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Conhecendo o olhar do acompanhante face à violência obstétrica

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Academic year: 2021

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Conhecendo o olhar do acompanhante face à violência obstétrica

Mirna Albuquerque Frota1, Conceição de Maria de Albuquerque 1,Jéssica Chaves1, Jéssica Ingrid Brasileiro

Rocha1, Karla Maria Carneiro Rolim1 e Aline Veras Morais Brilhante1

1 Departamento de Educação Universidade de Fortaleza, Brasil. mirnafrota@unifor.br; conceicaom@unifor.br; jessicachaves_@hotmail.com; jessicaingrid_rocha@hotmail.com; karlarolim@unifor.br; alineveras@unifor.br.

Resumo. A maternidade é percebida por muitas mulheres como o início de um novo ciclo de vida. Objetivou-se compreender o conhecimento dos acompanhantes acerca da violência obstétrica. Pesquisa exploratória e descritiva de natureza qualitativa. Elegeu-se para o cenário do estudo um Serviço de Alojamento Conjunto de um hospital secundário de Fortaleza. Os participantes do estudo foram 27 acompanhantes das puérperas. A coleta de dados ocorreu no período de outubro a dezembro de 2017 A pesquisa obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza sob Parecer de Nº 559.378. Com a análise dos dados, constatou-se que é um tema desconhecido, muitos desconhecem se já sofreram algum tipo de abuso e não reivindicaram seus direitos. Conclui-se a necessidade de dispor informações sobre os direitos da gestante mediante o processo do parto e puerpério, visando o empoderamento da mulher nesse momento tão singular na sua vida.

Palavras-chave: Violência Obstétrica; Gestantes; Parto Humanizado; Família.

Knowing the companion about obstetric violence

AbstractMotherhood is perceived by women as the beginning of a new life cycle. The objective was to understand on the occupancy Exploratory and descriptive research of a qualitative nature. He was chosen for the study scenario of the Joint Housing Service of a secondary hospital in Fortaleza. The study participants were 27 followers of the puerperal women. Data collection was done in December 2017. The research was done by the Research Ethics Committee of the University of Fortaleza under Opinion No. 559,378. With an analysis of the data, this is one of the most unknown forms, that may have suffered some type of abuse and not claimed their rights. The task of obtaining information on the rights of the pregnant woman through the process of childbirth and the puerperium, aiming at the empowerment of the woman at this unique moment in her life, is completed.

Keywords: Obstetric Violence; Pregnant women; Humanized birth; Family.

1 Introdução

A maternidade é vista por muitas mulheres como o início de um novo ciclo de vida. Entretanto, inúmeras delas encontram-se despreparadas quanto às adaptações fisiológicas e psicológicas para esse momento. E quando se deparam com profissionais de saúde inabilitados para conduzir tais mudanças a realidade torna-se ainda mais difícil. Muitos dos transtornos fisiológicos e emocionais são vinculados às lacunas destes profissionais responsáveis pela incapacidade de condução deste contexto a essas mulheres (Medeiros et. al, 2016).

Define-se a violência como qualquer ação que tenha o uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra o outro ou contra um grupo, que resulte ou possa resultar em qualquer dano psicológico, deficiência, lesão ou morte (OMS, 2002). Logo, a violência contra a mulher apresenta-se em distintas expressões e uma delas tem sido muito presente e não identificada: a violência obstétrica.

Desse modo, entende-se por violência obstétrica qualquer ato exercido por profissionais da saúde no que cerne ao corpo e aos processos reprodutivos das mulheres, exprimido por meio de uma atenção

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desumanizada, abuso de ações intervencionistas, medicalização e a transformação patológica dos processos de parturição fisiológicos (Andrade & Aggio, 2014).

É possível verificar por meio de pesquisas confiáveis que as mulheres sofrem violência no parto. Essas informações devem chegar às mulheres, e ser um alerta para a sociedade sobre essas práticas (Miranda, 2015).

Rede parto do princípio (2012) ressalta que a violência obstétrica institucional pode ser melhor identificada de várias formas, a saber: peregrinação por diversos serviços até receber atendimento; falta de escuta e de tempo para a clientela; frieza, rispidez, falta de atenção, negligência e maus-tratos dos profissionais com os usuários, motivados por discriminação, abrangendo idade, orientação sexual, deficiência física, gênero, racismo, doença mental; violação dos direitos reprodutivos (discrição das mulheres em decurso de abortamento), aceleração do parto para liberar leitos, preconceitos acerca dos papéis sexuais e em relação às mulheres soropositivas para o HIV, quando estão grávidas ou tencionam engravidar; desqualificação do saber prático, da experiência de vida, diante do saber científico.

Inegavelmente, o parto é um momento único e inesquecível na vida da mulher, quando o cuidado despendido pelos profissionais deveria ser singular e pautado no protagonismo da mulher, tornando-o mais natural e humantornando-o ptornando-ossível. Distintamente de tornando-outrtornando-os actornando-ontecimenttornando-os que necessitam de cuidados hospitalares, o processo de parturição é fisiológico, normal, necessitando, na maioria das vezes, apenas de apoio, acolhimento, atenção, e o mais importe, humanização (Andrade & Aggio, 2014).

O conceito de atenção humanizada durante a parturição engloba conhecimentos, práticas e atitudes que têm em vista garantir o parto e nascimento saudáveis, levando em consideração a prevenção da morbimortalidade materna e perinatal. Portanto, exprime a necessidade de alterações no entendimento do parto, como experiência humana e, para aquele que presta o atendimento, uma transformação em como agir no momento oportuno diante do sofrimento do outro (Andrade, 2014). O parto humanizado é aquele parto voltado e centrado na mulher com respeito a autonomia e protagonismos feminino. É aquele que ocorre sem intervenções, sem cesárea agendada, sem ocitocina sintética, sem manobras de expulsão do feto, sem fórceps, sem episiotomia, e as intervenções que se seguem no recém-nascido como nitrato de prata, aspiração nasal e gástrica, separação mãe – bebê, vitamina K entre outras (Miranda, 2015).

O Ministério da Saúde reconhece que a presença do acompanhante traz benefícios e que as gestantes que contam com um acompanhante no parto e puerpério imediato ficam mais tranquilas e seguras durante o processo, havendo diminuição do tempo de trabalho de parto e do número de cesáreas. A permanência de outra pessoa junto à mulher contribui, ainda, com a redução do risco de acometimento por depressão pós-parto. O acompanhante pode, sobretudo, ajudar a mulher nas tarefas básicas com o bebê no pós-parto, quando a mãe se encontra em fase de reabilitação (BRASIL, 2005).

Com a sanção da Lei n. 11.108, em abril de 2005, recomenda-se que os serviços de saúde se reorganizem para incluir o acompanhante no período de trabalho de parto, parto e puerpério imediato. Essa intervenção busca garantir que toda parturiente tenha uma pessoa de sua escolha para confortá-la e encorajá-la durante o processo do nascimento (Oliveira et al., 2011).

Embora a presença do acompanhante no cenário do parto humanizado seja uma recomendação do Ministério da Saúde, observam-se obstáculos quanto à sua participação, justificada pela inadequada infraestrutura dos serviços e, especialmente, pela falta de preparo da equipe de saúde para lidar com ele (Longo et al., 2010).

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Neste contexto, surgem as indagações: os acompanhantes das parturientes são bem orientados? Têm conhecimento sobre violência obstétrica e conseguem identificá-la? E por fim, sabem como agir diante de uma situação dessa?

O estudo principiou na necessidade de alertar os acompanhantes acerca da violência durante o trabalho de parto e parto, tendo em vista que a maternidade é um momento único na vida de uma mulher, e pode ser maravilhoso, como também, se conduzido de forma errônea, pode ser traumático.

Busca-se no estudo, avaliar se esses acompanhantes sabem o que é uma violência obstétrica e se estão preparados e orientados sobre como devem agir diante de uma situação dessas. Portanto, o estudo demostra a necessidade da identificação de um processo de atendimento nas instituições de saúde, onde estejam assegurados tudo o que está sendo proposto pela lei.

Diante do exposto, objetivou-se analisar o conhecimento dos acompanhantes acerca da violência obstétrica.

2 Metodologia

Trata-se de uma pesquisa exploratória e descritiva de natureza qualitativa. Para Bosi e Camargo Júnior (2011), ao referir acerca da pesquisa qualitativa em saúde, discorre-se de um conjunto de vertentes teórico-metodológicas que, superando dialeticamente modelos tradicionais, interessa-se em escutar os pontos de vista dos distintos atores sociais, preocupa-se com desfechos "objetiváveis" mas, para além da mensuração, valoriza a compreensão dos complexos processos subjetivos e simbólicos subjacentes aos mesmos.

Os autores supracitados revelam que é de extremo valor ressaltar que dependerá do rigor da intuição e da habilidade do pesquisador em manusear técnicas e recursos para retratar o objeto, a autoridade do pesquisador também se revela pela ocasião de que aquilo que ele pesquisa e busca faz parte do seu mundo, o que seguramente abrange a ciência operativa e científica. O objeto pesquisado desponta algo que incita o pesquisador para a investigação de novos conhecimentos. Para Minayo (2010), a metodologia da pesquisa inclui as concepções teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas de abordagem, que possibilitam a construção da realidade e o sopro divino criativo do investigador. Portanto, embora seja uma prática teórica, a pesquisa vincula pensamento e ação. Ou seja, nada pode ser intelectualmente um problema, se não tiver sido, em primeiro lugar, um problema da vida prática.

Elegeu-se como cenário um Serviço de Alojamento Conjunto de um hospital secundário de Fortaleza. Tal instituição oferece atendimento de urgência em ginecologia e obstetrícia, clínica médica (feminina), neonatologia e pediatria, além de consultas ambulatoriais e cirurgias eletivas em ginecologia, obstetrícia e mastologia.

Os participantes foram os acompanhantes das puérperas. Adotou-se os critérios de inclusão: acompanhantes maiores de dezoito anos que aceitaram participar do estudo, independente de gênero, religião, cor, raça ou situação financeira. Os critérios de exclusão: acompanhantes com algum distúrbio de ordem neurológica ou que desistirem do convite em qualquer etapa da pesquisa. Isaia (2010), refletindo acerca do participante da pesquisa nos revela que o participante é um voluntário que, depois de informado acerca dos os objetivos, a metodologia e os riscos e benefícios do estudo, decide participar.

Esclareceram-se as finalidades do projeto, garantindo aos participantes da pesquisa o sigilo e o compromisso ético de mantê-los no anonimato, bem como livrá-los de qualquer constrangimento, dano moral e físico. A eles se garantiu o compromisso do retorno da pesquisa no que diz a melhoria e

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benefícios para os mesmos. Na eventualidade do participante querer desistir, podia tê-lo feito em qualquer altura

Explicou-se aos participantes acerca do que desejávamos averiguar e as prováveis repercussões advindas do processo investigativo. Ressaltou-se que a pesquisa qualitativa não se baseia no critério numérico para garantir sua representatividade e que a amostragem boa é aquela que possibilita abranger a totalidade do problema investigado em suas múltiplas dimensões (Minayo, 2010). Outra informação relevante diz respeito aos benefícios que esta pesquisa trouxe para os participantes. Eles puderam contribuir com a equipe de saúde na melhoria da assistência. No tocante aos riscos, asseguramos que este estudo trouxe o risco mínimo de timidez pela utilização do gravador.

A coleta de dados ocorreu no período de outubro a dezembro de 2017. A primeira etapa da coleta dos dados consistiu-se na observação não participante. Segundo Gil (2010) nesta etapa o pesquisador entra em contato com o cenário a ser estudado a fim de conhecer a rotina, o fluxograma e a própria instituição, mas não participa, fazendo papel apenas de espectador. Esta etapa correspondeu também ao primeiro contato do pesquisador com os possíveis participantes da pesquisa.

No estágio inicial do estudo o investigador entrou em contato pessoal com os 27 entrevistados , os quais não houveram desistência dos mesmos, e estabeleceu, desde o primeiro momento, uma conversa amistosa. Neste momento ocorreu a justificativa do tema da pesquisa e a familiarização com os participantes envolvidos (Lakatos & Marconi, 2017).

Na segunda etapa da coleta aplicou-se de uma entrevista semi-estruturada com os participantes da pesquisa, composta por duas partes. A primeira tratou dos dados sócio-demográficos do entrevistado (tais como idade, base salarial, estado civil, dentre outros) e a segunda parte da entrevista abordou questões norteadoras pertinentes aos objetivos da pesquisa.

Lakatos e Marconi (2017) revelam que entrevista corresponde ao encontro entre duas pessoas, para que uma delas obtenha informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional. É um procedimento utilizado na investigação social, para a coleta de dados ou para a ajuda no diagnóstico ou no tratamento de um problema social. A entrevista ocorreu de forma estruturada que conforme os mesmos autores é aquela em que o entrevistador seguiu um roteiro previamente estabelecido; as perguntas feitas ao indivíduo foram predeterminadas.

Destaca-se que o diário de campo esteve presente em todos os períodos da coleta de dados fornecendo subsídios relevantes do momento da coleta para a análise dos dados. Utilizou-se também, o auxílio de um gravador, onde foram gravadas as entrevistas, individual e confidencial em um local apropriado, ter-se por finalidade a obtenção dos objetivos propostos pelo referido projeto. Tais entrevistas foram transcritas na íntegra para a confiabilidade e fidedignidade dos relatos, onde solicitou-se a autorização para o uso do gravador.

Transcreveram-se e analisaram-se todas as informações obtidas mediante os instrumentos realizados categorizando a fala dos participantes o que permitiu a produção de ideias e hipóteses de acordo com as respostas das mesmas.

Segundo Turato (2010), a transcrição das falas consiste em um trabalho árduo, tarefa esta que permitirá ao pesquisador um momento de respiro a uma análise preliminar e consequentemente uma retratação ao período em que ocorreu a entrevista.

Essa forma de organizar os dados avaliou as respostas dos participantes da pesquisa, a fim de que pudessem ser analisadas adequadamente, onde fez-se necessário, a isto, organização dos dados mediante seu agrupamento em certo número de categorias temáticas. Ao final desta etapa, foi feita a seleção das falas consideradas mais relevantes, com as quais se validaram as conclusões e atribuições dos significados das mesmas (Lakatos e Marconi, 2017).

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Minayo (2010) reforça que a palavra categoria, em geral, se refere a um conceito que abrange elementos ou aspectos com características comuns ou que se relacionam entre si. As categorias foram empregadas para se estabelecer classificações. Nesse sentido, trabalhar com elas significa dizer que foram agrupados elementos, idéias ou expressões em torno de um conceito capaz de abranger tudo isso.

A pesquisa respeitou a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, preservando os preceitos éticos e passou por análise e aprovação do Comitê de Ética (Brasil, 2012). A fase de coleta somente iniciou-se após a aprovação e apreciação do Comitê de Ética em pesquisa da Universidade de Fortaleza.

As questões éticas são importantes devido à proximidade entre pesquisador e participante entendendo-se como uma relação social e política, pois nenhum homem tem o privilégio de escolher os participantes para um procedimento arriscado sem o conhecimento e acordo do indivíduo (Araujo, 2003).

Todas as informações obtidas foram preservadas de forma sigilosas de acordo com os princípios éticos que norteiam a preservação do paciente no caso da publicação do trabalho. Seguiu-se os quatros princípios básicos da bioética: autonomia, não maleficência, beneficência e justiça.

Foi estabelecido o respeito devido à dignidade humana onde é exigido que toda pesquisa se processe após consentimento livre e esclarecido dos sujeitos, indivíduos ou grupos que por si e/ou por seus representantes legais manifestem a sua aceitação à participação na pesquisa. Foi assegurado a manutenção do tratamento da sua dignidade, o respeito da sua autonomia e a defesa da sua vulnerabilidade.

Todos os entrevistados serão representados por codificação alfanumérica E1, E2, E3... E19 e E27, para representar os acompanhantes de modo a assegurar o seu anonimato.

O Estudo é um desdobramento do projeto de pesquisa: "Os recursos de atenção à saúde materno infantil no âmbito da saúde coletiva". A pesquisa obteve a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza - COÉTICA/UNIFOR sob Parecer de Nº 559.378.

3 Resultados e Discussão

Inicialmente traçou-se o perfil sociodemográfico dos entrevistados, os quais a faixa etária variou entre dezenove (19) e cinquenta e cinco anos (55); a maioria se concentrou no intervalo de dezenove (19) a vinte e nove anos (29). No tocante a escolaridade dos acompanhantes, aferiu-se que quatro eram alfabetizados, seis com o ensino fundamental incompleto, três o fundamental completo, cinco o ensino médio incompleto, oito o médio completo e apenas um era pós-graduado.

Quanto ao estado civil, oito deles eram casados, oito juntos, oito solteiros, dois divorciados e um viúvo. Com relação a base salarial, houve uma variação entre meio salário e seis salários mínimos, onde cinco ganhavam meio, dezesseis ganhavam um, três ganhavam dois, um ganha três, um ganha quatro e um ganha seis. No tocante ao parentesco do acompanhante com a paciente, constatamos que onze eram as mães, duas eram sogras, quatro irmãs, duas tias, cinco eram esposos, duas amigas, uma cunhada.

Após a minuciosa leitura em busca da validação dos dados, mediante a descrição cuidadosa das entrevistas por meio do agrupamento, descrição, documentação e classificação das falas, foram identificados os núcleos temáticos, surgindo as categorias: Desconhecendo o assunto; Violência

significando maus tratos; Respeitando o direito da gestante; Vivenciando violência no trabalho de parto; Agindo pelos seus direitos.

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indagou-se a respeito do conhecimento dos acompanhantes sobre violência obstétrica, em que os vinte e sete entrevistados afirmaram não ter conhecimento algum sobre o assunto.

“Num sei não.” (E7)

“É... violência eu sei, qualquer tipo de violência... é ruim e a gente não quer que aconteça qualquer tipo de violência.” (E19)

“Eu já ouvi falar, mas nunca entendi.” (E23)

Destaca-se que essas pessoas chegam na atenção hospitalar para acompanhar um momento singular na vida de uma mulher, e não sabem o que podem encontrar pela frente. Muitas até já sofreram violência obstétrica alguma vez, mas não sabem o que é, então respondem que não.

Outro questionamento revelou a existência de alguma orientação dos profissionais de saúde acerca do assunto, e mais uma vez os depoentes responderam que não.

Quando os acompanhantes não sabem nada acerca da temática, é mais provável que permitam constrangimentos, abusos e grosserias, os quais geram um impacto negativo no trabalho de parto daquela mulher, causando um descontrole emocional.

Os profissionais envolvidos no momento do parto devem esclarecer para a paciente e acompanhante o que pode acontecer, e que a mulher tem direito de se empoderar daquele momento, não permitindo atitudes que lhes deixem constrangidas (Andrade & Aggio, 2014).

Violência significando maus tratos

Indagou-se aos acompanhantes o que imaginariam que fosse violência obstétrica, a maioria, relacionou à agressão e abuso.

“Imagino mais ou menos. Assim, tratar ela mal... essas coisas assim.” (E3) “Na minha opinião é alguém que bate, judeia né.” (E9)

“Acho que maldade, sei lá... abuso né.” (E10)

Nesta categoria, constatou-se que alguns acompanhantes percebem o parto cesárea como uma violência contra mulher.

“Violência obstetra... se a gente for analisar a cesárea é uma violência quanto o feto né...” (E16) “Tipo fazer um cesáreo... não sei não... violência é uma pessoa que maltrata a outra né.” (E26)

Define-se como “violência obstétrica” uma forma de violência contra a mulher, atos realizados por profissionais da saúde em relação ao corpo e os processos reprodutivos das mulheres, ocorrendo ao longo do processo de parto. Esse tipo de violência ocorre através do excesso de intervenções e onde os processos naturais sejam medicalizados e patologizados (Medeiros et al, 2016).

As puérperas estão submetidas à realização do parto por meio de formas obsoletas, o que torna o parto um ritual. A escolha do parto cabe à parturiente, o ato de parir é da mulher. Entende-se que não é o fato do parto ser cesáreo ou vaginal que a parturiente estará livre de qualquer procedimento ofensivo ou violento (Nazário & Hammarstron, 2015).

É conciso enfatizar que mesmo que a mulher opte por um parto vaginal, há riscos e complicações que podem ocasionar em uma cirurgia cesareana, e que isto não será considerado uma violência obstétrica, afinal é a vida da mãe e do bebê que está em questão.

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1370 Respeitando o direito da gestante

Após a orientação e o esclarecimento aos participantes a respeito do assunto, investigou-se quanto a ter presenciado alguma vez violência contra a gestante, podendo ter sido não só no parto atual, mais em algum outro momento. A categoria em questão nos revela que a maioria dos acompanhantes não presenciaram violência nem no parto atual, nem nos demais que já acompanharam.

“Não. Ela não porque quando eu vim com ela, ela é o segundo parto já. O primeiro ela chegou aqui com a pressão muito alta, mas assim que ela chegou já colocaram logo ela no soro, já colocaram a plaquetinha né, que ia ser normal. Dele também do mesmo jeito. Ela fez o pré natal, a doutora encaminhou ela pra cá. Ela não ficou no primeiro dia porque não tinha leito, na verdade não tinha mesmo, porque no outro dia quando eu cheguei tava do mesmo jeito. Como ela já tava com as semanas e os dias, aí ficou né. Ela já veio em jejum e foi encaminhada, mais graças a Deus até agora ela tá sendo tratada muito bem. Até agora eu ainda não tive o que dizer não.” (E1)

“Nunca sofri violência. Oito partos, fui bem tratada.” (E8) “Não, graças a Deus foi tudo bem.” (E15)

Inegavelmente, o parto é um momento único e inesquecível na vida da mulher, quando o cuidado despendido pelos profissionais deve ser singular e pautado no protagonismo da mulher, tornando-o mais natural e humano possível. Distintamente de outros acontecimentos que necessitam de cuidados hospitalares, o processo de parturição é fisiológico, normal, necessitando, na maioria das vezes, apenas de apoio, acolhimento, atenção, e o mais importante, humanização (Andrade & Aggio, 2014).

Salienta-se que apesar de todas as barreiras que as gestantes atravessam, como falta de leitos vagos e peregrinação, os acompanhantes afirmaram que a maioria saiu satisfeita com a instituição da parturição.

“Trataram ela bem, teve o melhor atendimento.” (E23)

“Acho que todo mundo trabalha direitinho, pelo o que eu vi aqui, são poucos né que trabalham de mal grado. A gente mal ver entendeu. Todo mundo trabalha mesmo porque gosta, uma coisa muito bem organizada né.” (E27)

Os sentimentos de felicidade e bem-estar, manifestados nessa fase estão ligados basicamente ao nascimento do bebê. Com isso, ressalta-se que o processo de parto envolve um conjunto de dúvidas e preocupações que se iniciam na descoberta da gestação e permanecem latentes, surgindo quando a mulher pressente que o nascimento está por vir. Confirma-se em estudo que com o nascimento do filho, as mulheres mostram alívio pela superação da dor e de todo sofrimento, além de felicidade em poder ver o filho nos braços (Medeiros et al, 2016).

Vivenciando violência no trabalho de parto

O parto humanizado e o empoderamento da gestante encontram-se como foco nas discussões relativas às questões relacionadas ao seu corpo. Portanto, os profissionais se atualizam para ofertar a essa gestante a partuirição da forma mais confortável e confiante.

Porém, essa categoria destaca que ainda existem profissionais que tornam esse momento singular na vida de uma mulher, em um verdadeiro trauma.

“Ela passou uns dois dias sofrendo. Aqui foi um dia. Passou um dia sofrendo lá em Pacajús. Aqui pelejaram muito, mais não tinha passagem. Mandaram ela fazer o que elas tavam pedindo né. Mandaram muitas vezes ela ficar numas posição que ela não queria ficar. Tinha hora que queriam fazer o exame de toque e ela não queria deixar. Aí tinha uns que vinham e fazia. Tinha uma médica que enfiava a mão bichinha, chega tremia a mão dela assim. Queriam colocar ela de

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cócora, segurar uns ferro, aí ela não queria. Aí queriam colocar ela em cima de um tambor, tipo assim, um tambor. Ficou na bolinha também. Botaram ela de cócora e no tambor e ela não queria. Mesmo assim botaram.” (E9)

“Já presenciei. Eu vi as enfermeiras mandando ela calar a boca né, mandando parar de gritar, por causa que achou bom fazer, pra que tá gritando.” (E13)

“Ah, eu já vi essa violência. A mulher dizia, se cale, você num achou bom fazer, pois também ache bom parir. Você não tá sentindo nada. Cale a boca, fique aí. Aí veio um abençoado de Deus, no outro dia, médico e deu uma injeção, aí resolveu o problema.” (E21)

Segundo pesquisa da Fundação Perseu Abramo uma em cada quatro mulheres sofre violência obstétrica no Brasil. Entre as violências que ocorrem nas maternidades, estão: jejum forçado, isolamento, não permitir acompanhante, restringir a gestante ao leito, para que não se movimente, amarrar a parturiente à maca, utilizar meios farmacológicos sem autorização, induzir o parto, episiotomia, manobra de kristeller (quando a barriga é empurrada), não deixar que a mulher grite ou converse, agressões físicas e humilhações (Nazário & Hammarstron, 2015).

Agindo pelos seus direitos

Pesquisou-se acerca de como agiriam ao presenciar uma violência obstétrica. Essa categoria diz respeito aos que afirmaram que procurariam seus direitos e não ficariam calados.

“Ah, eu ia fazer um escândalo, do jeito que eu sou.” (E3)

“Ah minha fia, eu botava minha boca no trombone, eu ia atrás de fazer. Deixava por isso não.” (E5)

“Ai, eu ia tomar as providências né, acho que denunciar ele. Dizer pro hospital o que ele tá fazendo. Não pode ficar calada né.” (E14)

Segundo Diniz et al. (2015) várias instituições, como o Ministério Público, têm assumido a responsabilidade de enfrentar a cultura de desconhecimento dos direitos das mulheres nos serviços, compilando denúncias e convocando os responsáveis pelos serviços e pelo ensino para um diálogo sobre as mudanças necessárias. Tais iniciativas, provocadas por movimentos de mulheres, foram decisivas para promover um clima de reconhecimento dos direitos, até então inédito na sociedade brasileira.

Vale destacar, que foi relatado o fato de terem presenciado ou sofrido violência obstétrica, mas no momento ficaram assustadas e permaneceram caladas, acatando tudo o que lhes era imposto.

“Eu fiquei calada. A pessoa que eu fiquei disse, que eu não ligo não.” (E12) “Eu achei melhor me calar, porque ia sofrer mais.” (E21)

“Eu fiquei calada, ia bem levar carão também. Fiquei calada, na minha.” (E26)

Desde os tempos bíblicos, a dor tem sido associada à parturição, obrigando a parturiente a suportá-la e aceitá-la. A passagem bíblica de Genêsis 3, em seu versículo 16, retrata esse contexto, quando Eva prova o fruto do pecado original, induzir Adão a também pecar e recebe como punição a dor multiplicada na parturição (Andrade & Aggio, 2014).

4 Conclusão

Com a análise do estudo, constatou-se que é um tema desconhecido, pois muitos já sofreram algum tipo de abuso e não reivindicaram. Evidenciou-se que o conhecimento acerca do assunto é mínimo. Após esclarecimento e explicações, desperta a possibilidade de discorrer e enfrentar esse problema ou não.

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O sentimento de medo de perpetrar reclamações diante de uma situação de violência é forte e presente, porém a busca por direitos surge ainda que de forma tímida.

Conclui-se que é necessário informar a população acerca dos direitos adquiridos mediante do processo do parto e puerpério para que possam se empoderar desse momento tão singular e único na vida de uma mulher. Assim como, capacitar os profissionais para que não comentam o erro da violência obstétrica.

Referências

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Referências

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