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Se a terra te der laranjas, faz uma festa! Relação festaturismo e desenvolvimento local

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM TURISMO

ROSALMA DINIZ ARAÚJO

SE A TERRA TE DER LARANJAS, FAZ UMA FESTA! RELAÇÃO FESTA-TURISMO E DESENVOLVIMENTO LOCAL

NATAL/RN 2019

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ROSALMA DINIZ ARAÚJO

SE A TERRA TE DER LARANJAS, FAZ UMA FESTA! RELAÇÃO FESTA-TURISMO E DESENVOLVIMENTO LOCAL

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Turismo do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito final para a obtenção do título de Doutora em Turismo.

Orientador: Prof. Dr. Wilker Ricardo Mendonça Nóbrega.

NATAL/RN 2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Central Zila Mamede

Elaborado por Ana Cristina Cavalcanti Tinôco - CRB-15/262 Araújo, Rosalma Diniz.

Se a terra te der laranjas, faz uma festa! Relação festa-turismo e desenvolvimento local / Rosalma Diniz Araújo. - 2019. 260 f.: il.

Tese (doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Programa de Pós-Graduação em Turismo. Natal, RN, 2019.

Orientador: Prof. Dr. Wilker Ricardo Mendonça Nóbrega.

1. Festa - Tese. 2. Turismo - Tese. 3. Desenvolvimento local - Tese. 4. Políticas públicas - Tese. 5. Matinhas-PB - Tese. I. Nóbrega, Wilker Ricardo Mendonça. II. Título.

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SE A TERRA TE DER LARANJAS, FAZ UMA FESTA! RELAÇÃO FESTA-TURISMO E DESENVOLVIMENTO LOCAL

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Turismo do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito final para a obtenção do título de Doutora em Turismo.

Natal/RN, 12 de março de 2019.

BANCA EXAMINADORA:

Dr. Wilker Ricardo de Mendonça Nóbrega Universidade Federal do Rio Grande do Norte

Presidente

Dr. Silvio José de Lima Figueiredo Universidade Federal do Pará

Membro Externo

Dra. Zulmira Nóbrega Piva de Carvalho Universidade Federal da Paraíba

Membro Externo

Dr. Severino Alves de Lucena Filho Universidade Federal Rural de Pernambuco

Membro Externo

Dra. Maria Lúcia Bastos Alves

Universidade Federal do Rio Grande do Norte Membro Interno

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Dedico este trabalho e todas as minhas conquistas àquele que me deu régua, compasso e muito amor e dedicação, não só a mim, mas à minha família: meu pai, Leônidas Paulino de Araújo, “Seu Léo”, a pessoa que me ensinou sobre humanidade, simplicidade, dignidade e compaixão. Onde eu estiver, você estará comigo, meu pai!

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AGRADECIMENTOS

Meus primeiros agradecimentos são às pessoas mais especiais da minha vida: ao meu pai, Leônidas Paulino (in memoriam), à minha mãe, Marlene Diniz, e a meus irmãos Roberto (“Filezinho”, pessoa de coração enorme e puro), Robério (“Louro”, essa criatura doidinha que me deu meu primeiro violão, que até hoje pelejo para tocar), Rosilma (minha conselheira e pessoa de uma sabedoria enorme diante da vida), Romero (meu “gato preto” preferido, que me ensinou a dirigir e me abrigou em sua casa durante as disciplinas da tese) e Rômulo (meu companheiro das peripécias de infância, e que ainda continua com aquela mesma idade mental. Amém!). A essa família que me deu tudo de que eu precisava e preciso para ser feliz: amor, carinho, compreensão, zoeira, leseira e a imperfeição, que nos fazem discutir e buscar o melhor para cada um de nós, com muita lealdade e dignidade. Vocês são minha prioridade e minha maior fonte de amor!

Também agradeço à minha amada Tia Mira, pelo carinho e amor com que sempre me recebeu em Campina Grande, o apoio do meu cunhado Stephan Thomas Buehler e de Esdras Rebouças Nobre, pelo olhar que resultou em fotos maravilhosas que compuseram este trabalho.

E abro um parágrafo para falar da minha mãe. Para mim, as mães são sagradas e, em determinado momento da vida, passam a ser “filhas” que merecem a reciprocidade de todo o amor que nos dedicaram no decorrer de suas vidas. E tudo o que eu puder proporcionar à minha “gatinha” não medirei esforços para fazer. A alegria dela é a minha. Te amo, galega!

Agradeço também aos Deuses por ter colocado em meu caminho, em uma noite casual de férias em Jericoacara – CE, no ano de 2007, uma pessoa que, a partir de então, divide sua vida com a minha, e vice-versa. Meu companheiro, meu amigo, meu conselheiro, meu designer, meu italiano preferido. Nicola Muratori, você é o melhor marido que Cesare Battisti poderia ter me dado (risos). Te amo!

Agradeço aos meus amigos-irmãos de longa jornada, Cristiane Pereira (Manézinha) e André Gustavo (Maluco), por estarem comigo na alegria e na tristeza, na saúde ou na doença, no riso ou nas raivas que me fazem (hehehehehehe). E também a jornada de trabalho, cumplicidade e amizade com a precisão de Ilana Kiyotani (Belezinha) e as orientações corriqueiras de Esdras Matheus (Theu). Agradeço ao auxílio luxuoso da arte “cítrica” de Eduardo Lyra na cerimônia de apresentação da tese. Minha gratidão aos meus ex-alunos, amigos e parceiros de campo: Nágila Layana e Emerson Gomes, cujas fotos também compuseram este estudo.

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Sou extremamente grata aos professores Flávia Pires e Adriano de Leon da UFPB pela orientação metodológica quando da feição do Projeto de Tese, quando este ainda era semente. Agradeço também à música de Nathalia Bellar.

Agradeço ao médico Henrique Maia e à enfermeira Liélia Araújo, do Incor Taguatinga – DF, por devolverem o ritmo sinusal do meu coração em 14 de maio de 2014. Naquele dia, iniciei a 2a Temporada da história da minha vida, sendo grata também ao meu primo Marcelo Araújo pelo apoio fundamental quando da decisão da cirurgia. Nunca esquecerei o que você fez por mim, primo! Também, por isso, creio que uma força maior nos olha e nos guarda, de forma muito misteriosa.

Deixo também registrado o prazer que foi dividir as disciplinas do mestrado com essas cinco meninas superpoderosas: Cristiane Dantas, Andrea Cacho, Viviane Medeiros, Ilana Kiyotani e Artemísia Costa. E também agradeço imensamente ao PPGTUR (Programa de Pós-Graduação em Turismo da UFRN) e aos maravilhosos professores que nos deram cimento e tijolo para a construção da tese.

Agradeço à minha querida UFPB. Instituição que me abrigou na graduação, mestrado e agora como docente. E aproveito para agradecer ao melhor Presidente que este país já teve, Luís Inácio Lula da Silva e ao REUNI (Plano de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), que expandiram o ensino superior público e gratuito para os vários recantos desse imenso país.

Sou grata aos professores Sílvio Figueiredo, da UFPA, Severino Lucena Filho, da UFPB, Zulmira Nóbrega, da UFPB e a Maria Lúcia Bastos, da UFRN por terem aceitado o convite para participar da minha banca. E agradeço, especialmente, ao meu caro orientador Wilker Ricardo Nóbrega, por se dispor a encarar esse desafio comigo. Agradeço a educação, gentileza, sapiência e responsabilidade que dispensou a mim e a esta pesquisa.

E, por fim, agradeço ao povo de Matinhas. A todo acolhimento e recepção a cada porta em que bati, a cada pessoa que entrevistei, a cada conversa que tive. Vocês me ensinaram muito! Em especial, agradeço aos meus queridos D. Graça e Seu Naçu, que se tornaram meus anfitriões a cada visita. Todos vocês merecem um Brasil melhor!

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“O livro, bem como sabemos, é o tijolo com que se constrói o espírito”.

Darcy Ribeiro

“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para sua própria produção ou a sua construção”.

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RESUMO

O turismo, enquanto fenômeno social, que influi no modo de vida de quem visita e é visitado, foi cooptado pelos discursos e ações políticas como meio de desenvolvimento para um povo ou nação. As festas populares, de origens remotas e ainda hoje tão presentes como prática cultural, fazem parte do calendário turístico de muitas cidades do Brasil e do mundo, sendo muitas delas baseadas em alguma atividade agropecuária, ocorrendo, portanto, em sua maioria, no denominado meio rural. A presente pesquisa, a partir de informações coletadas desde 2009 e de uma pesquisa de campo empreendida em dezembro de 2017, buscou compreender como as festas populares incorporaram o discurso do turismo, a partir de projetos que proclamam a sustentabilidade econômica e sociocultural. Para tal foi utilizado o caso da “Festa da Laranja, Festival Nacional da Tangerina”, que ocorre comumente no período de outubro, novembro ou dezembro, na cidade de Matinhas, Paraíba. Assim, tem-se como objetivo central analisar as implicações da conexão “festa-turismo” para o desenvolvimento local. Para tal fim, utilizou de métodos qualitativos, instrumentalizados pelas entrevistas em profundidade, observação participante e notas de campo – nos quais o texto-contexto (escrito e oral) do falante é que irá direcionar o entendimento das questões. Como resultado da pesquisa em tela, percebeu-se que, no caso da Festa da Laranja em Matinhas, a conexão Festa-turismo se faz mais presente não na atividade turística em si, mas na presença das políticas públicas, desde a inserção da cidade no “Mapa do Turismo” aos recursos do Ministério do Turismo auferidos pela gestão municipal para a Festa da Laranja e outros eventos festivos. De forma colateral ou transversal, tal conexão movimentou as estruturas socioeconômicas e culturais do município, tornando-o mais conhecido, menos isolado e estimulando a autoestima e o sentimento de pertencimento entre os habitantes, o que também acabou por lançar sementes para que o município entrasse em outros espaços ou instâncias turísticas, como o “Fórum Turístico do Brejo Paraibano”. Por fim, o caso nos faz refletir sobre o que é turismo e o papel das políticas públicas de turismo no Brasil, levando em conta as microrrealidades das chamadas zonas rurais, observando que as festas populares são um locus relevante para pensar o desenvolvimento local, e que o turismo é um fenômeno que está presente, seja no discurso ou ações efetivas, em lugares onde não podem ser vistos a “olho nu”, dado que as pesquisas comumente se voltam para megaeventos, megaprojetos ou “megarrealidades”.

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ABSTRACT

As a social phenomenon that affects both the way of life of visitors as well as locals, the tourism activity has been taken by political actions and discourses as means of development for a certain community or nation. Traditional folk festivals of remote origins, still very lively as a cultural practice, are part of the events calendar of many localities in Brazil and in other parts of the world, most of them taking place in rural areas based on an agriculture and cattle farming activities. The present research, based on information collected since 2009 and a field research undertaken in December 2017, sought to understand how the popular festivals incorporated the discourse of tourism, from projects that proclaim economic and socio-cultural sustainability. For that purpose was used the "Festa da Laranja, Festival Nacional da Tangerina” (Orange Festival, National Festival of Tangerine), which occurs usually in October, November or December, in the city of Matinhas, Paraíba, Brazil. Thus, the central objective is to analyse the implications of the "festival-tourism" connection to local development. In terms of methodology, this research draws on qualitative parameters by means of in-deph interviews, participant observation and field study narratives, in which the oral and written text-context of those interviewed is the reference guiding the questions understanding. As a result, it showed that in “The Orange Festival”, in Matinhas, the connection “festival-tourism” is more present, not in the touristic activity itself, but in terms of the effectiveness of public policies, which leads Matinhas to feature on the “national tourism map” as well as to gain access to financial resources from the Ministry of Tourism earned by the local government to sponsor the Orange Festival and other festivities. In a collateral or transversal perspective, this connection moved the socio-economic and cultural structures of the locality, giving it visibility, turning it less isolated and stimulating the self-esteem and the belonging feeling among the inhabitants, what led Matinhas to achieve access to other touristic business spots as the “Fórum Turístico do Brejo Paraibano”. Eventually, this case study brought us to reflect about what the tourism activity is and the role of tourism public policies in Brazil, considering the micro realities of the called rural areas. Observing that popular festivities are a relevant locus to think about the local development, the tourism activity also proved to be a phenomenon which is present, either in the discourse or in effective actions in places that require a proper investigation, since research data deal with mega-events, mega-projects or “mega-realities”.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Festa do Palio de Siena na Itália ... 18

Figura 2 - Escultura do Taj Mahal feita de laranjas e limões na “Fête du Citron”... 20

Figura 3 - Corso noturno da “Fête du Citron” nas ruas de Menton-França... 20

Figura 4 - São João de Campina Grande no Parque do Povo ... 21

Figura 5 - Categorias de análise da pesquisa em tela ... 25

Figura 6 - Tipologia dos eventos planejados segundo Getz ... 54

Figura 7 - “Gincatange” e Fanta no lugar do suco de laranja-tangerina... 56

Figura 8 - Tangerinas para distribuição gratuita e produtos à base de laranja sendo vendidos no Parque ... 57

Figura 9 - Mapa de localização de Matinhas-PB e municípios limítrofes... 58

Figura 10 - Construção da Rodovia da Laranja e estrada de terra que dava acesso à cidade ... 59

Figura 11 - Estrada da Rodovia da Laranja (PB-101) recém asfaltada ... 60

Figura 12 - Placa anuncia o fim do isolamento de Matinhas através da PB-101 ... 60

Figura 13 - Vista aérea do município de Matinhas-PB ... 61

Figura 14 - Árvore de tangerina às margens da PB 101 ... 62

Figura 15 - Tangerina pokan em detalhe ... 62

Figura 16 - Plantação de macaíbas na entrada de Matinhas ... 63

Figura 17 - Rotatória na entrada do município em 2017 (A) e em 2018 (B) com balão alusivo à Festa... 63

Figura 18 - Centro de Matinhas - Rua Governador Antônio Mariz ... 64

Figura 19 - Prefeitura Municipal de Matinhas e detalhe das varandas coloridas no Centro da cidade ... 64

Figura 20 - Praça principal do município ... 64

Figura 21 - Placas institucionais com motivo da laranja ... 65

Figura 22 - Igreja São Sebastião - no Centro de Matinhas ... 65

Figura 23 - Indicação improvisada da localização das comunidades rurais ... 66

Figura 24 - Casa na comunidade de Cosmo da Rocha ... 66

Figura 25 - Igrejinha de São Severino, no Juá ... 67

Figura 26 - Localização geográfica das comunidades rurais de Matinhas e limites do município ... 68

Figura 27 - Restaurante e Bar do Peixe ou de “Beto do Peixe”- em Juá de Matinhas ... 69

Figura 28 - Caminhão-pipa no Centro de Matinhas ... 69

Figura 29 - Gráfico ilustrativo de queda da produção 2011-2012 ... 75

Figura 30 - Parque da Laranja visto do Palco ... 81

Figura 31 - Parque da Laranja em 2009 e em 2017 ... 82

Figura 32 - Show da Banda Arreio de Ouro no Parque da Laranja em dezembro de 2017 ... 82

Figura 33 - Flyers das Festas de 2009, 2010 e 2011, respectivamente ... 85

Figura 34 - Flyers das Festas de 2013, 2014 e 2015, respectivamente ... 85

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Figura 36 - Flyer da Festa de 2018, tendo pela primeira vez a presença de um padre

como atração ... 86

Figura 37 - Fofim do Acordeon (ao centro) e seus músicos Francisco e Sidinaldo ... 87

Figura 38 - Artesãs vendem seus produtos na Festa no domingo à tarde ... 88

Figura 39 - Parquinho montado na Festa no domingo à tarde ... 88

Figura 40 - População e turistas prestigiando a Festa da Laranja sob esquema de segurança ... 89

Figura 41 - “Árvore” dos atores da pesquisa em tela ... 145

Figura 42 - Adesivo exibe correção com lápis da mudança de data da Festa ... 153

Figura 43 - Laranjas sendo vendidas a 3 reais na Festa... 156

Figura 44 - Barraqueiros se preparam enquanto o público começa a chegar ... 157

Figura 45 - Outdoor da Festa da Laranja em Campina Grande ... 158

Figura 46 - Tangerina colhida do sítio de Seu José ... 160

Figura 47 - Terreno acidentado faz o trabalho da colheita ser ainda mais penoso ... 161

Figura 48 - Casa na zona rural com grades na janela ... 175

Figura 49 - Casa na zona rural sem água encanada ... 191

Figura 50 - Entrada da cidade e letreiro em construção ... 205

Figura 51 - Galpão e máquinas da Packing House abandonados ... 211

Figura 52 - A produção de banana precedeu a de laranja como principal atividade agrícola ... 215

Figura 53 - Vegetação seca margeia a PB-097 em São Sebastião de L. de Roça ... 217

Figura 54 - Pé de tangerina condenado pela seca ... 218

LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Categorias de análise e autores que embasam o corpo teórico da pesquisa em tela... 26

Quadro 2 - Correntes sobre a dicotomia festa-transgressão ou festa-conformação... .... 37

Quadro 3 - Ideias-chave de diversos autores sobre festa... ... 39

Quadro 4 - Classificação das festas adaptada de Amaral... ... 51

Quadro 5 - Festas ligadas à agricultura/economia na Paraíba... ... 53

Quadro 6 - Resumo das informações demográficas de Matinhas... .... 71

Quadro 7 - IDHM de Matinhas - municípios vizinhos e João Pessoa... ... 72

Quadro 8 - Representação dos índices do IDHM... ... 72

Quadro 9 - Dados sobre a produção de tangerina dos três maiores produtores da Paraíba ... 74

Quadro 10 - Cidades do brejo paraibano que figuram no Mapa do Turismo Brasileiro em 2017... ... 80

Quadro 11 - Edições da “Festa da Laranja-Festival Nacional da Tangerina” em Matinhas-PB... ... 83

Quadro 12 - Vinculação institucional e marcos da intervenção governamental no turismo... ... 106

(13)

Quadro 14 - Resumo dos dados demográficos dos habitantes... ... 148

Quadro 15 - Resumo questões fechadas para os turistas... ... 149

Quadro 16 - Datas da realização da pesquisa em 2017 e 2018... ... 158

Quadro 17 - A Festa foi uma boa ideia da Prefeitura para o município? ... ... 163

Quadro 18 - A Festa justifica os investimentos feitos? ... ... 163

Quadro 19 - O que sabe sobre projeto que deu origem à Festa? ... ... 168

Quadro 20 - A população foi ouvida na feição do Projeto da Festa?... ... 168

Quadro 21 - Qual a intenção do Prefeito em criar a Festa?... ... 170

Quadro 22 - Como era Matinhas antes e agora depois da Festa?... ... 170

Quadro 23 - Em que gestão a Festa é melhor?... ... 174

Quadro 24 - A Festa é necessária para Matinhas?... ... 176

Quadro 25 - A Festa é dos Prefeitos ou do povo do município?... ... 179

Quadro 26 - Características teóricas encontradas na Festa... .. 179

Quadro 27 - Gosta da ideia de Matinhas se tornar conhecida e atrair visitantes além do período da Festa? ... ... 184

Quadro 28 - A Festa traz turista para o município? ... ... 187

Quadro 29 - Visitantes dos municípios vizinhos é turista? ... ... 187

Quadro 30 - A Festa ajuda o produtor local a vender? ... ... 199

Quadro 31 - A Festa trouxe alguma melhoria para os habitantes de Matinhas?... ... 199

Quadro 32 - A Festa serve mais ao visitante ou ao habitante? ... ... 200

Quadro 33 - Quando se diz que a Festa promove a cultura local, o que você entende por isso? ... ... 202

Quadro 34 - O que a laranja significa para Matinhas? ... ... 203

Quadro 35 - A laranja é homenageada como se deve na Festa? ... 204

LISTA DE TABELA Tabela 1 - População rural e urbana no Brasil de 1960-2010... .. 122

(14)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... ... 14

1 A FESTA COMO EXPERIÊNCIA DA EXISTÊNCIA HUMANA... ... 29

1.1 A “FESTA-PRESENTE” NO BRASIL COLÔNIA... ... 33

1.1.1 De Dionísio a Apolo: será o fim da festa?... ... 41

1.1.2 Festa e Turismo: ritos ancestrais e moderno... ... 48

2 MATINHAS: A TERRA ONDE A LARANJA ESCOLHEU MORAR... ... 56

2.1 A “FRUTA DE OURO” NO MAPA DO TURISMO... ... 76

3 O TURISMO E SUAS RAMIFICAÇÕES NA FESTA... ... 90

3.1 “SLOGANS NÃO FAZEM TEORIA”: DIÁLOGO ENTRE SOCIEDADE E SUSTENTABILIDADE... ... 94

3.1.1 Turismo na Agenda Pública: uma questão estratégica... ... 101

3.1.2 Desenvolvimento como ampliação das possibilidades do viver... ... 116

3.1.3 Plantando laranja, colhendo turismo?... ... 120

3.1.4 O Discurso do turismo visita a Festa da Laranja... ... 129

4 METODOLOGIA DA PESQUISA... ... 138

4.1 UNIVERSO DA PESQUISA... ... 139

4.1.1 Plano de Coleta de Dados... ... 140

4.1.2 Técnica de Análise... 142

4.1.3 Atores da Pesquisa... ... 144

4.1.4 Critério de seleção dos habitantes... ... 150

4.1.5 Arranjo da pesquisa de campo... ... 151

5 DISCUSSÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS DA PESQUISA... ... 163

5.1 HISTORICIZAÇÃO DAS FESTAS POPULARES E LOCALIZAÇÃO DESTAS COMO INSTRUMENTO DA DIVERSIDADE DA OFERTA TURÍSTICA... ... 163

5.2 DEMONSTRAÇÃO DE COMO O TURISMO DO TURISMO ESTÁ PRESENTE NAS FALAS GOVERNAMENTAIS SOBRE A “FESTA DA LARANJA” E ANÁLISE DO TURISMO ENQUANTO INSTRUMENTO DA FESTA... ... 181

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5.3 PERCEPÇÃO SOBRE OS EFEITOS DA FESTA NO DESENVOLVIMENTO

SOCIOECONÔMICO E CULTURAL DE MATINHAS... ... 193

5.4 DEBATE SOBRE A PLURIATIVIDADE COMO UMA ALTERNATIVA DE DESENVOLVIMENTO PARA O MUNICÍPIO DE MATINHAS... .. 219

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS... ... 225

REFERÊNCIAS... .. 240

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14

INTRODUÇÃO

Prática que pressupõe deslocamento e afastamento do cotidiano, o turismo é classificado de diferentes formas e vieses, dependendo da área pela qual é estudado.

Barretto (2003) chama atenção para o fato de que é após a Segunda Guerra Mundial que a atividade turística ganha amplitude para solidificar o chamado “turismo de massa” na década de 1950, difundindo, mundialmente, as viagens para uma parcela maior da população.

De acordo com o balanço da World Tourism Organization (UNWTO), em 2014, o turismo internacional apresentou números recorde, “crescendo 4,4% para chegar a 1.135 milhões de turistas que cruzaram as fronteiras internacionais durante o ano, consolidando o crescimento após a crise econômica global e apesar de muitos desafios” (UNWTO, 2014, p.10). No Brasil, atualmente, temos que:

O turismo representa cerca de 9% do PIB e é responsável por 8% dos empregos da economia local, considerando as atividades direta e indiretamente ligadas à atividade. É o quinto no ranking de exportações atrás apenas do minério de ferro, da soja, do petróleo e do açúcar (Instituto Brasileiro de Turismo [Embratur], 2016, p.102).

Mas nem só de números vive o turismo, embora sejam eles a despertar a atenção de outras disciplinas, pois, após a fase inicial e de euforia sobre os ganhos econômicos que a atividade propiciara, sucederam-se algumas fases, até que hoje essa discussão vem à tona com contornos mais humanísticos e qualitativos. Assim, outras ciências que estudam o fenômeno vêm ganhando destaque, como a sociologia, antropologia e ecologia, por exemplo, uma vez que o turismo é um vasto campo de estudo que precisa do aporte de outras ciências para a sua compreensão. E, a partir do debruçar de várias ciências sobre a atividade, ao mesmo tempo em que é tomado como alternativa de desenvolvimento, também é visto como meio de promoção do encontro entre culturas diversas, gerando novas sociabilidades.

Como categoria que se insere comumente nos estudos da cultura, o objeto do presente estudo são as festas populares vistas dentro do contexto turístico. “Os eventos1 de comunidade locais podem ser definidos como atividades estabelecidas para envolver a

1

A categoria “eventos”, para fins estatísticos da atividade turística, comumente descreve o negócio de feiras, convenções, congressos, dados que podem ser encontrados na Associação Brasileira de Empresas de Eventos (ABEOC). Já a Associação Brasileira de Eventos (ABRAFESTA) trata dos números relativos a eventos sociais, como casamentos e formaturas, entre outros. Para dados e estatísticas sobre festas populares, em especial, não existe um orgão específico. Algumas informações são compartilhadas no Portal do Governo Federal.

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15 população local em uma experiência compartilhada” (Watt, 2004, p. 15). Para Nielsen (2002, p.236), “um evento turístico é qualquer acontecimento de curto prazo que, por objetivo expresso ou coincidência, atrai um número significativo de visitantes locais, nacionais ou internacionais”. Este autor ainda afirma que “nos casos em que o evento é fabricado (…) existe a clara intenção de divertir, entreter ou simplesmente atrair atenção, por algum motivo, seja por lucro, motivação política, presentes, recompensas, etc” (Nielsen, 2002, p.236).

Estudar eventos é fazer “uma viagem de longa data de descoberta sobre a natureza da cultura e da civilização”, afirma Getz (2007, s/n), evidenciando que o “Estudo de Eventos” é o campo acadêmico dedicado à criação de conhecimento e teoria sobre eventos planejados e significados ligados a eles, e que estes se baseiam, sobretudo, nas ciências sociais, na administração, nas artes, nas humanidades e em vários campos profissionais intimamente relacionados, inclusive nas políticas públicas.

Existem eventos de todo tipo e natureza. “Podemos tratar desde eventos realizados em pequenas comunidades até espetáculos internacionais com participantes de todo mundo”, ressalta Watt (2004, p. 15). A festa popular, realizada em municípios pequenos e aberta à população, configura, dentre tantos, um tipo de evento.

No Portal do Governo do Brasil2, em 2018, constam algumas estatísticas sobre as Festas populares que ocorrem no Brasil. O site diz que “Por todo o País há exemplos de festas populares que vão além do lazer. Elas causam impacto econômico, dão visibilidade às cidades que as sediam e, principalmente, reforçam a cultura regional como um dos ricos patrimônios do Brasil”. As festas juninas de Caruaru e Campina Grande reúnem, juntas, mais de 5 milhões de pessoas a cada ano; Belém do Pará recebeu cerca de 84 mil turistas em 2017 para os festejos do Círio de Nazaré, injetando cerca de 112 milhões de reais na economia do Estado; o carnaval no Sudeste e Nordeste no Brasil movimentaram mais de R$ 6 bilhões, em especial, nos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, no Sudeste, e Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte, no Nordeste; No Centro-Oeste, destaca-se a Festa do Divino Pai Eterno em Trindade, Goiás, enfatizando que esse tipo de turismo, na chamada “Capital da Fé”, é um dos responsáveis pelo impulsionamento do desenvolvimento local, sobretudo em época de festa. A procura por hospedagem na cidade de apenas 120 mil habitantes aumenta em até 70%, com impacto também na cadeia de restaurantes, venda de produtos religiosos e outros serviços. E, na Oktoberfest, em Blumenau, Santa Catarina, no ano de 2017, por exemplo, o superávit alcançado com a festa foi superior a R$ 4 milhões – 33% maior que no ano anterior

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16 – e, entre 2013 e 2017, o lucro da festa cresceu quase 85%, enquanto as despesas cresceram somente 33% (Governo do Brasil, 2018).

No entanto, a festa em foco no presente estudo não cabe nas estratégias da política nacional de turismo voltada para megaeventos (com megainvestimento, megainfraestrutura), como o Carnaval do Rio de Janeiro, ou mesmo a Copa do Mundo ou Olímpiadas. A festa em questão é muito mais local, e seu raio de amplitude geográfica é limitado, porém seus efeitos ou significados são igualmente relevantes para a compreensão de estratégias de desenvolvimento local.

Assim, para fins desta pesquisa, pretende-se dar visibilidade a uma festa localizada na região Nordeste, a “Festa da Laranja – Festival Nacional da Tangerina”, no município de Matinhas, Estado da Paraíba, criada com base em um projeto de desenvolvimento local sustentável.

A festa em questão cabe nas políticas de turismo atuais que apontam para um caminho de mudança na rota das estratégias de captação de turistas da capital para o interior, na busca da redistribuição da demanda turística para diminuir a saturação do centro (notadamente traduzido pelo turismo de “Sol e Praia”) e ocupação dos municípios periféricos ou interioranos.

A gênese desse direcionamento se dá em 1996, no governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, no momento em que é apresentada a nova Política Nacional de Turismo3 para o período de 1996-1999, “contendo dez objetivos estratégicos, entre os quais se destacam a descentralização, „conscientização‟ e articulação intra e extragovernamental” (Beni, 2006, p.21).

Dentre os programas vigentes de maior destaque atualmente, o Programa de Regionalização do Turismo (PRT) é parte integrante da Política Nacional de Turismo (PNT), que “pressupõe um modelo de desenvolvimento descentralizado, integrado e participativo” (Nascimento, 2012, p. 9). O Programa foi criado em 2003, no governo do Presidente Luís Inácio Lula da Silva, para, dentre outros, fomentar políticas de turismo mais justas e equitativas. A estratégia de descentralização das decisões começa a tomar fôlego a partir desse contexto.

3 A nova Política Nacional do Turismo, portanto, inicia-se no Ministério da Indústria, Comércio e

Turismo, em 1996, e, quando ainda em vigor, em 1998, o Ministério muda para Esportes e Turismo, sob o segundo mandato do governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. A pasta “Turismo” permanece vinculada ao Esporte até 2002. Em 2003, no primeiro mandato do Presidente Luis Inácio Lula da Silva, o turismo ganha um Ministério próprio.

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Uma diretriz do PRT, que se ajusta ao Nordeste brasileiro, é a desconcentração da oferta, fazendo emergir a força e a cultura das cidades interioranas. E assim, sob o paradigma da sustentabilidade, muitos projetos foram lançados para pleitear recursos estaduais ou federais e promover o desenvolvimento local e endógeno. É uma oportunidade que se apresenta para os gestores, com base no potencial produtivo de pequenos municípios rurais que, no Brasil, comumente comemoram a emancipação da cidade e/ou a colheita de sua lavoura4.

Matinhas é um dos municípios que formam o Brasil rural, muitos deles invisíveis aos habitantes das capitais ou grandes metrópoles, na importância que têm econômica e socialmente. A ideia embutida no Projeto de tal festa é o aproveitamento do potencial agrícola de seu munícipio por meio da produção destacada de tangerina no Estado e na região Nordeste, apresentando um cenário que une festa, lazer e trabalho, buscando, no turismo, um aliado ao desenvolvimento sustentável. Aproveitar a criação ou a agricultura para outras atividades é o que configura a chamada “pluriatividade5”, recurso que vem sendo utilizado para dinamizar as atividades produtivas no campo. De acordo com o Ministério do Turismo (MTur, 2013, p.49),

esse deslocamento para áreas rurais começou a ser encarado com profissionalismo na década de 1980, quando algumas propriedades em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, devido às dificuldades econômicas do setor agropecuário, resolveram diversificar suas atividades e passaram a receber turistas.

A Europa, pela própria história e tradição, é um caso a ser considerado nos estudos do turismo em ambiente rural. Tulik (2003) argumenta que o desenvolvimento do turismo rural6 na Europa serviu de modelo a sua implementação em diferentes localidades no Brasil com características peculiares referentes à cultura, estrutura fundiária, organização econômica, social e política. A autora supracitada (2003) demonstra que foi na década de 1960 que o “agroturismo” surgiu na Europa, desenvolvendo-se principalmente na Itália, e que iniciativas pioneiras de turismo rural ocorreram em Lages-SC, Estado onde há fortes influências culturais da colonização europeia.

4 No caso de Matinhas, um novo patamar de desenvolvimento para a cidade é pensado a partir do

potencial citrícola do município.

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Este debate, sobre campo e pluriatividade, está sendo amplamente discutido na literatura sobre “turismo rural5” e “campesinato”, vide autores como Ploeg (2008), Schneider (2009), Wanderley (2009),

Elesbão (2014), Elesbão e Teixeira (2011), Graziano Silva (2004), Sabourin (2011) e Medeiros e Falcade (2009), entre outros.

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Apesar da referência que se fará neste estudo ao “turismo rural”, respeitando a classificação dos autores que comporão o quadro teórico, os objetos-temas da pesquisa em tela serão referenciados como “turismo em ambiente rural”, pela especificidade do tipo de atividade de deslocamento que a Festa-objeto promove.

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A professora e pesquisadora Maria Nazareth Ferreira realizou, em 2005, um estudo sobre 28 festividades em 28 diferentes cidades do interior italiano. Destas, escolheu 17 festas mais representativas para a sua obra “As festas populares na expansão do turismo”. O estudo teve por objetivo a análise das festas populares de pequenas cidades italianas e sua inserção em projetos turísticos de base local, colocando a festa como um dos aspectos mais significativos da cultura, um “instrumento privilegiado para o entendimento dos fenômenos da comunicação e como „mercadoria‟ para a expansão do turismo” (Ferreira, 2005, p.23). Assim, Ferreira (2005, p.23) examinou festas recentes que remontam a épocas remotas, “onde antigos rituais agrários de diferentes origens eram praticados pelos povos itálicos desde o alvorecer da formação de Roma, para comemorar os momentos importantes de sua experiência cotidiana”, como os solstícios e o nascimento da primavera. Uma das mais famosas e importantes festas da Itália é o Palio di Siena, uma corrida de cavalos na “Piazza del Campo”, que ocorre desde o século XVII até os dias de hoje.

Figura 1 - Festa do Palio de Siena na Itália

Fonte: Livejournal (2018)

Ferreira (2005) destaca a desmesurada dimensão cultural que tais festas assumem numa sociedade.

Do ponto de vista científico, a festa é um singular objeto de estudo, contemplado por especialistas de todas as correntes. É tão significativo para o homem, como ser comunicativo e social, que se pode afirmar – como o faz Lanternari – que não existe sociedade humana sem festas. Assim, a festa sendo como é, uma categoria da cultura, é um espelho no qual o ser humano se reflete, buscando respostas para sua condição de precariedade frente à vida (Ferreira, 2005, pp.26-27).

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Ao apresentar a ação das entidades denominadas Pro Loco (“pró local”) nas pequenas cidades italianas que estão se preparando para entrar no mercado turístico, Ferreira (2005, pp. 39-40) demonstra como estas entidades são organizadas por cidade, formando a

Unione Nazionale Pro Loco d’Italia7

, que conta com 5.500 agências espalhadas pelo país.

São formadas por comerciantes, políticos, intelectuais, artesãos, operários, donas de casa, etc., ou seja, são associações sem fins lucrativos, democráticas, populares, formadas pela vontade política dos cidadãos, para o benefício do seu local de moradia (...). Prestam um importante serviço de assistência aos visitantes da cidade, funcionando como verdadeiras entidades de turismo nestas pequenas cidades onde não existe este organismo (...). São estas entidades que organizam a memória histórica de suas cidades, realizam seu calendário de festas religiosas ou laicas (...) (Ferreira, 2005, p. 40).

Ferreira (2005) demonstra que, nestes eventos, a tradição interage com a comunicação de massa e com a política, resultando em um complexo processo intercultural.

Também na Europa, um caso exemplar é a “Fête du Citron8”, ou “Festa do Limão”, na cidade de Menton, França, que reúne características semelhantes àquelas celebrações que se utilizam da produção agrícola local como símbolo distintivo e identitário do lugar. A festa reúne um conjunto de valores, símbolos e elementos que levam as pessoas a sentirem-se parte de um grupo, promovendo o turismo, o comércio e o senso de pertencimento entre seus cidadãos. Frutas críticas, flores, esculturas gigantes construídas com limões e laranjas, comidas, músicas, entre outros elementos, constituem a Festa, apresentando-se como expressões relevantes da cultura regional determinados em seus contextos sociais, políticos e econômicos. Percebe-se como a festa, combinada a elementos que a tornam um atrativo turístico, projetam a cidade e sua produção agrícola9 em nível internacional, dinamizando a economia e promovendo o desenvolvimento local. Menton e a festa são um exemplo de como a agricultura está inserida no contexto da pluriatividade,

7 A Unione Nazionale Pro Loco d’Italia (UNPLI) foi constituída pela primeira vez em 1962 na

cidade de Bassano del Grappa (região do Veneto). Foram assim denominadas pelo Estatuto Nacional, aprovado em Roma em 26 de Janeiro de 2008, unindo todas as Pro Loco italianas.

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Uma das primeiras festas que surgem quando da busca no Google pelo tema “Festa da Laranja” é a “Festa do Limão” de Menton com suas enormes esculturas feitas de limão e laranja. Esta festa foi objeto de estudo da pesquisadora nos anos de 2017 e 2018, meses de fevereiro e março, quando foram feitas observações de campo e entrevistas com a Secretária de Turismo da cidade, a Sra. Patricia Mertzig, e com um dos mais antigos e renomados produtores de Menton, o Sr. François Mazet, para a produção de um artigo científico.

9 A Secretária de Turismo de Menton, Patricia Mertzig, em entrevista à pesquisadora, conta que,

no início, a Festa era realizada com limão de Menton, o que se tornou inviável com o crescimento do evento e concomitante valorização da pequena produção de Menton para Chefs da cozinha francesa. Nos últimos dois anos, foi a Espanha quem abasteceu a festa de laranja e limão, pois conseguiu o direito, por meio de um leilão realizado anualmente para a escolha do fornecedor que oferecesse melhor custo-benefício.

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combinando produção agrícola e atividade turística, fazendo com que uma promova a outra e vice-versa.

Figura 2 - Escultura do Taj Mahal feita de laranjas e limões na “Fête du Citron”

Fonte: Acervo da autora, 2017.

Figura 3 - Corso noturno da “Fête du Citron” nas ruas de Menton-França

Fonte: Acervo da autora, 2017.

A “Fête du Citron” surgiu, oficialmente, em 1934, sob o patrocínio do Comitê do Festival de Menton. Portanto, ela tem suas raízes na iniciativa privada, sendo, posteriormente,

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realizada por meio da confluência de interesses múltiplos articulados entre a Prefeitura Municipal e vários setores privados e da sociedade civil mobilizados para fazer um grande espetáculo que projeta a cidade nacional e internacionalmente.

Diferentemente da festa-objeto do presente estudo, que foi concebida pelo Prefeito municipal no ano de 2005, a quem cabe todo o poder de articulação, as festas europeias ora mencionadas são idealizadas e gerenciadas pelo Estado, iniciativa privada, ou população local (ou mesmo pela combinação dos três setores), tendo como elemento comum, não importando quem as concebeu, uma forte participação da sociedade civil, seja no poder de decisão, seja como partícipe da celebração.

Outro estudo que merece destaque para fins da presente pesquisa é a tese “Festa à brasileira: significados do festejar no país que não é sério”, da antropóloga Rita Amaral, realizada em 1998. Relacionando os estudos da festa com o desenvolvimento da atividade turística no Brasil, a antropóloga demonstra que a festa vai muito além do festejar, a partir da análise de algumas das grandes festas que ocorrem em cinco regiões brasileiras (Oktoberfest, no Sul; Festa de N. Sra. de Achiropita e do Peão Boiadeiro, no sudeste; São João, no Nordeste; Círio de Nazaré e Festa de Parintins, no Norte e as Festas do Divino Espírito Santo no Centro-Oeste).

Para Amaral (1998), a festa adquire tríplice importância por sua dimensão cultural, por ser modelo de ação popular e também espetáculo – produto turístico capaz de revigorar a economia de muitas cidades.

Figura 4 - São João de Campina Grande no Parque do Povo

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O que existe em comum nas festas pesquisadas por Amaral é que elas figuram no calendário turístico de suas cidades, sendo o evento mais importante em termos de número de visitantes anuais e também pelo número de habitantes que envolvem, não somente movimentando a economia da cidade, mas promovendo um senso de participação e integração em prol da própria comunidade, despertando, assim, o senso cívico. Amaral (1998) declara que a festa foi (e continua sendo) tão importante para o país, que pode ser entendida como modelo de ação e participação do povo brasileiro, ou mesmo de vivência de uma experiência de cidadania alternativa. E essa é uma das proposições de Amaral em sua tese: a festa como propiciadora de um potencial de cooperação e transformação social.

Presvelou (2000, p.146) expõe que, “para corrigir os desequilíbrios de zonas rurais problemáticas”, existe toda uma estratégia de programas de ação que buscam a cooperação, multidisciplinaridade, plurissetorialidade na execução, “fundadas sobre uma abordagem territorial e ascendente (bottom-up approach)”, encarando o turismo em ambiente rural não como uma atividade isolada, mas como uma das ações do desenvolvimento sustentável, englobando várias preocupações, quais sejam:

a) a urgência de encontrar soluções apropriadas para os problemas concretos. Não existem receitas milagrosas e as soluções devem ser adaptadas às necessidades de cada região;

b) as soluções serão, em parte, inspiradas pela história, pela cultura, pelos usos e costumes locais e pelo potencial humano e financeiro de cada região (grifo

nosso);

c) a parceria e o diálogo devem caracterizar todas as fases de um programa (...) com as ONGs, os grupos locais, as cooperativas e com a iniciativa privada;

d) a “solidariedade” é um dos grandes princípios que explicam a realização de uma iniciativa comunitária (...);

e) todos os agentes envolvidos no desenvolvimento de uma zona rural precisam ter uma formação: indivíduos, grupos locais e agentes que trabalham em nível institucional. (...) Geralmente, a experiência desses agentes interventores consistia, até o momento, em coordenar a implementação de ações setoriais de desenvolvimento baseadas sobre a abordagem “descendente” (Presvelou, 2000, pp.146-148).

Da mudança de uma abordagem “ascendente” para uma “descendente”, com a população sendo protagonista das estratégias e ações para o desenvolvimento endógeno, Presvelou (2000, p.148) explica que “é necessária uma reaprendizagem, para que se possa trabalhar em projetos fundados sobre a abordagem participativa”, uma vez que “a implementação de ações de desenvolvimento do tipo ascendente exige conhecimentos, habilidades, e estado de espírito muito diferentes daqueles que requerem a simples prestação técnica de serviços de base territorial”.

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Bidou-Zachariasen (2006, p.21) declara que “os corações das cidades são hoje objeto de dinâmicas múltiplas e de reinvestimentos importantes, tanto de parte dos atores políticos e econômicos, como dos atores sociais. A cidade agora está no coração da economia mundial”.

Segundo Pérez (2009), é importante que se faça distinção entre dois modelos de relação entre urbanismo e turismo, demonstrando que existem “cidades turísticas” e “cidades com turistas”:

No primeiro modelo, as “cidades turísticas” obedecem a processos de “turistização” (Santos Solla, 2002:309) e monumentalização que mono funcionalizam a cidade, convertendo-a num espaço só orientado para o turismo, no qual os habitantes locais se subordinam aos interesses do turismo (…). Pelo contrário, uma “cidade com turistas”, integra o turismo como mais uma atividade da cidade, não de uma maneira mono funcional, mas sim polifuncional e multifuncional evitando, assim, os riscos de uma economia urbana de excessiva dependência face ao turismo. Neste tipo de

cidades o turismo é entendido como um efeito colateral. O primeiro objetivo será

sempre construir uma cidade habitável e o resultado será atrair turistas que colaborem nesse objetivo (grifo nosso) (Pérez, 2009, pp. 288-289).

No primeiro modelo, “cidades turísticas”, vê-se uma orientação para o mercado, onde Pechman (2014, p.214) observa um “enfraquecimento da experiência pública, que induz a que a cidade seja percebida não mais como lugar da vida coletiva, mas como arena de „oportunidades‟ para bons negócios”. O autor faz perceber o risco de se perder a paixão pela cidade e que esta não pode ser pensada só como um sistema de produção e consumo, mas deve ser considerada, também, de acordo com Portella, como um lugar de trocas subjetivas, carente de investimentos afetivos (Pechman, 2014). Em uma visão que se coaduna com o modelo da “cidade com turista”, descrita por Pérez (2009), Pechman (2014, p.219) afirma que “a cidade é um lugar de produção de sentidos para toda uma mecânica social, a única possibilidade da urbanidade”. No entanto, além do mercado, outra força age na dinâmica da ocupação do espaço. E é então que Castells (1980) chama a atenção para o fato de que o Estado se transforma no patrão dos serviços públicos estruturadores da vida cotidiana.

Assim, o presente estudo se debruçará sobre uma festa criada pelo poder público para ser “doada” à população, ou seja, pensada de forma descendente, de “cima para baixo (up to down)”. No entanto, o sentido da festa parece ultrapassar ou mesmo escapar do controle de origem, pois sua dimensão simbólica evoca e provoca a natureza humana, pois, como anuncia Duvignaud (1977), citado por Perez (2012, p.21), “a festa é muito mais do que a festa”. Para Perez (2012, p.33), “a festa é o ato mesmo de produção da vida e não sua mera reprodução. Por isso, mais que descrever a festa, como usualmente se faz, ou mesmo explicá-la, parece que o caminho mais rentável é compreendê-explicá-la, talvez mais ainda, apreendê-la”. Para

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24 esta autora, “as festas são pontos estratégicos para formular questões sobre a vida social”, ponto de vista também compartilhado por Groppo (2005):

É intrínseco à festa se relacionar de modo ambíguo e dialético com a vida cotidiana. Cabe discutir, enfim, como a festa popular se relaciona, no mundo contemporâneo, com a vida cotidiana transformada pelo capitalismo e pela indústria cultural, processos que também transformam – e provavelmente, também transtornam – os significados e as formas de festa popular. (Groppo, 2005, p.28).

O turismo moderno nasce dentro de uma lógica capitalista de atuação, com ênfase em seus efeitos econômicos para, atualmente, dentro da mesma lógica, buscar um desenvolvimento mais equilibrado e justo, requerendo, para tal, o suporte de disciplinas das Ciências Humanas. A festa parece ter feito o percurso inverso da história da expansão do turismo, como se perdesse seu caráter simbólico para entrar na lógica do capitalismo e transformações da indústria cultural10. De acordo com Amaral (1998, p.39),

festeja-se sempre algo, mesmo quando o objeto seja aparentemente irrelevante. A função do símbolo parece não estar então, simplesmente, em significar o objeto, o acontecimento, mas em celebrá-lo, em utilizar todos os meios de expressão para fazer aparecer o valor que se atribui a este objeto.

O objetivo principal do “Projeto Festa da Laranja” demonstra que ela nasce para promover transações necessárias ao aumento da competitividade da laranja produzida em Matinhas no mercado regional, a fim de gerar emprego e renda para a região do brejo paraibano. Segundo o então prefeito da cidade e idealizador da festividade, Aragão Júnior, a Festa da Laranja,

se propõe a ser o maior evento do gênero na região (...) visando se transformar em um produto turístico para o estado da Paraíba, de forte apelo cultural por preservar as tradições do povo na área da culinária, do artesanato e da produção artística11.

É válido destacar que tais manifestações populares representam uma das vertentes da oferta turística brasileira, surgidas por tradição religiosa, ou mesmo por serem ligadas à produção econômica de um lugar (como a agricultura ou pecuária), e são relevantes manifestações culturais de um povo, embutindo um sentido muito maior do que, simplesmente, atrair turistas. Elas mudam a feição do lugar e podem significar uma alternativa de desenvolvimento local por meio do incremento da economia, da melhoria da qualidade de

10 Refere-se ao surgimento de uma cultura, que teve lugar na passagem do século XIX para o

século XX. Uma cultura popular industrial, de cujos esquemas, pouco a pouco, passou a depender a formação da subjetividade da maioria da população (Rudiger, 2004).

11 Retirado do site http://www.festadalaranja.com.br/v2010/. Este já não se encontra mais em

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vida da população e autoestima do povo. Ao menos é este o discurso do projeto de sustentabilidade em que se baseia o evento objeto do presente estudo, fazendo-se mister compreender que o projeto foi pensado para a festa, e este inclui o turismo, pois tal festividade existe desde 2005, e a inserção do turismo nela se faz de forma mais efetiva a partir de 2009, quando o município recebe verba do Ministério do Turismo. Assim, o foco do estudo não é a Festa no turismo, é o turismo na Festa.

Para tal, buscou-se o estabelecimento de algumas categorias de análise que pudessem fornecer elementos teóricos para balizar e contextualizar o estudo, seja na construção dos instrumentos de pesquisa, seja na discussão dos resultados. Assim, buscou-se ordenar as categorias sequencialmente, tomando a festa que se apropriará do Turismo, para analisar como estas, margeadas por discussões de cunho político e econômico, desembocarão na problemática do desenvolvimento local, também considerando que tais categorias vão conformar esse diálogo em uma superposição de fatos.

Figura 5 - Categorias de análise da pesquisa em tela

Fonte: Dados da Pesquisa, 2018.

Portanto, a festa – mantida há 13 anos – utilizar-se-á de uma política pública proposta pelo Ministério do Turismo, e os discursos e ações políticas vão ser publicizados, no intuito de ratificar a importância da atividade para o município. Em termos econômicos, vai-se utilizar como justificativa o devai-senvolvimento de forma sustentável para a região por meio da festa que promove a citricultura, principal cultura do município. O turismo entra, então, como um elemento agregador ou transversal, cuja função será divulgar e disseminá-la,

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tornando-a um ponto atrativo para negócios e visitação, no sentido de transformar Matinhas na “Terra da Tangerina/Laranja”, promovendo-a econômica, social e culturalmente. Neste momento, a investigação se orientará na busca do entendimento sobre o que é turismo, verificando, a partir daí, se ele existe mesmo na cidade, compreendendo seus usos e funções e se o mesmo atua como propiciador de desenvolvimento (e que tipo de desenvolvimento?). Para obter tais respostas, serão confrontados dados teóricos e da pesquisa de campo, por meio do discurso de “atores-chave” para a discussão do tema. Uma pista para tal entendimento nos dá Perez (2012), quando observa que “as festas são pontos estratégicos para formular questões sobre a vida social”. Uma das questões é, então, revelar mais sobre o turismo mediante os elementos que a festa pode fornecer.

A seguir, o Quadro 1 apresenta as categorias propostas e os principais autores que compõem a discussão teórica das mesmas.

Quadro 1 - Categorias de análise e autores que embasam o corpo teórico da pesquisa em tela

Categorias Autor-ano

Festa Duvignaud (1983), Amaral (1998), Durkheim (1999), Del Priore (2000), Rosa (2002), Itani (2003), Ferreira (2005), Groppo (2005), Bakhtin (2008), Brandão (2010), Perez (2011, 2012).

Política Viana (1988), Arretche (1996), Deubel (2002), Souza (2006, 2007), Beni (2006), Fratucci (2014).

Economia Castoriadis (1997), Max-Neef (1998), Swarbrooke (2000), Boisier (2001), Carvalho (2006), Fernandes (2006), Redclift (2006), Brandão (2008), Cano (2010). Turismo Smith (1989), Amaral (1998), Santana (2000), Ruschmann (1997, 2000), Swarbrooke (2000), Krippendorf (2000), Barretto (2001, 2003), Boyer (2003), Ferreira (2005), Groppo (2005), Jafari (2005), Costa e Souza (2010), Fratucci (2014), OMT (2017). Ploeg (2008), Schneider (2009), Elesbão (2014), Elesbão e Teixeira (2011), Aliste (2014).

Fonte: Dados da Pesquisa, 2018.

A presente tese, portanto, buscará compreender como as festas populares, a partir de projetos que proclamam a sustentabilidade econômica e sociocultural – utilizando o caso da “Festa da Laranja, Festival Nacional da Tangerina”, no interior da Paraíba – incorporou o discurso do turismo como meio de desenvolvimento local e que implicações esta conexão “festa-turismo” tem para a população em termos econômicos e socioculturais. Assim, tem-se como objetivo central analisar as implicações da conexão “festa-turismo” para o desenvolvimento local. Como objetivos periféricos, buscar-se-à:

1. Historicizar as festas populares e localizá-las como instrumento da diversidade da oferta turística;

2. Demonstrar como o discurso do turismo está presente nas falas governamentais sobre a “Festa da Laranja”;

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3. Analisar o turismo enquanto instrumento da Festa, identificando aspectos que demonstrem “se há” ou “que tipo” de turismo se desenvolve no município em virtude da Festa;

4. Analisar a percepção dos atores envolvidos na Festa quanto aos efeitos socioeconômicos e culturais causados pelo evento que influem no desenvolvimento do município.

5. Discutir a pluriatividade como alternativa socioeconômica para o município de Matinhas-PB.

A escolha do presente tema justifica-se: a) pela aproximação entre sociologia e antropologia no estudo do turismo e das festas populares; b) no ambiente rural, dar voz àqueles que não representam o saber hegemônico; c) debruçar um outro olhar sobre o campo que comumente é estudado com ênfase em seus aspectos agrícolas; d) contribuir para a discussão das políticas públicas de desenvolvimento econômico e sociocultural baseadas na atividade turística.

O percurso da pesquisa se inicia com a busca de informações e aprofundamento sobre o tema por meio de dados secundários, utilizando-se de uma revisão bibliográfica (abrangendo autores clássicos e atuais que nos forneçam teorias pertinentes ao tema) e documental, em meios como livros, artigos, teses, dissertações, sites governamentais, matérias jornalísticas, etc. Como fontes primárias, foram entrevistados os responsáveis por instituições governamentais relacionados diretamente ao tema, bem como foi ouvida uma parcela da população de Matinhas afetada pela Festa. Para tal fim, foi utilizado o método qualitativo, com entrevistas em profundidade e observação participante, nas quais o texto do falante e o contexto do pesquisador subsidiaram o entendimento das questões.

Para formar o arcabouço teórico que vai nortear o entendimento das questões abordadas neste estudo, foram construídos capítulos ou seções. Na “seção 1”, trabalhou-se o tema “festa” em diferentes e complementares perspectivas, partindo de um recorte temporal para destacar a sua presença em diversas civilizações. Neste momento, a festa é evidenciada como experiência da existência humana, abordando, em seguida, as do Brasil Colônia e a influência portuguesa, que contribuiram para a formação cultural do “ser brasileiro”, demonstrando como ela vai perdendo seu caráter mítico para entrar na lógica da “festa-função”. Em seguida, o conceito da festa utilitária é aprofundado com a denominada “Indústria Cultural”, e os diálogos se pautarão no questionamento sobre a possibilidade de a festa, como manifestação natural do homem, “subversiva” (Dionísio), ainda encontrar brechas

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para existir no âmbito da festa funcional-midiática, “controlada” (Apolo). E, por fim, é feita uma aproximação entre festa e turismo, como ritos, um ancestral e outro moderno, na capacidade que têm de afastar o homem de seus fardos. Na “seção 2”, o município de Matinhas foi caracterizado em seus aspectos demográficos, socioeconômicos e culturais, destacando a cultura da laranja-tangerina como fruto-símbolo da região e sua inserção no “Mapa do Turismo” brasileiro. Na “seção 3”, o turismo é abordado de forma interdisciplinar, com a discussão do papel do fenômeno turístico na sociedade, nas estratégias de sustentabilidade, na política, no desenvolvimento local, destacando a pluriatividade como alternativa. E, finalmente, como o discurso do turismo invadiu a “Festa da Laranja”, utilizando informações secundárias para preparar o leitor para a discussão e a análise da pesquisa de campo que irá descortinar a fala-contexto dos atores-chave, cujo “embate” será fundamental para responder à pergunta-problema: “quais as implicações da conexão “festa-turismo” para o desenvolvimento local?”, tomando o município de Matinhas como um caso, uma microrrealidade.

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1 A FESTA COMO EXPERIÊNCIA DA EXISTÊNCIA HUMANA

Comemoração, celebração, culto, ritualização, cerimônia, festividade, etc. Tantas manifestações do homem ao longo do tempo cabem no que, historicamente, denominou-se “festa”.

Mas desde quando, em que lugares e por que os homens festejam? Não existe uma resposta, mas várias. “Não se sabe exatamente quando aparecem as primeiras festas. Elas podem estar entre as manifestações de algumas civilizações antigas há mais de dez mil anos” (Itani, 2003 p.19).

Há menções da origem das festas na Índia, Egito, Mesopotâmia, China, etc. Mas a maioria dos registros que nos chegam narram a história da Civilização Ocidental12. A iconografia (mosaicos, cerâmicas, pinturas rupestres, pinturas em tela, etc.) nas antigas civilizações, revelava-as, demonstrando o quão antigo é o ato de festejar.

Na Bíblia, no Antigo Testamento (entre 1.200 e 165 A.C), é o próprio Deus (Jeová) quem determina a realização de festas, indicando datas, períodos e sacrifícios, e, no Novo Testamento (século 1 A.C), há passagens significativas da valorização das celebrações quando Cristo delas participa, deslocando-se, muitas vezes, de locais distantes para delas fazer parte (Amaral, 1998).

Tais informações são apenas retalhos de uma infinidade de relatos sobre festividades que remontam a tempos e povos distintos. Aqui será feito um recorte, não seguindo uma sequência histórica, pois não é objetivo deste estudo, mas evidenciando a importância e relevância das festas através do tempo e em sociedades distintas, como manifestação humana, natural e social, que perpassa gerações, dos nossos antepassados ao que somos hoje.

O tempo da festa e na festa está sobremaneira ligado ao calendário, à tentativa de apreensão, compreensão e controle do tempo pelo homem. Este tem uma relação estreita com o semear e colher. Para Itani (2003 p.21), “o processo de criação dos calendários e a organização do tempo são parte das experiências mais ricas da civilização13”. Esta autora

12 Como bem observa Lessa e Bustamante (2005, p.16), o que sobrevive e passa à posteridade é

resultante de um processo seletivo, quer da memória, quer da documentação, disponibilizando para o pesquisador não o conjunto do que existiu e foi, mas o que restou do que foi registrado, após escolhas e seleções diversas ao longo do tempo.

13 Há mais de um século foi descoberto, na Ilha de Anticícera, na Grécia, um artefato

(denomimado Antikythera, nome original da ilha em grego) com o qual se podia medir as fases da lua, pois estas “eram extremamente úteis na época dos gregos antigos”, pois, baseado nelas, “determinavam-se épocas de plantio, estratégias de batalha, festas religiosas, momentos de pagar dívidas e autorizações para viagens noturnas”.

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(2003) reitera que a festa não pode ser compreendida separada da história da humanidade e da tentativa de domínio do ambiente, pois a compreensão do tempo era uma das preocupações essenciais do homem, começando pelos ritos da colheita e pelo processo de criação do calendário14. “Observando os movimentos dos astros, as mudanças da Lua e as posições do Sol, as comunidades agrícolas utilizavam as festas como instrumento de marcação e, concomitantemente, celebravam o tempo de semear e de colher (...)”, comemorando também os frutos do trabalho, que serviam de oferenda e agradecimento e, ao mesmo tempo, de manifestação do regozijo coletivo.

Ferreira (2005), Itani (2003), Perez (2012) e Groppo (2005) dialogam no sentido de demonstrar que tais festividades, desde os primórdios, eram utilizadas pelo homem como instrumento de celebração do sagrado, por meio de ritos e oferendas aos Deuses, presentes nos costumes de vários povos, transmitidos e transformados de geração a geração, percorrendo os séculos até os dias atuais. São presença constante em nossas vidas individual e coletiva, regulando-as no ritmo de sua ininterrupta sucessão no calendário; tem fundamentos da própria humanização, entendida como a capacidade humana de criar cultura, símbolos e identidades, permitindo imaginar, ensaiar e até viver novos valores, novas formas de sociabilidade e novas relações com o mundo à nossa volta.

Para Del Priore (2000), o tempo da festa tem sido celebrado ao longo da história como um tempo de utopias, fantasias e liberdades, de ações burlescas e vivazes, quando a celebração se faz no interior de um território lúdico, onde também se exprimem frustrações, revanches e reivindicações dos vários grupos que compõem uma sociedade.

Em se tratando do legado de civilizações antigas, não há como negar a herança das festas da Grécia Antiga (cerca de 700 a 400 anos A.C) e do Antigo Império Romano15, que se espraiaram pelo mundo, a exemplo das festas gregas dionisíacas, em honra ao Deus Dionísio16, e que se relacionavam tanto com as estações do ano, colheita e fertilidade, como com os prazeres hedonísticos das festas regadas a vinho, nas quais as pessoas eram tomadas

Recuperado em 17 maio de 2017, de

https://www.terra.com.br/noticias/brasil/mecanismo-de-

antikythera-o-objeto-mais-misterioso-da-historia-da-tecnologia,4ad9bdfc6fbb1fa879e7208cac3ed8908aq1v5w9.html.

14 “A história do calendário moderno, contudo, é também a história da dominação da civilização

europeia, a partir da Idade Média, impulsionada sobretudo pela Igreja Católica, que passa a organizar os ritos festivos. O domínio do tempo, representado pelo calendário, se torna instrumento de poder” (Itani, 2003 p.26).

15 Também denominada Roma Antiga ou Civilização Romana, compreende o período que durou

cerca de 4 séculos A.C, até cerca de 4 séculos D.C.

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Uma das festividades dionisíacas mais significativas eram as “Anthestérias”. Estas comemoravam “a abertura dos tonéis de vinho fabricado por ocasião da última vindima do outono, em associação com a chegada da primavera e com o advento da brotação” (Fernandes, 2005, p. 207).

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pelo êxtase e por impulsos de transgressão das regras vigentes. A mais significativa delas é o carnaval e suas variações.

Tobia (2005, p.165), observa que “los conceptos de fiesta y memoria estuvieron siempre presentes en la concepción griega de las relaciones del ser humano con su trayectoria existencial”. E demonstra que as festividades gregas, seja ligada a Deuses ou à Mitologia, estavam estreitamente vinculadas com a intenção de preservação da memória para manter intacta a identidade do povo grego. Fernandes (2005) assim explica esse processo:

O cidadão pode melhor compreender a sua cidade, observando-a através do espelho invertido da festa. A prazerosa confraternização em tempos de licenciosidade, liberdade e transgressão fortalece os laços comunais e renova a ordem social. Os atenienses se tornam mais conscientes de sua identidade cultural pelo fato de poderem participar de um período de alegre suspensão de seu estado de ateniense. A festa apresenta um meio simbólico de a cidade vivenciar a anomia como forma de ampliar seus limites, reler seus modelos e se colocar “à prova” de tempos em tempos. (Fernandes, 2005, pp. 210-211)

A suspensão temporária da ordem, provocando estados de conscientização e subversão, marcavam o tempo da festa na Grécia e também no Império Romano. A festa subvertia os princípios estabelecidos em uma sociedade de ordens, como era a romana, em que a população se envolvia muito mais diretamente, a exemplo das “Saturnalia” e “Floralia”, herança de antigos cultos agrários (Mantas, 2006). A Saturnalia (que acontecia cerca de 500 anos A.C) era realizada em dezembro, “mês em que se inicia a germinação de plantas, consistindo numa grande celebração de abundância, consagrada a Saturno, em uma espécie de grande carnaval, com situações burlescas e grande liberdade, a ponto dos escravos darem ordem aos donos, que os serviam”. Para Mantas (2006, p.42), um motivo muito mais profundo para a realização de festas é que estas comemoravam, “sob o manto da renovação da natureza, a ideia que lhes estava subjacente, a da continuidade das comunidades humanas”.

Carcopino, revela que, na capital romana, na época dos imperadores antoninos (que compreende de 138 a 161 anos D.C), “a população de Roma dispunha de pelo menos cento e oitenta dias de festas diversas, por ano” (Carcopino citado por Mantas, 2006, pp.38-39). O número de festa dava a medida da importância destas na sociedade romana, a ponto de “considerar-se a civilização romana como uma civilização do lazer e do espetáculo (...)”. Para Mantas (2006, p.50), a real importância delas estrutura-se, na civilização romana, em torno de ideias que, mesmo reconhecendo o conceito de trabalho (labor), “conheceram uma evolução irreversível no sentido da valorização do lazer como um direito ou um prêmio merecido pela conquista do mundo (...)”. Portanto, vê-se a festa, momento de trégua e regozijo, como

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