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O dito e o não dito pelos usuários de drogas, obtidos mediante as vivências e da técnica projetiva.

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Academic year: 2017

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O DI TO E O NÃO DI TO PELOS USUÁRI OS DE DROGAS, OBTI DOS

MEDI ANTE AS VI VÊNCI AS E DA TÉCNI CA PROJETI VA

1

Francisca Lucélia Ribeiro de Farias2

Ant onia Regina Ferreira Furegat o3

Farias FLR, Furegat o ARF. O dit o e o não dit o pelos usuários de drogas, obt idos m ediant e as vivências e da

t écnica proj et iva. Rev Lat ino- am Enferm agem 2005 set em bro- out ubro; 13( 5) : 700- 7.

Nest e est udo, procurou- se conhecer alguns significados m anifest os e lat ent es da vivência dos usuários

de drogas. As ent revist as foram associadas à Técnica Proj et iva ( desenho livre e com t em a) a part ir das quais

foram analisados o conteúdo subj etivo e o exteriorizado pelos usuários. Os resultados dem onstraram a existência

de desest rut uração fam iliar, est igm a e preconceit o.

DESCRI TORES: drogas ilícit as; enferm agem ; saúde m ent al

W HAT DRUGS USERS SAY AND DO NOT SAY, USI NG

EXPERI ENCES AND THE PROJECTI VE TECHNI QUE

This st udy aim ed t o get t o know som e visible and hidden m eanings in drugs users’ experience. The

int er view s w er e associat ed w it h t he Pr oj ect ive Technique ( fr ee and t hem at ic dr aw ing) , based on w hich w e

analyzed the subj ective content and what was expressed by the users. The results dem onstrated the existence

of fam ily det eriorat ion, st igm a and prej udice.

DESCRI PTORS: illicit drugs; nursing; m ent al healt h

EL DI TO Y EL NO DI TO POR LOS USUARI OS DE DROGA, EXPRESO A TRAVÉS

DE LAS VI VENCI AS Y DE LA TÉCNI CA DESCRI PTI VA

La finalidad de est e est udio fue apr ender r espect o a algunos significados ex pr esos y ocult os en la

vivencia de drogadict os. Se asoció las ent revist as a la Técnica Descript iva ( el dibuj o libre y con t em a) , lo que

p e r m i t i ó e n a n á l i si s d e l co n t e n i d o su b j e t i v o y e x p r e so p o r l o s u su a r i o s. Lo s r e su l t a d o s m o st r a r o n

desest ruct uración fam iliar, est igm a y prej uicio.

DESCRI PTORES: drogas ilícit as; enferm ería; salud m ent al

1 Trabalho extraído da tese de doutorado; 2 Enferm eira, Professor Doutor da Universidade de Fortaleza, e- m ail: luceliafarias@unifor.br; 3 Orient ador, Professor

(2)

I NTRODUÇÃO

O

uso e o consum o excessivo de drogas são p r o b l e m a s sé r i o s, v e i cu l a d o s n a so ci e d a d e so b diferentes form as e interpretações. Em função de sua e l e v a d a f r e q ü ê n ci a , e sse u so e co n su m o t r an sfor m ar am - se em pr oblem a m u n dial de saú de pública( 1). Na Am érica Latina, estudos sobre o uso de

drogas por adolescentes, utilizando com o instrum ento quest ionár ios anônim os e aut o- aplicados, indicam que o álcool é a subst ância m ais consum ida, sendo as t axas m ais elevadas no sexo m asculino( 2). Esses dados est ão pr esent es em t odos os t r abalhos que abor dam o t em a, n o en t an t o, pou cos são os qu e enfocam o dit o e o não dit o pelos usuár ios. Nest e a r t i g o , p r o cu r o u - se a p r e se n t a r, p o r m e i o d e i n st r u m en t o ad eq u ad o , o d i t o p el o u su ár i o p ar a j ustificar seu com portam ento. Quanto ao não- dito das e m o çõ e s d o s su j e i t o s p e sq u i sa d o s, e sse s sã o elem ent os subj et ivos pouco explorados o que leva a ent endê- los, considerando a sua int erioridade, onde se acum ulam os conflit os não r esolvidos e onde as razões das pulsões oscilam ent re um a agressividade e u m a v i o l ên ci a v o l t ad as p ar a o o u t r o e d ep o i s r edir igidas cont r a si m esm o, com o obj et o de am or que não o é( 3- 4).

Sen do assim , são im por t an t es os est u dos sobre drogas psicot rópicas realizados por Bucher, em 1992; Muza et al. em 1997 o m ais abrangente deles, realizado pelo Centro Brasileiro de I nform ações Sobre Drogas Psicot rópicas- CEBRI D. Esses levant am ent os foram realizados em 10 capit ais brasileiras nos anos de 1987, 1989, 1993 e 1997. Os result ados desses est udos indicam que a adolescência é um a época de v u l n e r a b i l i d a d e a o co n su m o d e su b st â n ci a s( 1 ),

ocorrendo nessa fase de vida a prim eira aproxim ação co m o p r o d u t o e o se u a b u so v a i d e p e n d e r d o am biente sociocultural, do produto e da personalidade do suj eito( 3- 4).

OBJETI VO

I dent ificar o significado lat ent e e m anifest o das v iv ências, das em oções e dos sent im ent os dos usuários de drogas( 3).

METODOLOGI A

Do pont o de vist a form al, est a invest igação

pode ser classificada com o pesquisa est rat égica, pois o r i e n t a - se p a r a p r o b l e m a s a p r e se n t a d o s p e l a sociedade e t em com o finalidade a ação( 5). Quant o

aos aspect os m et odológicos, est a invest igação sit ua-se n o âm bit o da pesqu isa qu alit at iv a. Essa opção decorre do fato de poder am pliar e inserir o presente e st u d o n o ca m p o d o o b j e t o d o co n h e ci m e n t o relacionado ao ser hum ano e à sociedade( 6).

CONTEXTO DA PESQUI SA

A pesquisa foi realizada no período de j aneiro de 1996 a fevereiro de 1997, com um grupo de auto-a j u d auto-a q u e se r e ú n e se m auto-a n auto-a l m e n t e n u m sauto-a l ã o p a r o q u i a l n a ci d a d e Ri b e i r ã o Pr e t o - Sã o Pa u l o . Part icipava das reuniões a m édia de 30 dependent es quím icos, cuj a abst inência variava de um m ês a t rês anos. Com o referencial, o grupo utilizava os preceitos dos alcoólicos anônim os ( AA) , onde o m ais im portante é a sinceridade apresent ada, individualm ent e, pelas pessoas que pr ecisam de aj uda e/ ou que desej am a j u d a r o o u t r o . Tu d o f u n ci o n a e m cl i m a d e frat ernidade, solidariedade e acolhim ent o( 3).

Pa r a r e a l i za çã o d e st e t r a b a l h o , f o r a m ut ilizados dois m om ent os: no prim eiro, adent rou- se o cam po em pír ico par a r ealizar um a obser v ação e part icipação no grupo de Alcóolicos Anônim os ( AA) . Solicit ou- se aos organizadores do grupo aut orização para a realização da pesquisa, no que houve pront o atendim ento. Nessa etapa, foram contatados usuários durante 01 ( um ) ano, quando se convivia nos grupos, nos passeios aos m useus da cidade, visit a à fazenda de recuperação e ao confessor espiritual do grupo. O proj et o de pesquisa não foi subm et ido à análise do Com it ê de Ét ica em Pesquisa, pois esses som ent e foram inst it uídos após ser edit ada a Resolução 196/ 96, do Conselho Nacional de Saúde, de out ubro de 1996( 7). Port ant o, a aut orização para a realização da

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a m o st r a , ex t r a i u - se d o i s ca so s p a r a a p r esen t e publicação. A seleção da am ost r a foi int encional e co n si d e r a d a su f i ci e n t e p a r a r e f l e t i r o u n i v e r so pesquisado, em várias de suas m últ iplas dim ensões. Nu m a p e sq u i sa co m a m o st r a i n t e n ci o n a l , sã o selecion ad os ap en as aq u elas p essoas con h ecid as com o elem entos ativos de um a determ inada situação, às quais se propõe est udar, favoráveis ou cont rárias aos obj et ivos( 8).

A co l e t a d e d a d o s f o i r e a l i za d a n a s dependências onde se realizam as sessões do grupo de auto- aj uda e em um a sala de terapia da Escola de Enfer m agem de Ribeir ão Pr et o. Par a obt enção das i n f o r m a çõ e s, u t i l i zo u se a e n t r e v i st a se m i -est rut urada, nort eada pela qu-est ão: “ fale- m e de sua v i d a a n t e s d e u sa r d r o g a s e q u a n d o se t o r n o u d e p e n d e n t e ”. As e n t r e v i st a s f o r a m g r a v a d a s e t ranscr it as. Tam bém ut ilizou- se a t écnica pr oj et iva sob a form a de estória- com - tem a e desenho-est ór ia- liv r e. Os d esen h os e as v er b alizações d aí result ant es foram analisados nos m oldes da análise de cont eúdo. A t écnica pr oj et iv a foi ut ilizada com o r ecu r so d e ab o r d ag em , u t i l i zad a p ar a t em as d e acesso difícil em pesquisa( 9).

Co m o r e l a çã o a o d e se n h o - e st ó r i a ( D E) , pode- se dizer que é um pr ocedim ent o m ediant e o qual é possível ter acesso às idéias e às em oções do suj eito de form a m ais espont ânea. Considera- se que, para invest igar os aspect os m ais profundos da vida d e cad a su j eit o p esq u isad o, é n ecessár io q u e se m a n t en h a u m r el a ci o n a m en t o i n t er p esso a l m a i s pr óx im o e isso em um a pesquisa com usuár ios de d r og as r eq u er m u it o t em p o e a f or m ação d e u m vínculo de confiança. Sendo assim , o desenho foi a est r at égia qu e pr opiciou descon t r ação e cr iou u m am biente favorável para isso. Por isso, lançou- se m ão desse r ecur so. Sendo um pr ocesso inconscient e, o desenho ret rat a, em linguagem gráfica, o sent im ent o de quem desenhou.

A t écnica proj et iva

O desenho com o t écnica proj et iva, funciona com o est ím ulo da apercepção t em át ica sob m edida, um a vez que o suj eit o faz um desenho e cont a um a est ór ia sobr e o desenho feit o( 10- 12). O desenho e a

est ór ia funcionam com o agent es facilit ador es par a acesso aos cont eúdos inconscient es e por t r azer à

tona os conteúdos inconscientes, sendo considerados, d en t r o d a p er sp ect iv a w in n icot t ian a, com o “ ár ea t ransicional”( 11).

Os m ét odos proj et ivos podem ser usados no caso em que o pesquisador se depara com dificuldades de ex pr essão do suj eit o inv est igado, ent r et ant o, é at ravés da int erpret ação dos dados colet ados que se pode const at ar o significado lat ent e apresent ado no cont eúdo do carát er proj et ivo( 11).

DESENVOLVI MENTO DA TÉCNI CA

Após apresentação dos obj etivos da pesquisa e obt enção do consent im ent o, cada usuário recebia duas folhas de papel sulfite em branco, um lápis preto nº 2 e um a borracha. I nicialm ent e, solicit ava- se que el ab o r asse u m d esen h o - l i v r e, d esen h asse o q u e quisesse, após o que era estim ulado a escrever abaixo d o d e se n h o so b r e o q u e h a v i a f e i t o . A se g u i r, solicit av a- se que fizesse out r o desenho no qual se dava o t em a e se dizia: desenhe o que é para você u m u su á r i o d e d r o g a s. Er a est i m u l a d o , a p ó s, a escrever abaixo da sua produção gráfica um a estória. Depois da aplicação das t écnicas proj et ivas, os suj eit os par t icipar am de out r a ent r ev ist a, o que p o ssi b i l i t o u co m p i l ar al g u n s d ad o s p esso ai s e a t raj et ória no cont at o com as drogas.

Esses procedim ent os ocorreram em locais e h or ár ios n egociados in div idu alm en t e, em clim a de acolhim ento e respeito à produção e aos sentim entos de cada u m . Dessa for m a, en qu an t o colabor av am co m o e st u d o , o s u su á r i o s co n v i v e r a m co m a enfer m eir a/ pesquisador a, sob o clim a de int er ação t erapêut ica. Nessa int eração, puderam part icipar de co n f r a t e r n i za çõ e s f a m i l i a r e s e d e f e st i v i d a d e s exist ent es na cidade.

ANÁLI SE DOS RESULTADOS E DI SCUSSÃO

Os dados dest a pesquisa for am analisados nos m oldes da análise de conteúdo( 12) que considerou

o teor tem ático das form as discursivas utilizadas pelos suj eit os.

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p r ocu r a os sig n if icad os con t id os n o d esen h o, n as est órias a ele pert inent es, nos relat os de vida e nas dem ais expressões que acom panham a com unicação. É um t r abalho que exige, inicialm ent e, or ganização dos dados, seguido de recortes do conj unto de dados e m ca t e g o r i a s, p r o j e t a d a s so b r e o s co n t e ú d o s ex p r essos p elo su j eit o( 1 2 ). Pr essu p õe im er são d o

p e sq u i sa d o r, p o r m e i o d e l e i t u r a s e r e f l e x õ e s, r elacionando os dados com a ex per iência concr et a vivida pelos suj eit os.

Quant o ao t em a, consist e num a unidade de significação com plexa, de com prim ent o variável; sua validade não é de ordem lingüística, m as de natureza psicossocial. Um t em a pode ser const it uído t ant o por u m a a f i r m a çã o co m o p o r u m a a l u sã o , p o d e n d o contribuir com várias afirm ações e ser reenviado para diversos t em as( 12).

Qu an t o à t écn ica p r oj et iv a, selecion ou - se quat ro desenhos- est ória de dois usuários, sendo um desenho- liv r e e out r o desenho com t em a, além de t rechos de suas est órias, seguidos dos com ent ários analít icos.

César, 31 anos, solteiro, passou 8 m eses em u m a Fazen da de Recu per ação. Com eçou f u m an do m aconha aos 13 anos. Achava em ocionant e. Depois, p a sso u a u sa r o u t r a s d r o g a s e t a m b é m b e b i d a alcoólica ... eu era um a pessoa norm al... estudava... era um a pessoa tím ida, não gostava m uito de grupo, tinha poucos am igos,

tinha bom relacionam ento com a fam ília, era um a pessoa m edrosa,

tinha m edo de tudo..., com o uso da droga fui m e libertando dos

m edos... fui m e desligando da escola, do trabalho... m e tornei um

alcoólatra ... sou hom ossexual, tratei e m e curei. Fui trabalhar

num bar da fam ília. . . som os m uit o unidos. . . causei m uit o

t ranst orno e t odo m undo correu at rás... nunca m e abandonou.

Tive envolvido com a polícia.... O drogado é um a pessoa que j á

tem rótulo, está escrito na testa, vai ser perseguido pelo resto da

vida porque na verdade a sociedade não acredita nesse negócio de

recuperação... é taxado, é rotulado.

D ESEN H O- ESTÓRI A - A

Tít ulo - Ave Maria

V e r b a liz a çã o A - Est a flor significa cada ave- m aria que ofereço a Nossa Senhora.

DESEN H O- ESTÓRI A COM TEM A - B

Tít ulo - O que é ser um usuário de drogas

V e r ba liz a çã o B - O drogado est á preso no t únel. É m uit o escur o. . . m uit as v ezes ele pr ocur a luz, m as não consegue chegar até lá. É preciso que ele próprio se aceit e com o realm ent e é e, conform e o 1º passo, possa adm it ir que é im pot ent e per ant e o v ício, os hábit os e em oções.

O r e l a t o d e Cé sa r é p e r m e a d o p e l o s desent endim ent os com sua fam ília, t ant o por causa das drogas com o pela sua preferência sexual, e t al fat o, segundo ele, o deixa m uit o const rangido.

Na v er balização A do desenho, obser v am -se a pre-sença de sím bolos fem ininos ( flor, ave- m aria, Nossa Senhora) e a presença de int ensa angúst ia e sent im ent os de culpa, os quais foram observados no contato com ele durante a entrevista. A oração sugere a r em issão de suas culpas. Podem os afir m ar que, cult uralm ent e, essa t em sido um a m aneira ut ilizada p e l a s p e sso a s p a r a e x p i a r se u s p e ca d o s. Su a per cepção de usuár io de dr ogas é ex pr essa no 2º desenho, assim com o suas dificuldades encont radas na vida e o cam inho que deve seguir para conseguir a salvação. Na verbalização B, o usuário refere que foi colocado dent r o do t únel, que é m uit o escur o, d e m o n st r a n d o a ssi m q u e n e ce ssi t a d e a j u d a . Ent ende- se, assim , que é com o se ele se visse num

beco sem saída, sem perspectiva de apoio, pois, sendo u m ex clu ído da sociedade, só pode esper ar aj u da m ediada por f ór m u lar m ágicas. Ele, com o m u it os out ros, não acredit a em soluções concret as e apóia-se no m íst ico, no sobrenat ural, para conapóia-seguir um a r eabilit ação.

João, 22 anos, m ecânico de m ot os, solt eiro. Usou droga pela prim eira vez aos 15 anos, oferecida por um “ am igo”. Com eçou por curiosidade e só usava na rua com os am igos. Depois que entrei nessa vida não quis saber de m ais nada, parei de t rabalhar, de est udar, de namorar...

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ele fazia na nossa presença. Eu ainda guardo lem branças dessas brigas, m as procuro esquecer e procuro não ficar lem brando dessas coisas, isso m e faz m uit o m al. Mesm o assim eu considero a fam ília tudo para m im ; é na m inha fam ília onde estão as pessoas que m ais gosto nessa vida e as que m ais m e ajudam . A sociedade, eu vej o com o pessoas que usam m áscara, são am igos por interesse, no m eu caso por causa da droga; na hora que se pede aj uda, desaparecem . A sociedade é assim , só discrim inação...

Su a pr odu ção gr áf ica r et r at a, de m an eir a nostálgica, suas lem branças da infância. No relato de sua vida, ent ret ant o, expressa os conflit os vividos, a desorganização fam iliar e refere que procura esquecer aquelas lem branças, das brigas do pai com a m ãe na pr esença dos filhos. No desenho, r et r at a um a casa onde m or av am 7 pessoas ( os pais e os 4 ir m ãos) , ob ser v an d o- se assim ele se ex clu in d o d o g r u p o, e m b o r a t e n h a co l o ca d o 7 f r u t i n h a s n a á r v o r e , entendendo- se cada frutinha com o cada um dos filhos. No out ro desenho, o usuário est á lado a lado com a polícia, porém dom inado.

D ESEN H O- ESTÓRI A - A

Tít ulo - A casa onde eu m orei na infância

V e r ba liz a çã o A - Est e desenho lem bra a casa onde eu m orava no I piranga. E aonde eu m orava tinha um pom ar com o este, aonde eu gostava m uito de brincar com m eus am igos. Nest a época, eu t inha 6 anos e m oravam sete pessoas nesta casa, m eus pais e m eus quat r o ir m ãos.

DESEN H O- ESTÓRI A COM TEM A - B

Tít ulo - O que é ser um usuário de drogas

V e r b a l i z a çã o B - Est e desenho r epr esent a a v ida de um usuário de droga que estava usando droga na r u a. Qu an do acabou a dr oga, o u su ár io saiu par a r oubar um a lanchonet e com um r evólver 38; levou t o d o o d i n h e i r o e l o g o e m se g u i d a o d o n o d a lanchonet e cham ou a polícia e cat ou o ladr ão com algum as pedras de crack.

Os dois r apazes dest e est udo par t icipav am do Grupo de Auto- Aj uda e referem - se a esse trabalho de m aneira posit iva t al com o nas falas abaixo.

Aqui nesse grupo eu sei que sou m ais um doent e,

porque o alcoolism o e a dependência de drogas são problem as

que não têm cura... a pessoa dependente vai ser sem pre um

doente em recuperação.

... é m uito difícil, elas têm que ter m uita perseverança,

espero que elas tenham isso e consigam se recuperar, tenham

boa sorte e força para elas, e que elas creiam em Deus, porque só

Deus resolve todos os nossos problem as.

... eu tenho o grupo com o um a força, uns aj udando os

outros. Participar do grupo porque o pai ou a mãe quer, não adianta;

a pessoa tem que querer sair da droga... só assim ela pode ser

ajudada.

D o co n t e ú d o e x p r e sso p o r e sse s d o i s rapazes, usuários de drogas, depreende- se que suas h ist ór ias per m eiam o espaço social da fam ília, da escola e da religião, ressaltando- se dois tem as básicos o est igm a e as relações sociais.

O uso e o abuso de álcool e de outras drogas sã o a ssu n t o s co m p l e x o s e r e q u e r e m p r o f u n d a reflexão sobre as razões, m ot ivações e dificuldades encont radas pelos usuários para sua dependência.

Mer ece d est aq u e o f at o d e q u e o m esm o m eio social que incentiva, concretiza e legitim a o uso, cr ia san ções am bígu as, com o a pr isão do u su ár io q u a n d o o e n co n t r a so b e f e i t o , o u p o r t a n d o , a su b st â n ci a ; n ã o o f e r e ce u m t r a t a m e n t o d e r ecu p er ação n em p ar a o u su ár io n em p ar a seu s com ponentes fam iliares. Não se percebem claram ente os lim ites de dom ínios, nem as estruturas defensivas, estando talvez perm eando o inconsciente das pessoas o m edo de sucum bir ao seu poder e o t em or de ser incapaz de enfrent am ent os efet ivos.

Essa a m b i v a l ê n ci a e st á p r e se n t e n o s desenhos e verbalizações dos dois rapazes, conform e explicit ado na seqüência.

Cé sa r, falando sobre a flor do seu desenho

(6)

um a vida tranqüila. No desenho com tem a, entretanto, é r et r at ada a r ealidade que v iv encia com t odos os se u s e n co n t r o s e d e se n co n t r o s n a co r r i d a p a r a preencher sua falt a, que é a busca com pulsiva pelo seu obj eto de prazer - a droga. Com o não tem dinheiro par a com pr á- la, r ouba um a lanchonet e m as logo é apanhado pela polícia. Nessa sit uação, o que dev e fazer? Quem ele pode procurar para aj udá- lo?

No m at er i al p r od u zi d o p el os u su ár i os d e drogas, percebe- se, à prim eira vist a, a crist alização de sent im ent os de angúst ia, de insegurança e falt a de per spect iv a social. A cr ença na possibilidade de recuperação, entretanto, nem sem pre dita, é expressa nas im agens da própria vida proj etada nos desenhos, com o nas orações recitadas diariam ente na esperança de um lar com preensivo e sem brigas.

No im aginário social, o usuário de drogas é considerado um transgressor das norm as e, portanto, um a am eaça à ordem social. Por outro lado, a própria sociedade incent iva o alívio das t ensões sociais, por m eio do uso de bebidas e do cigarro, drogas vendidas livrem ent e. O fenôm eno do uso de drogas, incluindo a q u i o u so d e b e b i d a s a l có o l i ca s e d e o u t r a s su b st ân ci as q u e cau sam d ep en d ên ci a e q u e são v en d i d as l i v r em en t e, en v o l v e t an t o o s asp ect o s socioculturais com o fonte de perigo e de poder, com o t am bém os aspect os psicológicos, um a vez que não chega a todas as pessoas, m as som ente a um grupo que, ao fazer uso, ou cont inua usando ou pár a de usar.

O f e n ô m e n o d o u so d e d r o g a s, p a r a det er m inados segm ent os da sociedade, é analisado co m o u m a q u est ão l i g ad a so m en t e à p esso a d o usuár io. Há, por par t e da sociedade, int er esse em t e n t a r e n co b r i r a v e r d a d e i r a l ó g i ca d a o r d e m econôm ica e est r ut ur al que ex ist e nessa sit uação? Em alguns casos, é at é com um relacionar o uso de dr ogas ao que se cham a de cont ágio sim bólico( 13),

com o um pr oblem a com t endência à dissem inação d e u m est ig m a, con t ag ian d o as p essoas d o m eio so ci a l q u e t ê m r e l a ci o n a m e n t o a m i st o so co m o u su á r i o . Cr e n ça s co m o e ssa s, v e i cu l a d a s p e l a sociedade, r ef or çam as con du t as de despr ezo, de p u n i çã o o u d e a f a st a m e n t o d a s p e sso a s est igm at izadas, o que, cert am ent e, só aum ent a m ais o pr oblem a.

Sob essa perspect iva, a sociedade t ransfere as verdadeiras causas geradoras de conflit os para o i n d i v íd u o , o u su á r i o d e d r o g a s, e o d e f i n e p u b l i ca m e n t e co m o i n a ce i t á v e l e r e p r e e n sív e l ,

ex cluindo- o.

D a f a m íl i a , p r i m e i r a r e f e r ê n ci a d o se r h u m a n o , e sp e r a - se q u e p r o p i ci e , d e sd e a su a co n ce p çã o , a s co n d i çõ e s d e d e se n v o l v i m e n t o biopsicossocial ao indivíduo. Ao m esm o tem po, tem os q u e com p r een d er a f am ília com o u m a in st it u ição m ut ável, que se organiza de acordo com os padrões cult urais est abelecidos pela sociedade, absorve esses p a d r õ e s cu l t u r a i s e o s t r a n sm i t e p a r a o s se u s m em br os. Os fat or es de sobr ev iv ência de cada um têm origem na fam ília, com o esteio, referência e fonte f o r m a d o r a d e co m p o r t a m e n t o s. Sã o a s r epr esen t ações sociais per m eando o cot idiano das pessoas na sociedade.

Co n si d e r a n d o o s r e l a t o s d o s su j e i t o s pesquisados, há a percepção de que m uit os usuários de drogas tiveram pais, m as não tiveram experiências com eles qu e lh es per m it issem in t r oj et ar a figu r a pat erna est ável, com preensiva e com plem ent ar, que ele pudesse ter um a identificação. Esse fato os tornou p si q u i ca m en t e ó r f ã o s. No s r el a t o s co n t i d o s n a s en t r ev ist as, as f am ílias d os u su ár ios ap ar ecer am com o perm issivas, com pais om issos ou agressivos, alcoolistas e m ães vítim as am orosas e, na sua m aioria, conivent es com o uso de drogas, um a vez que, para m inim izar suas dores, faz uso de benzodiazepínicos, um a droga lícit a que t am bém causa dependência.

Do pon t o de v ist a in div idu al- em ocion al, a drogadição pode ser vista com o um a busca narcisista de prazer, arcaica e regressiva( 4). O desej o e o prazer

com a droga vão substituindo todos os outros desej os e prazeres e sua busca é m arcada pela im pulsividade e pela urgência de sat isfação. Os usuários relat am , n os d ep oim en t os, p r og r essiv o ab an d on o d e t u d o aquilo que eles consider av am bom , aceit áv el, que dava prazer e m otivava sua existência, com o nam orar, t rabalhar e est ar present e j unt o à sua fam ília.

(7)

o dependent e do usuário event ual( 4).

Em relação à religião, pelos seus princípios d og m át icos, é u m a d as op ções en con t r ad a p elas pessoas par a m inim izar ou at é m esm o supor t ar as d u r e za s d e st a v i d a , o f e r e ce n d o a se n sa çã o d e pr ot eção cont r a t odos os m ales e o sent im ent o de que, por m eio dela, podem ser r e- ligados a t udo o que os cerca. É um a “ m itologização” da própria vida. Quanto à escola, é oportuno dizer que, com o p er t en cen t e ao m eio social e con st it u íd o- se u m a extensão da fam ília, essa instituição tem se m ostrado a p a r e n t e m e n t e n e u t r a a ce r ca d e ssa q u e st ã o , acr edit ando- se que os gest or es ainda não fizer am cu m p r ir a lei, en v id an d o esf or ços n o p r ep ar o d e professores para esse fim . É nesse am bient e social, ent ret ant o, que a m aioria dos adolescent es inicia o seu cont at o com a droga( 3).

Em um a investigação a respeito do que havia si d o e scr i t o so b r e d r o g a s n o s l i v r o s d i d á t i co s br asileir os, dest inados ao ensino de 1º e 2º gr aus, en con t r ou - se g r an d e n ú m er o d e t ex t os com u m a a b o r d a g em q u e o s p esq u i sa d o r es ch a m a r a m d e

p e d a g o g i a d o t e r r o r. Ca u sa m i m p a ct o p e l o a m e d r o n t a m e n t o e u t i l i za m - se , p o r v e ze s, d e infor m ações cient ificam ent e infundadas, abst r aindo o v er d ad eir o q u ad r o ep id em iológ ico d o País e as causas m acr oest r ut ur ais da pr oblem át ica do uso e do abuso de drogas( 14).

CONSI DERAÇÕES FI NAI S

A presente pesquisa foi realizada j unto a um grupo de aut o- aj uda para usuários de drogas, com o obj et iv o de ident ificar os significados m anifest os e lat ent es da vivência desses suj eit os.

Foi necessário m ais de um ano de convivência e de observações para que se conquistasse a adesão con scien t e e esclar ecid a d os colab or ad or es d est e est udo. A seleção foi int encional e suficient e par a r eflet ir o u n iv er so pesqu isado e os pr ocedim en t os t écnicos for am r ealizados ut ilizando- se ent r ev ist as, conduzidas de m odo a est im ular a livre narrat iva do en t r ev ist ad o, com o m ín im o d e in t er f er ên cia d as

pesquisadoras, e da t écnica proj et iva, que forneceu m at erial suficient e para ent endim ent o das quest ões subj et ivas do ent revist ado.

A t écn ica p r oj et iv a m ost r ou - se ad eq u ad a p ar a m an t er o d iálog o, p ar a se cr iar o am b ien t e f av o r áv el à i n v est i g ação d e asp ect o s d i f ícei s d e abordar, para indicar m uit as quest ões subj et ivas não reveladas na verbalização e para acessar cont eúdos inconscientes, freqüentem ente bloqueados e não ditos com o uso de t écnicas diret as de abordagens.

A análise dos dados buscou o t eor t em át ico d a s f o r m a s d i scu r si v a s d a co m u n i ca çã o q u e se est abeleceu en t r e a pesqu isador a e o u su ár io. Os relatos dos casos selecionados para o presente artigo f or am apr esen t ados pr iv ilegian do os t r ech os m ais significat ivos, relacionados aos respect ivos desenho-livre e desenho- est ória com Tem a.

Os resultados evidenciam que as estórias dos dois usuários perm eiam o espaço da fam ília, da escola, da r eligião, r essalt ando- se o est igm a e as r elações do suj eit o consigo m esm o e com o seu m eio social.

D est a ca m - se o s a sp ect o s em o ci o n a i s d o indivíduo, seu am biente fam iliar, a escola, as am izades ant es e após ser coapt ado pela droga.

O a m b i e n t e f a m i l i a r n ã o l h e s p e r m i t i u int roj et ar um a figura pat erna est ável, com preensiva e com plet a. Observa- se o abandono progressivo dos seus hábit os, cost um es e relações para t ransform ar-se num excluído.

O papel do am bient e escolar e do sist em a social, a b u sca p ela r elig ião e as d if icu ld ad es d e r ecuper ação const it uem pont os que se dest acam a p a r t i r d a ex p r essã o v er b a l e d o s d esen h o s d o s suj eit os, discut idos nest e est udo.

Os result ados dest a análise são im port ant es p a r a su b si d i a r a co n st r u çã o d e p r o g r a m a s p a r a dependent es quím icos que levem em consideração a singularidade do usuário de drogas.

En f im , en t en d e- se q u e est a p esq u isa é o i n íci o d e u m ca m i n h a r d i f íci l q u e o e n f e r m e i r o psiquiát rico deve percorrer para a const rução de um trabalho sólido de atendim ento ao dependente quím ico e ao seu fam iliar, t endo com o obj et ivo a valorização da saúde e o respeit o ét ico e solidário à vida.

REFERÊNCI AS BI BLI OGRÁFI CAS

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(8)

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