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Processo de trabalho em saúde mental e o campo psicossocial.

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PROCESSO DE TRABALHO EM SAÚDE MENTAL E O CAMPO PSI COSSOCI AL

1

Ana Luisa Ar anha e Silva2

Rosa Mar ia Godoy Ser pa da Fonseca3

Aranha e Silva AL, Fonseca RMGS. Processo de trabalho em saúde m ental e o cam po psicossocial. Rev

Latino-am Enferm agem 2005 m aio- j unho; 13( 3) : 441- 9.

Tr at a- se d e r ef lex ão t eór ica sob r e os d et er m in an t es e os elem en t os con st it u t iv os d o p r ocesso d e

t r abalho da enfer m agem no cam po psiquiát r ico e no cam po psicossocial no cont ex t o da Refor m a Psiquiát r ica

br asileir a. O obj et iv o é ofer ecer cont eúdo t eór ico- conceit ual par a or ient ar a ação r eflex iv a de t r abalhador es

em saúde m ent al e, em part icular, da enferm agem . A finalidade do art igo é preservar a m em ória da prát ica da

enfer m agem no cam po psiquiát r ico e pr om ov er sua necessár ia super ação com v ist as à const r ução do cam po

psicossocial, subsidiando o ensino nos div er sos cam pos de saber em saúde.

DESCRI TORES: enfer m agem psiquiát r ica; saúde m ent al; ét ica; t endências

W ORK PROCESS I N MENTAL HEALTH AND THE PSYCOSOCI AL AREA

We pr esent a t heor et ical r eflect ion about det er m inant s and const it ut iv e elem ent s of t he nur sing w or k

process in t he psychiat ric and psychosocial areas, in t he cont ext of t he Brazilian Psychiat ric Reform . The aim is

t o offer t heoret ical and concept ual guidance wit h a view t o m ent al healt h workers’ reflexive act ion, part icularly

in nur sing. The pur pose of t his ar t icle is t o pr eser v e t he m em or y of nur sing pr act ice in psy chiat r y and t o go

beyond, wit h a view t o const ruct ing t he psychosocial area, support ing t eaching in all fields of healt h knowledge.

DESCRI PTORS: psy chiat r ic nur sing; m ent al healt h; et hics; t r ends

EL PROCESO DE TRABAJO EN SALUD MENTAL Y EL CAMPO PSI COSOCI AL

Se t rat a de una reflexión t eórica acerca de los det erm inant es y elem ent os const it ut ivos del proceso de

t rabaj o de enferm ería en el cam po psiquiát rico y psicosocial en el cont ext o de la Reform a Psiquiát rica brasileña.

El obj et iv o es ofr ecer subsidios t eór ico- concept uales par a or ient ar la acción r eflex iv a de enfer m er os y dem ás

t r abaj ador es de la salud m ent al. Est e ar t iculo t iene com o finalidades pr eser v ar la m em or ia de la pr áct ica de

en f er m er ía en el cam p o p siq u iát r ico y p r om ov er la su p er ación n ecesar ia, con v ist as a la con st r u cción d el

cam po psicosocial, ofr eciendo subsidios par a la enseñanza en los div er sos cam pos del saber en salud.

DESCRI PTORES: enfer m er ía psiquiát r ica; salud m ent al; ét ica; t endencias

1 Trabalho extraído da tese apresentada à Escola de Enferm agem da Universidade de São Paulo, em 25/ 4/ 2003; 2 Professor Dout or da Escola de Enferm agem

(2)

I NTRODUÇÃO

O

que guia o processo de t rabalho em saúde

é um conj unt o de det erm inant es( 1) de ordem :

a) est r ut ur al - a lei orgânica da saúde, os princípios d o SUS, r eg u l a m en t a çõ es, d i r et r i zes e p o l ít i ca s públicas para o set or;

b) par t icular - a função do serviço na rede local de at en ção , o s d i sp o si t i v o s d e i n t er d ep en d ên ci a o u colaboração das ações no sist em a de saúde, e c) si n g u l a r - a f or m a d e or g an ização d o ser v iço, m odelo de at enção oper ado inst it ucionalm ent e e a ca p a ci d a d e d o ser v i ço p r o d u zi r sa ú d e ( n ív el d e sat isfação de client ela e t rabalhador, resolut ividade, previsibilidade de ações, disponibilidade e capacidade de absor ção de dem anda espont ânea ou pr oduzida nas ações int erinst it ucionais) .

No cam p o d a saú d e m en t al , a d i m en são

singular - com preendida com o colet iv o inst it ucional*

- diz r espeit o ao que “per m an ece e se en r aíza nos indivíduos envolvidos por um a dinâm ica inst it ucional [ . . . ] algo dest e im per at iv o colet iv o [ que t am bém ] poderia exercer- se de m odo a solapar, a oblit erar ou sim plesm en t e dilapidar as v on t ades em j ogo n u m espaço institucional”( 2). A dim ensão singular, o

colet ivo

i n st i t u ci o n a l é, p o r t a n t o , a e ssê n ci a d o p r o j et o t erapêut ico, é o lócus onde se inscreve a concepção d e ser h u m an o q u e d et er m i n a a a çã o d e sa ú d e

o f e r e ci d a p a r a a l ca n ça r o o b j e t i v o d e p r o d u zi r

produt os de saúde: cuidar, am pliar o ent endim ent o e a apr opr iação do pr ocesso saúde- doença, m elhor ia da qualidade de vida dos usuários, ent re out ros.

Do ponto de vista da ação de saúde m ent al, o m odelo de at enção t r adicional m édico- cent r ado e h ospit alar con v ocav a ( e con v oca) u m pr of ission al su b or d in ad o à or g an ização p ar celad a d o t r ab alh o i n st i t u ci o n a l , o r i g i n á r i a d a d i v i s ã o t é c n i c a d o

t r ab alh ad or m éd ico colet iv o( 3 - 4 ) e, coer en t em en t e, afirm ava ( e afirm a) a cura ou adapt abilidade social com o finalidade do pr ocesso de t r abalho, a doença com o seu obj et o de int er v enção e a concepção do p r oj et o t er ap êu t ico d e com p et ên cia p r i v at iv a d o agen t e m édico, su bsidiado pr ef er en cialm en t e pelo t r ab al h o d o s d em ai s a g e n t e s d e sa ú d e d e n ív e l su per ior, secundar izando a per cepção e o saber do port ador de sofrim ent o psíquico, sinalizadores de um p r o j e t o si n g u l a r i za d o e q u e f a z se n t i d o n a su a part icular experiência de adoecim ent o( 5).

No Br a si l , a n e c e s s i d a d e d e s a ú d e d o port ador de sofrim ent o psíquico est eve subm et ida à or denação j ur ídica que r espondeu ao clam or social da década de t rint a, do século XX, prest ando- se ao con t r ole do alien ado e of er ecen do- lh e m in or idade social e t u t ela j u r íd ica at é a ap r ov ação d a n ov a legislação que r eor ient a o m odelo assist encial, em abril de 2001. O Relat ór io sobr e a saúde no m undo

2001, da Organização Mundial da Saúde, dedicado à saú d e m en t al, in d ica e r econ h ece o cu st o social, econôm ico e pessoal da doença m ent al.

Até a década de 90 do século XX, a ação da e n f e r m a g e m p si q u i á t r i ca se co n cr e t i za v a prevalentem ente no cam po adm inistrativo, no hospital p siq u iát r ico, d e f or m a b u r ocr át ica e b asead a n o m odelo biológico. No cam po do ensino, as referências t eóricas privilegiavam aut ores que adm it iam o papel d o en f er m ei r o co m o o d e ag en t e t er ap êu t i co( 6 ),

e v i d e n ci a n d o co n t r a d i çã o e n t r e i n s t r u m e n t o d e

i n t e r v e n ç ã o ( o r e l a ci o n a m e n t o t e r a p ê u t i co enferm eira( o) - pacient e) e a ação de saúde produzida

e oferecida à clientela, evidenciando que o organism o f o r m a d o r d e f o r ça d e t r a b a l h o em en f er m a g em r eit er av a ideologicam ent e o m odelo t r adicional. As polít icas de saúde, engendradas no nív el est r ut ur al, nas décadas de 80 e 90 do século XX t inham com o conseqüência a produção e ofert a de ação de saúde

produzida quase exclusivam ente no âm bito hospitalar. Portanto, observa- se coerência entre a ação de saúde prevalent em ent e hospit alar e as polít icas de saúde, o q u e p o d e i n d i ca r a i n f l u ê n ci a d a q u e l a s n a organização de serviços e na ofert a de produt os de saúde para a população.

D e ssa f o r m a , a r e a l i d a d e i m p o st a p e l a Ref o r m a San i t ár i a n as d u as ú l t i m as d écad as d o século XX, no Brasil, pelo processo de im plant ação e co n so l i d a çã o d o Si st e m a Ún i co d e Sa ú d e e , p ar t i cu l ar m en t e, p el a Ref or m a Psi q u i át r i ca, v em pr ov ocando um cont ínuo e consist ent e r om pim ent o n e sse p a r a d i g m a . A r e o r i e n t a çã o d o m o d e l o assistencial em saúde m ental em curso no país é fruto da or ganização do agent e de saúde com for m ação de nível superior e m édio, do usuário e do fam iliar de u su á r i o d e se r v i ço d e sa ú d e m e n t a l e d a r esponsabilização do Minist ér io da Saúde, por m eio de leis, port arias e regulam ent ações.

(3)

A AÇÃO D E EN FERM AGEM N O CAM PO

PSI QUI ÁTRI CO

O sist em a de saúde brasileiro, regulado pela Lei n. 8.080, de 19 de setem bro de 1990, instituiu o Sist em a Único de Saúde, com definição de níveis de r e sp o n sa b i l i za çã o e co m p e t ê n ci a s d e g e st ã o e financiam ento do setor saúde ( j á anunciados no SUDS e consolidados no SUS) nas t rês esferas de poder. A j uventude do Sistem a Público de Saúde brasileiro pôde explicar a ofert a da at enção hospit alar, especializada, par celada, diagnóst ica e fr agm ent ada, nos cent r os m et ropolit anos, nas décadas de 70 e 80, quando a form ação do agente de enferm agem de nível superior enfat izava com pet ência gerencial, inst rum ent al e em r elações t r ab alh ist as, sem p r e sob o p r in cíp io d a aust er idade, aut or idade, disciplina e hier ar quização d e l u g a r es e sa b er es, r esp a l d a d a s p el o esf o r ço co r p o r a t i v o d e g a r a n t i r à ca t e g o r i a u n i d a d e e legit im idade deont ológica.

No universo das especificações profissionais, e honr ando o p ar celam en t o d o t r ab alh o n a saú d e, en gen dr ado pela d i v i são so ci al d o t r ab al h o( 3 - 4 ) n a con solid ação d o m od o d e p r od u ção cap it alist a, a enferm agem construiu um cam po de ação identificado com a m edicina, esm erando esforços para classificar a ação que lhe é própria, à im agem e sem elhança do procedim ento diagnóstico e da conduta m édica. Desse e sf o r ço p r o d u zi u co r r e n t e s t e ó r i ca s, p r o t o co l o s classificadores de procedim ento e de ação em saúde, referidos ao cuidado da doença e sua m anifest ação. Essa é a e n f e r m a g e m c i e n t íf i c a, a n co r a d a n o p a r a d i g m a p o si t i v o ca u sa - e f e i t o q u e b u sca a

hom ogeinização da ação e da concepção do m odo de adoecer e de cuidar.

A polít ica de desospit alização na década de 70 ( o Hospit al do Juquery, por exem plo, alcançou a assust adora cifra de 14000 pacient es) t ransferiu os pacient es, deposit ados sob os cuidados do Est ado, d e u m e st a b e l e ci m e n t o a o u t r o s se m a l t e r a r a qualidade do cuidado nem o dir eit o ao asilam ent o( 7)

com a f in alid ad e d e r acion alizar o u so d e leit os e st a d u a i s p ú b l i co s e g e r e n ci a r u m a e st r u t u r a gigant esca, inadm inist r áv el.

A co n d i çã o d e t r a b a l h o n o s h o sp i t a i s psiquiát ricos era desoladora. Grande hospit al fechado ( público ou pr iv ado) dist ant e do cent r o ur bano, ou sediado em hospit al escola, apr ox im av a a ação de enfer m agem da pr át ica car cer ár ia. Tal ident ificação incluía, de for m a ger al, a est r ut ur a física opr essiva

do m anicôm io, o odor, a cor, o isolam ent o.

A seleção do agente de enferm agem de nível m édio pr iv ilegiav a o por t e físico av ant aj ado e er a usual o deslocam ent o de agent e de serviço auxiliar com o lim peza, lavanderia, cozinha, m anutenção, para com por o quadro de pessoal de enferm agem . O acesso ao serviço de enferm agem indicava prom oção, porém , d e m o n st r a v a t a m b é m o d e sco m p r o m i sso d a inst it uição com a capacit ação da for ça de t r abalho em saú d e e co m a q u al i d ad e d a ação d e saú d e oferecida para essa população, um a vez que o novo agent e não t inha acesso a qualquer form ação.

Nu m ser v i ço so b essa o r g an i zação , a( o ) enferm eira( o) recolhia sua habilidade e conhecim ento ao fazer adm inist rat ivo e burocrát ico, num infindável fazer e refazer de escala de t rabalho ( do profissional de nível m édio) , conferência de roupa ( de pacient e, de cam a, de banho) , de pert ences ( de pacient e, da enferm aria, do hospit al) , afast am ent o sist em át ico do cuidado do pacient e e cont role sist em át ico do fazer alheio ( visita m édica, vigilância de fam iliar, do auxiliar, out ro profissional)( 8).

No dur o r egim e asilar - hospit alar da década d e 8 0 , a a d m i ssã o p a r a t r a b a l h a r n o h o sp i t a l psiquiát r ico er a associada a cast igo, um lugar par a onde poucos profissionais iam de livre escolha e para on d e o f u n cion ár io- p r ob lem a er a t r an sf er id o ( n o serviço público) . O sentido da adm issão para o quadro de funcionários tinha a m esm a conotação da adm issão de um pacient e: absolut a falt a de livre escolha.

Até o início da década de 90, qualquer direito de escolh a er a n egado ao pacien t e, qu e in clu ía a im possibilidade de escolher : o lugar para se t rat ar, por que não hav ia ofer t a subst it ut iv a ao hospit al; o pr of ission al r espon sáv el pelo seu cu idado, por qu e essa responsabilidade era prerrogativa m édica, desde a adm issão à alt a hospit alar ; co- r esponsabilizar - se p el o seu t r a t a m en t o , p o r q u e l h e er a m n eg a d a s i n f o r m a çõ es so b r e m a n ej o d e m ed i ca m en t o , d o t r at am ent o clínico ( insulinot er apia, choque elét r ico sem anest esia, choque com car diasol, ent r e out r as t erapias biológicas) consent ido por parent es e depois co m p a r t i l h a d a s co m o p a ci e n t e co m o a ú n i ca alt ernat iva disponível o que, diant e do veredict o da autoridade m édica, nada m ais exigia de explicação( 8).

(4)

Agentes de saúde e pacientes aguardavam a conduta m édica, subm et idos à aut oridade do saber cient ífico, const ruído e aut orizado pelo prot ocolo de pesquisa, nem sem pre com partilhado com a pessoa sem crít ica

a quem iria “ aj udar”.

A ação d e en f er m ag em ( p r ev alen t em en t e pr esidida por agent e de nív el super ior e ex ecut ada por agent e de nível m édio) dependia do diagnóst ico

e da ordem m édica e constava de: a) cuidado com a a l i m e n t a çã o ( m o n i t o r a r o p e so , h i d r a t a çã o e acom panhar a alim ent ação realizada com colher para evit ar que o t alher se t ransform asse em inst rum ent o de ataque) ; b) cuidado com o sono ( vigilância noturna, adm inist r ação de m edicam ent os e est r at égias par a evitar o sono durante o dia) ; c) cuidados com a higiene ( v ig ilân cia n os b an h os colet iv os, t r oca d e r ou p a hospitalar, conferência e controle de pertences de uso i n d i v i d u a l p a r a p a ci en t e a u t o r i za d o p a r a p o r t a r o b j et o s) ; d ) v i g i l ân ci a co m at i t u d es ag r essi v as, su i ci d a s, m a n i p u l a t i v a s, d e p r e ssi v a s, a n si o sa s, so ci o p a t a s, p si co p a t a s, d esv i a d a s se x u a l m e n t e , am or ais; e) encam inham ent o dos pacient es par a o pátio, algum as horas sem anais( 8). Num lugar com tais

características, o paciente era o depósito de patologias a se r o b se r v a d o , d i a g n o st i ca d o , co n t r o l a d o , docum ent ado e post er ior m ent e ofer ecido ao saber m édico para ser curado.

A b ase t eór ica p ar a su st en t ar a ação d e e n f e r m a g e m , co n st r u íd a so b a i n f l u ê n ci a d a e n f e r m a g e m n o r t e - a m e r i ca n a e t r a n sm i t i d a hegem onicam ent e pelas escolas, faculdades e cursos de nível m édio, privilegiava o papel t erapêut ico e de ag en t e d e m u d an ça d a( o) p r of ission al, a at it u d e t er apêut ica, t écnicas de com unicação t er apêut ica e relacionam ent o t erapêut ico int erpessoal apoiadas na t eor ia da cr ise, noção de psicopat ologia de r ecor t e fenom enológico e influência hum anista do cuidado ao ser h u m an o. O par adox o en t r e o en sin o e a ação

ev idenciav a- se quando a ação de en f er m agem não alvej ava o paciente ou sua fam ília, m as a m anutenção do “ am bient e t erapêut ico”, para ser um ver dadeir o palco de int er venções m édico- cent r adas.

I sso se t r a d u zi a n a p r o m o çã o d o silen ciam en t o d os sin t om as ex u b er an t es ( d elír io, h i p o m a n i a , i n q u i e t a çã o p si co m o t o r a , a g i t a çã o psicom ot or a, cr ise de aut o ou het er oagr essiv idade, t e n t a t i v a d e su i cíd i o o u d e f u g a , t e n t a t i v a d e com unicação com o m undo exterior) , ou dos sintom as silenciosos ( depressivo grave, idoso senil errante pela e n f e r m a r i a , a n o r é t i co o u b u l ím i co , o b se ssi v o e

com p u lsiv o r en it en t e) e a a çã o d e e n f e r m a g e m , sem p r e sob o con t r ole d a con d u t a m éd ica, incluía solicit ar a avaliação m édica, adm inist rar a m edicação p r escr it a, con t er m ecan icam en t e, se n ecessár io, m anter o paciente sob vigilância e suspender direitos, com o ir ao pát io, sair aos finais de sem ana, da alt a m édica( 8).

A ação de enfer m agem psiquiát r ica ( e das dem ais prát icas sociais em saúde) , em que pesasse a disponibilidade pessoal ou o agenciam ent o afet ivo int r a- equipe ( r elação de am izade, r espeit o pessoal ou profissional) , est ava inst it ucionalm ent e subm et ida ao saber e ao poder m édico. Assim , a realização de at iv idade gr upal, at endim ent o indiv idual, at iv idade ext erna, acom panham ent o fam iliar, t oda e qualquer int er v enção pr ofissional não m édica er a r egulada e r eg u lam en t ad a p elo co r p o cl ín i co m é d i co. Dessa form a, a habilidade e o conhecim ento teórico e prático do m anej o da doença e sua sintom atologia ensinados à en f er m ei r a( o ) , d u r an t e a f o r m ação acad êm i ca ( transm itido ao profissional de nível m édio e m antido sob sev er a super v isão) , er am dispensáv eis.

Essa dinâm ica alim ent ava o exercício de um poder perverso da enferm agem , obt ido por m eio de m e ca n i sm o s d e p r e v a l e ci m e n t o o u co a çã o d o s pacient es, sem pr e sob o cont r ole de quem t in h a a chave, o j argão utilizado para discrim inar quem podia sair e quem est av a pr eso na inst it uição. Por out r o lado, a ch av e e o acúm ulo de ação não específica pr ov ocav a, no agent e de nív el super ior e de nív el m édio de enferm agem , t am bém , a ilusão e o desej o d a au t on om ia ad m in ist r at iv a, d a m an u t en ção d a or dem inst it ucional necessár ia par a o ex er cício de um out r o poder, um poder dissociado do saber e do f a zer esp ecíf i co d e en f er m a g em p si q u i á t r i ca: u m p o d e r g e r e n ci a l , a d m i n i st r a t i v o , n o r m a t i v o e disciplinar, subm et ido ao poder da inst it uição m édica e das idiossincrasias próprias das inst it uições t ot ais. Est e t rabalho apóia- se num a perspect iva de teorização sobre o poder e o saber e a incidência de u m sobr e o ou t r o( 9 ). Segu n do o au t or, a t r adição

hum anist a est á equivocada quando supõe que quem a t i n g e o p o d e r d e i x a o sa b e r p o r q u e o p o d e r “ enlouquece, os que governam são cegos”. Pode- se su p o r q u e o e x e r cíci o co n t ín u o d e u m p o d e r secundar izado e subalt er nizado da enfer m agem na inst it uição asilar m édico- cent rada pode t er favorecido a construção de um a ação e um saber secundarizado e subalt er nizado. Assim , de um lado, o sab er e o

(5)

est av am or ganicam ent e associados ao ex er cício do

saber e do poder m édico, a ele subm et ido e por ele r egulado. E, por out r o lado, est av am associados a ações coer cit iv as e desconect adas da f u n ção social d e p r o d u z i r a ç ã o d e s a ú d e, m a s a ç ã o d e su bor din ação, depen dên cia e v iolên cia.

Ne sse se n t i d o , a a çã o d a e n f e r m a g e m psiquiát rica do século XX era coerent e com a origem do processo de inst it uição da assist ência psiquiát rica, iniciada na virada do século XVI I I . Trat ava- se de um poder legítim o e legitim ado pela ordem positiva, onde a in st it u ição t r azia ader ido int r insecam ent e na sua f u n çã o o c o n t r o l e / e x c l u s ã o s o c i a l, a o r d e m i n st i t u ci o n al , r aci o n al i zação d e t em p o e esp aço , obj etivação e otim ização de recursos e econom ia e a base de sua operacionalização, a disciplina( 9).

Ainda para esse autor( 9), disciplina é “ análise

do espaço” e a ciência do exercício do poder, operada por m eio da indiv idualização e inser ção dos cor pos num espaço classificatório e com binatório, é o controle sobre o desenvolvim ent o de um a ação, não de seu resultado, im plica na vigilância “ perpétua e constante dos indivíduos”, subm et endo- os a um a “ pirâm ide de olhares” e num sist em a de regist ro cont ínuo.

Nenhum a out ra prát ica profissional, com o a enfer m agem , exer ceu de for m a m ais or gânica esse poder. Desde o relatório de enferm agem , diário e por t ur nos no dia, ao r elat ór io de ocor r ências, nenhum pr ofission al se en car r egou de for m a m ais n ít ida e abnegada do cont role do cot idiano inst it ucional. I sso porque, via de regra, a função dos relat órios sem pre est eve associada ao cont role do am bient e, que fosse t e r a p ê u t i co , à s i n f o r m a çõ e s so b r e o s p a ci e n t e s oferecidas ao m édico, com o subsídios para avaliação e con d u t a, p ar a in d icar en cam in h am en t o p ar a o pr of ission al da psicologia, t er apia ocu pacion al, ou serviço social, prom over, ou suspender, direitos, com o licença sem anal, pát io, alt a et c( 8).

Guar diã da or dem int er na da inst it uição, a e n f e r m a g e m , cu j a a çã o e r a p r e v a l e n t e m e n t e pr esidida por agent e de nív el super ior e ex ecut ada por agent e de nível m édio, perm anecia am bivalent e

en t r e a su b al t er n i d ad e e m i cr o p o d er es, en t r e a e x a u st ã o d a s d i v e r sa s r e sp o n sa b i l i d a d e s n ã o específicas e o prazer de legislar sobre com o, o que e quem podia realizar at ividade no t errit ório sob seu dom ínio. A par t ir dos m ecanism os disciplinar es, foi possível a const it uição de um a psiquiat ria disciplinar, cient ífica e m oral e de um a enferm agem disciplinar, cient ífica e com port am ent al, paradigm a de form ação e prát ica no Brasil.

Tal conj unt ur a foi par cialm ent e m odificada nos últim os dez anos, em função das políticas públicas d e saú d e m en t al, f or j ad as p el a or g an i zação d os trabalhadores, usuários, fam iliares, organizações não-governam ent ais e das iniciat ivas im plem ent adas sob a form a de diret rizes, norm as, port arias e leis pelo Ministério da Saúde. São instrum entos legislativos que coibem e punem tais ações e instituem novas ofertas de ser v iços.

É o caso da Port aria SNAS nº 189, de 19 de n o v e m b r o d e 1 9 9 1 *, a n t e r i o r à 2 ª Co n f e r ê n ci a Nacional de Saúde Ment al realizada em Brasília, em 1 9 9 2 , p u b l i ca d a n o co n t ex t o d a d i scu ssã o p a r a r eor ient ação da assist ência à saúde m ent al par a a Am ér ica Lat ina, pr esidida pela Or ganização Mundial da Saúde, e que result ou na Declaração de Caracas, d e 1 9 9 1 , al i an d o co n sci ên ci a cr ít i ca d o s g r u p o s or g an izad os ( t r ab alh ad or es, u su ár ios, f am iliar es) para a rupt ura de um m odelo assist encial excludent e e segr egat ór io com a per spect iv a de r acionalização d e cu st ei o e f i n an ci am en t o d as açõ es d e saú d e m ent al.

Com a incor por ação de ação de saú de n ão h o s p i t a l a r a o cu st e i o d a r e d e d e cu i d a d o s, d e se n ca d e o u - se u m p r o ce sso co m p l e m e n t a r d e regulam entação das ações hospitalares, regulado pela Por t ar ia n º 2 2 4 , d e 2 9 d e j an eir o d e 1 9 9 2 , q u e est abeleceu diret rizes e norm as para os serviços de saúde no país( 10)* * . Out ro consenso ent re os grupos

or ganizados do Mov im ent o da Refor m a Psiquiát r ica brasileira é que a 2ª Conferência Nacional de Saúde Ment al, foi o m om ent o da v ir ada da or ient ação do m odelo assist encial hospit alar hegem ônico por força

* “ Alt era( va) o financiam ent o das ações e serviços de saúde m ent al. Polít ica pública se faz conhecer quando se define o seu financiam ent o. Essa Port aria evidenciou que o nível cent ral do SUS, enquant o principal financiador do sist em a público, oferecia para os dem ais gest ores a possibilidade de im plant ar, no cam po da at enção à saúde m ent al, ações e serviços m ais cont em porâneos à incorporação de conhecim ent os e de valores ét icos, subst it uindo o m odelo t radicional: ela aprova os procedim ent os NAPS/ CAPS, oficinas t erapêut icas e at endim ent o grupal e sinaliza que seguirá out ra norm a adm inist rat iva regulam ent ando t odo o subsist em a, considerado claram ent e inadequado”(10)

(6)

d a m o b i l i zação d a so ci ed ad e ci v i l o r g an i zad a e, particularm ente, pelo fato inaugural da forte presença de usuários e fam iliares discutindo o rum o e o proj eto de saúde m ent al para o país.

De 1992 para os dias atuais, a oferta de ação de saúde subst it ut iva à ação asilar em saúde m ent al vem desenhando um a curva ascendente. Na dim ensão e s t r u t u r a l, a si t u a çã o é f a v o r á v e l à Re f o r m a Psiquiátrica por força Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001( 10)* . E, ainda dos procedim ent os reguladores e

de avaliação do parque hospit alar, com o da Port aria/ GM nº 251, de 31 de j aneiro de 2002* * .

Segundo dados do Minist ér io da Saúde de 2004, exist em m ais de 57 m il leit os psiquiát ricos no Br a si l . Essa si t u a çã o i n d i ca q u e a g e n t e s d e en f er m ag em ( e d em ais cam p os d e sab er ) p od em est ar subm et idos à organização do t rabalho asilar. A reorientação do m odelo assistencial em saúde m ental indicada no Relatório Final da 3ª Conferência de Saúde Mental encontra dificuldades de operacionalização nas t rês dim ensões da realidade obj et iva em função da m agnit ude do problem a.

At ualm ent e exist em m ecanism os de cont r ole social ( ação cidadã que avalia e int erfere na ofert a dos produtos de saúde m ental) das instituições asilares r e m a n e sce n t e s, co m o a Po r t a r i a n º 2 5 1 e o s Con selh os de Saú de. En t r et an t o, com r elação aos serviços subst it ut ivos, regulam ent ados pela Port aria/ GM nº 336, de 19 de fev er eir o de 2002( 10)* * * , os

t r abalhos escr it os por gest or es de ser viços indicam que n a r ede pú blica de assist ên cia à saú de m en t al

du as con dições n ão m u dam * * * * : a) n a d im en são sin gu lar encont r am - se o t r abalhador e o gest or de serviço buscando alternativa para as ações de saúde, a int er locução m ais ar ej ada, ar r iscando um pr oj et o assist encial que possa fazer m ais sent ido par a sua

vida e a do usuário e b) condição de trabalho precária, m orosidade no financiam ent o das ações subst it ut ivas em saúde m ental, salário aviltante e o im enso esforço de convencim ento para a concretização de um proj eto de saúde m ent al cidadão.

A AÇÃO D A EN FERM AGEM N O CAM PO

PSI COSSOCI AL

A or ganização do ser v iço e a est r ut ur ação d a r ed e d e cu i d a d o s, m a n ej a d a p el a eq u i p e a o concret izar o proj et o assist encial é m ediada por um conj unt o de sab er es e um a “ específica m odalidade d e co n h e ci m e n t o , d e n o m i n a d a sa b e r o p e r a n t e , técnico ou tecnológico”( 11) que, para constituir- se com o cam po psicossocial, agrega o saber não cient ífico ( do at or social com unit ár io, dos r ecur sos do t er r it ór io, ent re out ros) e do usuário ( indivíduo e fam iliar) .

O cam po psicossocial é o lugar onde a ação de saúde é produzida. Quem a produz é um suj eit o, t am bém socialm ent e const it uído, o que t r aduz, no lim it e da int er ação, o saber e o poder ader ent e ao seu lugar social. Dessa form a, as prát icas concret as representam ou reproduzem dada ideologia e o lócus

onde cooperam ou rivalizam é a equipe de t rabalho. Essa é a dim ensão singular do t rabalho em saúde.

A d i m en sã o si n g u l a r t r a t a , p o r t a n t o , d a organização do serviço (com o) , do m odelo de atenção em saúde m ent al oper ado inst it ucionalm ent e (p ar a que) e da capacidade do serviço produzir saúde (para quem) que se relaciona com o nível de satisfação de cl i e n t e l a e t r a b a l h a d o r e s, r e so l u t i v i d a d e , previsibilidade de ações, disponibilidade e capacidade de absorção de dem anda espont ânea, ou produzida, nas ações int erinst it ucionais.

* Lei nº 10.216, de 06 de abril de 2001. “ Esse texto aprovado em últim a instância no Plenário da Câm ara Federal, reflete o consenso possível sobre um a lei nacional para a reform a psiquiát rica no Brasil. Tem com o base o Proj et o original do Deput ado Paulo Delgado e versão final modificada do Subst it ut ivo do Senador Sebastião Rocha. I nclui proposições contidas em substitutivos anteriores favoráveis ao proj eto original ( dos senadores Beni Veras e Lúcio Alcântara) , ou cont rários a ele ( do senador Lucídio Port ella) . A lei direciona o m odelo da assist ência psiquiát rica, regulam ent a cuidado especial com a client ela int ernada por longos anos e prevê possibilidade de punição para a int ernação involunt ária arbit rária e/ ou desnecessária”

* * “ est abelece diret rizes e norm as para a assist ência hospit alar em psiquiat ria, reclassifica os hospit ais psiquiát ricos, define a est rut ura, a port a de ent rada para as int ernações psiquiát ricas na rede do SUS e dá out ras providências [ ...] , ( e) ret om a o processo de avaliação e supervisão da rede hospit alar especializada de psiquiat ria, assim com o hospit ais gerais com enferm arias ou leit os psiquiát ricos, est abelecendo crit érios de classificação, conform e port e do est abelecim ent o e cum prim ent o dos requisit os qualit at ivos de avaliação fixados pela área t écnica de saúde m ent al do Minist ério da Saúde quant o ao processo t erapêut ico e ANVI SA para análise da área de vigilância sanit ária. Ao est abelecer classificação baseada no port e do hospit al e na qualidade do at endim ent o prest ado, a Port aria t em o obj et ivo de reest rut urar t odo o sist em a hospit alar psiquiát rico, buscando nove configuração form ada por hospit ais de pequeno ( at é 80 leit os) e m édio ( at é 160 leit os) , com subst it uição progressiva dos m acro- hospit ais” ( 10)

(7)

Esse s e l e m e n t o s sã o a b a se p a r a o funcionam ent o da em presa - o cam po psicossocial( 12)

- que vai gerar produtos de saúde m ental. A finalidade

( para que) dessa em presa é responder à necessidade de saú de m en t al de um a det er m inada população e g e r a r p r o d u t o s d e sa ú d e m e n t a l ( p r e v e n çã o , pr om oção, r eabilit ação, r edução de dano, pr ot eção, o q u e f o r ) p a r a e ssa p o p u l a çã o d e t e r m i n a d a , op er an d o m acr o ( n o caso d a saú d e colet iv a) ou m icrom odelos assist enciais ( no caso dos serviços) .

Essa em pr esa dev e pr oduzir saúde m ent al sem escassez ou desper dício ( sem pr e hav er á um a m ar gem de t oler ância) . Por t ant o, ela pr ecisa saber

p a r a q u e m el a est á g er an d o p r o d u t o s d e saú d e m ent al. Assim , delim it a o obj et o de t r abalho - u m a

população det er m inada - de um det erm inado espaço geográfico. Esse espaço geográfico agrega as pessoas e suas hist ór ias, as r elações sociais, or ganizações se t o r i a i s e so ci a i s, a g r e m i a t i v a s, co r p o r a t i v a s, a n t a g o n i sm o s e p o l a r i za çõ e s, p r o sp e r i d a d e s e m isér ias e, por isso, esse espaço geogr áf ico v em sendo denom inado t er r it ór io.

Definido para que ( finalidade do processo de t r abalho) e p ar a q u em ( obj et o de t r abalho) , r est a definir com o gerar produtos de saúde ( os instrum entos de int ervenção) . Para responder ao proj et o com plexo o s i n st r u m e n t o s d e i n t e r v e n çã o (c o m o) d e v e m a d a p t a r - se à d i n a m i ci d a d e e f l e x i b i l i d a d e d a s necessidades de saúde. Nesse sent ido, a organização

d o t r a b a l h o d ev e ser o p r in cip al i n st r u m e n t o d e ger ação de pr odu t os de saú de, a par t ir do qual os ag en t es p ossam ex p er im en t ar n ov as t ecn olog ias, t est á- las e produzi- las, dispensá- las ou recuperá- las. Segundo t al per spect iv a, esse in st r u m en t o, que const ela o proj et o de int ervenção, deve: rom per com a organização m édica do serviço, ser planej ado por t oda a equipe, respeit ar um a paut a ou agenda, de preferência pequena, clara e obj et iva, realizar- se por m eio da divisão não burocrática do trabalho entre t odos os m em bros da equipe, m odificar- se conform e a condução do caso e dos r esult ados obt idos, cuj o parâm etro de avaliação é se a intervenção está sendo út il ou prej udicial ao usuário( 12).

Ain da, segu n do os au t or es, “ qu alqu er qu e sej a a t écnica específica de int ervenção eleit a, t odo

t rabalhador da equipe ( quem - força de t rabalho), na

su a or g an ização, t e m d e g a r a n t i r co n t i n u a m e n t e

algu m as at it u des básicas em r elação à com unidade

( at it ude de par t icipação) , em r elação aos m em br os

da equipe ( atitude de integração interna e externa) e em r elação ao pacient e ( at it ude solidár ia e afet iva, psicot erapêut ica, reabilit at ória e farm acológica) ”( 12).

Assim , no cam po psicossocial, a equipe de

saú d e - ag en t e d e saú d e com f or m ação d e n ív el m édio inclusive - ( quem - a força de t rabalho), deve

desenvolver ao m enos duas habilidades com o agent e

g e r a d o r d e p r o d u t o s d e s a ú d e: a ) a t e n d e r a

população, sustentando o vínculo do cuidado em si, e b) sustentar o vínculo que a clientela estabelece com o serviço, produzindo colet ivam ent e a ação de saúde

n o â m b i t o d a co ex i st ên ci a so ci a l ( d em a n d a s d e ordem j urídica, de sociabilidade e agrem iação, lazer, habit ar e coabit ar espaços privados ou públicos) .

CONSI DERAÇÕES FI NAI S

A n ov a or ien t ação d o m od elo assist en cial v em im pondo a im plant ação gr adat iv a e cr escent e d e u m a r ed e d e cu id ad os cu j a or g an ização ex ig e com plexa est rut ura de serviço com unit ário art iculado a recursos t errit oriais, cult urais, sociais; enferm aria d e sa ú d e m e n t a l e m h o sp i t a l g e r a l ; r e si d ê n ci a t er ap êu t ica e coop er at iv a social. Nesse con t ex t o, encont r a- se a t ar efa r adical da const r ução de um a

n o v a a çã o d e sa ú d e , co m p l e x i f i ca n d o o t i p o d e

r esp o st a e o t i p o d e o f er t a d e p r o d u t o d e saú d e

m en t al, on de o agen t e de saú de m en t al de n ív el superior e m édio é desafiado a disponibilizar o saber

t écnico( 11), adquirido na form ação profissional e um a dada habilidade superior( 13) no trato com a diversidade e i m p r e v i si b i l i d a d e . Tr a t a - se d e r u p t u r a paradigm át ica, conceit ual e ét ica.

Na saúde m ent al, na per spect iv a da saúde colet iv a, con st r u ir a t r an sfor m ação de con t eú d o e

prát ica im plica adm itir que o fluxo de produção desse

cont eúdo e dessa pr át ica est á subor dinado à v isão d e m u n d o q u e co n si d e r a t a m b é m o f l u x o d e t r a n sf o r m a çã o d a p r ó p r i a r ea l i d a d e. É i sso q u e sust ent a a const rução de um proj et o de ensino e de cuidado construído a partir da necessidade de saúde( 3-4).

Essa perspect iva de const rução de cont eúdo

e prát ica antagoniza com a visão de m undo do cam po m édico- psiqu iát r ico qu e bu sca a r eg u l ar i d ad e d as

ações e d os p r ocessos d e cu id ar e r iv aliza com a concepção de um sab er ( t écn ico) que ex clui out r o

(8)

p o si çã o d e so l i d a r i e d a d e e n ã o d e co m p e t i çã o / exclusão, busca a necessidade( 3- 4) que desencadeia o

pr ocesso de t r abalho em saúde. A necessidade com o

for ça pr opu lsor a de agen ciam en t o de respost a para o problem a real, num a realidade concret a, vai ent ão engendr ar for m as m últ iplas de r espost as, inv ent ar solução inesper ada, insuspeit a, conv ocando t odo o pot encial do at or em cena para viabilizá- la( 13).

Dessa f or m a, n o ca m p o p si co sso ci a l, q u e pr essu põe ação in t egr ada da equ ipe, o agen t e de saúde m ent al de for m ação super ior ou m édia não co m p e t e , co m p õ e ; n ã o r i v a l i za , so l i d a r i za ; n ã o con t r ola, acolh e; n ão pr om ov e su bm issão, m as a cooperação; não se subm ete ou estabelece hierarquia, m as reflexão e co- labor ação* na geração de produt o de saúde, por que cr ê que o usuár io de ser v iço de saúde m ent al, t al qual a população em ger al, t em

n e c e s s i d a d e p r o d u zi d a e i m p o st a p e l o p r ó p r i o d e se n v o l v i m e n t o d a s f o r ça s p r o d u t i v a s co m o : necessidade de ganhar dinheir o, v iv er dignam ent e, t er acesso a bens de consum o, t er um a vida afet iva e am orosa est ável e t rat am ent o no seu sent ido m ais estrito, clínico( 14- 15).

O c a m p o p s i c o s s o c i a l * * t e m co m o pr essupost o, par a o pr odut or de ação de saúde: o plan ej am en t o do m odelo assist en cial colet iv izado, produzido no espaço m ult iprofissional com qualidade i n t e r d i sci p l i n a r, a su p e r a çã o d a r i g i d e z d a especificidade profissional e flexibilidade para ger ar o p r o d u t o d e s a ú d e m e n t a l co m p a t ív e l co m a

n ecessi d a d e d o co n su m i d o r d e p r o d u t o d e sa ú d e

m ent al. Essa posição é coerent e com a base t eórica para a reorientação do m odelo de atenção que afirm a a concepção de saúde com o pr ocesso e não com o ausência de doença, na perspect iva de produção de qualidade de vida, enfat izando ações int egrais e de p r o m o çã o d e sa ú d e . No c a m p o d o e n si n o e d a pesquisa t rat a- se de consolidar a aquisição t eórica j á acum ulada, fundam ent ada na perspect iva crít ica da ciência, com a cont r ibuição dos conceit os da saúde colet iva( 1,16).

So b e ssa v i sã o d e m u n d o , a r e a l i d a d e o b j et i v a n ã o é l i n ea r, n ã o r eso l v e u m p r o cesso histórico prim eiro para depois iniciar outro. Diferentes

m om en t os h ist ór icos apr esen t am - se sob o m esm o

recort e t em poral, o que explica os diversos níveis de t r a n sf o r m a çã o n u m ú n i co r e co r t e d a r e a l i d a d e obj etiva, com o é o m om ent o hist órico da saúde m ental n o Br a si l : co n v i v e - se co m n ív e i s d i st i n t o s d e t r a n sf o r m a çã o i n st i t u ci o n a l e co n ce i t u a l , so b a regência das t rês dim ensões da realidade obj et iva.

Assim , é possível depreender ao m enos t rês g r a n d es co n t r a d i çõ es a ser em en f r en t a d a s p el a Re f o r m a Psi q u i á t r i ca * * * : a ) a a ç ã o d e s a ú d e

pr oduzida nas inst it uições asilar es r em anescent es; b ) a a ç ã o d e s a ú d e p r o d u zi d a n o p r o ce sso d e desospit alização que pode est ar encam pan do u m a iniciat iv a higiênica e c) a ação de saú de pr oduzida n o s se r v i ço s su b st i t u t i v o s q u e p o d e m e st a r reproduzindo a lógica de dom inação, sob a form a de r elações m ais dem ocr át icas sob o m esm o pr incípio das relações de dependência.

* Segundo entendim ento do educador Paulo Freire

* * Para Cam pos, no t rabalho em saúde: “ a inst it ucionalização dos saberes e sua organização em prát icas se daria m ediant e a conform ação de núcleos e de cam pos. Núcleo com o um a aglut inação de conhecim ent os em um saber e com o a conform ação de um det erm inado padrão concret o de com prom isso com a produção de valores de uso. O núcleo dem arcaria a ident idade de um a área de saber e de prát ica profissional; e o cam po, um espaço de lim it es im precisos onde cada disciplina ou profissão buscaria em out ras apoio para cum prir suas t arefas t eóricas e prát icas”. Segundo o aut or, a const rução difere da elaboração de Bourdieu porque m odifica “ o sent ido polar e ant agônico” at ribuído pelo sociólogo francês aos t erm os “ cam po e corpus”. Cam pos GWS. Saúde pública e saúde coletiva: cam po e núcleo de saberes e práticas. Departam ento de Medicina Preventiva e Social da Faculdade de Ciências Médicas da UNI CAMP. s/ d. Out ra form a de conceit uar os lim it es dessa polaridade pode ser at ribuída aos conceit os de prát ica social em saúde e especificidade profissional, em Aranha e Silva AL, Fonseca RMGS. Repensando o trabalho em saúde m ental: a questão da interdisciplinaridade. Rev. Bras. Enf. v. 48, n. 3, p. 212- 17, 1995. E t am bém com os conceit os m arxianos de t ot alidade t ot al e t ot alidade parcial, em Paro VH. Adm inist ração escolar: int rodução crít ica. 3 ed. São Paulo: Cort ez Editora, 1988

* * * A Reform a Psiquiát rica é produção colet iva, não se resolve na ação isolada de qualquer um dos at ores porque o agent e de saúde de nível m édio, ou superior, t am bém é suj eit o em t ransform ação, por força do próprio m ovim ent o da hist ória. Sem essa crença, seria im possível sustent ar os pressupost os da Reform a Psiquiát rica

REFERÊNCI AS BI BLI OGRÁFI CAS

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Referências

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