ESTADO DO PARANÁ
AGRAVO Nº 1.341.206-5/02 - FORO REGIONAL DE SARANDI DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ – VARA CÍVEL E DA FAZENDA PÚBLICA
AGRAVANTE: CONSTRUTORA VICKY LTDA. AGRAVADO: MUNICÍPIO DE SARANDI RELATOR: DES. STEWALT CAMARGO FILHO
AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO. PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. INDEFERIMENTO FUNDAMENTADO NO NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO LIMINAR. PROMITENTE VENDEDOR (AQUELE QUE TEM A PROPRIEDADE REGISTRADA NO REGISTRO DE IMÓVEIS) É O RESPONSÁVEL PELO PAGAMENTO DO IPTU. PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PROTESTO DE CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. PREVISÃO NA LEI Nº 9.492/97. PRESUNÇÃO DE CONSTITUCIONALIDADE DA LEI. LEGALIDADE DO ATO. INCONSTITUCIONALIDADE. QUESTÃO NÃO ENFRENTADA PELA DECISÃO AGRAVADA. ANÁLISE VEDADA, SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PROTESTO FACULTATIVO, FIGURA HÁ MUITO CONHECIDA NO DIREITO, NUNCA FOI CONSIDERADO ABUSO DE DIREITO DO CREDOR, TAMBÉM NÃO CONFIGURA ABUSO DE PODER ESTATAL, NEM VIOLAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS ADMINISTRADOS. AINDA QUE NÃO HAJA EXIGÊNCIA DE
REALIZAÇÃO DO PROTESTO DE CDA PARA CONFERIR A ELA OS ATRIBUTOS DA LIQUIDEZ E CERTEZA, JÁ DECORRENTES DA LEI Nº 6.830/80, ART. 3º, “A DÍVIDA ATIVA REGULARMENTE INSCRITA GOZA DA PRESUNÇÃO DE CERTEZA E LIQUIDEZ”. A LEI, AGORA, EXPRESSAMENTE PERMITE O ATO DE PROTESTO DE CDA. SE O PROTESTO TEM POR FINALIDADE, DE UM LADO, CONSTITUIR O DEVEDOR EM MORA E PROVAR A INADIMPLÊNCIA, DE OUTRO, CONFIGURA MODALIDADE ALTERNATIVA DE COBRANÇA DA DÍVIDA ASSEGURADA LEGALMENTE À ADMINISTRAÇÃO, PARA CONSECUÇÃO DA TUTELA DO CRÉDITO PÚBLICO, NÃO PODE O PODER JUDICIÁRIO SUBSTITUIR A FAZENDA PÚBLICA NA ANÁLISE DA UTILIDADE OU CONVENIÊNCIA NA UTILIZAÇÃO DO PROTESTO PARA RECUPERAÇÃO, EXTRAJUDICIAL, DE SEUS CRÉDITOS.
VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES NÃO CONFIGURADA.
RECURSO EM CONFRONTO COM A JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE DO TRIBUNAL. ART. 557, CAPUT, DO CPC. DECISÃO MANTIDA.
AGRAVO NÃO PROVIDO.
I. Trata-se de Agravo interposto pela Construtora
Vicky Ltda. da decisão de f. 264/268, complementada em sede de embargos de declaração (f. 301/305), que negou seguimento a agravo de instrumento.
Alega a agravante que opera no ramo imobiliário, em especial na implantação de loteamentos, efetuando a compra e venda de terrenos, em que os promissários compradores assumem a obrigação, não só quanto ao pagamento de todos os impostos e encargos referentes aos imóveis adquiridos, como efetuam a escritura de compra e venda ao término do pagamento avençado.
Assevera que, em virtude da celebração contratual, os imóveis não mais lhes pertencem, o que afasta a cobrança pelo ente municipal, e que inexiste previsão legal a validar o uso, por parte do Poder Público, do ato de protesto.
Defende que, embora a decisão de primeiro grau esteja alinhada à jurisprudência deste Tribunal, outros Tribunais pátrios têm entendido possível o redirecionamento da cobrança do IPTU para o atual proprietário, bem como que no Estado de São Paulo foi suscitado incidente de inconstitucionalidade da Lei nº 12.767/2012 ao Órgão Especial daquela Corte.
Aduz a desnecessidade do protesto de CDA e a configuração da vedada coação ao pagamento do tributo.
Lastreia suas alegações na inconstitucionalidade do artigo 1º, parágrafo único, da Lei nº 12.767/12, cuja origem se deu por meio da Medida Provisória nº 577/2012, uma vez que “não há qualquer
pertinência entre a matéria abordada pela medida provisória com a que fora introduzida ao converter a mesma em Lei, em especial, em relação ao protesto de CDA” (f. 317), e também na constatação de vício da lei de
conversão da Medida Provisória nº 577/2012, visto que a mesma viola a Lei Complementar 95/1998, no que se referem às matérias estranhas ali inseridas, especificamente, in casu, ao do Parágrafo único, do art. 1º da Lei 9492/1997.” (f. 319).
Assim, requer o conhecimento e o provimento do recurso, para o fim de reformar a decisão de primeiro grau que indeferiu a liminar de cancelamento do protesto, diante da existência do direito alegado e do periculum in mora, em razão dos inúmeros prejuízos que os protestos estão causando à agravante, e a terceiros de boa-fé.
A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (f. 260/262).
É o relatório.
II. A decisão agravada foi lançada com o seguinte
teor:
“No presente caso, ainda que a agravante alegue que os imóveis não mais lhes pertencem em virtude dos contratos celebrados com terceiros, transferindo-lhes todas as obrigações tributárias, os contratos não estão registrados junto ao Cartório de Registro de Imóveis local.
Conforme asseverou o magistrado na decisão agravada, ‘o artigo 34 do CTN, o contribuinte do imóvel é o
proprietário do mesmo, o titular do seu domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título, o que caracteriza, à luz do art. 124 do CTN, a solidariedade da obrigação entre o comprador e vendedor, podendo o exequente, porquanto, escolher o sujeito passivo da obrigação. Verifica-se, então, que os protestos levados a efeito pelo réu são legítimos, em princípio, o que impossibilita, por ora, a concessão da medida liminar.‘ (f. 26)
A decisão agravada está alinhada ao posicionamento da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que, tanto o promitente comprador do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são
contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU. (RESP n.º 979.970/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJ de 18.6.2008; AgRg no REsp 1022614 / SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJ de 17.4.2008; REsp 712.998/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJ 8.2.2008 ; REsp 759.279/RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 11.9.2007; REsp 868.826/RJ, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJ 1º.8.2007; REsp 793073/RS, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJ 20.2.2006).
Veja-se que as leis têm presunção de constitucionalidade. E, sobre a alegada inconstitucionalidade, o Tribunal não pode se manifestar, neste momento, sob pena de suprimir grau de jurisdição, já que a decisão agravada não se pronunciou a respeito.
No mais, havendo previsão na Lei nº 9.492/97, o protesto da CDA é legal, e portanto deve ser mantida a decisão.
Como visto, o recurso está em confronto com a jurisprudência dominante deste Tribunal, razão pela qual, com fundamento no art. 557, ‘caput’, do Código de Processo Civil,
nego-lhe seguimento.”
Sendo integrada pela decisão que acolheu os embargos de declaração opostos, sem efeito modificativo, conforme segue transcrita:
“A jurisprudência inicialmente reconhecia a falta de interesse no protesto da CDA, porque a Administração já possuía o título executivo e os meios para a publicidade da inscrição em dívida ativa (STJ, AgRg no Ag 1172684/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, 2ª T, DJe 03.09.2010). Tal posicionamento foi revisto, no precedente do Superior Tribunal de Justiça, REsp 1126515/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, 2ª Turma, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013, que tendo em conta a ausência de vedação legal e do cabimento do instituto, firmou orientação no sentido do reconhecimento da legalidade e da constitucionalidade do protesto da CDA.
Especificamente em relação à Certidão de Dívida Ativa, por contar a Fazenda Pública com meios de cobrança próprios, a controvérsia foi afastada com a edição da Lei
12.767/2012, que introduziu o parágrafo único ao art. 1º da Lei 9.492/1997, para admitir expressamente o protesto das CDAs:
‘Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se
prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida. Parágrafo único. Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as
certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas. (Incluído pela Lei nº 12.767, de 2012).’
Além disso, a figura do protesto facultativo, há muito conhecida no Direito, nunca foi considerada abuso de direito do credor, também não configura abuso de poder estatal nem violação aos direitos fundamentais dos administrados. Ainda que não haja exigência de realização do protesto de CDA para conferir a ela os atributos da liquidez e certeza, já decorrentes da Lei nº 6.830/80, art. 3º, ‘a Dívida Ativa regularmente inscrita
goza da presunção de certeza e liquidez’, fato é que a lei,
agora, expressamente permite o ato de protesto de CDA.
Assim, se o protesto tem por finalidade, de um lado, constituir o devedor em mora e provar a inadimplência, de outro, configura modalidade alternativa de cobrança da dívida assegurada legalmente à Administração, para consecução da tutela do crédito público, e não pode o Poder Judiciário substituir a Fazenda Pública na análise da utilidade ou conveniência na utilização do protesto para recuperação, extrajudicial, de seus créditos.
Destarte, ausente a verossimilhança do direito
alegado, correta a decisão agravada em concluir pelo indeferimento da liminar.
III. Desta maneira, acolho em parte os embargos de
declaração, com a análise das questões omissas, sem efeitos infringentes.” (f. 304/305)
Como se vê, o agravo de instrumento teve seu seguimento obstado, com fundamento no art. 557, caput, do Código de Processo Civil, por se encontrar em confronto com a jurisprudência deste Tribunal e do Superior Tribunal de Justiça.
Ademais, os argumentos apresentados pelo agravante foram enfrentados nas decisões impugnadas, e não se mostram suficientes a modificar o entendimento adotado.
Portanto, nego provimento ao recurso e mantenho a decisão agravada.
III. ACORDAM os Desembargadores integrantes da
Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por
unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo, nos termos da
fundamentação supra.
Participaram do julgamento presidido pelo Desembargador LAURO LAERTES DE OLIVEIRA – com o Relator, e acompanhou também o voto do Relator, o Juiz Substituto em Segundo Grau RODRIGO OTÁVIO RODRIGUES GOMES DO AMARAL.
Curitiba, 16 de fevereiro de 2016.
Des. Stewalt Camargo Filho Relator