• Nenhum resultado encontrado

Segmentação de mercados da assistência à saúde no Brasil.

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Segmentação de mercados da assistência à saúde no Brasil."

Copied!
14
0
0

Texto

(1)

Segmentação de mercados

da assistência à saúde no Brasil

Market shares in the Brazilian health sector

1 Escola Nacional de Saúde Pública.

Departamento de Ciências Sociais. Fiocruz. Rua Leopoldo Bulhões 1480, 9o andar, Manguinhos, 21041-210, Rio de Janeiro RJ. farias@ensp.fiocruz.br Luís Otávio Farias1 Clarice Melamed1

Abstract T he cu rren t paper presen ts in its first part a theoretical fram ework for an a-lyzing the m ain m arket failures in the health sect or followed by a gen eral evalu at ion of the private health sector in OCDE countries and a com parative approach to the Brazil-ian case. In the second part, there is a brief h ist orical of t h e privat e h ealt h sect or in Brazil sin ce the seven ties an d also som e in-ferences are drawn from Pnad – IBGE data t h at allow a pict u re of privat e in su ran ce consum ers.

Key wo rds Privat e in su ran ce plan s, Su p-plem en tal health, M arket failu res, H ealth supply and dem and

Resum o O artigo analisa a dim ensão e seg-m entação do seg-m ercado supletivo de assistên-cia à saú de n o Brasil e o perfil dos seu s se-gurados. N a prim eira parte, destaca alguns elem en t os con ceit u ais n ecessários à com -preensão das características do m ercado em saú de. A n alisa brevem en te a dim en são e o papel do set or privado de saú de em países m em bros da Organização para Cooperação e Desen volvim en t o Econ ôm ico ( OCDE) e com para com caso brasileiro. Em segu ida, realiza u m breve histórico do setor su pleti-vo de saú de n o Brasil e, por fim , apresen ta u m a an álise do perfil dos segu rados, ten do por base os m icrodados da Pesqu isa N acio-n al de A m ost ra por Dom icílio de 1998 ( Pnad/ IBGE).

(2)

Introdução

O presen te artigo foi escrito com o objetivo de analisar a dim ensão de m ercado supletivo de assistência à saúde no Brasil e o perfil dos seus segurados, destacando alguns elementos con ceituais n ecessários à com preen são das características do m ercado, em sentido lato, quando se trata da produção de bens e servi-ços relacionados à saúde.

Os principais conceitos são apresentados em paralelo a um pequen o levan tam en to de como coexistem o setor público e privado em saúde hoje entre os países-membros da Orga-nização para Cooperação e Desenvolvimento Econôm ico (OCDE) – e alguns outros países não pertencentes a organização. Construímos um quadro básico de referências a partir dos modelos em vigor para, então, analisar a evo-lução recente da segmentação desse mercado no caso brasileiro dos anos 90.

Os dados do suplem en to especial da Pnad-98 foram utilizados para caracterizar a dim ensão e o perfil dos beneficiários de pla-nos privados de saúde no Brasil. Por m eio de an álise estatística exploratória pode-se res-pon der que fun ção o setor privado de saúde tem cumprido no país, seja na perspectiva de complementação das atividades desempenha-das pelo SUS, seja dirigido à especialização de clien telas próprias. A an álise dos dados per -m ite, ta-m bé-m , qualificar os segurados do setor supletivo, propiciando uma melhor com -preensão dos elementos que asseguram a for-mação dessa clientela.

Características do setor saúde

Arrow (1963), em trabalho considerado clás-sico sobre o assunto, define que o objeto do es-tudo da saúde em term os m acroecon ôm icos está relacionado à indústria de cuidados m édicos; m ais precisam en te, referese ao com plexo de serviços cen trados n o m édico, gru -pos privados de aten ção à saúde, hospitais e saúde pública.

Apesar de a defin ição deixar claro qual o espaço de m ercado reservado ao setor saúde strito sensu, reabre o debate sobre sua especi-ficidade. Um a das prin cipais características do mercado de serviços de saúde é de que par -te dos ben s aí produ zidos são con siderados bens públicos e/ ou meritórios.

Defin e-se ben s públicos com o aqueles

que, em geral, o Estado deve provê em função de su as extern alidades, verificadas sem pre qu e em presas ou pessoas im põem cu stos ou ben efícios a ou tros, sem qu e estes recebam qualquer in den ização ou efetuem o devido pagam en to e assim n ão há in teresse privado em fornecê-los. Já a definição de bens meritó-rios está associada a valores históricos, cultu-rais e políticos partilhados por determ inado grupo social ou até m esm o por um a nação, a partir dos quais coletivamente são estabeleci-dos fluxos de redistribuição de recursos entre diferentes estratos da sociedade. A história de estruturação dos estados de bem -estar social foi em gran de parte alicerçada com base n a necessidade de provisão, por parte dos governos, de serviços de educação, saúde, assistên -cia so-cial e outros, a maior parte deles, poden-do enquadrar-se na categoria de bens meritó-rios.

Além das dificuldades de operacionalizar o equilíbrio entre oferta e procura visando à in clusão un iversal da população, a alocação de recursos no setor saúde envolve escolhas e dificuldades específicas e m ais com plexas. A alocação n ão pode ser baseada som en te n o custo-efetividade, que focaliza a eficiên cia, mas ignora a eqüidade. A incerteza associada ao risco fin an ceiro poten cial, gerado pela ocorrên cia de doen ças graves, legitim a a de-manda por subsídios ou seguro público.

Seguros contra problem as de saúde apre-sentam características próprias relacionadas a várias form as de falhas de m ercado – m ar -ket failures– (Arrow, 1985). Entre elas, pode-se citar risco m oral (m oral hazard), ou seja, situações nas quais o seguro social ou privado atua com o um fundo de financiam ento cole-tivo ao consumo de serviços de saúde, estimu-lando o consumo dos que pagam menos e que teriam m enos acesso aos serviços, caso tives-sem de pagá-los a partir de sua própria renda. Em decorrência, in divídu os qu e participam com igual con tribuição n o fin an ciam en to usufruem de forma diferenciada dos serviços ofertados.

(3)

clientes. Fundam entalm ente encontra-se associado ao perigo de incorporar com o clien -tes in divídu os cu jos tratam en tos cu starão m ais do que em m édia a seguradora está dis-posta a financiar. Com o objetivo de protege-rem -se da com bin ação de plan os baratos e riscos potenciais altos, as seguradoras inves-tem n a seleção de risco: gastam m ais em ad-m inistração, criando barreiras à inscrição de indivíduos com potenciais problemas de saú-de ou idosos.

A seleção adversa e o risco moral emergem em um contexto em que consumidores e seguradoras possuem apenas inform ação incom -pleta, o que também acarreta falha de merca-do à m edida que é con dição n ecessária para com petição perfeita que com pradores e ven -dedores possuam informação completa. Uma dificuldade adicional corresponde à informa-ção assimétrica (asym m etry inform ation), is-to é, informação disponível somente a um dos lados do mercado. Por exemplo, consumido-res que conheçam seus riscos de saúde têm um incentivo para omiti-los das seguradoras para evitar mensalidades muito altas. As segurado-ras, em contraste, geralmente conhecem mais sobre riscos médios e custos da assistência do que os con sum idores; a ign orân cia dos con -sumidores nesses assuntos também pode con-duzir à ineficiência.

Em resumo, como conseqüência dessas fa-lhas de mercado, na ausência de regulação e existindo companhias seguradoras que atuam n a form a de terceiro pagador, aqueles com condições crônicas ou altos riscos de saúde se-rão su b-segurados. Além disso, os custos ad-m inistrativos serão m ais elevados do que os necessários devido aos esforços das segurado-ras de filtrar riscos e processar reclam ações pelas quais nem o provedor nem o consum i-dor estão dispostos a se respon sabilizar. É nesse sentido que o “m ercado não funciona” n a aten ção à saúde. Con tudo, essas falhas se detectam predominantemente no mercado de segu ros de saú de, e n ão n ecessariam en te n o mercado de saúde como um todo.

O debate sobre o papel dos setores público e privado na saúde se organiza teoricam ente em torno de com o e em que profundidade ocor rem as falhas de m ercado. Estas, com o uma noção econômica, se referem a possíveis desencontros ou desequilíbrios entre o que o m ercado oferta e o que con sum idores racio-nais bem informados possam demandar.

No entanto, a concepção teórica está

sujei-ta a exceções quando se trasujei-ta de situações de pobreza, definida, neste caso, pela existência de pessoas que não apresentam condições pa-ra pagar pelos mais simples serviços de saúde ou uma adequada parcela de seguro. Essas situações tornariam necessariamente mais am -plas as fun ções do Estado. A falta de con di-ções para acessar serviços médicos não é mui-to diferente de outros tipos de carência em re-lação às necessidades m ais básicas qu e pode ser tecn icam en te com pen sadas por m eio de tran sferên cias e subsídios em espécie ou su -plementação de renda. Mais uma vez – o caso da saúde é excepcional – o risco de um grupo populacional necessitar de tratamentos de al-to cusal-to pode al-tornar mais eficiente o subsídio ao seguro do que a transferência de renda, no caso da ausência de serviços públicos com co-bertura universal.

O papel do Estado

Entre as agências internacionais, há um certo consenso quanto a um papel genérico que o Estado deva desem pen har n a área da saú de. Aceita-se a idéia de que os govern os seriam responsáveis pela criação de instituições que financiem diretamente os serviços de saúde e a distribuição do risco. No entanto, a situação com bin ada em que o m ercado e o govern o atingem m aior eficiência varia em função da form a com o são fin an ciadas essas in stitu i-ções, assim como, em que circunstâncias se dá a provisão dos serviços. Situações extremadas são consideradas igualmente ineficientes, ou seja, a existência apenas de seguro privado ou a provisão pública exclusiva de serviços. Não há u m m odelo qu e com bin e as du as form as considerado ótimo.

De uma maneira geral, o mercado privado traz para o setor a questão da eficiên cia, en -quanto o governo seria responsável por um a distribu ição eqü itativa de ben s de saú de es-senciais. A forma de alocação de recursos está diretam ente relacionada à efetividade de sua aplicação. Se o sistem a é adm in istrado pelo govern o por m eio de prestadores públicos e/ou privados, o orçamento é transferido a re-giões ou program as de saúde específicos. No caso de serem utilizadas formas de seguro so-cial ou privado, os recursos são alocados por tipos de serviços correspon den tes a pacotes específicos de benefícios.

(4)

ativida-des básicas a serem desem pen hadas pelo Es-tado: (1) fin an ciar e prover publicam en te bens meritórios como educação para a saúde, im un ização, aten ção m atern o-in fan til; (2) subsidiar a aten ção prim ária e serviços hos-pitalares para os pobres; (3) estabelecer segu-ro nacional ou regional para o setor formal de trabalhadores e su as fam ílias; (4) regu lar as falhas do m ercado e m on itorar su a perfor -m an ce; (5) educar o público para que esteja informado sobre os serviços de saúde.

O

mix

público e privado

Em grande parte dos casos, é a form a com o o Estado está organizado para produzir os ser -viços de saúde que dá os contornos e a dimen-são do setor privado. Este ten de a em ergir quando ocorre uma percepção coletiva de que o sistem a público oferece serviços de baixa qualidade, não permite possibilidade de esco-lha do provedor ou por cobrir apenas alguns tipos de serviços. Em geral, o papel do seguro privado pode ser de três tipos:

1) cobertura de in divíduos que são in elegí-veis ao seguro público. Neste caso, o principal exemplo são os EUA on de apen as um a parte da população é elegível (idosos e pobres); 2) cobertura de in divíduos que optam por retirar-se do programa de seguro público uni-versal, por exemplo, a Alemanha;

3) cobertura suplementar de serviços coexis-tindo com um sistema público universal, por exemplo, Reino Unido e Brasil.

No caso dos países da OCDE, o espectro de com binações possíveis que trata do finan

-ciamento da saúde e tipos de prestadores apa-rece no quadro 1.

De form a geral, a adesão ao seguro priva-do n esse grupo de países, com exceção priva-dos EUA, cum pre a função de com plem entar o sistem a público de saúde, oscilando a cober -tura da população en tre 45% n a Austrália e 9% no Reino Unido (Chollet & Lewis, 1997). Seu formato varia de país a país, incluindo ser-viços especializados não cobertos pelo setor público, taxas extras de consultas e hospitali-zação que excedem o pagam en to efetuado através de credenciamento público, ou indiví-duos que optem por estar fora do sistema pú-blico, como é o caso da Alemanha.

O seguro privado de saúde raram ente é a principal fonte de financiamento dos serviços n o setor. Atua com o sistem a suplem en tar, crescen do em con seqüên cia da cobertura de segm en tos n ão in clu ídos pelo segu ro social ou pacote básico de benefícios. Em outros casos atu a adicion alm en te aos serviços fin an -ciados pelo sistema público existente. Nesses países, os plan os de seguro privado com fre-qüência excluem doenças crônicas ou as que exigem tratam entos prolon gados e custosos; apresentam baixo teto de benefícios (em ter -m os de nú-m ero de dias de hospitalização ou dispêndio total).

Entre os países m ais pobres, que não per -tencem à OCDE, o percentual m édio de ade-são da população ao seguro privado é m uito baixo, em torno de 15%. Chile (27%) e Brasil (25%) encontram-se acima da média (Chollet & Lewis, 1997).

Com o foi observado até aqu i, o Brasil apresenta uma posição peculiar no que se

re-Quadro 1

Características da provisão de serviços de saúde em países da OCDE

País Financiamento Prestador

Bélgica, França, Alemanha, Seguro social Mix

público/priva-do

Áustria, Japão, Luxemburgo

Holanda Mixseguro social/privado Privado

Irlanda, Espanha, Reino Unido, Dinamarca, Recursos fiscais Público Finlândia, Grécia, Islândia, Portugal, Noruega, Suécia

Canadá Recursos fiscais Privado

EUA, Suíça Seguro voluntário Privado

Itália Seguro social/recursos fiscais Público

Austrália, Nova Zelândia Recursos fiscais Mix público/priva-do

Turquia Não há fonte predominante Mix

público/priva-do

(5)

fere à oferta com binada de serviços públicos e privados em saúde. A partir de 1990, com a criação do Sistem a Único de Saúde (SUS) foi tornada oficial a proposta de cobertura públi-ca un iversal e in tegral. Paralelam en te, em processo iniciado na década anterior, o setor supletivo cresce tornando-se autônomo do fi-nanciamento estatal e atingindo uma fatia de m ercado bastante superior a que se constata, quer seja em países da OECD ou no grupo de países mais pobres.

No caso brasileiro, a em ergência do setor supletivo passa a cham ar aten ção a partir da prim eira m etade da década de 1980, em fun -ção da trajetória crescente de sua m agnitude e, no início da década atual parece ter encon -trado o ponto de estabilização, abarcando em sua clientela algo em torno de 1/4 da popula-ção brasileira. Nas seções que se seguem, após breve histórico, serão utilizados os dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio de 1998 (Pn ad) com o objetivo de produzir evidências a respeito da segmentação do setor no caso brasileiro, assim como explicar o sig-nificado de sua expansão mais recente.

O setor supletivo de assistência à saúde no Brasil: breve histórico

Desde a década de 1960, já era possível obser-var n o Brasil a form ação de em presas m édi-cas com característiédi-cas sim ilares às do atual setor supletivo de assistência à saúde. Porém, até o final da década de 1970, essas em presas possu íam u m a clien tela ain da pequ en a e m antinham alto grau de dependência em re-lação ao sistema público, estando fortemente integradas ao m odelo de assistência m édico-previdenciária então vigente. No 1o Congres-so Brasileiro de Medicina de Grupo, realizado em 1978, o centro dos debates foi o fortaleci-mento da parceria entre as empresas médicas e o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdên cia Social (In am ps). Algun s n ú -m eros apresen tados n aqu ele con gresso são bastan te ilustrativos; por exem plo: n aquele ano, dos 7,6 milhões de beneficiários das em-presas de m edicin a de grupo, 4,8 m ilhões (61%) eram oriundos de convênios-em presa intermediados pelo Inamps.

Esses con vên ios, com o descreve Teixeira (1989), eram est abelecidos em t rês in st it u ições: u m a em presa ou in dú st ria X , a Previ -dência Social e a em presa m édica. A em presa

m édica receberia da Previdên cia u m valor global pelo con vên io ( calcu lado com base n o n ú m ero de fu n cion ários da em presa X ) pas-sando inicialm ente a ser responsável integral pelo atendim ento m édico desse grupo de segu-rados. Em um a outra form a de organ ização desses convênios, o empregador contratava e pagava diretam en te um a em presa m édica, a qual ficava responsável pela assistência à saú-de saú-de seus funcionários e saú-depensaú-dentes, caben-do à Previdência o ressarcimento de uma da-da quantia ao empregador, baseada-da no núme-ro de funcionários da empresa.

No início da década de 1980, o sistema mé-dico-previden ciário de assistên cia à saú de, baseado n a m útua depen dên cia dos setores público e privado, mostrava sinais de esgota-m ento. A inoperância dos serviços prestados à população denunciava o seu fracasso. A es-cassez dos recursos estatais no quadro de re-cessão econ ôm ica do in ício dos an os 80, faz com que o setor privado encontre dificulda-des para dar continuidade ao seu processo de acumulação, uma vez que diminuía a capaci-dade de absorção de sua produção por parte do Estado, seu principal comprador. A manu-tenção da interdependência dos setores públi-co e privado públi-com o fundam ento da estratégia de reprodução de ambos era, aparentemente, um empecilho à tentativa de superação da cri-se instalada (Farias, 1999).

Esse con texto setorial, aliado às pressões políticas decorrentes do processo de redemo-cratização, criaria o ambiente propício ao de-sen volvim en to de propostas de reform a do sistem a pú blico de saú de, as qu ais con du zi-riam à universalização setor.

(6)

planos de saúde no financiamento de suas ati-vidades, e apenas 31% prestavam serviços ao SUS, conforme revela a exploração dos dados da Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária realizada em 1999 (www.datasus. gov.br). Por certo, esta realidade comporta formas bastante variadas de vínculo ou relacionamento en -tre as em presas operadoras dos planos, esta-belecimentos e profissionais de saúde, contu-do não seria apropriacontu-do discuti-las aqui.

Im agin a-se qu e a qu eda da qu alidade n a prestação dos serviços públicos de saúde du-rante a década de 1980 tenha contribuído de form a im portante para o crescim ento do po-tencial de expansão das empresas do setor su-pletivo, que passaram a estabelecer relações diretas com as empresas contratantes. Faveret e Oliveira (1990), assim como Médici (1991), argumentam que naquele período o processo de expansão da clientela no sistema público de saúde n ão foi acom pan hado de um propor -cion al aum en to dos recursos, fato que teria deteriorado ain da m ais o sistem a, im pon do uma forçosa racionalização dos serviços com reflexos negativos sob sua qualidade e acessi-bilidade. Essa linha de argumentação, embo-ra consistente, não esgota as possibilidades de explicação do crescimento do setor supletivo. Deve-se con siderar, tam bém , a participação ativa das operadoras de planos e dos estabele-cimentos de saúde na reestruturação da ofer-ta n o segm en to do m ercado de assistên cia à saúde.

Bahia (2001) assinala que na primeira me-tade da década de 1980, a quantidade de clien-tes de planos de saúde já se tornava expressiva, con tabilizando 15 m ilhões de segurados se-gundo os registros da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge) e da Federação das Unimed’s (não contabilizados os clientes de planos de entidades fechadas do tipo auto-gestão). Para a autora, já n aquela década as em presas de plan os de saúde con solidam -se como alternativas assistenciais para os traba-lhadores especializados da região Sudeste.

Sob o pon to de vista patron al – grupo de su m a im portân cia em todo esse processo – pode-se argumentar que o retorno das despe-sas com a contratação de planos de saúde pa-ra seus funcionários seria dado pela queda do absenteísmo, do maior controle sobre a força de trabalho e m aior valorização do vínculo com a empresa por parte dos trabalhadores, o que resultaria em possíveis ganhos de produti-vidade. Obviam en te, essas em presas con

tra-tan tes agiam , tam bém , sob pressão exercida pelas entidades sindicais, que passavam a de-m an dar n as su as pau tas de reivin dicação a oferta de “plano de saúde” pelo empregador.

Em m eados da década de 1990, o tem a da regulam en tação do setor supletivo da saúde pen etra a agen da política m obilizan do, de forma intensa, o conjunto de atores direta ou in diretam en te en volvidos n a produção, co-m ercialização e con su co-m o desses serviços de saúde. Àquela época, a dim en são alcan çada por esse m ercado já u ltrapassava os 30 m i-lhões de ben eficiários. Qu estões relativas à solvên cia das em presas operadoras dos pla-n os e segu ros e, pripla-n cipalm epla-n te, problem as relacion ados aos direitos dos con sum ido-res/beneficiários tornavam -se cada vez m ais n otórios, gan han do aten ção crescen te n os m eios de com unicação e retroalim entando a discu ssão e m obilização dos atores en volvi-dos.

O debate sobre a regulamentação do setor supletivo foi m arcado pela dificuldade de consenso frente aos de interesses conflitantes. Pode-se identificar alguns atores importantes n a década de 1990: en tidades de defesa dos consum idores (IDEC, Procon, etc), Ministé-rio Público, MinistéMinisté-rio da Saúde, MinistéMinisté-rio da Fazen da, Poder Legislativo, en tidades de representação das em presas do setor supleti-vo (Abram ge, Fen aseg, Con federação das Unimed’s do Brasil, Ciefas, Abraspe), entida-des de representação de médicos (Associação Médica Brasileira – AMB; Conselhos Federal e Regional de Medicina) e dos hospitais (Fe-deração Brasileira de Hospitais – FBH). Ope-radoras de planos de saúde, provedores e be-n eficiários bu scavam m axim izar gabe-n hos e m inim izar perdas. A partir de 1998 o Estado inicia o processo de regulamentação do setor, por meio da lei n. 9.656/98, da medida provi-sória n. 1.976 e da instituição da Agência Na-cion al de Saúde Suplem en tar (ANS) n o an o 2000.

(7)

rei-terada anualmente.

A am pliação de coberturas e o estabeleci-m en to de parâestabeleci-m etros estabeleci-m ín iestabeleci-m os n a coestabeleci-m posi-ção dos produtos comercializados fazem com que os planos form atados, segundo à regula-m en tação, apresen teregula-m custos e preços regula-m ais elevados do que os planos form atados e ven -didos an tes da vigên cia da lei 9.656/98. Este fato levou a m aior parte dos ben eficiários a não aderir aos novos contratos ofertados. Em entrevista realizada pelos autores, em dezem-bro de 2002, com o diretor técnico de uma das m aiores em presas de Medicin a de Grupo n o Brasil, este declarou qu e a regu lam en tação provocou uma elevação de preços entre 7% e 40% no valor de m ensalidades de planos ofe-recidos pela operadoras, dependendo do per-fil dos produtos que estas já comercializavam. Nesse cenário setorial e, em consonância com as orientações gerais do processo de reform a do estado no Brasil, foi criada no ano 2000 a Agência Nacional de Saúde.

Contudo, apesar dos esforços dirigidos à regulam entação estatal dos planos de saúde, em 2000 grande parte dos usuários ainda não estava protegida pela nova legislação. Setenta por cento dos beneficiários de planos de saú-de m antinham contratos firm ados no perío-do anterior à promulgação da lei 9.656/98, se-gundo informações fornecida pelo entrevista-do, e confirmadas pela apresentação de plani-lhas de dados da ANS.

A clientela do setor suplementar em saúde no Brasil

Demonstraremos a seguir, por meio da explo-ração e análise dos dados da Pesquisa Nacio-n al por Am ostra de Dom icílios de 1998 (-Pn ad/IBGE), que o processo de reestrutura-ção do m ercado de assistência apoiou-se num a segnum en tação, n a qual coube ao setor su -pletivo abarcar u m a parcela su bstan cial da clien tela rem an escen te do an tigo sistem a de assistên cia m édico-previden ciária, ou seja, trabalhadores situados no mercado formal de trabalho. É nesse grupo, particularmente, em seus estratos médios e superiores que as ope-radoras de plan os de saú de con cen tram su a clientela.

Os resu ltados con solidados relativos ao suplementoAcesso e utilização dos serviços de saúdeda Pnad 1998 foram publicados em 2000 (IBGE, 2000), entretanto, análises mais

deta-lhadas, como as que aqui serão apresentadas, exigem que as informações sejam trabalhadas a partir dos m icrodadosda pesquisa, ou seja, do banco de dados desagregado. A manipula-ção direta do banco de dados permitiu preen-cher algumas lacunas de inform ação existen -tes na referida publicação, aprofundando as-sim o conhecimento sobre os usuários de pla-nos de saúde e, indiretamente, sobre o merca-do da assistência supletiva à saúde no Brasil.

A Pnad confirma a estimativa já citada na primeira parte deste texto, segundo a qual 1/4 da população brasileira estaria coberto pelo setor suplementar na saúde. Na pesquisa exe-cutada pelo IBGE, estim a-se que 24,5% dos brasileiros possu íam plan os de saú de em 1998. A análise que se segue perm ite qualifi-car esse grupo populacion al, iden tifican do tan to as características qu e o distin gu e do restan te da população, quan to os elem en tos que lhe proporcionam uma significativa hete-rogeneidade interna.

A análise dos dados está organizada a par-tir dos seguintes eixos: a) caracterização das modalidades de adesão ao sistema suplemen tar, segundo a presença ou ausência de inter -m ediação patron al n a vin cu lação segu ra-do/operadora; b) caracterização dos segura-dos quanto à posição no mercado de trabalho; c) caracterização dos segu rados a partir da ren da fam iliar per capita; d) distribuição da popu lação coberta por plan os de saú de se-gundo as regiões do país, relacionando-a aos eixos de análise anteriormente explorados; e) por fim, uma sucinta exploração do consumo de consultas e internações hospitalares na po-pu lação segu rada por plan os de saú de e n a população SUS-dependente.

Modalidades de adesão ao sistema supletivo de saúde

(8)

-da com o aquela que se caracteriza pela ação privada do sujeito, que de forma livre e direta contrata no mercado o serviço de uma deter -minada operadora.

De forma mais ou menos similar, a distin-ção entre segmentos da clientela também apa-rece por m eio da classificação entre “seguro/ contrato coletivo” ou “seguro/contrato indi-vidu al”. Na lin guagem do sen so com um , os próprios usuários de planos de saúde tendem a utilizar os term os “plan o do em prego” e “plan o particu lar”, dem arcan do igualm en te distin tas m odalidades de adesão. Cada um a dessas tipologias presta-se a usos específicos. A primeira, adequa-se a uma certa interpreta-ção socioan tropológica; a segu n da é apro-priada a algumas análises econômicas, jurídi-cas e, prin cipalm en te, atuariais; a terceira, mais simples, direta, e facilmente compreen -sível, constitui a form a corrente pela qual se assinala, na linguagem cotidiana, as diferen -tes formas de adesão. As três tipologias não se sobrepõem de form a perfeita, visto que nem sempre a presença do empregador como ente intermediário da adesão a um plano de saúde configura a existência de um “seguro/contrato coletivo”. Tanto é possível a existência de um contrato coletivo sem a presença do emprega-dor (através de associações, por exemplo), co-m o uco-m seguro in dividual pode ser custeado pelo em pregador (fato corriqueiro quando o empregador é uma microempresa).

Os dados disponíveis não permitem men-su rar a proporção de ben eficiários segu n do as modalidades de contrato individual ou co-letivo, mas apenas segundo a presença ou au-sência de intermediação do empregador. Para serm os m ais fiéis à in form ação con tida n os dados da Pnad, utilizaremos doravante os term os “plano pelo eterm prego” e “plano particu -lar”.

Verifica-se que entre os segurados de pla-n os de saú de, 65% in tegram arran jos in ter

-m ediados pelo vín culo e-m pregatício (plan o pelo emprego), enquanto 35% contratam di-retam ente seus planos, e os pagam m ediante desem bolso próprio. A prepon derân cia dos planos intermediados por empregadores, por si só, já con stitui um a evidên cia de que a clientela do setor supletivo corresponde, em gran de m edida, àqu ela qu e ou trora fora a clientela dos sistem as de assistência m édico-previdenciários.

Na aplicação do questionário da Pnad a per gu n ta Qu em paga a m en salidade dest e plano de saúde?(variável V1332) era realizada apen as para a pessoa titu lar do plan o. Essa questão possuía oito opções de resposta: 1) somente o empregador do titular; 2) o titular, através do trabalho atual; 3) o titular, através do trabalho anterior; 4) o titular, diretamente ao plano; 5) ou tro m orador do dom icílio; 6) pessoa não m oradora do dom icílio; 7) outro tipo; 8) ignorado. As opções 1, 2 e 3 foram agregadas como “plano pelo emprego”, ao pas-so que as opções 4, 5, 6 e 7 foram agregadas co-mo “plano particular”.

Para que pudéssem os saber, para o con jun to dos segurados (titulares + depen den -tes), qual a proporção dos que se ben eficia-vam de plan os in term ediados por em prega-dores e daqueles que possuíam plano particu-lar, foi necessário im put araos depen den tes, n a variável acim a citada, a m esm a resposta declarada pelo seu respectivo titular. Essa in -form ação tam bém poderia ser obtida u tili-zando-se para cálculo a m édia do núm ero de dependentes de cada titular, entretanto a im -put açãoapresen ta van tagen s n a m edida em que permite incluir os dependentes em poste-riores cruzamentos da variável V1332.

Com o se vê na tabela 1, a grande m aioria dos segurados adere ao sistem a suplem entar de saú de através de arran jos derivados do vínculo empregatício. Porém, isso não signifi-ca que essas pessoas estejam isentas de

parti-Tabela 1

Distribuição de titulares e dependentes, segundo o modo de adesão

Tipo de adesão N. médio de dependentes Distribuição Distribuição do total por titular dos titulares dos segurados

Pelo emprego 1,68 59% 65%

Particular 1,04 41% 35%

(9)

cipação n o pagam ento das m ensalidades, ao contrário, apenas 22% dos titulares com pla-n o pelo em prego declararam que a m epla-n sali-dade era paga in tegralm en te pelo em prega-dor. Em bora os plan os pelo em prego sejam m ajoritários, a proporção de planos particu-lares (desembolso próprio) é bastante expres-siva. Esse segmento de segurados representa-va 8,5% da população brasileira em 1998.

Tam bém m erece destaque a expressiva participação de segurados vinculados a insti-tuições de assistên cia a servidores públicos. Tal in form ação foi captu rada pela segu in te pergunta, feita aos indivíduos que já haviam declarado possuir plano: Este plano de saúde é de instituição de assistência de servidor pú -blico (federal, estadual ou m unicipal)? (variá-vel V1326). Entre as pessoas que declaram ter plan o de saúde, 25% afirm aram que o plan o era de alguma instituição de assistência a servidor público. Essas instituições são respon -sáveis pela assistên cia de 35,6% dos in diví-duos que possuem planos pelo emprego.

Características de trabalho dos segurados

Cruzando-se a variável ram os da ativida-de econ ôm ica n o t rabalho prin cipal do an o (V4716) com a variável Quem paga a m ensa-lidade deste plano de saú de?, constata-se que en tre os titu lares com plan o pelo em prego 23,6% trabalham na indústria de

transforma-ção; 20,7%, no ramo social (composto por ser-viços com un itários e sociais; serser-viços m édi-cos, odon tológicos e veterin ários; en sin o) e 15,2%, n a adm in istração pública. Quan to à posição da ocupação no trabalho principal do an o(variável V4715), 86,9% desses titulares são trabalhadores com carteira assin ada ou funcionários públicos estatutários.

Já o gru po form ado pelos titu lares com plan o particu lar apresen ta u m a estru tu ra bastan te distin ta em relação ao gru po an te-riorm en te an alisado. Sua distribuição pelos ram os da at ividade econ ôm icarevela que a maior concentração encontra-se no comércio de mercadorias com 20,6%, seguido do ramo social com 17,8% e da prestação de serviços com 15,6%. Em relação à posição da ocu pa-ção, apenas 40,1% declararam ser trabalhado-res com carteira assinada ou funcionários pú-blicos estatutários. Os trabalhadores por con-ta-própria representam 24,7%, segu idos do segm ento form ado pelos em pregadores com 19%. Ressalte-se que as características de tra-balho expressas nas variáveis V4715 e V4716 são perguntadas apenas para as pessoas de 10 anos ou mais de idade (Tabela 2).

Quan do cruzam os a variável posição n a ocupaçãocom a variável possui plano de saú-de? verificamos que os grupos com maior in cidên cia de segu rados (titu lares ou depen -dentes) são os militares com 70,9%, os funcio-nários públicos com 66,6%, os empregadores

Tabela 2

Distribuição dos titulares de planos de saúde pelos ramos de atividade econômica, segundo a modalidade de adesão

Ramos da atividade econômica Tipo de adesão

Pelo emprego Particular Total

Agrícola 1,5% 5,0% 2,6%

Indústria de transformação 23,6% 11,8% 19,8%

Indústria da construção 1,8% 3,4% 2,3%

Outras atividades industriais 3,9% 1,0% 2,9%

Comércio de mercadorias 9,2% 20,6% 12,9%

Prestação de serviços 6,1% 15,6% 9,2%

Serviços auxiliares da atividade

econômica 5,0% 10,8% 6,9%

Transporte e comunicação 6,8% 4,4% 6,0%

Social 20,7% 17,8% 19,7%

Administração pública 15,2% 6,4% 12,3%

Outras atividades, atividades mal

definidas ou não declaradas 6,3% 3,1% 5,2%

Total 100,0% 100,0% 100,0%

(10)

com 48% e os em pregados com carteira com 39,2%.

Características de renda dos segurados

Para a elaboração das an álises que se se-guem criam os a variável renda m en sal fam i-liar per capita, dividindo a variável valor do rendim ento m ensal fam iliar exclusive agrega-dos(V4726) pela variável núm ero de com po-n epo-n t es da fam ília ex clu sive agregados (V4725). A partir da nova variável foi criada um a outra, den om in ada est rato de ren da,a qual classifica os indivíduos em três grupos, a dizer: os 10% mais ricos; os 40% mais pobres; os 50% da faixa in term ediária. Esses três es-tratos foram adotados por serem u tilizados em vários estudos sobre pobreza e desigual-dade no Brasil. Com isso acreditamos que tais inform ações possam ser m ais facilm ente uti-lizadas por estudos que se dediquem especifi-camente à análise das desigualdades em geral e, em particular, das desigualdades em saúde.

Prim eiram en te, é n ecessário dizer que a m édia aferida pela Pnad para a renda m en sal fam iliar per capit a n o an o de 1998 foi de R$254,00. Ter ciência desse valor é importan-te na medida em que ele nos serve de parâme-tro em relação à ren da dos grupos particula-res que estão sendo analisados.

Com parando os indivíduos que possuem planos de saúde com aqueles que não possu -em , observa-se qu e para o prim eiro gru po o valor m édio da renda fam iliar per capitaé de R$569,34, enquanto para o segundo grupo, no qual encontra-se 3/4 da população, a renda é de apenas R$153,07. Essa diferença é bastante ilu strativa da distân cia social e econ ôm ica que separa os grupos e corrobora as an álises

que identificam as classes m édia e alta com o segm entos que utilizam serviços do setor su -plem entar, em contraste com a utilização do Sistem a Ún ico de Saúde pelos segm en tos de menor renda. Nesse ponto interessa destacar, sobretudo, a distân cia que separa os ren di-mentos desses grupos, mas para que se tenha ao menos uma vaga referência do que os valo-res repvalo-resentavam em termos reais registre-se qu e o salário m ín im o em 1998 era de R$130,00.

Analisando exclusivam ente os segurados do setor suplem en tar tam bém en con tram os expressivas diferenças de renda quando com param os o grupo que possui plan o pelo em -prego com o grupo que possui plano particu-lar. Para o prim eiro, o valor m édio da ren da mensal familiar per capitaé de R$498,19 e pa-ra o segun do alcan ça o valor de R$736,02, equivalente a quase cinco vezes o valor médio aferido entre os indivíduos que não possuem seguro saúde. De um a m aneira geral pode-se afirm ar que a adesão ao seguro saúde através de desem bolso próprio é um a prática pouco viável para segmento de menor renda. Indiví-duos de renda baixa que aderem individualm en te ao seguro saúde con stitueindividualm uindividualm per -centual residual e, como demonstrado por Fa-rias (2001), tais adesões, quan do ocorrem , freqüentem ente m obilizam estratégias fam i-liares voltadas para a proteção de m em bros cujo estado de saúde seja considerado vulne-rável.

Utilizan do a variável estrat o de ren da– variável criada pelos au tores –, foi possível descobrir que entre as pessoas que compõem o segm ento dos quarenta por cento m ais po-bres apenas 5,1% possuem seguro saúde, seja este particular ou pelo emprego. Em

contras-Tabela 3

Características demográficas e econômicas associadas à distribuição regional dos beneficiários de planos de saúde

Regiões % da população % dos beneficiários % da população % de empregados Renda mensal nacional concentrada de planos de saúde regional coberta com carteirana familiar per capita

na região concentrados na região por plano de saúde população ocupada na região (R$)

Norte 5,0 3,5 17,0 18,5 183,59

Nordeste 29,0 14,7 12,4 15,7 137,77

Sudeste 43,7 59,6 33,3 38,2 324,31

Sul 15,3 15,9 25,3 32,6 283,47

Centro-Oeste 7,0 6,4 22,5 25,1 280,65

(11)

te, no grupo formado pelos dez por cento mais ricos, 74% dos in divídu os possu em segu ro saúde.

Distribuição regional dos segurados

A distribuição dos segurados do setor su-plem en tar n a saúde pelas regiões do país re-vela grandes desigualdades no acesso/consu-mo a esse tipo de serviço, quando compara-se os diferen tes espaços do território n acion al. Observa-se, entre outras questões, a tradicio-n al dicotom ia etradicio-ntre o Sudeste e o Nordeste, que se apresen tam com o pólos opostos n o que se refere à cobertura populacional do se-guro saúde.

O Su deste é a região on de se en con tra o m aior con tin gen te de u su ários de plan os de saúde, concentrando 59,6% do total de segu-rados no país. Essa concentração deve-se tan-to ao fato ser o Sudeste a região mais populo-sa, quanto ao elevado nível de cobertura po-pulacional do setor supletivo nessa região. No Sudeste, 1 em cada 3 habitantes possui plano de saúde, ao passo que no Nordeste essa rela-ção é de 1 em cada 8. A tabela 3 apresenta uma síntese das diferenças regionais mencionadas. A região é u m a u n idade de an álise capaz de revelar expressivas desigualdades, seja no tem a em questão com o em vários outros. No entanto, é importante destacar que a realida-de in tra-region al está lon ge realida-de ser hom ogê-nea. Se por um lado as unidades da federação que compõem uma região tendem a apresen -tar características similares, não é menos ver-dade que tam bém guardam particulariver-dades im portan tes. Para exem plificar a força com que as desigualdades podem se fazer presen -tes n o in terior da própria região é válido m en cion ar algun s dados relativos à propor ção da cobertura dos planos de saúde segun -do as unidades da federação (Tabela 4).

Os dados apresen tados n as três ú ltim as colunas da tabela 3 sugerem que a proporção da população coberta por planos de saúde por região está associada à variação observada nas variáveis pertinentes à configuração do m er-cado de trabalho e à renda nessas mesmas re-giões. Para verificar de forma mais consisten-te tal associação, efetuou-se a análise a partir das Unidades da Federação, utilizando-se as variáveis: percen tu al da população cobert a por seguro saúde na UF; percentual de empre-gados com carteira na população ocupada na UF; valor médio da renda mensal familiar per

capita na UF. A matriz de correlações (Tabela 5) confirma uma forte associação entre as va-riáveis e o gráfico da análise de regressão de-m onstra tade-m béde-m a existência de linearidade n essa associação (Figura 1). Foi possível as-sim, construir um modelo no qual a cobertura populacional dos planos é variável depen -dente da dimensão do mercado form al de tra-balho. Excluiu-se do modelo a variável renda pois, do ponto de vista teórico, pode-se consi-derá-la, tam bém , depen den te em relação ao mercado de trabalho.

Segmentação do mercado e desigualdades no consumo de serviços assistenciais

No caso brasileiro, a segmentação de merca-dos implica distintos padrões de consumo merca-dos serviços médico-assistenciais pelas respectivas clientelas. Quando analisada a utilização dos ser-viços na forma de consulta médica, conclui-se que indivíduos que possuem plano apresentam indicador per capitade consultas/ano quase duas vezes mais que aqueles que não possuem seguro. Da mesma forma, quando observa-se, nos dife-rentes grupos, o percentual de indivíduos que de-claram ter tido alguma internação hospitalar nos últimos 12 meses anteriores à pesquisa, verifica-se que também nesverifica-se item a população não co-berta por planos de saúde apresenta menor con-sumo/utilização (Tabela 6).

Um assunto recorrente nas discussões sobre a segmentação de mercado na assistência à saúde diz respeito à freqüência com que segurados do setor supletivo utilizam os serviços do SUS e ao tipo de serviço/procedimento consumido por es-ses indivíduos quando recorrem ao sistema pú-blico de saúde.

Tabela 4

Diferenças intra-regionais na cobertura populacional dos planos de saúde

Regiões e UFs % da população coberta por plano de saúde

Nordeste 12,4

MA 5,9

PE 17,4

Sudeste 33,3

ES 22,8

SP 39,2

(12)

A análise dos dados procurou dimensionar a utilização de internações no SUS pelos segura-dos do setor supletivo, contribuindo para que se responda, ao menos em parte, à questão ante-riormente apontada. Verificou-se que entre os in-divíduos que possuem plano de saúde, e tiveram alguma internação nos 12 meses anteriores à

pes-quisa, 14% declararam que a última internação fora realizada através do SUS. Vale destacar que, para os segurados situados no estrato de renda correspondente aos 40% mais pobres, esse per-centual alcança 33,7% ao passo que entre os 10% mais ricos atinge apenas 5,7%. O fato indica que os usuários do primeiro grupo provavelmente Tabela 5

Matriz de correlações

% da população coberta % empregados com carteira por seguro saúde na UF na população ocupada na UF

% da população coberta 1,000 por seguro saúde na UF

% empregados com carteira 0,894* na população ocupada na UF

Valor médio da renda mensal 0,829* 0,837*

familiar per capitana UF

* Correlação significante no nível de 0,01

Figura 1

Análise de regressão

R2ajustado = 0,791

Coefficients1

Unstandardized Standardized t Sig. Coefficients Coefficients

B Std. Error Beta

(Constant) -0,573 2,077 -0,276 0,785

% Empregados com carteira 0,830 0,830 0,894 9,958 0,000

1Dependent variable: % da população coberta por plano de saúde na UF. 0

10 20 30 40

2 3

1 0

-1 Regression Standardized

Predicted Value

%

da

po

pula

çã

o c

ob

er

ta

po

r

plano d

e sa

úd

e

na

(13)

Tabela 6

Consumo/utilização de serviços médicos (consultas e internações)

Indicadores de consumo Beneficiários de planos Beneficiários de planos Beneficiários de planos População não vinculada de saúde (todos) de saúde (pelo emprego) de saúde (particular) a planos de saúde

consulta per capita 3,1 2,8 3,5 1,75

(12 meses)

% de indivíduos 8,0 7,3 8,7 6,6

internados em 12 meses

Fonte: Pnad 1998. IBGE. Tabulações especiais dos autores.

possuíam planos mais restritivos, principalmen-te se considerarmos que, no período investigado pela Pnad, os pacotes mínimos de serviços que deveriam ser ofertados nos produtos comerciali-zados pelas empresas operadoras de planos ain-da eram alvo de contestações, e o processo de re-gulação vivia um momento embrionário.

Embora a utilização de internações SUS pe-los beneficiários de planos não possa ser consi-derada residual, nota-se que a utilização da rede hospitalar vinculada às empresas operadoras é absolutamente majoritária entre os segurados. Considerando todos os indivíduos que declaram ter tido internação no SUS, os segurados do setor supletivo representavam 6,3%. É plausível supor que, em decorrência da regulamentação que, en-tre outras medidas, estabelece padrões mínimos de cobertura para os produtos comercializados, a utilização de internações SUS por segurados do setor supletivo tenha diminuído nos últimos anos.

Conclusão

Este estudo m ostra a particularidade do caso brasileiro em relação à form a com o in tera-gem no mercado o setor público e privado em saúde. Com o foi visto, em países desenvolvi-dos, com exceção dos EUA, o setor privado de-sempenha uma função complementar aos sis-tem as públicos atuan do em faixas m uito es-pecíficas e correspon den do a exigên cias de consumo de setores de altas rendas.

Procurouse tam bém apresen tar as prin -cipais falhas de m ercadorelatadas pela litera-tura, no campo da economia da saúde, tais co-mo: risco m oral, seleção adversae seleção de risco. Na ausência de uma ação regulatória do Estado, essas falhas se tran sform am em gra-ves entragra-ves ao acesso à assistência,

principal-mente em países onde o seguro privado torna-se responsável pela cobertu ra de u m a am pla parcela da população.

Sob o ponto de vista dos sistemas de assis-tên cia à saú de, os dados perm item afirm ar que o m ercado brasileiro en con tra-se clara-mente segmentado – os sub-sistemas público e privado apresentando clientelas quase exclu-sivas, determinadas por características de tra-balho e renda. Esta conclusão está am parada na evidência demonstrada pela forte associa-ção das variáveis de renda familiar per capita e posição no m ercado de trabalho, com a variável qu e registra a m agn itu de do setor su -pletivo. A matriz de correlações e o resultado da análise de regressão constituem boas indi-cações para a com provação desse fenôm eno. Igualmente, os dados sobre o perfil de consum o das distintas clientelas corroboraconsum o ar -gumento da segmentação do mercado.

Não obstante, fundamental destacar a im -portância do SUS como provedor de serviços para 3/4 da população brasileira, lem brando que estrato de renda formado pelos 40% mais pobres, apenas 5,1% dos indivíduos possuem plano de saúde. Em todas as regiões do país o sistem a pú blico é m ajoritário, em especial, nas regiões Norte e Nordeste onde o setor su-plementar ainda é pouco desenvolvido, devi-do às condições socioeconômicas locais.

(14)

Referências bibliográficas

Agência Nacional de Saúde Suplem entar 2002. Regu-lação e saúde: estrutura, evolução e perspectivas da assist ên cia m édica su plem en t ar. Min istério da Saúde/ANS, Rio de Janeiro.

Arrow KJ 1963. Uncertainty and the welfare economics of m edical care. A m erican Econ om ic Review

53:941-973.

Arrow KJ 1985. Theoretical issues in health insurance. In KJ Arrow. Collected papers of Kenneth J. Arrow volu m e 6: A pplied Econ om ics. H avard University Press, Cambridge.

Bahia L 2001. Plan os privados de saúde: luzes e som -bras no debate setorial dos anos 90. Revista Ciência e Saúde Coletiva6(2):329-340.

Chollet DJ & Lewis M 1997. Private insurance: princi-ples an d practice. In GJ Schieber. In n ovat ion s in health care, proceedin gs of a W orld Ban k Con fer-en ce. March 10-11, 1997. World Bank. (Series WB Discussion Papers, 365).

Congresso Brasileiro de Medicina de Grupo 1978. Anais do 1oCon gresso Brasileiro de M edicin a de Gru po.

DAG, São Paulo.

Cutler DM & Zeckhauser RJ 1999. T he an at om y of health in su ran ce. NBER Working Paper 7.176. Dispon ível em <http://www.nber.org/paperS/W7176>.

Farias LO 2001. Estratégias in dividuais de proteção à saúde: um estudo da adesão ao sistem a de saúde suplem entar. Revist a Ciên cia e Saú de Colet iva

6(2):405-416.

Farias LO 1999. Adesão voluntária aos planos de saúde

em cam adas popu lares. Dissertação de m estrado. Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz, Rio de Janeiro.

Faveret Filho P & Oliveira PJ 1990. A un iversalização excluden te: reflexões sobre as ten dên cias do sis-tem a de saúde. Dados Revist a de Ciên cias Sociais

33(2):257-283.

Figueiredo LF, Andréa JLB & Checchia CMA 2001. Mer-cado de atenção supletiva e regulamentação. In PR Barbosa. Autogestão em saúde: volum e 1. Fiocruz, Rio de Janeiro.

HSIAO W 2000. W hat shou ld m acroeconom ists know about health care policy? A prim er, IM F. Working Paper 136. Disponível em <http://www.imf.org/ex-ternal/pubs /ft/wp/2000/wp00136.pdf>.

IBGE 2000. A cesso e u t ilização de serviços de saú de 1998. IBGE, Rio de Janeiro.

IBGE 2000. Est at íst icas da saú de: assist ên cia m édico-sanitária 1999. IBGE, Rio de Janeiro.

Médici AC 1991. A m edicina de gru po no Brasil. Orga-nização Pan-Am ericana de Saúde, Brasília. (Série Desenvolvimento de Políticas Sociais, 1).

Musgrove P 1996. Pu blic an d privat e roles in healt h. World Bank Discussion Paper 339. Disponível em < http:// www-wds.worldbank.org/servlet/WD-S C o n t e n t S e r v e r / WDSP/IB/1996/08/01/000009265_3961219094216/ Rendered/PDF/multi0page.pdf>.

Teixeira SMF 1989. Política de saúde na transição con-servadora. Londrina, CEBES. Revista Saúde em De-bate(26):42-53

Artigo apresentado em 21/10/2002 Aprovado em 27/11/2002

Referências

Documentos relacionados

Figura 38 – Acompanhamento diário de peso dos animais tratados com ENSJ39 via oral e intraperitoneal, LE39 e LBR via intraperitoneal para avaliação da toxicidade aguda.. Dados

E para opinar sobre a relação entre linguagem e cognição, Silva (2004) nos traz uma importante contribuição sobre o fenômeno, assegurando que a linguagem é parte constitutiva

Considerando a presença e o estado de alguns componentes (bico, ponta, manômetro, pingente, entre outros), todos os pulverizadores apresentavam alguma

Os principais resultados obtidos pelo modelo numérico foram que a implementação da metodologia baseada no risco (Cenário C) resultou numa descida média por disjuntor, de 38% no

libras ou pedagogia com especialização e proficiência em libras 40h 3 Imediato 0821FLET03 FLET Curso de Letras - Língua e Literatura Portuguesa. Estudos literários

De acordo com estes resultados, e dada a reduzida explicitação, e exploração, das relações que se estabelecem entre a ciência, a tecnologia, a sociedade e o ambiente, conclui-se

Este estudo tem o intuito de apresentar resultados de um inquérito epidemiológico sobre o traumatismo dento- alveolar em crianças e adolescentes de uma Organização Não

Para tal, iremos: a Mapear e descrever as identidades de gênero que emergem entre os estudantes da graduação de Letras Língua Portuguesa, campus I; b Selecionar, entre esses