0,4 % 18,6 % 2001 4.976.462 91.101 -237.342 + 1,9 % - 4,6 % - 0,3 % 18,3 % 2002 5.209.774 233.312 -4.030 + 4,7 % - 0,1 % 0,0 % 18,2 % 2003 5.356.159 146.385 142.355 + 2,8 % + 2,7 % + 0,1 % 18,1 % 2004 5.926.857 570.698 713.053 + 10,7 % + 13,7% + 0,7 % 18,9 %

Fonte: RAIS – Ministério do Trabalho e Emprego.

Do ponto de vista da análise de subsetores da indús-tria de transformação, podemos notar, conforme a Tabela 2, que o comportamento foi bastante hetero-gêneo, sendo que alguns subsetores experimentaram queda no emprego formal no acumulado do período 1985-2004, ao passo que para outros houve elevação do estoque de postos de trabalho formais. De um modo mais geral, nota-se que os ramos mais intensivos em mão-de-obra e com menor complexidade tecnológica (calçados, têxtil, alimentos e bebidas, madeira e mobi-liário) tiveram um desempenho melhor que aqueles

complexa do ponto de vista tecnológico (metalúrgica, material de transporte, mecânica e material elétrico e de comunicações), embora existam exceções a este padrão geral.

Este melhor desempenho do emprego dos setores intensivos em mão-de-obra não pode ser creditado ao comportamento da produção, a julgar pelos dados da produção industrial mensal física do IBGE, que indi-cou, para o período de 1991 a 2004, maior crescimento da produção dos setores intensivos em capital vis-à-vis

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