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Democracia e política na gestão educacional: limites e perspectivas de uma gestão democrática

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE MESTRADO

Linha de Pesquisa: Políticas Educacionais, Planejamento e Gestão da Educação

DEMOCRACIA E POLÍTICA NA GESTÃO EDUCACIONAL

Limites e perspectivas de uma gestão democrática.

MARÍLIA TEIXEIRA MIRANDA SILVA

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MARÍLIA TEIXEIRA MIRANDA SILVA

DEMOCRACIA E POLÍTICA NA GESTÃO EDUCACIONAL

Limites e perspectivas de uma gestão democrática

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco para obtenção de título de mestre.

Linha de pesquisa: Políticas Educacionais, Planejamento e Gestão da Educação.

Orientadora: Profª. Drª Alice Miriam Happ Botler.

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AGRADECIMENTOS

À profa. Dra. Alice Mirian Happ Botler, pela orientação competente desta pesquisa e pela atuação profissional ética;

Ao prof. Dr. Evson Malaquias de Moraes, pela credibilidade e incentivo;

Aos meus pais, Mário Fernandes e Célia Fernandes por todo apoio e motivação; Aos colegas da turma 29, pela parceria, incentivo e contribuições;

A Karla Crístian, pela amizade, incentivo e parceria em todos os momentos desta empreitada;

Aos professores e funcionários do Programa de Pós- Graduação em Educação da UFPE; A Jany Barros pelas contribuições durante a pesquisa;

Aos demais amigos que torceram por mim e me motivaram; Aos entrevistados, pela valiosa colaboração;

À Banca que avaliou esta dissertação e pela rica contribuição; Ao meu Deus, que pela fé me fez forte pra chegar até aqui.

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RESUMO

O presente estudo teve como objetivo analisar o processo de democratização da gestão educacional de um município em processo de emancipação política. Buscaram-se identificar os entraves que permeiam as ações dos sujeitos envolvidos nesse processo e as reais possibilidades de superação de uma cultura autoritária. Partimos do pressuposto de queé a partir do contexto micropolítico e microssocial que se efetivam (ou não) as demandas macropolíticas do âmbito educacional. A fundamentação teórica nos permitiu compreender que a formação social pode ser afetada pela concepção de democracia, cidadania e pelas políticas públicas estabelecidas, mas é no âmbito das micropolíticas que se encontram subsídios para compreendermos a cultura organizacional que determina o modelo de gestão efetivado, e é nas relações de poder que se encontram, a partir das ações conscientes dos sujeitos, os mecanismos necessários para o compartilhamento do poder e construção de novas realidades A pesquisa qualitativa realizada via estudo de caso no sistema educacional do município de Abreu e Lima em Pernambuco utilizou como instrumentos de coleta de dados a observação participante, entrevistas e análise documental, para uma maior aproximação e compreensão do nosso objeto de estudo, cujos dados foram analisados à luz de Bardin (1977). Constatou-se que as determinações macropolíticas no âmbito educacional não são suficientes para a real efetivação e desenvolvimento de práticas democráticas na gestão educacional e escolar do município. Verificou-se que as concepções dos sujeitos sobre democracia, participação e autonomia denotam entendimento sobre as demandas políticas e seus limites, porém suas ações ainda são restritas e limitadas a ditames formais do sistema de ensino. Dessa forma ainda são limitados os desdobramentos necessários à superação de um paradigma de gestão centralizador e autoritário. Nessas condições, as práticas desenvolvidas pelos sujeitos detentores do poder reproduzem uma cultura autoritária e burocrática com relações desiguais de poder. Sendo assim, concluímos que as práticas vivenciadas na gestão educacional municipal são pautadas por uma cultura centralizadora. No entanto, as relações de poder estabelecidas nesse processo vêm ganhando novas configurações a partir dos conflitos que se intensificam entre a gestão educacional e os professores da rede. Logo, afirmamos que o desenvolvimento de uma gestão efetivamente democrática enfrenta ainda muitas limitações, mas o contexto de mobilização docente contra as posturas autoritárias vem delineando uma etapa fundamental para a construção de uma nova cultura mais participativa e democrática no município, configurando a escola e suas relações como uma arena política.

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ABSTRACT

The present study aimed to analyze the process of democratization of the educational management of a municipality in the process of political emancipation. We sought to identify the barriers that permeate the actions of those involved in this process and the real possibilities of overcoming an authoritarian culture. We assume that is from the micro and micro-political context that take place (or not) the macro policies of the educational demands. The theoretical framework allowed us to understand that the social formation can be affected by the conception of democracy, citizenship and the public policies established, but it is within the micro grants that are to understand the organizational culture that determines the management model is in effect and power relations that are, from the conscious actions of individuals, the necessary mechanisms for the sharing of power and the construction of new realities Qualitative research conducted via a case study in the educational system of the municipality of Abreu e Lima in Pernambuco used as instruments for data collection participant observation, interviews and document analysis, to a greater approach and understanding of our subject, whose data were analyzed according to Bardin (1977). It was found that the determinations macro policies in the educational field are not sufficient for the proper enforcement and development of democratic practices in educational administration and the school council. It was found that the subjects' conceptions about democracy, participation and autonomy, show understanding of the political demands and limits, but their actions are still restricted and limited to the dictates of the formal education system. Thus are limited developments needed to overcome a management paradigm centralized and authoritarian. Under these conditions, the practices developed by individuals in power, reproduce authoritarian and bureaucratic culture with unequal power relations. Thus, we conclude that the practices experienced in managing municipal education, are guided by a culture of centralization. However, the power relations established in this process are gaining new settings from the conflicts that intensify between educational management and school teachers. Hence, we affirm that the development of an effective democratic management still faces many limitations, but the context of mobilizing teachers against authoritarian postures comes outlining a key step for the construction of a new more participatory and democratic culture in the city, the school and its setting relations as a political arena.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CPqD COMUDE CONAE CI

Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Conferência Municipal de Educação Conferência Nacional de Educação Comunicado Interno

IBGE INEP

Instituto Brasileiro de Estudos Geográficos

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

LDB LDO

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Lei de Diretrizes Orçamentárias PDE PT SISMAL SIMPROFAL SEDUC TCE

Plano de Desenvolvimento da Educação Partido Trabalhista

Sindicato dos Servidores Municipais de Abreu e Lima Sindicato dos Professores de Abreu e Lima

Secretaria de Educação Tribunal de Contas do Estado

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

CAPÍTULO 1. DEMOCRACIA E EDUCAÇÃO: DA RAZÃO À AÇÃO ... 17

1.1. Os sentidos da democracia ... 17

1.2. A democracia na teoria liberal ... 21

1.3. Uma busca pela superação ... 23

1.4. Educação e democracia ... 25

CAPÍTULO 2. O PODER NA ORGANIZAÇÃO ... 30

2.1. O poder e suas formas de dominação na perspectiva de Max Weber ... 33

2.2. A moderna administração burocrática como forma racional de dominação ... 34

2.3. Análise do poder na perspectiva de Bourdieu ... 36

2.4. Análise do poder na perspectiva de Foucault ... 40

2.5. A escola como organização política ... 43

CAPÍTULO 3. DELIMITANDO O CAMINHO METODOLÓGICO DA PESQUISA ... 48

3.1. O estudo de caso ... 50

3.2. O processo de coleta dos dados ... 51

3.3. Características políticas do município de Abreu e Lima ... 55

3.4. Secretaria de educação de Abreu e Lima... 57

CAPÍTULO 4. A ESTRUTURA EDUCACIONAL DE ABREU E LIMA: entre a tradição centralizadora e a perspectiva democrática. ... 59

4.1. Gestão democrática: concepções e perspectivas ... 60

4.3. Perspectiva de democratização na gestão municipal de educação: a eleição de gestores como mecanismo de participação ... 75

4.4. Carreira no magistério público municipal: o regime de trabalho. ... 78

4.5. Construindo uma nova cultura ... 83

4.6. A criação de uma nova identidade sindical: o surgimento de novas formas de relações de poder ... 85

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 93

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 98

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INTRODUÇÃO

No Brasil, a década de 1980, sob o ponto de vista político, é constituída de uma atmosfera de lutas que visam mudanças quanto à participação da sociedade civil no compartilhamento do poder e controle estatal. Surge, então, um cenário otimista no projeto democrático-popular, no qual a participação ativa da sociedade em diversos movimentos ganha espaço e aquisição de direitos básicos. A Constituição de 1988 apresenta uma conquista social no avanço de ideais democráticos, contemplando, como princípios fundamentais para a democratização na esfera pública, a descentralização político-administrativa via municipalização, a abertura de oportunidades igualitárias aos cidadãos no gozo de direitos civis básicos como educação e saúde, e garante a participação popular na concepção e na implementação das políticas públicas. Tais diretrizes viabilizam a constituição de uma cultura de participação nos municípios brasileiros com vistas à democratização da esfera pública. A partir de então, a educação passa a ser reforçada como um direito social, considerando aspectos norteadores da política educativa e fortalecendo uma visão de democratização do ensino público.

Essa temática tem sido amplamente discutida, principalmente a partir da promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9.694/1996, que apresenta as diretrizes que norteiam a educação nacional voltada para a democratização da escola pública a partir da gestão democrática. As questões que envolvem a descentralização do ensino, a autonomia da gestão escolar e sua democratização fazem parte de muitos estudos e debates na educação brasileira e se inserem num contexto de aspirações pela democratização das nossas instituições educacionais. A intensificação desse debate

reflete não só a importância da esfera educacional como subsídio para a democratização social, mas também as dificuldades e limitações quanto a sua realização, pelas inevitáveis resistências que enfrenta um processo de mudança e

também pela complexa multiplicidade de concepções decorrentes. As análises efetivadas até o momento, no entanto, parecem ainda não esclarecer as nuances culturais que interferem nas mudanças decorrentes das novas regulamentações, o que denota uma limitação no avanço da cultura democrática.

Essa prática é construída de maneira intensa e exige envolvimento, estudo e esforço em prol de uma compreensão política para, assim, poder nela atuar.

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Pesquisadores têm mostrado através de experiências reais que a implantação ou processo de democratização da gestão escolar e do ensino público tem sido um grande desafio em nossa realidade. Dentre eles, Araújo (2003) e Arruda (2003)desenvolveram estudos que tratam sobre a gestão da educação, participação, autonomia e

descentralização da gestão. Esses autores destacam um paralelo entre as possibilidades

de construção de uma gestão democrática e os obstáculos que se configuram para a implantação dessa proposta.

Sales (2004) analisa a cultura escolar e a construção da gestão democrática sob o enfoque da cultura organizacional. Na referida pesquisa, a autora faz um breve recorte dos aspectos políticos e sociais que ao longo dos anos serviram de base cultural que subsidiaram a gestão educacional e as práticas educacionais vigentes. A autora utiliza-se de análise documental e observação não participante, além de entrevistas semiestruturadas com perguntas definidas para aproximar-se e compreender o cotidiano escolar em suas várias conexões e captar a interpretação dos atores dessa comunidade escolar no que se refere à democratização do ensino.

Botler (2004) tratou da escola como organização comunicativa, analisando a organização escolar na perspectiva do conflito entre o modelo de gestão democrática que vem sendo difundido pelas políticas educacionais e a construção democrática no interior da escola. A autora buscou ainda compreender a cultura escolar através de padrões de comportamento e análise das relações de poder, enfatizando-as como uma estratégia que possibilita ou não a formação de uma cultura democrática. A referida pesquisa utiliza-se de um estudo de caso com observação participante, entrevistas estruturadas e semiestruturadas para a captação dos significados atribuídos pela comunidade escolar sobre democracia, organização escolar, princípios e valores da prática educacional, embasada por uma abordagem sócio-histórica. A autora compreende que a democracia como valor vem se desenvolvendo no cotidiano escolar refletindo as demandas políticas de democratização, considerando as observações das manifestações culturais que se apresentam e que estruturam as relações de poder presentes nesse processo.

Nos trabalhos de Pedrosa (2005) e Nóbrega (2005), a gestão democrática é abordada a partir do projeto político-pedagógico, que é visto como pressuposto ao desenvolvimento da autonomia escolar.

Nos estudos realizados por Melo (2005), Andrade (2005) e Matos (2006), podemos observar a relevância das questões pertinentes à participação social com

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vistas à democratização da gestão educacional e escolar através dos conselhos escolares e municipais de educação. Nesses estudos constata-se a fragilidade do processo de participação da comunidade escolar, bem como as dificuldades dessa comunidade em integrar esses espaços de forma consciente e democrática.

Neves (2006) analisa, através do orçamento participativo, o impacto provocado pela inovação democrática e pela gestão participativa sobre a cultura política popular. Mortatti (2006) analisou, em seus estudos, o orçamento participativo da cidade de Araraquara-SP como instrumento de gestão democrática sob a hipótese de que esse mecanismo de participação popular viabiliza a construção da cidadania e outros espaços de participação popular com vistas a uma mudança cultural quanto à participação consciente da população. A autora adota a metodologia qualitativa com base na pesquisa-ação, já que é também agente participante da pesquisa e utiliza como instrumento de pesquisa a observação e entrevistas.

Já nos estudos desenvolvidos por Marques (2007), analisam-se os significados da gestão escolar democrática nas escolas públicas, através de práticas discursivas, no intuito de compreender as mudanças geradas pelas políticas de

descentralização/democratização da educação e suas possibilidades de contribuir para

a democratização da sociedade. A autora traz como objeto de estudo a gestão democrática escolar a partir da política educacional e dos conselhos escolares.

Bizerra (2008) apresenta uma análise sobre as concepções democráticas e traça uma investigação de caráter teórico-documental sobre o processo de globalização e suas implicâncias nas políticas educacionais, identificando os modelos de gestão que se configuram na atualidade e as possibilidades de democratização das nossas instituições.

No trabalho desenvolvido por Santos (2009), buscou-se analisar a cultura como um lócus de instauração do imaginário social brasileiro que produz e que também é produto das significações que dão sentido à cultura escolar, interpretada pelo autor como cultura “doméstico-clientelista”. Sendo assim, o autor busca como foco principal de sua pesquisa estudar as significações imaginárias da sociedade a partir da escola, sua ligação com as formas de poder político e as relações que são estabelecidas no seu cotidiano. Nesse contexto a escola é percebida como parte constitutiva e formadora da identidade social brasileira.

Souza (2010) analisou as significações imaginárias de democracia que permeiam a gestão educacional e as dificuldades existentes para a efetivação da democracia no município de Santa Cruz do Capibaribe e constata que existe um

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discurso de gestão democrática, fortemente ligado à política de resultados. Além disso, a autora ressalta que a cultura democrática desenvolvida pelos sistemas políticos que conduzem a educação municipal se distancia dos valores democráticos de emancipação e participação que terminam afastando os cidadãos dos processos de tomada de decisões, principalmente nos assuntos pertinentes à escola.

Diante dos estudos apresentados, podemos observar que a democratização, além de ser um processo complexo em nosso contexto social e institucional, ainda apresenta obstáculos que não podem ser vistos superficialmente. Queremos dizer com isso que o processo de democratização hoje é cada vez mais visto como aspecto que exige um olhar aprofundado sobre a cultura e as singularidades locais.

De acordo com Candau (2001, p.9),

A instituição escolar está construída sobre a afirmação da igualdade, enfatizando a base cultural comum a que todos os cidadãos e cidadãs deveriam ter acesso e colaborar na sua permanente construção. Articular igualdade e diferença, a base cultural e expressões da pluralidade social e cultural, constitui hoje um grande desafio (...).

Nesse sentido, é preciso considerar não só os elementos políticos constitutivos dos processos de gestão democrática, nem apenas penetrar no campo cultural e considerar seus elementos mais amplos, mas também identificar as dinâmicas que se

processam nas relações pessoais, no cotidiano vivido. É nessa linha de investigação

que seguimos.

Algumas Considerações Sobre o Campo de Estudo

Em minhas experiências enquanto professora das séries iniciais do ensino público, no município de Abreu e Lima, pude perceber contradições entre os discursos políticos e as práticas vigentes nas relações de gestão da educação e escolar que nos fazem refletir sobre qual democracia estamos vivenciando e sobre qual projeto de sociedade almejamos. Na qualidade de técnica em gestão educacional da Secretaria de Educação de Pernambuco, em atividades desenvolvidas e nas observações feitas a partir de dados e visitas às escolas, pude perceber as dificuldades e conflitos gerados pelo modelo de gestão gerencialista implantado pelo governo do estado e as práticas que vêm sendo desenvolvidas no interior das unidades de ensino e de gestão da educação. Como

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membro integrante do Sindicato dos Professores de Abreu e Lima (SINPROFAL), fundado em 2011, observei, através das dificuldades enfrentadas pelo grupo e pela resistência da administração municipal quanto à formação desse sindicato e de um espaço político de lutas e discussões, que ainda existe um distanciamento entre o discurso da democracia e a sua materialização. Essas vivências foram de fundamental importância para o delineamento do objeto de análise da presente pesquisa.

É importante destacar que o município de Abreu e Lima apresenta algumas particularidades que serviram de motivação para o desenvolvimento do estudo: por ser um município com emancipação relativamente recente, o que nos permite analisar de maneira mais precisa seus processos de formação política através da instituição escolar via secretaria de educação (SEDUC) e pela ausência de estudos que analisem as questões referentes às políticas de gestão educacional nesse município.

Em 1994, pela primeira vez, um quadro de professores efetivos tomou posse e ingressou na carreira de magistério, aprovados no primeiro concurso público para professores polivalentes do município. Com o passar dos anos, o aumento da população no município e, consequentemente, de alunos, resultou na contratação de mais professores em regime CLT. Apenas em 2008 foi realizado o segundo concurso público para professores. Com o ingresso desses novos professores em 2010, boa parte dos antigos professores com contratos temporários foram demitidos, muitos deles bem próximos da aposentadoria, o que gerou uma sensação de revolta e injustiça por parte dos servidores em educação da cidade. É importante salientar que a maioria dos professores que exerciam suas funções no município não eram efetivos (concursados), ou seja, uma situação que, segundo professores mais antigos, enfraquecia o poder político da categoria e limitava o desenvolvimento de um campo político mais sólido e ativo.

A presença de um novo quadro de professores efetivos trouxe algumas transformações à realidade desse município, não só nas questões que envolvem condições de trabalho e garantia de direitos, mas também no cenário político da cidade.

Em maio de 2011, insatisfeitos com a situação de desvantagem devido a salários, condições de trabalho e espaço político, numa assembleia convocada pelo sindicato dos servidores municipais da cidade, um grupo de professores foi eleito pela maioria para representar uma comissão integrante no referido sindicato com vistas a estabelecer algum diálogo com o governo local em prol dos direitos estabelecidos por lei à categoria. Após algumas tentativas frustradas de negociação e diante de contradições

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políticas entre a nova comissão e os representantes do sindicato dos servidores do município, foi dado início a um processo de fundação de um sindicato de classe, o

que demarca, a nosso ver, um salto qualitativo no sentido da emancipação política da classe docente no município, bem como o delineamento de uma “arena política”. É

importante destacar que durante os trinta anos de emancipação política, Abreu e Lima ainda não possuía um sindicato de professores. Apenas a partir de 2011, após a

mudança do quadro de professores, surge a iniciativa de fundação de um sindicato de

classe.

O contexto de lutas políticas e contradições que se instalou no município a partir do processo de fundação sindical tomou proporções mais amplas no contexto político da cidade e nos fez refletir sobre o processo de democratização da educação nesse município, por entendermos a relevância dessas questões para o desenvolvimento de práticas democráticas condizentes com um projeto de sociedade mais justo. Nesse sentido, compreendemos que não se esgotam as possibilidades e necessidades de se mergulhar nessa temática, tendo em vista o caminho de contradições acerca das práticas e processos de democratização, bem como as várias interpretações por que passa o sentido de “democracia” em nossa sociedade.

Foi a partir da necessidade de identificar possíveis limites à construção de uma gestão democrática condizente em suas práticas que delimitamos como objetivo geral

da presente pesquisa:analisar o processo de democratização da gestão educacional do município de Abreu e Lima no tocante às ações/iniciativas materializadas com o intuito de promover a partilha do poder entre a Secretaria de Educação e as Escolas.Nessa direção, apontamos como objetivos específicos:

Investigar os influentes político-sociais da cultura nacional que perpassam

as relações sociais no interior da secretaria de educação do município;

Identificar as concepções de democracia, autonomia e participação expostas

pelos membros da unidade de gestão (secretaria de educação e escolas da rede);

Analisar como as políticas de democratização têm influenciado e/ou se

materializado nas práticas de gestão através das concepções dos gestores educacionais (secretário de educação e gestores escolares) e professores, bem como as ações desenvolvidas a partir dessas relações.

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Para atingir tais objetivos, consideramos necessário compreender como a democratização da gestão já estabelecida legalmente vem se materializando nas instituições de gestão da educação, quais sejam: a Secretaria de Educação e as Escolas.

Nos estudos apresentados anteriormente, pudemos encontrar uma forte presença de aspectos tomados como categorias de análise, como participação, autonomia democracia, entre outros. Assim, na presente pesquisa, buscamos refletir a respeito do que está por trás das práticas de gestão educacional, o que fizemos tomando as concepções de democracia, os discursos presentes e as relações interpessoais dos atores que participam e que são corresponsáveis pelo processo de materialização das políticas de educação e de democratização no município de Abreu e Lima.

A gestão democrática se constitui num dos maiores desafios da gestão educacional e do ensino e, nesse sentido, torna-se relevante o estudo abordado nessa pesquisa, à medida que se faz necessário compreender os impasses e possibilidades de se avançar nessa temática, principalmente quando se refere ao aspecto cultural, por estar intimamente ligado à constituição da concepção de democracia ou “democracias” que se compõem ou se contrapõem no atual cenário político. Como já assinalamos, muitos embates e pesquisas sobre a gestão democrática da educação no Brasil podem ser encontrados, porém pouco ainda se tem discutido sobre qual democracia se propõe diante das diferentes concepções da mesma. O enfoque no qual é discutida a gestão

democrática neste estudo nos possibilita compreender como a formação social pode ser afetada pela concepção de democracia, cidadania e pelas políticas públicas estabelecidas.

Nesse sentido, apresentamos alguns questionamentos que nos ajudam a orientar nossas reflexões. São eles: Que ações têm sido planejadas e executadas pela gestão educacional com vistas à concretização da democratização da educação no município em análise? Qual tem sido o resultado das ações desenvolvidas pela SEDUC Abreu e Lima no tocante à democratização do ensino? Como têm sido interpretadas essas ações pela escola pública sob a ótica de gestores escolares e professores? Qual é a concepção de democracia exposta pelos sujeitos inseridos nesse processo? As práticas “democráticas” estão condizentes com o discurso exposto? Quais significações culturais vêm orientando as práticas de gestão educacional?

A gestão democrática estabelecida legalmente representa um avanço nas possibilidades de democratização educacional e escolar, embora ela não possa ser considerada como um receituário que orienta como se deve agir nas diversas situações

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vivenciadas quanto a sua regulamentação. Nessa direção, a legislação nacional estabelece marcos macropolíticos, mas compreendemos que as práticas se efetivam no âmbito micropolítico, ou seja, é nos aspectos microssociais que podemos apreender como as práticas se materializam na realidade de seus contextos. Sendo assim, é sob essa ótica que analisamos a gestão educacional e escolar numa perspectiva democrática em seus aspectos mais peculiares, com o intuito de apreendermos suas limitações e possibilidades de avanço.

Compreendemos que o desenvolvimento de práticas democráticas é fundado na liberdade e autonomia dos sujeitos que, no gozo de seus direitos podem de maneira consciente intervir e reconstruir suas próprias leis e sua própria realidade de acordo com suas necessidades (CASTORIADIS, 2002). Nessa direção,“a gestão democrática ocorre na medida em que as práticas escolares sejam orientadas por filosofia, valores, princípios e ideais conscientes, presentes na mente e no coração das pessoas, determinando o seu modo de ser e de fazer” (LUCK, 2011, p. 41). Para esse fim, acreditamos que se faz necessário que as relações de poder, sejam pautadas na interação dialógica e na reconfiguração de práticas autoritárias e centralizadoras de poder.

Para o desenvolvimento do estudo proposto, delimitamos como lócus da pesquisa a Secretaria de Educação do Município do Abreu e Lima-PE. Buscamos um aporte teórico que embasou nossa pesquisa a partir dos aspectos citados acima, enfatizar algumas categorias como: democracia, autonomia, relações de poder, gestão

educacional.

Dessa forma organizamos nosso trabalho em quatro capítulos. No primeiro

capítulo apresentamos uma análise sobre o conceito de democracia e seus princípios

fundantes; em seguida trazemos as características da atual democracia, baseada nos princípios do Estado liberal e suas implicações nas políticas públicas, especialmente nas políticas educacionais; salientamos algumas perspectivas de modelos democráticos de gestão como base para uma construção educacional mais justa e participativa; nessa perspectiva ressaltamos a necessidade do compartilhamento do poder no âmbito social e educacional, tomando a gestão da educação como um espaço que deve ser ocupado pela coletividade com vistas à democratização da educação e da sociedade.

No segundo capítulo apresentamos uma abordagem sobre o poder e seus

mecanismos de dominação. Tomamos como base para a compreensão da instituição educacional e escolar a análise micropolítica através das relações de poder que se estabelecem nas instituições. Nosso intuito no estudo das relações de poder foi o de

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compreender a cultura que se manifesta no contexto institucional e principalmente na instituição educacional enquanto arena política, através das suas peculiaridades, da dinâmica do dia a dia, das relações interpessoais e dos conflitos inerentes a essas relações. Buscamos enfatizar a gestão educacional e escolar como um espaço político no qual o compartilhamento do poder pode contribuir significativamente para a democratização escolar e exercício da cidadania.

O terceiro capítulo trata do caminho metodológico da nossa pesquisa empírica,

seus fundamentos e procedimentos. Nessa direção, desenvolvemos uma pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso. Fizemos uso de análise de conteúdos para o processamento dos dados coletados e para o aprofundamento da nossa pesquisa documental. Fizemos uso ainda de entrevistas semiestruturadas e observação participante para uma melhor compreensão do nosso objeto de estudo. Ao longo do capítulo apresentamos as características políticas do município em análise bem como do nosso lócus de pesquisa.

No quarto capítulo, apresentamos a descrição e análise dos dados coletados.

Procuramos, a partir dos documentos que norteiam as práticas e ações da SEDUC e sindicato dos professores, confrontar a realidade vivenciada no município com as determinações legais no tocante à gestão democrática da educação. Buscamos também apreender a concepção dos sujeitos envolvidos nesses processos nos aspectos referentes à democracia, gestão democrática, relações de poder e participação. O esforço na síntese das análises apresentadas bem como a reflexão sobre o contexto analisado nos permite uma maior aproximação com a realidade vivenciada no contexto educacional do município, ampliando nossa compreensão sobre os aspectos limitadores de uma construção democrática na gestão educacional e escolar que valorize a participação e compartilhamento do poder entre a população.

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CAPÍTULO 1. DEMOCRACIA E EDUCAÇÃO: DA RAZÃO À AÇÃO

A gestão democrática da educação no Brasil tem sido amplamente discutida e pesquisada nos meios acadêmicos e órgãos centrais dos sistemas de ensino. Contudo é ainda incipiente, no âmbito de tal debate, uma reflexão sobre qual democracia se propõe, frente às várias modalidades da mesma. Buscando a contextualização da temática e considerando sua relevância para o avanço da qualidade no nosso sistema de ensino, partimos de uma análise sobre as diferentes acepções em torno do termo democracia que surgem de acordo com os contextos históricos a que são relacionadas.

Duriguetto (2007) apresenta uma análise sobre o conteúdo da democracia na tradição liberal. Bobbio (1986) faz referência ao que chama de concepções mínimas para o desenvolvimento de uma democracia substancial, trazendo suas reflexões sobre a atual situação da democracia. Procuramos abordar ainda, de maneira breve, outras concepções trazidas sob a ótica de outros autores como forma de apresentar novas tendências democráticas que emergem na contemporaneidade, objetivando uma possível superação de práticas democráticas desarticuladas presentes hoje em nossa sociedade e principalmente nas políticas e práticas de gestão da educação. Segundo Silva (2010):

é frente a esse horizonte ético-político que são contrapostos “modelos” de democracia para se investigar a gestão da educação. Os modelos são reapresentados no sentido de indicar formas de democracia que têm sido não apenas concebidas filosoficamente, mas também historicamente construídas e que têm sido apresentadas como “paradigmas” da gestão democrática (op. cit. p.35)

Os modelos de democracia apresentam concepções ético-políticas muitas vezes divergentes, exigindo práticas de gestão democrática diferenciadas, o que contribui para gerar, em muitas situações, a negação da própria essência democrática. É através dos modelos de democracia que a gestão das políticas públicas e, mais especificamente, as políticas de educação encontram suas bases de materialização.

1.1. Os sentidos da democracia

O termo democracia, em seu sentido epistemológico, significa “o governo do povo”, ou “governo da maioria” (ROSENFIELD, 1984, p. 3). Foi na Grécia Clássica que teve início o processo democrático, um regime que tinha como essência a soberania

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que, por sua vez, ultrapassava as barreiras do transcendental para encontrar sua base na autonomia e liberdade humana, um sistema político reconhecidamente auto-instituído e que deu origem à filosofia. Para entendermos melhor o surgimento da democracia clássica, apoiamo-nos em Castoriadis (2002). Ele ressalta que o processo de instauração da democracia se deu em oposição à heteronomia, em que considera como sociedade heteronômica aquela caracterizada pelo “fechamento da significação”, ou seja, qualquer questionamento que possa ser colocado nessa sistemática se encerra nela mesma. Isso significa uma negação da essência das criações ou do imaginário criativo autônomo, das instituições imaginárias da sociedade, em que a resposta para o que está posto se encerra na transferência para o transcendental ou divino. Nessas sociedades não se reconhece que as leis são obras das instituições sociais e coletivas, o que dificulta que sejam transformadas. De acordo com o autor, é na Grécia, no período de criação da polis e na Europa Ocidental que ocorre a ruptura desse fechamento:

Essa ruptura, que é ao mesmo tempo uma criação histórica, implica uma ruptura do fechamento da significação, tal como ela é instaurada nas sociedades heteronômicas. Ela instaura ao mesmo tempo, a democracia e a filosofia. (CASTORIADIS, 2002, p. 187).

Nessa perspectiva, a “ruptura do fechamento” significa a abertura de questionamentos e institui a verdadeira filosofia que exclui o caráter determinista, exato e limitador que antes não poderia ser posto em questão. É esse movimento que instaura a democracia, pois:

Em sua verdadeira significação, a democracia consiste no fato de que a sociedade não para numa concepção do que é justo, igual ou livre, dada uma vez por todas, mas se institui de tal maneira que as questões da liberdade, da justiça, da equidade e da igualdade possam sempre ser colocadas no quadro do funcionamento “normal” da sociedade. [...] diz respeito à instituição explícita global da sociedade, e às decisões concernentes a seu futuro (op. cit. p. 187).

Dessa forma, entende-se a democracia como uma auto-instituição pela própria coletividade e reconhecida por ela, é esse movimento que dá sentido ao ideal de democracia, de acordo com o autor.

Rosenfield (1984) acrescenta que a democracia na antiguidade grega era uma forma de governo entre outras duas: “a monarquia ou governo de um só” e a aristocracia ou “governo de alguns” (op. cit., p. 3).

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Quando nos reportamos ao seu significado mais abrangente: “governo do povo” ou “da maioria”, o termo democracia sempre esteve relacionado à participação do povo na tomada de decisões na vida pública. Embora existissem duplicidades em relação à “participação de todos”, não podemos deixar de considerar que em uma democracia a soberania popular se faz sempre necessária e essa participação, por sua vez, não acontece sem que haja a liberdade e autonomia do povo. Rosenfield (1986) esclarece que a questão filosófica ligada à escolha da melhor forma de governo na antiguidade não estava fundamentalmente ligada ao critério apenas quantitativo, pois o próprio reconhecimento do termo “maioria” se restringia ao cidadão politicamente reconhecido, excluindo do processo de cidadania aqueles sujeitos que se dedicavam à reprodução de trabalho braçal ou à realização de uma atividade material. Nesse sentido, a própria escravidão, considerada inaceitável aos olhos da modernidade para o mundo ateniense, não feria aos princípios da moral e da política. Sendo assim, a questão central na democracia grega estava ligada aos valores que fundamentariam suas leis, suas regras e procedimentos, ou seja, o valor da lei esteve fundamentalmente ligado à filosofia política clássica.

De acordo com Chauí (2001) a questão filosófica da democracia clássica está ligada à noção de liberdade, que garante ao cidadão sua participação no poder.

Na democracia, o valor dos valores é a liberdade e é ela quem determinará a natureza da igualdade ou da realização da justiça. O que caracteriza a igualdade democrática e a diferencia das demais em outras sociedades (como as aristocráticas e as monárquicas) é a afirmação de que todos os membros do

demossão absolutamente iguais porque todos são livres. É esta igualdade

absoluta (que não é econômica, mas social e política) que permite a democracia, isto é, o poder do demos (op.cit., p.207).

Seguindo essa lógica, de acordo com Castoriadis (2002), a liberdade e autonomia se fazem essenciais ao princípio político da democracia que, por sua vez, está ligada à liberdade do indivíduo, e é essa autonomia, essa liberdade e esse reconhecimento consciente do auto-instituído que fazem surgir pela primeira vez nas sociedades gregas também e, com mais intensidade, no mundo ocidental moderno, a ruptura que viabiliza a criação do processo democrático.

O autor ressalta ainda como fundamental que num processo de democracia essa liberdade esteja assegurada por uma lei que permita ao indivíduo estabelecer e definir suas significações, normas e valores que orientarão suas vidas.

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De acordo com Marques (2007) “(...) a justiça como igualdade exige uma ordem jurídico-política que tem como base e exigência, o respeito recíproco às diferenças de grupos e indivíduos” (op. cit.p. 33).

Na perspectiva de uma definição mínima de democracia, Bobbio (1986) afirma que a maneira mais legítima de compreender a democracia e contrapondo-a com as demais formas de governo, é aproximá-la, ou melhor, associá-la a um conjunto de regras. Dessa forma “por regime democrático entende-se primariamente um conjunto de regras de procedimento para a formação de decisões coletivas, em que está prevista e facilitada a participação mais ampla possível dos interessados” (op cit.).

Tomando como regra central da democracia a “maioria”, no sentido de tomada de decisões, o autor chama a atenção para esse aspecto, salientando que para uma definição mínima do que acredita ser democracia em sua essência, não basta apenas que lhe atribua a condição de uma maioria dos cidadãos ligados ao processo decisório, bem como a existência de regras para esse procedimento, o que aqui julgamos também necessário. No entanto, além desses atributos, é fundamental que outra condição incida sobre o princípio democrático, qual seja: a possibilidade de reais alternativas, embasadas em reais condições de poder, pois só munido desse poder, o cidadão terá a condição para deliberar sobre suas escolhas e decisões. Nesse sentido, os cidadãos envolvidos direta ou indiretamente no processo democrático necessitam gozar dos direitos à liberdade de expressão, opinião e, sobretudo, de liberdade de associação, ou seja, de poder, em conjunto, decidir sobre os problemas comuns. Esses direitos devem decorrer do estado de direito que permita, mas que também limite o exercício do poder do estado aos direitos “invioláveis” dos indivíduos. Segundo Bobbio (1986),decorrem daí os pressupostos necessários aos procedimentos que fundamentam o regime democrático e permitem seu desenvolver. Desse modo, se o efetivo funcionamento de um regime democrático só se faz possível se baseado no âmbito legal, o poder e o direito andam juntos e uma contraposição entre o governo das leis e o governo dos homens não representa uma democracia justa (op. cit). Logo, quando nos referimos a um governo de leis, estamos priorizando que essas leis sejam capazes de estabelecer seu próprio modo de produção, respeitando não só os direitos e deveres dos governados, como também estabelecendo normas que vinculem a todos, governantes e governados.

“Um ordenamento deste gênero apenas é possível se aqueles que exercem o poder em todos os níveis puderem ser controlados em última instância pelos possuidores originários do poder fundamental, os indivíduos singulares”. (BOBBIO,

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1986, p. 13). Tal fundamento difere da concepção individualista de sociedade que repousa sobre o ideal liberalista. Enquanto o liberalismo prega o individualismo como liberdade, excluindo os indivíduos do seio das lutas comuns e sociais, a democracia preza pela união social em prol de suas causas, viabilizando a construção de um poder, não tirano como se constrói no liberalismo, mas compartilhado.

1.2. A democracia na teoria liberal

Com a chegada do Estado Liberal, ganha evidência a democracia representativa, em que o poder é delegado a um representante, eleito democraticamente através do voto e que por sua vez assume a responsabilidade de atender às demandas da população. Essa nova forma de democracia tem, como base teórica, os fundamentos do Estado Liberal democrático e da moderna cidadania. Dessa forma, os princípios da democracia grega são reinterpretados e vinculados a valores liberais, relacionados às teorias contratualistas e ao processo capitalista. Nesse sistema democrático, o valor ético-político está ligado ao princípio da igualdade de posses de direitos civis, em que a igualdade de oportunidades se dá através da capacidade individual e não da coletividade.

De acordo com Duriguetto (2007), é através dos fundamentos da igualdade dos direitos individuais que a ordem política passa a ser consolidada e interpretada sobre a natureza humana. Dessa forma:

Rompendo com as concepções de homem tanto da tradição judaico-cristã – que o concebia como criatura divina inserido em uma comunidade que se submete à vontade de Deus – quanto da tradição aristotélica que o concebia como animal político inserido em uma comunidade voltada para a elaboração intersubjetiva da sociabilidade – o homem passa a ser concebido como ser natural, racional e individualizado, que age movido por paixões e interesses (op. cit.,p.34).

Nessa perspectiva, o homem passa a ser interpretado como proprietário de suas capacidades e suas posses determinam sua liberdade, soberania e potencialidades. Assim surge a democracia moderna, baseada em uma sociedade civil, de relações livres de trocas, na qual quem detém o poder o tem como uma relação de riqueza.

Para Bobbio (1986), através da concepção liberal são fixadas as regras fundamentais da democracia atual, contrapondo ao que determina por estado e

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não-estado (sociedade religiosa) os grupos de formação da sociedade civil. Nessa lógica, o estado deixa de ser o braço secular da igreja para ser o braço secular da burguesia mercantil e empresarial.

A essência ético-política e moral que fundamenta o Estado Liberal e seu pensamento político – regulamentação das relações sócio-políticas – consiste no poder adquirido a partir do mercado que é assegurado pela capacidade de o indivíduo conquistar o poder individual para dominar o outro. Nessa direção, surgem os conflitos de interesses gerados pela disputa de poder que gera a insegurança dos indivíduos. Essa ameaça constante de guerra e de perda de segurança e de liberdade na esfera privada conduz os indivíduos a um “estado de natureza”. Duriguetto (2007) pontua que a partir dessa lógica surge a necessidade de estabelecimento de regras como um contrato que produza um efeito de proteção dos direitos individuais e de convívio social que seja capaz de subordinar politicamente a sociedade através da transferência de seus poderes e direitos a uma esfera superior, a um poder soberano, ou seja, ao Estado. Assim cria-se uma sociedade política (contrato legítimo de poder em defesa das relações de troca de mercado e de manutenção da ordem) com objetivo de proteger legitimamente a sociedade civil (sociedade com relações baseadas no individualismo e no poder de mercado) de seu estado de natureza (conflitos advindos do próprio sistema capitalista liberal que se baseia em lutas pelo poder, competição e ameaça aos bens naturais de direito) (op. cit.).

Ainda de acordo com o pensamento da autora, o problema que se apresenta com o ordenamento político liberal consiste na formação desse contrato social, que ao regulamentar as relações sócio-políticas e assegurar ao Estado soberania total não cria princípios claros que vinculem esse poder ao compromisso constante com a coletividade e com a delimitação de sua própria ação. É nessa perspectiva que a esfera política liberal constitui seus governos como garantia de liberdade de ação da sociedade civil e de proteção e manutenção de seus direitos naturais (bens, propriedades e liberdade de ação).

Nessa direção, Bobbio (1986) afirma que a essência democrática liberal concentra-se na proteção dos interesses privados e da economia de mercado e enquanto teoria política está reduzida ao estado mínimo, o que significa uma mínima intervenção estatal na garantia de direitos coletivos, limitando a participação democrática da coletividade aos momentos de escolha de representantes.

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À medida que os procedimentos do ideário liberal envolvem os sujeitos na busca pelo poder e ascensão individual, afasta-os da coletividade e das lutas necessárias ao bem comum, que se constroem a partir da efetiva participação popular e pela tomada pelo poder dessa coletividade. É dessa efetiva participação popular que se constitui o conceito de cidadania e é a tomada do poder pela coletividade que conduz à soberania popular. Bobbio (1986) defende que se faz necessária uma reviravolta no desenvolvimento das instituições democráticas, que vai do estado à sociedade. Para o autor, não basta que aconteça a democratização do estado, pois essa democratização, se considerarmos a instituição de parlamentos, já existe. Nesse sentido é indispensável que aconteça de fato, a democratização que atinja a sociedade e para isso, as instituições como empresas, escolas, famílias, gestão dos serviços públicos, sejam tocadas democraticamente. Ainda de acordo com o autor, os dois principais centros de poder, tanto a empresa, quanto a administração pública não sofreram efetivo processo de democratização e o que pode garantir, hoje, um grau de desenvolvimento democrático não está mais ligado a critérios de maioria ou de direito ao voto, pois essas barreiras já foram superadas, mas sim ao espaço de atuação e desenvolvimento de práticas políticas pelos cidadãos (op. cit). Para isso é preciso que o espaço público, até agora ocupado por organizações de tipo burocrática ou hierárquica, seja ocupado pelo povo e, nessa perspectiva, aconteça a organização de novos ideais políticos.

1.3. Uma busca pela superação

Hoje, no Brasil, vivemos um momento histórico no qual a população, de uma forma mais significativa, começa a exigir do estado o que seria seu dever, ou seja, garantir os direitos comuns à população, tais como educação e saúde. Em paralelo a esse clima de insatisfação que transborda na atualidade brasileira, estão os crescentes casos de escândalos políticos de corrupção, que através dos novos e eficazes meios de comunicação circulam instantaneamente a nível mundial e fazem surgir um movimento de mal estar geral. Tais acontecimentos trazem à tona problemas que há muito tempo vêm sendo mascarados pelas formas de governo democrático liberal e hoje provocam o desgaste da população. Entendemos esse movimento popular massivo que toma as ruas no Brasil como um momento de luta da população para tomar o poder ao seu controle e ocupar seu espaço público de direito.

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Gerbaudo (2013) defende uma estrutura formal que legitime os movimentos sociais e afirma que a essência da luta que emerge hoje, no Brasil, é por uma nova forma de democracia, e para isso acontecer é preciso que haja a abertura de novos mecanismos de controle social sobre as ações políticas. Gerbaudo defende ainda que se instaurem novos instrumentos de democracia direta que viabilizem novas formas de participação, e que para isso, os diversos interesses da sociedade devem ser defendidos de maneira organizada. Dessa forma o autor acredita que é através da ação social organizada que se podem construir novos caminhos para atingir a justiça democrática e, nesse sentido, defende a importância da atuação dos partidos políticos como mediadores nas lutas pelos direitos coletivos: “A política é uma obra coletiva, não um agregado de

indivíduos. São blocos diferentes que interagem. Para isso, você precisa dos partidos. Eles sempre existiram e sempre vão existir” (op.cit., pág. 53).

Sendo assim, colocamos como uma das questões da democracia a construção de uma relação em quea população assuma o controle do poder exercendo de fato a sua cidadania.

Bobbio (1986), refletindo sobre os sentidos da democracia, apresenta uma contradição entre o que seria uma democracia ideal e a democracia real – que temos hoje – e evidencia o que chama de “promessas não cumpridas” pela democracia moderna. Dentre os vários princípios democráticos não cumpridos, conforme já explorado, o autor chama a atenção para a questão do exercício do poder ou “poder invisível” como um valor maior da democracia e que consiste num grande desafio. É exatamente no modo como esse poder é exercido, em sua transparência, que devemos nos deter: “Enquanto a presença de um poder invisível corrompe a democracia, a existência de grupos de poder que se sucedem mediante eleições livres permanece, ao menos até agora, como a única forma na qual a democracia encontrou a sua concreta atuação” (op.cit., p.11).

O autor coloca os partidos políticos como únicos e legítimos elos da democracia, ou seja, são instituições políticas que funcionam como elo entre os indivíduos e o estado, e é através de seus movimentos que devemos nos apoiar como espaços de poder para as lutas pela real democratização das nossas instituições e da nossa sociedade.

Outra promessa da democracia moderna, não cumprida, analisada por Bobbio (1986) consiste na educação para a cidadania. Nesse sentido a educação seria um meio de construção e efetivação dos princípios democráticos “segundo a qual o cidadão,investido do poder de eleger os próprios governantes, acabaria por escolher os

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mais sábios, os mais honestos e os mais esclarecidos dentre os seus cidadãos” (op.cit., p. 11).

Por fim, compreendemos a educação para a formação cidadã como um grande desafio enfrentado na atualidade, uma possibilidade real de participação social e transformação política que seja capaz de garantir uma justiça social. A ela nos deteremos como fator fundamental pelo sucesso ou fracasso de um construto social justo e igualitário.

1.4. Educação e democracia

As instituições educacionais, bem como as demais instituições sociais, exprimem o modelo político ao qual pertencem e, dessa forma, sevem como mantenedoras ou reprodutoras da ordem vigente. Tomando a educação como um dos pilares para a construção do exercício da cidadania, bem como ao desenvolvimento de uma cultura política e social, compreendemos que a escola enquanto instituição política pode exercer uma função social voltada para a construção da justiça social. Sendo assim, à educação, compete uma parcela considerável na construção de um projeto de democracia que se faça através da participação comunitária e de sua atuação na participação da gestão.

Silva (2010)vai além do pensamento puramente ideológico quando reflete sobre as questões ético-políticas das perspectivas ou modelos democráticos direcionados para a educação:

A questão que se coloca, então, é a de investigar as possibilidades de se ir além destas concepções, resgatando dimensões da vida democrática que escamoteiam, sobretudo no sentido de descortinar formas de gestão da educação comprometidas com a soberania popular e com o papel integrador do Estado numa democracia (op cit., p. 33).

Ao analisar a gestão da Educação, seja no âmbito escolar ou no sistema municipal de ensino, faz-se necessário uma reflexão sobre o contexto político e social mais amplo, especificamente as políticas educacionais por estarem inevitavelmente ligadas, pois é a partir da gestão que se concretizam ou não as ações propostas pelas políticas. A importância dada à gestão na presente pesquisa justifica-se pela força transformadora que esta pode vir a desempenhar na constituição desse novo modelo de política. Para Ball (2001, p. 108):

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Durante os últimos vinte anos, a gestão tem sido um mecanismo chave tanto na reforma política, quanto na reengenharia cultural no setor publico dos países do norte. Tem sido a forma principal através da qual se tem reconfigurado a estrutura e a cultura do serviço público.

Podemos dizer que a gestão pode exercer forte influência de transformação, não só de um modelo de política, mas também na construção de uma nova cultura que possa favorecer ou não uma ação mais democrática e influenciar as relações de poder que se estabelecem dessa prática. Nesse sentido, investigar a gestão educacional significa indagar sobre o tipo de sujeitos que se pretende formar e como se dará esse processo.

Somos fruto de um construto social e cultural que resulta das interações sociais, políticas e econômicas que vivenciamos, mas é claramente possível que também possamos planejar de forma democrática o que pretendemos ser, ou seja, construir uma identidade coletiva. Para isso, contamos com as políticas públicas que devem ser desenvolvidas no sentido de apoiar tais projetos. Nesse sentido, Habermas (1999 apud SILVA, 2010, p.33) afirma que:

O problema ético político mais básico da democracia refere-se à possibilidade de se conceber um ponto de vista comum e compartilhado, que supostamente permitiria uma avaliação imparcial das questões a serem decididas coletivamente, o que tem sido denominado de “ponto de vista moral”.

Nessa direção, refletimos a possibilidade de chegar a um consenso diante de um universo de racionalidades diversas, tomando como referência os espaços escolares e as políticas de educação, de se construir um caminho viável a um projeto comum de educação e de sociedade e, além de tudo, de como garantir que tais determinações sejam respeitadas e até mesmo moldadas diante das necessidades coletivas.

Estêvão (2006), em uma análise sobre as formas de democracia para a educação, apresenta as características da democracia deliberativa, na perspectiva de Habermas e a comunicativa como outro modo de ver a democracia e a própria política. O autor considera a democracia deliberativa como:

Ideal intuitivo de uma associação democrática cuja justificação assenta em argumentos públicos e racionais entre cidadãos iguais. Ou seja, quer as instituições, quer as decisões só serão legítimas quando recebem a concordância dos implicados, num procedimento democrático em circunstâncias de participação livre e igual (op. cit. p. 88).

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O autor identifica como um ponto a ser superado o fato de que nessa forma de democracia corre-se o risco de privilegiar grupos com maior prestígio simbólico e material, por esses grupos dominarem as habilidades argumentativas e também de o argumento não ser a única forma de se exercer um poder. Como modo de superação dessa lacuna o autor defende a democracia comunicativa como uma forma que detém muito da democracia deliberativa, mas que a complementa no sentido de considerar e aceitar a diferença do outro no processo de igualdade de oportunidades. Dessa forma, o autor defende que:

Na democracia comunicativa, então, a interação comunicativa não omite a diferenciação dos sentidos que os actores atribuem aos problemas, aos interesses, às próprias coisas, ao bem comum, nem esquece as suas diferentes posições sociais. E é esse reconhecimento da diferença e do que não é comum que desafia a própria argumentação e que leva a invocar a justiça e a “reciprocidade assimétrica” entre perspectivas dos sujeitos, uma vez que cada um tem a sua história que “transcende a copresença de sujeitos em comunicação” e cada posição social é estruturada pela configuração de relações entre outras posições, o que dá a cada locação um sentido específico e irreversível Young (1977 apud ESTÊVÃO, 2006, p.90).

Hoje, a Constituição Federal de 1988 e a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação asseguram aos nossos sistemas estaduais e municipais de ensino novos mecanismos democráticos que permitem que nossas escolas vivenciem formas mais participavas como a gestão colegiada, a descentralização administrativa, eleições para diretores e crescentes graus de autonomia escolar. Tais mecanismos, embora desarticulados, representam uma possibilidade de abertura política para uma nova construção educacional. É nesse sentido que defendemos a democratização da gestão educacional e da escola para que seja possível a participação efetiva da comunidade escolar nas tomadas de decisão e compartilhamento do poder.

A questão que se coloca agora é de como atuar nesses espaços de forma democrática e garantir nossos direitos. É diante da concepção democrática comunicativa que Estêvão (2006) acredita ser possível uma maior abertura da participação de todos, em suas diferenças, para atuarem coletivamente num espaço público, e é essa comunicação, entre perspectivas diversas, que garante a condição de publicidade onde os sujeitos ampliam a visão dos processos sociais, reforçando o exercício regulatório da comunidade e fortalecendo a cidadania. Desse modo acreditamos que a democracia comunicativa pode alargar a noção de espaço público, que surge, contudo, além da argumentação intersubjetiva, na notoriedade do outro enquanto ser, o que pode refletir

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numa justiça social indispensável às formas democráticas, especialmente nas políticas de gestão da educação e da gestão democrática e participativa como espaço privilegiado de interação.

Nessa perspectiva, a participação dos usuários na gestão escolar reflete-se como um instrumento ao qual a coletividade necessita ter acesso para que seja possível o exercício da cidadania. É assim que, para Bobbio (1986), pode acontecer o processo de democratização das nossas instituições e, paralelamente, da nossa sociedade, ultrapassando os limites da democracia política para a construção da democracia social. Nesse sentido se torna indispensável que se questionem as normas legais das políticas de gestão, dentro e fora das escolas, pois:

A formulação de qualquer hipótese sobre a gestão democrática envolve sempre um pressuposto ético-político que nem sempre vem explicitado. Não se pode partir da ideia ingênua de que a concepção de democracia com a qual se trabalha é consensual ou é a única possível ou a melhor que se tem. É necessário justificar isso e, fazê-lo, estar-se-ia argumentando no âmbito ético-político ou ideológico (SILVA, 2010, p. 51).

Nessa direção, a normatividade dominante da escola deve ser analisada para que possamos compreender como a escola atua em sua dinâmica, como ela regula e se é regulada pela coletividade. Ou seja, observar essa instituição em sua dimensão normativa significa questionar o que e como essa escola tem agido para legitimar sua democratização; significa compreender como esse espaço tem sido utilizado pela coletividade para seu domínio, se existe o domínio da coletividade nesse espaço. Esse entendimento permite a identificação da democracia que está sendo desenvolvida na escola para poder transformá-la ou desmascará-la. Em uma sociedade capitalista, a democracia pode assumir várias formas, mas cabe a nós, através da análise normativa, identificar até que ponto a gestão da escola tem ignorado ou criado formas de superação de uma ordem excludente que se oculta no modelo econômico de reprodução cultural, através de suas ações. Trata-se de investigar sobre como e se a política educacional tem contribuído para o fortalecimento da ação coletiva e formação de uma sociedade efetivamente democrática em sua forma e conteúdo; é acima de tudo, inquerir sobre a real tomada do público no seu lugar e ao seu poder.

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Daí a importância de se analisarem as dimensões éticas e políticas, principalmente quando queremos entender a gestão democrática da educação. Por esse motivo, passaremos, no próximo capítulo, a analisar o poder nas organizações.

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CAPÍTULO 2. O PODER NA ORGANIZAÇÃO

Com o crescimento das demandas sociais, paralelamente as instituições e organizações ganham mais relevância nos contextos sociais; à medida que esse crescimento se intensifica, pouco a pouco as organizações que mantinham um conjunto de estruturas técnicas contínuas e rotineiras passaram a necessitar de estruturas técnicas de trabalho mais dinâmicas e cada vez mais específicas, o que desencadeia uma diversidade de atividades e divisão de trabalho e, consequentemente, intensificam-se os conflitos interpessoais e nas relações de poder.

O poder é um fenômeno já discutido amplamente nos contextos organizacionais; com o aumento e complexidade que ganharam as organizações sociais e principalmente com o surgimento da gestão democrática politicamente instituída, faz-se cada vez mais necessário discutir e compreender acerca das relações de poder que se estabelecem nas organizações. Trazendo nosso olhar para a instituição da gestão educacional, Botler (2009) ressalta que uma gestão democrática passa pela ressignificação das relações de poder, é através de relações crítico-dialógicas e argumentativas que se torna possível um delineamento das relações emancipatórias.

Nesse sentido, buscamos nos apropriar de um breve aporte teórico que verse sobre a análise das relações de poder nas organizações com o intuito de compreender as possibilidades e perspectivas de avanço para análises nesse campo. Dentro dessa perspectiva apontamos os estudos desenvolvidos por vários autores, dentre eles Friedberg (1993), Bourdieu (1989), Foucault (1988) e Weber (1999), num diálogo teórico visando um aprofundamento na perspectiva analítica sobre o poder e suas formas de dominação na organização.

Para Friedberg (1993) é possível fazer duas leituras dos anos 80 (momento em que os estudos organizacionais ganham força); a primeira, que aponta os limites que os processos tradicionais burocráticos apresentam para o desenvolvimento da eficácia nas organizações sociais e a segunda, que aponta a necessidade de organização, sem a qual não seria possível atingir o bom desempenho das atividades coletivas nas organizações. Nessa perspectiva, ressalta-se a condição fundamental da dimensão organizacional para o desenvolvimento das ações. O autor salienta a importância da dimensão organizacional para a estabilização das complexas relações humanas que, por sua natureza, são conflituosas e instáveis e acredita que a partir dessa dimensão seja

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possível estabelecer um equilíbrio e uma interação social no ambiente organizacional que viabilizará a construção da cooperação entre os indivíduos e a coordenação das ações coletivas, mesmo se tratando de racionalidades diferentes. O autor aponta ainda que a construção dessa organização capaz de estabilizar o universo conflituoso nas relações humanas pode se operar de maneira diferente, de organização para organização e de acordo com suas peculiaridades, mas que reside nessa construção o problema central de toda organização. Dessa forma compreende-se que esse problema, pela inevitável instabilidade nas relações coletivas, esteja sempre presente, o que reflete a necessidade da constante busca de uma construção edificante nos contextos organizacionais.

Sendo a organização um ambiente de instabilidade e sendo a especificidade desse problema o cerne para sua regulação, Friedberg ressalta que a análise e compreensão dessa especificidade se torna a questão central da reflexão organizacional. Nesse sentido:

O fenômeno organização aparece, então, como o resultado contingente e sempre provisório da construção de uma ordem local cujas características relativamente autônomas estruturam a capacidade de ação coletiva dos interessados. Ele é, ao mesmo tempo, continente e conteúdo, estrutura e processo, obrigação para a ação humana e seu resultado. (1993, p. 11).

O autor destaca ainda a necessidade de se compreender a ação humana através dos seus objetivos e efeitos, ou seja, o resultado que essas estruturas geram e em que novas posturas e procedimentos resultam. Parte daí o cuidado de não se fragmentar a análise sobre as organizações, como frequentemente se observa nos estudos sobre o tema que tendem a separar o foco de análises ou abordá-las como um conjunto de estruturas delimitadas ou como uma análise das ações coletivas, de derivação mais espontânea, com estruturas fluidas e informais, implícitas nas relações humanas. Essa é uma preocupação constante na abordagem de Friedberg, que propõe uma análise organizacional que implica numa observação mais profunda e geral remetida a uma esfera política das ações e seu potencial de mudança.

Sobre esse aspecto Cappelle, Melo e Brito (2005) trazem em um ensaio teórico uma análise que, a princípio, compreende os estudos organizacionais conforme dois paradigmas: o funcionalista (paradigma compreendido como dominante) e o estruturalista (crítico), visando facilitar a compreensão da análise sobre as organizações

Referências

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