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Da agente de desenvolvimento infantil à professora de creche: estudo sobre uma trajetória profissional a partir da categoria gênero

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Academic year: 2017

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CIENCIAS HUMANAS

DJENANE MARTINS OLIVEIRA

Da Agente de Desenvolvimento Infantil à Professora de Creche:

Estudo sobre uma trajetória profissional a partir da categoria

gênero

Guarulhos

(2)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO

ESCOLA DE FILOSOFIA, LETRAS E

CIENCIAS HUMANAS

DJENANE MARTINS OLIVEIRA

Da Agente de Desenvolvimento Infantil à Professora de Creche:

Estudo sobre uma trajetória profissional a partir da categoria

gênero

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e Adolescência de Ciências da Universidade Federal de São Paulo, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação e Saúde.

Orientadora: Profª Drª Daniela Auad

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Ficha Catalográfica

Universidade Federal de São Paulo Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas

OLIVEIRA, Djenane Martins.

Da Agente de Desenvolvimento Infantil à Professora de Creche: estudo sobre uma trajetória profissional a partir da categoria gênero / Djenane Martins Oliveira. – Guarulhos, 2011.

156 f.

Dissertação (Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e Adolescência) - Universidade Federal de São Paulo, Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, 2011.

Orientadora: Profª. Drª. Daniela Auad

Título em inglês: An Agent of Child Development to Teacher Child Care: Study on a professional career from the perspective of gender.

(4)

DJENANE MARTINS OLIVEIRA

Da Agente de Desenvolvimento Infantil à Professora de Creche:

estudo sobre uma trajetória profissional a partir da categoria

gênero

Guarulhos, 27 de setembro de 2011

_________________________________________________

Profª Drª Daniela Auad

DP- EEFLCH – Universidade Federal de São Paulo

_________________________________________________

Profº Dr. José Cerchi Fusari FE- Universidade de São Paulo

__________________________________________________

Profª Drª Cláudia Regina Lahni

FACOM – Universidade Federal de Juiz de Fora

__________________________________________________

Profª Drª Regina Cândida E. Gualtieri

(5)

Dedicatória

À Ângela, mãe e amiga e ao meu pai Luiz Carlos, pessoas que acreditaram desde a criança que fui, e que continuarei a ser no potencial de ser e do vir-a-ser, que

mostraram a mim e a meus queridos irmãos, o verdadeiro

sentido da infância.

À Ana Clara, filha amada, que inaugurou no mundo uma nova mulher, uma nova educadora e um novo jeito de perceber as crianças no mundo.

Ao companheiro Marcos, pela cumplicidade na

jornada, pelos vários momentos de paciência e apoio.

Às Agentes de Desenvolvimento Infantil,

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Agradecimentos

Muitos e muitas foram aqueles (as) que de várias maneiras colaboraram com a realização deste trabalho. Agradeço a todos (as) pelo incentivo, carinho, apoio e críticas quando da sua elaboração.

Agradeço, em especial, à Profª Drª Daniela Auad, orientadora que acompanhou os diversos momentos desta pesquisa, oferecendo observações críticas pertinentes e respeitosas, assim como estabeleceu diretrizes norteadoras para a realização do presente estudo.

Aos professores (as) e estudantes do Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e Adolescência da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) que comigo enfrentaram o desafio da inauguração de um programa interdisciplinar tão abrangente quanto este.

Da mesma forma, agradeço aos professores (as) componentes da banca examinadora desta dissertação e da qualificação deste trabalho, que com análises rigorosas, apontamentos respeitosos e principalmente com co-responsabilidade, colaboraram para que o presente estudo se concretizasse – Professores (as) Doutores (as): Daniela Auad, José Cerchi Fusari, Regina Cândida Ellero Gualtieri, Claudia Regina Lahni, Rosário Genta Lugli e Pedro Paulo Pereira Gomes.

Agradeço a todas as Agentes de Desenvolvimento Infantil e Professoras de Educação Infantil, pelas informações, apoio, disposição para participação deste estudo, agradeço pela divisão das angústias, sonhos, sentimentos e percepções, em especial, a Clô, Cris, Silvana, Vera Lúcia, Ana Lícia, Ana Paula, Karina, Juliana, Conceição, Célia, Fernanda, Eva Maria, Virgínia, Nora, Camila, Lilian, Márcia, Daniela e Egle.

Agradeço a Elaine pelo apoio e a Aurora pelas infindáveis encadernações das versões preliminares.

(8)

RESUMO

OLIVEIRA, Djenane Martins. 2011. Da Agente de Desenvolvimento Infantil à Professora de Creche: estudo sobre uma trajetória profissional a partir da categoria gênero. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em

Educação e Saúde na Infância e Adolescência da Universidade Federal de São Paulo.

O objeto de investigação da pesquisa é conhecer a trajetória profissional das professoras de creche da rede pública municipal de Guarulhos/SP, as Agentes de Desenvolvimento Infantil. Tal conhecimento é buscado com a adoção de gênero como categoria de analise histórica, partindo das diferentes nomenclaturas utilizadas para a função ao longo dos anos. As atividades profissionais das mulheres nas creches são tradicionalmente desvalorizadas, em grande parte por estarem ligadas às características atribuídas ao feminino. Relacionando-se a essa desvalorização, há, por um lado, a mobilização das profissionais de creche e sua busca para qualificar as práticas cotidianas no interior da instituição e, por outro lado, a continuidade da naturalização dos papéis femininos adquire estatuto docente. Tal situação oferece oportunidade para que se verifique o papel da formação em serviço, com abordagem de gênero, nas práticas educativas realizadas no interior da creche. Os procedimentos de pesquisa adotados foram a análise dos questionários respondidos pelas ADI / PEI, a observação participante e a análise dos documentos oficiais sobre a formação destas educadoras no município de Guarulhos, como apontado por Thiollent (2007). Uma vez que as práticas na creche estiveram por muito tempo dissociadas das questões pedagógicas, o atual momento parece conter

uma contradição que somente o exame da questão poderá responder: é possível

aliar as práticas educativas destas profissionais, construídas socialmente, com suas trajetórias profissionais individuais e de classe, proporcionando uma nova compreensão a respeito do cotidiano das creches e da formação de suas

professoras? Os resultados da pesquisa apontam para a necessidade da produção

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escolares, sobretudo acerca dos valores hierarquizados que se atribuem ao masculino e feminino.

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ABSTRACT

OLIVEIRA, Martins Djenane. 2011. An Agent of the Child Development to Teacher Child Care: Study on a professional career from the perspective of gender. Dissertation. Program of Post Graduate Studies in Education and

Health in Childhood and Adolescence, Federal University of São Paulo.

The object of investigation of the research is to know the career of

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LISTA DE TABELAS

TABELA 01 - Número de Escolas Municipais, por décadas, em

comparação a população total da cidade de Guarulhos:... 25

TABELA 02 - Número de ADI / PEI em relação aos PEB na Rede

Municipal de Educação... 60

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LISTA DE GRÁFICOS

GRÁFICO 01 - Crescimento das escolas municipais de 1980-2011... 57

GRÁFICO 02 - Creches da Rede Municipal de Guarulhos de 1980-2008... 59

GRÁFICO 03 - Escolaridade quando do ingresso na função de ADI ... 80

GRÁFICO 04 - Porcentagem de ADI/PEI por gênero... 85

GRÁFICO 05 - Tempo deExperiência como ADI/PEI ... 102

GRÁFICO 06 - Escolaridade quando do ingresso na função de ADI ... 103

(14)

LISTA DE ANEXOS

ANEXO 01 - Portaria 30/2010 da SME ... 130

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LISTA DE APÊNDICES

APÊNDICE 01 - Modelo de Termo de Livre consentimento esclarecido ... 142

APÊNDICE 02 – Modelo de questionário para pesquisa de campo... 145

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ADI - Agente de Desenvolvimento Infantil

AGAM - Associação Guarulhense de Amparo ao Menor

CIEE - Centro de Integração Empresa-Escola

CLT - Consolidação das Leis Trabalhistas

DNC - Departamento Nacional da Criança

ECA - Estatuto da Criança e Adolescente (Lei nº 8069/1990)

FUNDEF - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério.

FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização do Magistério

FFLCH/USP - Faculdade de Filosofia, Ciências, Letras e História da Universidade de São Paulo

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH - Índice de Desenvolvimento Humano

LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96)

MEC - Ministério da Educação

PEB - Professor (a) de Educação Básica

PEI - Professor (a) de Educação Infantil

PIB - Produto Interno Bruto

PMG - Prefeitura Municipal de Guarulhos

PPP - Projeto-Político-Pedagógico

SAM - Secretaria de Administração e Modernização

SAS - Secretaria de Assistência Social

SME - Secretaria Municipal de Educação

SENAI – Serviço Nacional da Indústria

STAP- Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública Municipal de Guarulhos

UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 18

O memorial de vida como proposta de formação... 18

Percurso Metodológico ... 28

CAPÍTULO 1 - O Histórico da creche e suas profissionais ... 42

1.1 - As concepções de Educação Infantil no contexto da educação brasileira ... 42

1.2 - A cidade de Guarulhos: expansão territorial e crescimento populacional... 50

1.3 - A educação escolar em Guarulhos ... 55

1.4 - O Histórico da creche e suas profissionais ... 60

CAPÍTULO 2 - A Tríade Mulher-Mãe-Professora... 67

CAPÍTULO 3 - A Realidade da Creche... 83

3.1 – As relações de gênero como organizadoras de hierarquias e produtora de identidades... 83

3.2 - Caracterização do espaço físico e atendimento da creche analisada ... 86

3.3 - Histórico da região de atendimento da creche analisada por uma de suas moradoras ... 89

3.4 - Ideal formativo e profissional... 93

3.5 – A adoção do cuidado como prática de homens e mulheres... 101

3.6 – A ruptura da tríade mulher-mãe-professora... 106

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 112

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 117

ANEXOS... 130

(18)

INTRODUÇÃO

O Memorial de vida como proposta de formação docente

Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo. E examinai, sobretudo, o que parece habitual. Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar.

BERTOLD BRECHT

Este estudo trata de mulheres, crianças e trabalho1. Para apresentá-lo faz-se

necessário falar do caminho que me levou a este tema, das muitas crianças e mulheres que determinaram o objeto de pesquisa. A minha narração cumpre aqui o propósito de situar o leitor com relação aos motivos que me levaram à escolha desta pesquisa e compartilhar as percepções acerca do cotidiano das creches e das profissionais que nela atuam.

Rememorar a minha própria trajetória traz um não-sei-quê de reviravolta, uma sensação de escavar as lembranças que podem estar no fundo de um baú esquecido no porão, quer porque as deixemos, ou ainda por que preferimos não trazê-las à tona, por dor, por saudade ou por arrependimento. E é nesse movimento de resgate que todas as lembranças e rememorações se misturam em passado, presente e futuro.

A importância da memória na produção do conhecimento tem grande relevância quando se apresenta a maneira como se chegou a sua efetivação. Para Chauí (1987), lembrar é reconduzir a memória à dimensão de um trabalho sobre o

1 A escrita desta introdução se deu no âmbito da disciplina Memória e Formação Docente, ministrada

(19)

tempo e no tempo, compreensão do agora a partir de outrora; é sentimento e não sua mera repetição. De acordo com Bosi, (1998):

Pela memória, o passado não só vem à tona das águas presentes, misturando-se com as percepções imediatas, como também empurra, ‘desloca’ estas últimas, ocupando o espaço todo da consciência. A memória aparece como força subjetiva ao mesmo tempo profunda e ativa, latente e penetrante, oculta e invasora. (BOSI, 1998p. 47)

Nas primeiras linhas claramente emergiam e se apresentavam algumas mulheres que foram fundamentais para a delimitação do objeto de pesquisa. Tentar escrever sobre os motivos que me trouxeram até aqui, o papel assumido como pesquisadora requereu a retomada da trajetória percorrida. Creio que quando iniciei a escrita deste texto, pouco claro estava para mim, o quanto a minha própria trajetória como sujeito estava presente na pesquisa que estava disposta a realizar.

Esse movimento não seria tão rico se não houvesse um resgate em minha trajetória e a relação que tive com a instituição escolar. Para pensar o meu ingresso ao mundo letrado foi preciso voltar um pouco no tempo histórico, voltar para antes da minha existência. Na rememoração, por mais esforço que eu tenha feito para isto, foi impossível desvincular os vários fatos rememorados, daqueles da vida que tiveram minha avó e minha mãe. E na reviravolta deste baú, isto ficou muito mais claro para mim do que eu podia sequer supor a alguns anos atrás.

Na ordem do tempo, creio que devo começar pela breve história da minha avó, digo breve porque ela foi uma das pessoas que se foram cedo demais. Cresci ouvindo as histórias de Anna Coccenzza, filha de imigrantes italianos, colonos das Minas Gerais do final do século XIX, uma das treze filhas de Maria Rita, que infelizmente não teve acesso às letras, assim como uma grande parte das meninas colonas, filhas de imigrantes pobres.

(20)

pereceu ainda na flor da idade, sob uma enorme Araucária2, fato que se deu no Estado do Paraná em 1956, época em que vários trabalhadores pobres e sem

qualificação partiram para tentar “ganhar a vida”, com a larga exploração madeireira

por empresas americanas, como a Lumber3, e num lastimável paradoxo, meu avô

que havia partido de São Paulo para tentar “ganhar a vida”, perdera a sua:

(...) Essa serraria [da Lumber] tinha capacidade de produção de 470 m3 de madeira serrada por dia e chegou a ter cerca de

2.000 operários, sendo uma média de 400 a 500 trabalhadores somente no engenho e o restante trabalhando por empreitada nos serviços de corte e transporte das toras e construção de ferrovias particulares” (CARVALHO E NODARI, 2008. p. 67).

Daí em diante foram cinco filhos e nenhum amparo, a não ser de outras duas mulheres fenomenais, Jovina e Benedita Coccenzza, suas irmãs, que ainda na década de 1950, enfrentavam as barreiras sociais de ser mulher no Brasil, eram

enfermeiras4 e solteiras.

Segundo Moreira (1999): “... a enfermagem é uma profissão feminina por

excelência, por ter sido sempre o cuidado à saúde uma atribuição da mulher”. Esse discurso revela um cotidiano das mulheres que exercem a profissão, como se profissional de enfermagem fosse sinônimo de mulher-enfermeira. O cuidado aos doentes, de início, era realizado nos hospitais de forma filantrópica e caritativa, sob a responsabilidade das irmãs de caridade.

2 A Araucária (Araucária Angustifólia) é a principal arvore do ecossistema denominado Floresta de

Araucária que cobria, até o final do século XX, cerca de 200 mil Km2 do planalto dos três Estados do Sul do Brasil. (CARVALHO, 2006)

3 A Southern Brazil Lumber and Colonization, que a partir de 1920 construiu serrarias com alta tecnologia, produção em larga escala e deu impulso a nova economia madeireira que estava se formando no sul do Brasil. (CARVALHO, 2006)

4Interessante notar que a profissão de enfermeira no Brasil também passou por uma naturalização

(21)

Voltando a história de Anna Coccenzza, mudou-se para a pequena cidade do Vale do Paraíba em São Paulo, chamada Lorena, mudou de cidade, de vida e de sonhos.

A necessidade de trabalhar e criar os filhos fez com que a minha avó tivesse que fazer uma escolha entre o emprego oferecido no hospital e aquele que lhe foi

oferecido na escola confessional5, onde as meninas das famílias mais abastadas da

cidade foram educadas e desde cedo escolarizadas. Sem dúvidas, mesmo porque não poderia se dar ao luxo de tê-las, ela foi trabalhar na escola. Torna-se primordial

lembrar que o acesso à creche não era uma realidade para as mulheres

contemporâneas a minha avó, e que ainda nos dias de hoje conforme aponta o

documento Situação Mundial da Infância-Caderno Brasil produzido pela UNICEF,

publicado em 2008, o acesso à creche e pré-escola ainda é insatisfatório, somente 15,5% das crianças de até três anos (ou seja, 1,7 milhões) freqüentavam as creches. Em todo o Brasil, temos o vergonhoso número de 9,5 milhões de crianças até três anos sem acesso à creche.

As freiras deram a Anna a possibilidade para que a pequena Ângela lhe acompanhasse durante o trabalho, e ainda hoje minha mãe orgulhosa, conta que sentava nas escadarias e do lado de fora assistia admirada as aulas, ainda aos quatro anos de idade. Motivo de orgulho de minha avó, minha mãe já sabia todas as orações ensinadas pelas freiras, o que algumas das meninas letradas ainda não sabiam, e então , as irmãs lhe permitiram que freqüentasse a catequese junto com as meninas mais velhas e mais abastadas, alunas regulares do colégio.

A única possibilidade de escolarização que se apresentou à minha mãe foi a confessional, o que vale lembrar que no mundo e também no Brasil, como política pública, a universalização do ensino, foi tardiamente levada em consideração, financiada e ainda infelizmente não é uma realidade para todas as crianças, como

sinalizava ainda em 2002, o documento intitulado Um mundo para as Crianças

UNICEF, sobre a realidade da infância no mundo, 100 milhões de crianças no

mundo estavam fora da escola, e deste total 60% eram meninas.

5 Aqui reconheço que também se expressou claramente a lamentável ausência de políticas públicas

(22)

Mas como é possível supor aquele que lê este relato, essa escolarização inicial só foi possível para uma menina bem pequena que ainda não tinha compromissos econômicos e sociais. Minha mãe sempre foi grata às freiras da

Santa Casa de Misericórdia por lhe proporcionarem o estudo até a quarta série

primária, mas contava-me não sem um olhar vago que quando do exame de

admissão6 para o único ginásio da cidade, as coisas mudaram. Não seria possível

arcar com os custos de uma educação mais avançada. Eu cresci ouvindo estas histórias, e agora na distância que me permiti, sei o quanto elas influenciaram em minhas escolhas.

Não conheci minha avó, a não ser pelo retrato pintado na parede da sala e pelas muitas histórias contadas e recontadas sobre as mulheres da família. Mas sei que suas escolhas se tornaram parte do que eu sou hoje, faz parte das minhas inquietações sobre a educação e seus rumos fazem parte da minha constante busca por entender as relações escolares e o mundo feminino, as mulheres e a escolarização, os processos educacionais e a mão-de-obra feminina.

É interessante perceber hoje, com o devido distanciamento, que o meu ingresso ao mundo letrado iniciou e se inaugurou no mundo muito antes de mim. Assim como percebo que a história da minha filha, Ana Clara iniciou-se bem antes que eu tivesse sequer suposto a sua existência.

Vivi a infância na cidade de São Paulo, na década de 1980, num bairro operário da zona norte da cidade, recordo-me dos dias que se passavam numa morosidade quase sonolenta, quase sem novidades. O mundo era muito menos complicado, muito mais devagar. Nossa rotina quase nunca se alterava, os desenhos animados não tinham cores e às vezes nem som. Nos anos oitenta do

século XX no Brasil7, ser criança de uma determinada classe social, a dos pobres,

significava ter a disposição um número infinitamente menor de objetos do que hoje se apresenta, era um tempo diferente de ser criança, muito menos apetrechado.

6 Os exames de admissão ao ginásio foram iniciados em 1931 e extintos em 1971, eram utilizados

para o ingresso de alunos do Curso Primário (entre 10 e 13 anos de idade) no Ginásio, objeto de desejo da classe média em ascensão, e que representou uma trava à democratização do ensino no Brasil.

7 Torna-se necessário lembrar que a década de 1980 no Brasil, carregava consigo o final de um

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Um dia, ainda nos anos de 1980, achei uma pequena colherzinha plástica azul com uma inscrição, e que por pura brincadeira, decidi copiar os caracteres inscritos no pequeno objeto. Segurei-o em minhas mãos e escrevi aquelas poucas letras que ali estavam, desenhei-as no chão de terra com um pequeno graveto. Não percebi nenhuma novidade, nada de espetacular ou de fantástico naquilo, era uma brincadeira como tantas outras num mundo sem muitas opções.

Eu estava com pouco mais de quatro anos de idade, enquanto escrevia aquela palavra que não sabia o que significava. Ao me virar pude ver a cara de espanto de minha mãe que me olhava, numa mistura de felicidade, de medo, de encanto e de esperança:

- Ela já sabe escrever!

As poucas vizinhas vieram acudir minha mãe, aquelas mulheres boquiabertas pareciam empoderadas ao ver a menininha que iniciava um ciclo. Parecia se abrir, as portas de um mundo, o mundo das letras, a mesma porta que foi trancada para as mulheres da minha família, pelo total descaso dos governantes pela educação, pela falta de políticas públicas para crianças e mulheres. Nos anos de 1960 e 1970, época em que minha mãe deveria ter se escolarizado, o mundo e em especial o caso brasileiro, ainda não considerava abarcar sem tensões, mulheres, trabalho e crianças. No decorrer deste estudo, minhas inquietações ainda

pairam sobre a pergunta: Estas tensões foram solucionadas ou encontram-se

apenas diluídas na modernidade?

Depois daquela tarde de sol quente em que eu havia escrito uma palavra da qual não tinha a mínima idéia do significado, mas que tinha me dado um poder que eu jamais poderia imaginar, passaram-se alguns meses, em que eu todos os dias escrevia a mesma palavra, naquele mesmo quintal de terra, esperando os elogios que sempre acompanhavam aquela misteriosa escrita, (só lamentava não ter outros objetos de onde tirar mais palavras para copiar, aquilo era quase como tirar o coelho da cartola). Esse era o meu truque.

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Mudamos para um bairro distante, na periferia da cidade de Guarulhos, na Grande São Paulo, onde não conhecíamos ninguém. Lamentei durante um tempo. Minha mãe percebeu isto. Percebeu que eu havia me tornado mais triste e mais quieta do que era de costume, mas em sua imensa e simples sabedoria me fazia reviver a possibilidade da escrita e da brincadeira com o mundo letrado, aquele que para nós e para muitas outras crianças, estava muito além da única porta de entrada da casa.

O mundo em que fui criança, apesar de não ter decorrido tanto tempo assim, era um mundo difícil, pelo menos na classe social a que pertencíamos. Não tínhamos a nossa disposição lápis, canetas e outros objetos ligados ao mundo escolar. Divertíamo-nos correndo atrás de animais, fazendo os próprios brinquedos com latinhas ou caixas, era tudo muito mais simples. Mas minha mãe havia

encontrado uma saída, mesmo que naquele momento euainda não soubesse disso,

ela havia arranjado um modo de me colocar em contato com as letras .

A nossa casa como a de muitas outras crianças, não tinha livros, papéis ou lápis como hoje é comum para muitas crianças, mas lamentavelmente ainda não para todas. Na nossa casa tinha um único lápis, que servia para anotar pedidos no

catálogo8 que minha mãe vendia. Aquelas vendas lhe rendiam um dinheirinho, que

ela guardava sem que ninguém soubesse. Ela sempre me dizia:

- Não conte nada disso ao seu pai, ouviu?

E eu sem saber o porquê, respondia que sim, mas não me atrevia a perguntar. Quando vejo hoje minha filha brincar tão descompromissadamente com seus lápis e canetinhas, pintando seus livros para colorir e manuseando os livrinhos de história, me pego pensando como é bom poder oferecer a ela tudo isso e vejo como o ciclo da história se repete. Entendo com isso, como a estimulação cultural oferecida às crianças é importante e fundamental para seu desenvolvimento, no entanto é necessário considerar o quanto a materialidade condiciona isto e restringe ainda o acesso de muitas crianças às letras no Brasil.

8 A venda de produtos a catalogo, conhecida como porta a porta, era uma prática comum nos anos

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Não demorou muito para que eu descobrisse o propósito daquilo tudo. O fim do ano estava próximo, mas não era o Natal que minha mãe esperava, ela aguardava ansiosamente o próximo ano e eu nem imaginava o porquê. Descobri que todo aquele esforço não era sem propósito. No bairro vizinho, no Jardim Presidente Dutra, já em Guarulhos, havia a única pré-escola que conhecíamos, uma instituição privada, era lá que estudavam as crianças com condições financeiras infinitamente melhores que as minhas.

A minha mãe já tinha dinheiro suficiente para a matrícula, o uniforme e as primeiras mensalidades. Ganhei até uma lancheira. Era a realização de um sonho, sonho meu e sonho dela, era a oportunidade que ela não teve. Foi um esforço argumentativo imenso para convencer o meu pai de que, com muita força de vontade seria possível me manter naquela escola particular, pois naquela época a escola pública era um luxo que muitos bairros não tinham.

Vale notar que nesta época, a cidade de Guarulhos contava apenas com

algumas escolas públicas, como mostra o quadro a seguir9, obtido através dos

dados do IBGE e da Secretaria Municipal de Educação (SME), conforme Cardoso (2006)10:

Tabela 1 : Número de Escolas Municipais, por décadas em comparação a população total da cidade de Guarulhos:

Ano População de Guarulhos Número de Escolas

Municipais

1950 34.683 0

de 1961 a 1971 236.811 01

de 1971 a 1980 532.724 16

de 1981 a 1991 787.866 36

de 1992 a 2000 1.072.717 66

de 2001 a 2004 1.200.000 116

Fonte: CARDOSO (2006)

9 Os números da tabela são significativos quando analisados em conjunto com o desenvolvimento da

cidade de Guarulhos, o que doravante dissertarei.

10 É necessário considerar que apesar do gráfico apresentado por Cardoso (2006), não apresentar

(26)

Fui para a escola, penteada, perfumada e cheia de medo. Medo do novo, medo de não me adaptar, medo de decepcionar, de frustrar as expectativas que haviam sido depositadas em mim. Na minha lancheira havia um chocolate, colocado lá pela minha mãe, ela sabia o quanto eu desejava aquele chocolate que havia sido lançado há pouco tempo e que estava em todas as propagandas de tevê, e que eu também já havia aprendido a copiar o nome, mas que não podia provar, pois era muito caro. Aquilo me encantou profundamente, era o meu primeiro dia de aula e minha mãe havia colocado na minha lancheira sem me contar aquele chocolate. Olhei para ele e sentia seu gosto mesmo sem abrir a embalagem, tinha medo de abrir e terminar com aquele momento mágico.

Mas descobri logo cedo, que na escola também pode morar a crueldade, um garoto que me viu olhando o chocolate, sozinha sentada no banco do jardim, passou correndo e levou o chocolate. Fiquei triste, mas não tive coragem de contar para minha mãe. Aquele chocolate era um código, era a mensagem que ela me passava silenciosamente de boa sorte naquele novo mundo no qual ela não tinha tido a oportunidade de ir tão longe quanto desejara.

Comprei outros chocolates mais tarde, mas nenhum tinha aquele sabor, que eu não cheguei a experimentar, mas que ficara marcado em minhas lembranças até hoje, como um código entre minha mãe e eu, e que nunca foi revelado. A mim me basta que ela saiba que sua intervenção foi determinante e definitiva para a mulher que me tornei.

Findo aqui o meu relato que situa o leitor no contexto em que as minhas

inquietações surgiram e à luz das referências bibliográficas de Thiollent (1984)11,

interessei-me no desenvolvimento da pesquisa-ação que relatarei nos parágrafos

seguintes.

Sejam as mulheres da família, Anna, Ângela, quer sejam as primeiras professoras Áurea e Terezinha e também as outras tantas que vieram mais tarde,

Profª Drª Anita W. Novinsky, a Profª Drª Mary Del Priore12 e suas inquietações sobre

11 Referências que me foram apresentadas durante a especialização em Gestão Escolar, cursada

na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) em parceria com o MEC no Programa Escola de Gestores, oferecido, como formação continuada, pela Secretaria Municipal de Educação em 2007. 12 As Professoras Anita Novinsky e Mary Del Priore estiveram presentes em minha formação

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as mulheres, o amor e a maternidade. A Profª Drª Daniela Auad e suas provocações sobre a questão de gênero e as relações escolares, assim como as amigas e companheiras de trabalho, em especial uma que me ensinou muito mais do que eu a ela, a Tia Clô, com seu jeito específico de ser professora de creche. Elas me despertaram para o tema que inquieta e provoca: as tensas e aparentemente insolúveis tensões que se estabelecem nas relações entre os papéis de mulher, mãe e professora, que se confundem e se misturam em tantas outras mulheres quanto em mim mesma.

Quando do ingresso em nível de mestrado, no Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e Adolescência da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), em 2009, a minha proposta inicial de pesquisa era realizar o aprofundamento da reflexão acerca da construção da identidade das educadoras de creche no município de Guarulhos. Essa proposta surgiu inicialmente pelas inquietações que afloravam em todas as reuniões pedagógicas das escolas pelas quais tive o prazer de passar durante os cinco anos que atuei, e ainda atuo na gestão de escolas, principalmente das creches. Outro fator importante foi o fato de ter me tornado mãe, em 2006, quando algumas escolhas se apresentaram, quase se impondo. Na urgência de uma mãe trabalhadora, a creche apresentou-se em três dimensões: a da mulher, a da mãe e a da educadora.

(28)

Percurso Metodológico

A pesquisa-ação é inovadora do ponto de vista científico somente quando é inovadora de vista sócio-político, isto quer dizer, quando tenta colocar o controle do saber nas mãos dos grupos e das coletividades que expressam uma aprendizagem coletiva tanto na sua tomada de consciência como no seu comprometimento com a ação coletiva.(ZUÑIGA apud THIOLLENT, 2007, p. 50)

O presente estudo, ao considerar o gênero como categoria analítica, busca perceber as tensões aparentemente insolúveis existentes na trajetória histórica das

profissionais de creche, as Agentes de Desenvolvimento Infantil13 e também em

suas trajetórias individuais, tendo como pano de fundo a tríade mulher-mãe-

professora, questionando se serão insolúveis as tensões advindas dessas

identidades ou se a qualificação profissional das educadoras de creche dissolveria, pelo menos em parte, as assimetrias de gênero que podem afligi-las?

Há, ainda, que se questionar de que maneira essas tensões se apresentam no universo das relações escolares, levando em consideração o ofício do pesquisador como desnaturalizador das palavras e práticas tendo em vista desvelar e desenredar o que se apresenta em busca desta “desnaturalização”.

Destaco aqui, que as investigações feministas mudaram radicalmente o que se pensava sobre a humanidade, especialmente em relação às concepções ditas

13 O termo Agente de Desenvolvimento Infantil surgiu no ano de 2001, em substituição ao termo

(29)

neutras, mas que desconsideravam o gênero como uma categoria útil de analise histórica.

Os trabalhos de autoras brasileiras de diversas áreas foram de suma

importância para o reconhecimento semântico deste campo de estudo, dentre eles,

A mulher na sociedade de classes de Helleieth Saffiotti publicado em 1985, Estudos sobre mulher e educação de Cristina Bruschini e Tina Amado publicado em 1988

nos Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos Chagas, Mulher e Educação Formal

no Brasil: estado da arte e bibliografia de 1990 de Fúlvia Rosemberg, Edith Piza e

Thereza Montenegro, O Dicionário Crítico do Feminismo de Helena Hirata (2009),

Relações de Gênero nas práticas escolares: da escola mista ao ideal de

co-educação de Daniela Auad (2004) e Gênero, Sexualidade e Educação de Guacira

Lopes Louro publicado em 1997.

Entre as referências internacionais, apresentaram-se de forma significativa

para este estudo, os trabalhos Ciência, Razão e a Mente Feminina de Valerie

Walkerdine publicado em 2007, Gênero: Um conceito útil à análise histórica de

Joan Scott, publicado em 1989 e Problemas de Gênero de Judith Butler, publicado

em 2009.

Fúlvia Rosemberg em 1984 afirmou algo que pareceu muito atual para uma pesquisadora que se encontrava inquieta diante da observação cotidiana das relações escolares e da tensão de ser mulher, mãe e trabalhadora em educação:

(30)

Antes de iniciar o estudo de campo propriamente dito, envolvi-me com a leitura crítica de obras clássicas e recentes das Ciências Sociais, entrando em contato mais direto com a literatura feminista, onde percebi a importância da busca e utilização do vocabulário feminista e dos estudos de gênero nesta produção, assim como o reconhecimento semântico da área para o presente foco de estudo,

buscando compreender os meandros que envolvem as questões relativas à

formação docente nos anos iniciais do magistério bem como a construção do discurso naturalizador destas práticas.

Pela própria natureza do objeto de estudo, as linhas já se traçam demonstrando que não haverá para o presente trabalho outra possibilidade, a não ser relatar através de uma pesquisa-ação ou pesquisa participante, as várias ações

e reflexões que provocam e inquietam o grupo de educadoras14 de creche da cidade

de Guarulhos, no percurso longo e tortuoso de constituição de suas trajetórias profissionais.

Tornou-se necessário entender as várias transformações ocorridas sem deixar de ser aquela educadora de antes, mas agora recheada de novas expectativas, idéias e vontades. O grande desejo de pesquisar aquelas educadoras, que encantaram e intrigaram a pesquisadora, motivou o desejo de conhecer cada vez mais, criou anseios, decepções, possibilidades e frustrações de querer fazer mais, mas também possibilitou observar a construção da identidade da ADI, que trabalha e acredita que a discussão e a reflexão sobre os espaços de brincadeiras,

as discussões a respeito do cuidar / educar15 que devem ser fortalecidos na escola

de educação infantil, sobretudo naquelas que atendem crianças de zero a três anos.

E aqui, assumo que as minhas escolhas influenciaram a escolha de meu objeto de estudo concordando com o que sugere Louro:

14 Apesar da exigência gramatical de que se use o masculino genérico quando houver um ou mais

homens, optamos por utilizar o gênero feminino nas expressões ou palavras que indicam as Educadoras de Creche por serem a grande maioria.

15 Optei por utilizar a barra entre o cuidar e o educar de forma a colocá-los na mesma ordem de

(31)

O modo como pesquisamos e, portanto, o modo como conhecemos e também como escrevemos é marcado por nossas escolhas teóricas e por nossas escolhas políticas e afetivas. É certamente, afetado por nossa historia pessoal, pelas posições-de-sujeito que ocupamos, pelas oportunidades e encontros que tivemos e temos. Conseqüentemente, o modo como escrevemos tem tudo a ver com nossas escolhas teóricas e políticas. O modo como conhecemos é, por tudo isso, incontrolável, volátil. Mas essa constatação não significa que não possamos refletir sobre este processo. (LOURO, 1997, p.213)

Sei, portanto, dos riscos assumidos na escolha do método de pesquisa-ação, que por si só não garante a qualidade das descobertas, mas com a iluminação dos referenciais teóricos, procurei mergulhar o quanto pude na realidade estudada, o quanto possível no interior dos questionamentos, no intuito de desmistificar, de avaliar transformações, debater, discutir, sentir e rever práticas, pensar nas

possibilidades da ação, mas “o desafio consiste em mostrar que tais riscos, que

também existem em outros tipos de pesquisa, são superáveis mediante um

adequado embasamento teórico” (THIOLLENT, 2007).

Dar voz16 a essas mulheres, as Agentes de Desenvolvimento Infantil, pode

ser um meio de dar a elas instrumentos para responderem aos problemas da situação em que vivem no contexto da creche, sob a forma de diretrizes de ação transformadora. Não faria sentido realizar a pesquisa com elas e sobre elas, sem colocar as questões pertinentes a partir do referencial teórico adotado.

Nessa perspectiva, o estudo se desenvolve a partir do referencial da pesquisa-ação assim como aponta Thiollent (2007). Trata-se de prática de pesquisa atenta às exigências teóricas e cotidianas na direção de equacionar problemas relevantes dentro da situação social observada: a trajetória profissional das Agentes

16 Ao mencionar o “

dar voz” refiro-me a sistematização das práticas e sentimentos em relação à

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de Desenvolvimento Infantil, utilizando a categoria gênero para conhecimento do objeto de estudo.

Fazer uma investigação, cujos resultados compõem uma descrição, é de fato, elaborar um discurso sobre dado assunto. Nunca devemos esquecer que os fatos ou o real não falam sozinhos. Sempre os interesses e as características sócio-culturais de quem faz o discurso influem de alguma maneira no que é dito e no que fica escondido. (THIOLLENT, 1984, p.47).

O objeto da pesquisa, desta forma, é a trajetória profissional das professoras

de creche, partindo até mesmo das diferentes nomenclaturas adotadas para a

função17 durante os anos: Recreacionista, Agente de Desenvolvimento Infantil e

mais recentemente Professor (a) de Educação Infantil, utilizando-me das narrativas das trajetórias individuais e como estas se relacionam no recorte da história da constituição da carreira das docentes, objeto este concebido enquanto processo.

Vale reforçar portanto, que a categoria utilizada para conhecer o objeto descrito é a

categoria gênero, sobre a qual doravante dissertarei.

Diante do objeto e da problemática elucidada sintetizamos o problema da pesquisa nas seguintes questões:

Quais são as possibilidades de construção de uma identidade

profissional das educadoras de creche, que atuam na modalidade da educação infantil de zero a três anos?

Como identificar as relações de gênero, muitas vezes tradicionais,

envolvidas na construção da identidade de Educadora de crianças pequenas, a partir do seu ingresso na creche com Agente de

17 Utilizo-me do termo função e não cargo, por assim serem denominados na Prefeitura Municipal de

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Desenvolvimento Infantil e em um contexto mais amplo de desvalorização dos papeis femininos naturalizados?

Da questão central da pesquisa decorrem outras:

De que maneira as instituições de Educação Infantil, em Guarulhos,

vêm atuando na formação contínua e em serviço de suas educadoras, considerando a adoção da categoria gênero em suas propostas pedagógicas?

Como superar a imensa lacuna criada durante décadas em relação ao

papel da creche na sociedade?

De que maneira superar a idéia de que educação e cuidado não são

atividades similares, complementares e que devem ser igualmente valorizadas?

Conforme Fusari (1990), a competência docente deve ser entendida em contexto mais amplo, como um eterno processo de desenvolvimento e crescimento pessoal e profissional, aonde o educador vai revendo de maneira crítica e consciente, no exercício de sua prática pedagógica, os seus compromissos sociais, dentro dos diversos papéis que exerce como profissional, como cidadão e como educador (a).

(34)

Discutir, de maneira propositiva, o papel da instituição de Educação Infantil

de zero a três anos nos processos de desenvolvimento global da criança, levando em consideração que a criança, desde o seu nascimento, interage com o mundo e com os outros seres humanos e desde a primeira infância já se constitui um ser de direitos, capaz de construir uma cultura própria, apresentando-se como uma superação do modelo tradicional da creche que tem como propósito “cuidar” de criança, cujas mães ou avós18 trabalham fora (o que muito colabora para a desvalorização e naturalização do trabalho domestico), para a transição de um modelo que coloque a criança como ser de direitos e como responsabilidade social.

Conhecer e identificar as diversas maneiras encontradas dentro da instituição

de Educação Infantil para a contribuição com a formação continuada em serviço de suas Agentes de Desenvolvimento Infantil.

Produzir conhecimento a partir das possibilidades de aprimoramento da

formação das educadoras que atuam na modalidade da educação infantil de zero a três anos, por meio da discussão sobre a assimetria apresentada nas relações escolares acerca dos valores que se atribuem ao masculino e feminino.

Refletir sobre a construção da identidade da Agente de Desenvolvimento

Infantil como educadora de crianças pequenas, e seu conseqüente desenrolar como Professora de Creche, entendendo suas potencialidades e desafios, dentro de um contexto mais amplo do histórico da creche na sociedade brasileira. Vale notar que esse processo será analisado principalmente na cidade de Guarulhos.

18 Utilizo-me tanto do termo mães quanto avós, pois se torna necessário considerar o crescente

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Selecionar e sistematizar bibliografia especifica sobre relações de gênero e

formação de educadoras.

Compreender e analisar os documentos oficiais da Secretaria Municipal de

Educação de Guarulhos, suas diretrizes e políticas para a profissionalização das Professoras de Creche.

A partir de análise da bibliografia feminista e de estudos e pesquisas desenvolvidas por estudiosas de gênero, assim como da bibliografia referente à formação de professores (as) e á Educação Infantil, ocupei-me de observar as práticas cotidianas dentro da instituição escolar, especificamente da creche, de forma a tentar ver com as lentes críticas da realidade aquilo que se apresenta na

formação econstituição da profissionalização das educadoras de creche, as Agentes

de Desenvolvimento Infantil no município de Guarulhos/SP.

Nesse sentido elegemos a escola, mas especificamente uma creche, como nossa unidade de análise, dada a sua relevância para o contexto, entendendo-a como produtora de identidades, para tanto apoiamo-nos nas formulações de autoras como Walkerdine (2007), que nos alerta sobre como a escola é produtora de identidades sejam elas étnicas, de gênero, de classe, intelectuais ou profissionais.

Eleger a creche como unidade de análise nos permite conhecer de perto a construção da identidade de suas educadoras e, consequentemente, pensar os aspectos formadores e formativos em suas trajetórias profissionais.

Acreditamos que no espaço da escola se reforçam as desiguais divisões sociais, ainda que nem todas as vezes isso esteja explicitamente colocado, os valores que são transmitidos de maneira oculta, ou aqueles que são silenciados também colaboram para a manutenção de determinadas configurações sociais.

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Partimos da hipótese de que a formação em serviço - coletiva, híbrida e como parte de um Projeto-Político-Pedagógico construído coletivamente na escola,-pode se tornar um instrumento de construção da identidade das professoras de creche, ao passo que coloca essas mulheres como protagonistas e autoras da reconstrução de sua profissionalidade, onde possam deixar de ser ouvintes e

possam tornar-se autoras.

Trata-se de uma pesquisa-ação ou pesquisa participante, conforme o que

aponta Thiollent (2007):

Do ponto de vista sociológico, a proposta da pesquisa-ação dá ênfase à análise das diferentes formas de ação. Os aspectos estruturais da realidade social não podem ficar desconhecidos, a ação só se manifesta num conjunto de relações sociais estruturalmente determinadas.

(THIOLLENT, 2007 p. 11).

E continuando:

A pesquisa-ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com uma resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. (THIOLLENT, 2007 p. 16).

Nesse sentido torna-se necessário situar o leitor para a realidade estudada,

entendo que na pesquisa-ação os pesquisadores desempenham um papel ativo no

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a) ampla e explícita interação entre pesquisadores e participantes da situação investigada;

b)estabelecimento da ordem de prioridade dos problemas a serem pesquisados e das soluções encaminhadas sob forma de ação concreta;

c) a constituição do objeto de investigação dá-se pela situação social e pelos problemas decorrentes desta situação;

d) na pesquisa-ação o objetivo é resolver os problemas decorrentes da situação social observada ou pelo menos tentar esclarecer esses problemas;

e) durante o processo há um acompanhamento das ações, decisões e atividades intencionais dos atores da situação e,

f) não se limita a uma forma de ação, mas pretende-se aumentar o conhecimento dos pesquisadores e dos grupos considerados.

A pesquisa-ação não deixa de ser uma experimentação em situação real, portanto as variáveis não são isoláveis, todas elas interferem no que está sendo investigado. No entanto, não se trata apenas de agir ou participar, mas é necessário a produção de conhecimentos, a contribuição para a discussão, fazendo avançar o

debate a cerca das questões abordadas.

Considerando ainda, que aquilo que o que o pesquisador observa nunca é independente de sua formação, de suas experiências anteriores e do próprio

mergulho na situação investigada, torna-se necessário esclarecer que a realidade observada das educadoras de creche deu-se de forma integral pela pesquisadora, ao passo que integra o grupo de educadoras que trabalham em creche da rede municipal de educação de Guarulhos, na condição de gestora de creche. Torna-se

fundamental esclarecer ao leitor, que o lugar que me cabe ao sistematizar este

estudo é enquanto educadora e pesquisadora. Tenho a difícil tarefa de ser analista e ao mesmo tempo uma dos agentes do processo.

(38)

assim como apontar caminhos diante do problema colocado. Para tanto alguns critérios de escolha foram utilizados:

• Ser uma escola pública do município de Guarulhos, com atendimento

de creche.

• Existir interesse e disponibilidade para a realização da

pesquisa-participante.

• Existir na Instituição uma prática estruturada de formação de

educadoras de creche.

• Possibilidade de participação em reuniões coletivas dos educadores,

horas-atividades e momentos de formação.

• Disponibilidade em fornecer documentação para análise (PPP, Planos

de Ação, Semanários e Registros das Professoras)

No desenvolvimento da pesquisa em questão, recorremos a procedimentos de coletas de dados, métodos e técnicas de grupo para lidar com a dimensão interativa e coletiva da investigação, também foram utilizadas técnicas de registro, bem caderno com observações de campo, observação participante e exposição dos resultados.

Visto que na pesquisa-ação, a utilização do questionário não é suficiente em si mesmo, estes foram considerados como meio de informação complementar, mas que quando aliados a observação participante revelaram as percepções das educadoras no tangente a constituição de suas carreiras docentes e deixaram transparecer os percursos individuais de cada uma delas.

Por um lado, toda a documentação disponível foi levantada: Documentos da

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como descreverei pormenorizadamente no capitulo 3: A Realidade da creche e as relações de gênero como organizadoras de hierarquias e produtoras de identidade.

Percorri um caminho metodológico que envolveu, ainda, estudos sobre a história da formação e profissionalização docente no Brasil, onde se destaca notadamente o reduzidíssimo número de trabalhos referentes especificamente a formação das profissionais da educação de crianças muito pequenas, como no caso da creche.

Posteriormente relatarei as experiências de observação em relação a este tópico de análise, que já de antemão reconhece que homens podem exercer a docência nesta modalidade de ensino, a da creche, mas freqüentemente os cuidados com o corpo são vistos como algo que deve ficar a cargo do universo feminino.

Ao longo da investigação, consideramos a profissão docente das Agentes de Desenvolvimento Infantil vinculando-a às questões do gênero feminino, na medida

em que ser mãe (ou não), mulher e professora condiciona esta forma de atuação

profissional e sua relação com a Pedagogia da Educação Infantil.

Foram realizados vinte e dois questionários 19 com as ADI ⁄ PEI, nos quais foi

utilizado o recorte necessário à pesquisa, sendo eles:

• Somente foram ouvidas as profissionais do sexo feminino20.

• Deveriam apresentar dois anos ou mais de exercício na função de

ADI ⁄ PEI21 em creches da Rede Municipal de Educação de Guarulhos.

• Estar em exercício na função docente de ADI ⁄ PEI22.

19 Os questionários utilizados serviram como meio de informação complementar às observações. O

modelo do questionário utilizado encontra-se nos Anexos na página 145.

20 Foram ouvidas apenas mulheres, por se tratar de uma investigação que considera o feminino e as

mulheres como importantes para a análise da situação observada. Além disso, incluir homens na amostra traria outras questões (também relativas à gênero) para o trabalho. O Professor-homem na Educação Infantil estava ausente, em meu campo, e é atualmente analisado como objeto na pesquisa de Maria Arlete Bastos, orientada pela Profª. Drª. Daniela Auad da EEFLCH /UNIFESP.

21 O prazo de dois anos ou mais de exercício foi considerado, pois a partir desta data (2007), foram

exigidas a formação mínima em Nível Médio Normal ou Pedagogia, o que já aponta que pela formação adquirida haveria a possibilidade da docência, o que não estava implícito nos anos anteriores, quando a exigência de habilitação era a apenas a do Ensino Médio na modalidade Regular.

22 Não foram considerados os profissionais afastados, designados ou comissionados em outros

(40)

Estes recortes foram adotados por serem considerados pela pesquisadora como de grande importância, no sentido de refletirem a recente história profissional destas mulheres, visto que somente a partir deste recorte de data, começaram a ser exigidos critérios mínimos de atuação profissional para a função de ADI ⁄ PEI, a exigência mínima de formação escolar do Ensino Médio na Modalidade Normal ou Formação de Nível Superior em Pedagogia.

Os questionários realizados contavam com várias possibilidades de narrativa, de modo a considerar como se apresentam para as docentes, as percepções

acerca de sua atuação profissional na primeira infância23, bem como entender como

se deu a escolha profissional ou ingresso na instituição creche.

Torna-se necessário, ainda, apontar o conceito de gênero utilizado para a analise da situação observada e para isto utilizamos, para melhor esclarecer esta questão, do conceito de gênero adotado por Auad (2004):

Gênero não é sinônimo de sexo (masculino ou feminino), mas corresponde ao conjunto de representações construído por cada sociedade, através de sua Historia, para atribuir significados, símbolos e características para cada um dos sexos. Logo, as diferenças biológicas entre homens e mulheres são valorizadas e interpretadas segundo as construções de gênero de cada sociedade. (AUAD, 2004, p.42)

Desse modo, o presente estudo organizou-se de forma a contemplar o objeto investigado segundo a organização abaixo descrita:

Na introdução, utilizando-nos do memorial de vida como proposta de formação profissional, apresentamos a justificativa da escolha, a origem do problema, a delimitação da problemática de pesquisa, a metodologia utilizada na coleta de dados, bem como a proposta de contribuição deste estudo para a formação de professoras com enfoque de gênero, e ainda as contribuições para a

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história da constituição da creche no Município de Guarulhos e para a formulação de políticas públicas voltadas para a educação de crianças pequenas.

No 1º Capítulo, de modo mais abrangente, procuramos situar o leitor acerca das concepções de Educação Infantil no contexto da educação brasileira, bem como o histórico da creche e suas profissionais, e mais detalhadamente o histórico da constituição da ocupação, territorialidade e identidade na cidade de Guarulhos/SP, no qual detivemo-nos mais pormenorizadamente na educação escolar no município, o que se apresentou de grande relevância para o presente estudo.

No 2º Capítulo abordamos a Tríade Mulher-Mãe-Professora, assim denominada por expressar as tensões consideradas neste estudo, entre a conseqüente naturalização dos papéis femininos no cuidado / educação de crianças pequenas. E, de maneira propositiva, colocamos a necessidade da análise da presença maciça de mulheres no exercício do magistério com crianças pequenas, como é o caso das educadoras de creche, sob o enfoque das relações de gênero, de forma a desnaturalizar as diferenças entre homens e mulheres.

O 3º Capítulo pretende analisar e discutir a realidade da creche observada, e as relações de gênero como organizadoras de hierarquias e produtora de identidades, abordando o ideal formativo e profissional das docentes desta modalidade de ensino, bem como apresentar ainda de maneira propositiva, a adoção do cuidado como prática de homens e mulheres, com a possibilidade de ruptura da tríade Mulher-Mãe-Professora. Abordaremos ainda análise dos dados coletados na realidade observada, apresentando, ainda a caracterização do espaço físico e atendimento da creche analisada e o histórico da região de atendimento da creche analisada na visão de uma de suas moradoras, a Dona Zuleica.

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Capítulo 1

1.1- As Concepções de Educação Infantil no Contexto da

Educação Brasileira

(...) ergueu-se nossa simplicidade de aço, mostrando o que é possível fazer sem nos deixar esquecer o que ainda não foi alcançado.

BERTOLT BRECHT

Para a realização deste estudo, utilizei-me das referências bibliográficas de autoras e autores que estudaram a história da instituição creche no contexto da educação brasileira e o histórico da constituição profissional das educadoras de creche no Brasil e no mundo, além dos dados coletados na realidade específica da educação pública do município de Guarulhos. Os estudos realizados por Maria Malta Campos (1993), Fúlvia Rosemberg (1984), Ana Beatriz Cerisara (2002), Cristina Bruschini (1981), além de Moisés Kuhlmann (1998), foram importantes fontes para a pesquisa bibliográfica.

As referências históricas da creche afirmam em unanimidade que este modelo foi construído para cuidar das crianças pequenas, cujas mães saíam para o trabalho, estando portanto, intimamente ligado ao trabalho extradomiciliar da mulher.

(43)

crianças pequenas24, sejam educadoras, mães ou formuladores/as de políticas públicas para esta etapa do desenvolvimento humano.

A gradual e morosa transição democrática do golpe militar à abertura política culmina tardiamente na Constituição Federal de 1988, o primeiro documento oficial a proclamar o direito da criança à creche e à pré-escola, que em seu Art. 227

afirma: as creches e pré-escolas deixam de ser apenas um direito das mães que

trabalham fora e passam a representar um direito das crianças.

Esse direito é confirmado pela legislação posterior, no também tardio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990 e em seguida, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96).

Se a Constituição garantiu o direito, a LDBEN não só cunhou o termo Educação Infantil, para se referir a creches e pré-escolas, como finalmente também a reconheceu como a primeira etapa da Educação Básica Brasileira. Ou seja, as creches e pré-escolas, depois de pertencerem a tantas e diferentes áreas, das ações das primeiras-damas às áreas trabalhista, previdenciária e assistencialista,

passam, então, definitivamente para a responsabilidade da área educacional:

Art. 62. A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em Nível Médio, na modalidade Normal. LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL (1996)

Com essa mudança, as profissionais que atuavam e continuam atuando na Educação Infantil, principalmente as da creche, passaram a ser reconhecidas como profissionais, com direito à formação inicial e continuada. De forma que, se compararmos os dados referentes a estas educadoras será possível, ainda, encontrar um número comparativamente maior das professoras de pré-escola e

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Educação Básica, no que se refere à formação profissional, do que em relação às professoras de creche.

Isto deve-se, muito provavelmente em decorrência do percurso histórico da creche, uma vez que o atendimento em creches consolidou-se na área da Assistência Social, sem exigência de profissionais com uma habilitação específica para o exercício da docência, caminho um pouco diverso das pré-escolas, ambiente no qual o atendimento, desde sempre, se desenvolveu a cargo da educação demandando profissionais habilitadas para o exercício do Magistério.

Esta nova abordagem legal da educação infantil pode ser interpretada como valorização das profissionais da creche e, juntamente com isso, a garantia de uma profissão para aquelas mulheres que há muito tempo, assim como as crianças com as quais trabalham, ficaram à margem de políticas públicas.

No entanto é perceptível, nas observações em campo, que as professoras que atuam na Educação Infantil e Fundamental, ainda gozam de maior prestígio e

status do que as professoras que atuam somente na creche.

Basta para isto, lembrar os diferentes nomes usados para se referir a essas

trabalhadoras: auxiliares, monitoras, berçaristas, babás, recreadoras,

recreacionistas, animadoras, pajens, tias, cuidadoras entre outros:

(...) Até a promulgação da LDBEN 9394/96, os cursos que preparavam os profissionais para atuarem nos sistemas educacionais não tinham como tarefa implícita incorporar temas relativos aos cuidados e à educação de bebês ou sobre a proposta pedagógica adequada ao atendimento em período integral, mesmo que eventualmente o fizessem. (MACHADO, 2002 p. 99).

(45)

profissionais das educadoras de creche da cidade de Guarulhos, tendo o gênero como categoria de análise, acredito que serão necessários estudos posteriores, os quais devem elucidar melhor e de forma mais aprofundada esta outra problemática: a abordagem do desenvolvimento profissional das educadoras de creche e suas especificidades regionais, tendo em vista que trata-se de uma pesquisa-ação, cujo intuito não é promover generalizações, mas apontar caminhos possíveis que podem se cruzar nas trajetórias profissional de outras professoras de creche.

Até o início do século XX, a profissão de professor gozava de certo prestígio, o professor era visto como um intelectual, porém houve um momento de feminização em massa da profissão de professor, provocada, basicamente, em razão do

desinteresse dos homens, que podiam ganhar mais em outras atividades. Para

Demartini e Antunes (1993) há a necessidade de registrar como a mulher vai entrando para o magistério primário e tornando o exercício dessa profissão predominantemente feminino já na virada do século XX, em São Paulo.

Isso não foi um fenômeno exclusivo do caso brasileiro, no caso francês Cacoualt (1987), ao estudar a realidade francesa, afirma que a imagem do magistério como profissão feminina tornou-se uma forma de resolver as contradições entre o privado e o público, ou seja, entre a mulher-mãe e a mulher-educadora. Os estudos realizados por Luis Pereira em “Magistério Primário numa sociedade de classes” (1969), e Aparecida Joly Gouveia em “Professoras do Amanhã” (1965), são ricas fontes para o estudo destes fenômenos.

Porém é necessário ressaltar que, no caso específico das professoras de creche, não é possível realizar uma análise a partir da feminização, visto que a trajetória profissional das educadoras de creche apontam para mulheres como a maioria no segmento desde sempre. Concordando com o que constata Auad (1998):

Referências

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