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Modelagem e desenho de processos como ferramenta de verificação da gestão municipal no processo de inclusão da pessoa com deficiência

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Academic year: 2021

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MOISES LOPES SANCHES JÚNIOR

MODELAGEM E DESENHO DE PROCESSOS COMO FERRAMENTA DE VERIFICAÇÃO DA GESTÃO MUNICIPAL NO PROCESSO DE

INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

CAMPINAS 2014

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

MOISES LOPES SANCHES JÚNIOR

MODELAGEM E DESENHO DE PROCESSOS COMO FERRAMENTA DE VERIFICAÇÃO DA GESTÃO MUNICIPAL NO PROCESSO DE

INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA

Tese apresentada à Faculdade de Educação Física da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em Educação Física, na área de Atividade Física,

Adaptação e Saúde.

Orientador: Paulo Ferreira de Araújo

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL TESE DEFENDIDA PELO ALUNO

MOISES LOPES SANCHES JÚNIOR ORIENTADO PELO

PROF. DR. PAULO FERREIRA DE ARAÚJO

______________________________________

CAMPINAS 2014

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SANCHES Jr., Moises Lopes. MODELAGEM E DESENHO DE PROCESSOS COMO FERRAMENTA DE VERIFICAÇÃO DA GESTÃO MUNICIPAL NO PROCESSO DE INCLUSÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. 2014. 147f. Tese (Doutorado em Educação Física)-Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.

RESUMO

Diversos são os recortes pelos quais se tem analisado as questões da inclusão da pessoa com deficiência, sejam nas pesquisas desenvolvidas nos foros acadêmicos, ou nos debates sócio-político-econômicos. É nítida, no âmbito histórico, uma rápida evolução conceitual nas diversas publicações acadêmicas e políticas em que se apresenta o tema, principalmente nas últimas quatro décadas, o que tem proporcionado um redirecionamento no olhar e práticas direcionadas a inclusão desta população. No entanto, ao destacarmos as políticas expressas na legislação, confrontadas com as práticas, planejamento e articulações desenvolvidas nos municípios, nos defrontamos com uma realidade que expõe a desarticulação entre essas atividades, e principalmente, a quase completa ausência de instrumentalidades que possibilitem aferir sua eficácia. Se por um lado, as agências formadoras tentam desenvolver em seus graduandos conceitos que possibilitem uma sociedade inclusiva e que contemplem com um novo olhar a pessoa com deficiência, de outro lado, observamos o descompasso entre a intenção e a prática, e principalmente, entre os setores que planejam e os que gerem os processos inclusivos. Isto resulta em processos não racionalizados, com sobreposição de tarefas, de custeio ou de atendimentos, retrabalho, falta de atendimento pela inferência de que alguma atividade seja de outro setor, além de um conjunto de informações dispersas ou desconexas, e por fim, ausência de indicadores confiáveis que propiciem validação de resultados. Desta percepção decorre a necessidade de modelos de integração destes conceitos (oriundos da pesquisa e ciência) e práticas (presentes nos ambientes sociais) em uma ação que apresente sincronia e alinhamento com um ponto de convergência comum (as necessidades humanas), e que possibilitem rastrear a eficácia dos resultados das políticas públicas. O presente trabalho evoca o uso da metodologia de modelagem e desenho de processos orientadas a valor, aliada a uma abordagem de resolução de problemas complexos, como alternativa para o estabelecimento, mapeamento e verificação de indicadores de gestão de processos inclusivos, e monitoramento, validação e rastreabilidade de resultados das ações voltadas à inclusão. Concluímos, pela otimização de processos e resultados obtidos pela aplicação desta metodologia, ela se demonstrou útil para certificar municípios, entidades ou quaisquer outros níveis de recortes estruturais, aferindo e validando processos de inclusão, além de fornecer indicadores para correção e planificação das ações de formação ou indicação de áreas de carência em pesquisa e desenvolvimento, contribuindo para a eficácia, e não somente eficiência, das atividades desenvolvidas no sentido da inclusão da pessoa com deficiência.

Palavras-Chave: Inclusão; Gestão Pública; Modelagem de Processos; Melhoria de Processos;

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SANCHES Jr., Moises Lopes. MODELING AND DESIGN PROCESS AS A TOOL FOR VERIFYING THE MUNICIPAL MANAGEMENT IN THE PROCESS OF INCLUSION OF PEOPLE WITH DISABILITIES. 2014. 147f. Tese (Doutorado em Educação Física)-Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2014.

ABSTRACT

There are several clippings by which it has been analyzed the issues of inclusion of people with disabilities in research are developed in academic forums, or in the socio- political and economic debates. It is clear, in the historical context, a quick conceptual evolution in several academic publications and policies which presents the theme, especially in the last four decades, which has resulted in a redirect gaze and practices aimed at inclusion of this population. However, when we cut the policy expressed in legislation, confronted with the practical, engineering and joints developed in the municipalities, faced with a reality that exposes the lack of connection between these activities and especially the almost complete absence of instrumentalities that enable measuring its effectiveness. On one hand, the training agencies try to develop concepts that enable its graduates an inclusive society and contemplating a new look with the disabled person, on the other hand, we observe the gap between intention and practice, and especially among sectors planning and managing the inclusive processes, resulting in not streamlined processes, with overlapping tasks, or calls costing, rework, lack of care by the inference that some activity is of another sector, plus a set of Scattered or disconnected information, or lack of reliable indicators that provide validation of results . From this perception stems the urgent need of models of integration of these concepts (derived from the research and science) and practical (present in social settings) in synchrony to submit an action and alignment to a common point of convergence (human needs), and enabling to track the effectiveness of the results of public policy. This work evokes the use of the value-oriented methodology for modeling and designing processes, combined with an approach of solving complex problems, as an alternative to the establishment, mapping and verification of management indicators of inclusive processes and monitoring, validation and traceability of results of actions aimed at inclusion. We conclude that such a methodology, if applied, could make municipalities, entities or other levels of structural clippings, assessing and validating processes of inclusion and provide indicators to correction and planning of training activities or indication of areas of need in research and development contributing to the effectiveness, not just efficiency, of the activities developed for the inclusion of people with disabilities.

Keywords: Inclusion; Public management; Process Modeling; Process improvment; Vocational

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 01

2 A INCLUSÃO ... 11

2.1 O Persistente Desafio da Conceituação... 11

2.2 Breve Panorama Histórico da Inclusão... 18

2.2.1 Os Sujeitos da Inclusão e a Evolução das Terminologias... 18

2.2.2 Caminhos e Descaminhos da Inclusão ... 21

2.2.3 A Educação Especial e a EFA ... 23

2.2.4 Da Educação Especial e EFA a Escola Regular e EF – Implicações Sociais... 25

3 A COMPLEXIDADE DO PROBLEMA E O PROBLEMA DA COMPLEXIDADE... 42

3.1 Aspectos Relativos À Polissemia E Etimologia Do Termo Problema ... 47

3.2 Problema Complexo ... 51

3.3 Ferramentas de Resolução de Problemas ... 54

3.4 Conceitos Associados à Resolução de Problemas ... 58

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ... 63

4.1 Etapas, Natureza e Tipificação da Pesquisa ... 63

4.2 Universo da Pesquisa ... 65

4.3 Delimitação do Estudo, Tecnologias e Procedimentos ... 66

4.4 Aspectos Éticos... ... 68

4.5 Análise dos dados... 68

5 ANALISANDO A MODELAGEM DE PROCESSOS E SUA FUNÇÃO NA GESTÃO MUNICIPAL ... 70

5.1 O Diagnóstico – pensando do fim para o começo ... 75

5.2 As ações – Estabelecendo as transições e não as atividades ... 79

5.3 Os Processos – Iniciando a Modelagem ... 80

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 111 REFERÊNCIAS ... 116 APÊNDICE ... 124

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Agradecimentos

Em primeiro lugar a Deus, a quem devo a benção da vida e em quem tenho encontrado forças para prosseguir nos tempos de crise e dificuldade.

Ao meu orientador Prof. Paulo Araújo, pela paciência, apoio e compreensão sem os quais esse momento não teria chegado.

Aos professores José Luiz Rodrigues, Josiane Fujisawa Filus de Freitas, Luiz Seabra Junior, Rita de Fátima da Silva, Fuad Gattaz Sobrinho e Oscar Ivan Palma Pacheco, por aceitarem ler e avaliar este trabalho.

Aos amigos Josi, Rita, Luiz e Marina, por me apoiarem durante todo esse tempo, e por dividirem comigo a honra de aprender e a missão de ensinar.

Aos amigos do IASP, Instituto Adventista São Paulo pela acolhida e colaboração para que esta etapa fosse vencida.

Aos professores e colegas da FEF pela paciência e colaboração.

À minha esposa Líslei, e minhas filhas, Bianca e Milena por suportarem a ausência, as neuras, as crises, as noites perdidas, e apesar de tudo, continuarem incentivando.

Aos meus pais, que me possibilitaram meu primeiro contato com a área de inclusão.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Perspectivas da Inclusão... 13

Figura 2 - Perspectiva Conceitual da Inclusão... 14

Figura 3 - Perspectiva do Sujeito/Objeto da Inclusão – Enfoque Positivo... 15

Figura 4 - Perspectiva do Sujeito/Objeto da Inclusão – Enfoque Negativo... 16

Figura 5 - Enfoque e Abordagens da Inclusão – Evolução Histórica... 39

Figura 6 - Cronologia das ações direcionadas as pessoas com deficiência... 40

Figura 7 - Determinantes de Qualidade de vida – Hortolândia... 71

Figura 8 - Representações Tradicionais de Cadeia de Valores e Fluxo de Atividades. 77 Figura 9 - Detalhe de Mapa de Processos Orientado a Valores... 78

Figura 10- Exemplo de um Valor Caracterizado... 78

Figura 11- Exemplo de uma Transição Caracterizada... 80

Figura 12- Exemplo: Segmento de Processo... 81

Figura 13- Representação de processos – Modelagem a partir de Resultados... 83

Figura 14- Representação de um Processo Modelado em PArchitect... 86

Figura 15- Representação dos Componentes de um Processo... 91

Figura 16- Representação de Processos – Programa de Governo – Hortolândia... 93

Figura 17- Representação de Processos – Recorte 1 – Valor Inicial ... 94

Figura 18- Representação de Processos – Recorte 2 – Valor Adicionado ... 95

Figura 19- Representação de Processos – Recorte 3 – Referências ... 96

Figura 20- Representação de Processos e Fatiamento de Sub Processos ... 97

Figura 21- Representação de Simulação e Emulação de Processos – Rastreabilidade 99 Figura 22- Representação de Rede de Processos ... 102

Figura 23- Representação de Encadeamento de Valores em Nível Inicial ... 104

Figura 24- Exemplos de Monitoramento de Indicadores ... 110

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

EFA Educação Física Adaptada

EF Educação Física

PNE Pessoa com Necessidades Especiais

FEF Faculdade de Educação Física

PCD Pessoa com Deficiência

PNEE Pessoa com Necessidades Educativas Especiais LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais

DC Diretrizes Curriculares

IES Instituição de Ensino Superior UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

FEF Faculdade de Educação Física

ARPCOOP Abordagem Resolução de Problemas Complexos Orientada aos Princípios de Processo

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1 Introdução

Desenvolver um caminho de pesquisa é delinear a trajetória de pensamento, experiências, aprendizagens e por que não emoções da vida, sonhos e perspectivas de um pesquisador. Tentar recortar onde terminam as vivências e em que momento começam as reflexões teóricas, não raras vezes é uma tarefa árdua, artificial ou impossível, razão pela qual entendemos o processo da pesquisa como uma projeção de si mesmo, ainda que com o rigor imposto pela técnica, pela métrica e pelo método.

A escolha de um tema, sua delineação, seus referenciais, críticas e ponderações, se mesclam numa linha as vezes muito tênue com a história de vida, conceitos desenvolvidos e validados pela prática, observação, pensar e sentir do autor.

Por essa razão, conhecer esta trajetória e seus desenhos, talvez seja a primeira e importante parte de um trabalho, afim de que se conheça o autor e se entenda seus caminhos, e eventualmente, “descaminhos”, ao longo de sua interação com o tema e suas problematizações.

O tempo – início da década de 70; o cenário – Escola Fundamental; o contexto – implementação da LDB (5692/71); os protagonistas – alunos e professores comuns, como outros quaisquer, não fora o fato de que um deles era o filho do diretor, iniciando os estudos aos 3 anos de idade, na pré-escola como ouvinte, vendo seus colegas passando de ano, e ele ficando pra trás por não ter idade mínima pra continuar, mas sem entender direito o fato, pois tudo que os outros eram capazes de fazer ele também era. As mesmas notas (resultados conceituais) nas avaliações apenas sustentavam a tese e dificultavam as tentativas de explicação para o fenômeno. Alternativa de gente grande foi simples, troca de sala (não de série) com outro professor.

Tudo ia bem na primeira vez, mas ao chegar o fim da segunda “repetência” a explicação não parecia ter nexo. E, de fato, não tinha, pois se a escola é o lugar em que se aprende para progredir, uma vez aprendido, por que não progredir? Conselho reunido, argumentos vão e vem, e uma professora (a de Alfabetização) tem uma “iluminação”: já que está como ouvinte há dois anos no pré, por que não colocar como ouvinte na 1a. Série?

Brilhante idéia, não fosse o fato de que ao final do mês de maio, ele já tivesse terminado a cartilha (nostálgica “Caminho Suave”), enquanto todos os demais ainda estavam pela metade ou menos.

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Não é difícil imaginar que os próximos meses se tornaram de discussão antecipada sobre o que fazer para resolver as questões de natureza legal pois a ida para a segunda série ao final do ano se tornaria inevitável.

Ser diferente, não importa o que provoque a distinção, é algo arraigado a nossa trajetória acadêmica. O mais baixinho, o magricela, o criancinha, sem contar o fato de ser o filho do diretor, além de todos os apelidos decorrentes do processo, são apenas um pedaço do que se desenharia num futuro não muito distante (a adolescência dos outros) na dinâmica do fenômeno da inclusão.

Ainda que de forma inconsciente, sob o prisma de um acadêmico, estes temas estavam lá, embrionariamente se formando.

A segunda série chegou, e lá estava o garoto fora da idade, entre seus colegas da idade correta, feliz da vida como aluno de verdade, com nome na chamada, boletim, etc... alheio de certo modo, à toda discussão formal e informal sobre o caso.

Como seus pais passavam o dia na escola, pela manhã estudava, e à tarde, tornara-se o monitor (informal) daquele espaço. Numa dessas idas e vindas de alunos, entrou na escola um aluno que diziam à época, havia sido acometido de paralisia, e apresentava vários comprometimentos motores, mas com uma mente brilhante. Era aluno do fim do ginásio (5a. – 8a séries da época). Há que se considerar que no início da década de 70, conceitos de inclusão escolar, alunos com deficiência em escola regular, eram algo fora de cogitação. Este aluno só conseguira estudar e ingressar na escola regular por se tratar de escolas confessionais, os pais conviviam com a comunidade da confissão, e os diretores tinham um coração “mole”(como diriam à época).

Não demorou muito que os dois alunos esbarrassem pelos corredores e se tornassem amigos, apesar da diferença de idade e de séries.

Encurtada a história, em meio às dificuldades enfrentadas pelos professores durante os processos de avaliação, dado o comprometimento motor e o tempo que aquele aluno levava para escrever as respostas às avaliações formais, o processo de bondade em atender um “aluno deficiente” foi se transformando num problema a ser discutido nos conselhos da escola.

Nova ideia brilhante, desta vez, da professora de inglês, “por que não experimentar um modelo de parceria, colocarmos um aluno que saiba escrever, mas que não conheça os conteúdos da série, e este servirá de mão para o “deficiente” motor e este lhe diz o

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que escrever ou quais as respostas corretas das questões?”. É óbvio deduzir qual o aluno escolhido, com tempo livre no contra turno, que soubesse escrever, mas que não conhecesse os conteúdos da série... lá se vai o garoto do 2o ano “ajudar” o “deficiente” do ginásio.

Foi quase um ano de parceria entre estes dois garotos, mas que deixou marcas que resultariam em questionamentos, inquietações e experiências ao longo do caminho acadêmico de ambos. O ano terminou, o diretor da escola foi transferido, os alunos se separam, mas as marcas já estavam fixadas, só não se sabia quanto ou por quanto tempo.

Nesse momento da história, olhando por uma perspectiva de quem vive no século XXI, numa fase de conclusão doutoral, tentando lembrar os momentos de 40 anos atrás, é incrível como certas coisas ainda estão lá.

Considerando que este texto é a introdução de uma tese e não de um livro de história ou romance, ao tentar refletir sobre quantos aspectos teóricos e problematizáveis estão imbricados nesse breve e inicial relato, surge o primeiro dilema, fruto da escolha (ou do vício), da forma e do rigor, impostos pelo momento de ter que descrever tais informações no modelo impessoal, terceira pessoa, ou na primeira do plural. Ao olhar para o aluno da época com sua ingênua compreensão dos fatos, discussões, argumentos, contextos legislacionais, metodologias, técnicas, e tantas coisas que aquelas duas experiências forneciam, quem é aquele aluno? Não dá pra dizer que é alguém sem que se sinta perdendo a identidade, não tem como apontar como sendo “Ele”, sem que pareça de certo modo “ezquisofrênico”, não tem como dizer que é “nós” sem que se despersonifique o personagem pois o personagem “sou eu”.

Não quero com isso, e me permita a quebra do protocolo comum ao trazer para a primeira pessoa nem que seja só por um ou dois parágrafos, criticar o rigor do método, ou a necessidade da forma, apenas evidenciar a dificuldade de se pensar a experiência quando ainda sou capaz de sentir o cheiro, de visualizar a sala, de lembrar as questões da primeira prova que respondi (escrevi) por ele, e se fecho os olhos ainda sou capaz de sentir as gotas pulverizadas de saliva que espirravam no meu rosto, braço e mãos, irremediavelmente, quando ele se esforçava para falar e principalmente quando ele se sentia ansioso por saber a resposta e sorria enquanto falava por demonstrar que sabia. Como teorizar aquilo que se pode sentir? Como descrever como o outro aquilo que você mesmo viveu? Como mensurar estatisticamente todos os detalhes de um sorriso por se sentir incluído? (ou excluído).

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Essa pequena derivação ao tema surge como um movimento de olhar “de perto e de dentro” como sugerido por Magnani (2002), que foge ao clássico “de fora e de longe”, na tentativa de implicar a discussão num sentido quase metafísico, na intenção de evidenciar a complexidade de abordagem, seja nos aspectos conceituais ou mesmo nos técnicos do processo de inclusão.

O distanciamento necessário para se problematizar, discutir, propor, orientar ou pesquisar não deve, e talvez nem possa, anular a pessoa daquele que pesquisa.

Por outro lado, a criança ingênua que sentia as gotas de saliva e não achava nojento, mas apenas engraçado, olhada quarenta anos depois, talvez ainda busque respostas sobre o real significado de acessibilidade, adaptabilidade, discriminação, e tantos outros termos que, em maior ou menor grau foram alvo das discussões daqueles docentes de então, que com suas ideias brilhantes, tentavam achar caminhos para um problema persistente.

Ainda que estranho, porém não menos verdadeiro, vivemos o paradoxo de estar na era da informação, ao mesmo tempo em que sofremos o risco de pelo excesso e facilidade de acesso, perpetuarmos a displicência, o descaso e a superficialidade do conhecimento/reflexão dessa mesma informação.

O tempo passou, e como o tempo achata as distâncias, aqueles mesmos garotos foram se encontrar quinze anos mais tarde nas alamedas da faculdade de pedagogia, e num espaço, ainda que curto de tempo, era como se o tempo houvesse parado.

Mas alguma coisa havia mudado, e não era a idade. A saliva que nunca incomodou, causava certa estranheza. O jeito de falar com dificuldade, a maneira de caminhar, os pequenos espasmos, já não eram engraçados, mas de certo modo constrangedores. A amizade era a mesma, mas as mentes, na época distantes por conta da diferença de idade, agora pareciam distantes pelo conhecimento formal e exacerbação da diferença.

O garotinho havia crescido, e portanto, era igual a todos os demais, mas o “deficiente” continuava “deficiente”.

Não é possível dizer que foi um primeiro reencontro agradável sem que se esteja ignorando o que de fato se sentiu. O racional se sentia feliz por encontrar um velho amigo, enquanto o emocional misturava alegria e constrangimento. É óbvio que bastaram alguns encontros para que as “neuras” e as “nóias” dessem lugar aos mesmos sentimentos da infância, e os próximos anos da graduação serviriam para um reexame das trajetórias, e os livros deixassem

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de ser simplesmente teóricos para se parecer com as discussões e percepções decorrentes da vivência com aquele amigo. Os conceitos saiam do papel e pareciam ser a descrição da realidade, e a pergunta inevitável para um graduando dos 16 aos 19 anos acendia com nova luz – Será que o preconceituoso descrito nos livros sou eu? Seria eu o pedagogo apontado pelos autores como desconhecedor dos métodos, da adaptação ou provocador da exclusão?

Naquele instante começava a saltar aos olhos a diferença entre o ser e o legislar, entre o estabelecer políticas e o conhecer seus impactos, o descrever problemas e soluções e o fazer parte da experiência que soluciona.

Quando desta nova fase, outros aspectos desconhecidos do período de infância se tornaram conhecidos: A escola da infância era térrea, a da graduação tinha escadas e três andares; na escola de criança as discussões docente-aluno eram mínimas, na graduação, o debate era necessário, e o tempo de espera das falas lentas do amigo de infância seriam proibitivos numa sala convencional, e a ansiedade por ser ouvido só aumentava a lentidão. Nos tempos de infância, ir e vir era algo que os pais faziam, mas na graduação, ou se dirigia ou tinha que usar ônibus, metrô ou trem.

O novo contexto tornava evidente questões da cidade de São Paulo que necessitavam de adaptação, calçadas, escadas, guias, semáforos, assentos, banheiros, automóveis, leis, prioridades, e tantos outros aspectos que hoje soam como lugar comum, mas que na década de 80 ainda nem estavam ou saiam do papel.

Uma vez concluída a graduação, fui convidado para atuar na rede adventista de educação, surgiria um novo impacto, desta vez semelhante ao primeiro do tempo da 1a. série. O convite era para ser coordenador pedagógico da mantenedora, com 21 anos de idade, quase 300 professores, e os mais novos do grupo com um ano ou mais do que o jovem coordenador. Os próximos doze anos seriam desafiadores e inquietantes.

As duas décadas finais do século XX, que absorveram o período de graduação e os primeiros dez anos de trabalho, historicamente, foram permeadas de discussões, às vezes intermináveis, sobre os rumos da Educação Brasileira. Permearam tais debates, aspectos estruturais e metodológicos, concepções da pessoa humana, inclusão e diversidade, bem como sua releitura do processo educacional frente às demandas de causas sociais, discutidas e revistas por órgãos oficiais e de direitos humanos, em prospecção mundial ou local.

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Todo esse movimento, resultaria em impactos de ordem legal, quer na reedição do documento maior, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (1996), quer na criação ou revisão das instituições regulamentares e complementares de Educação, e que acabaria por produzir efeito direto sobre o alinhamento das pesquisas e o olhar acadêmico, mas que, de algum modo paradoxal, parecem não estar produzindo o mesmo resultado, ou pelo menos, não na mesma intensidade, no extremo oposto deste fenômeno – a família, a escola.

Ao olharmos para o século XXI, nos questionamos sobre os reais motivos da apressada reivindicação dos movimentos de inclusão, seja nas esferas e motivações políticas envolvidas no tema, seja pelos resultados econômicos gerados pelo discurso/retórica, ou mesmo prática restrita a nichos seletivos de inclusão, esporte, educação, cotas, trabalho, principalmente pela exploração da imagem da “pessoa incluída”.

A primeira década do novo século implementaria à nossa trajetória um novo olhar sobre o tema, como resultado de nossa aproximação com a área da Educação Física.

O contato com o curso como professor, e em 2006 com o ingresso no mestrado em Educação Física, implicariam em uma ampliação da visão, decorrente do acréscimo à perspectiva de um pedagogo, dos aspectos oriundos da abordagem multidisciplinar da Educação Física. A compreensão de aspectos da Fisiologia, Anatomia, Atividade Motora, Adaptação, e, principalmente, a história da Educação Física e suas transições na direção da Adaptação e Saúde, abririam novos debates às respostas até então consolidadas na estrada de um pedagogo.

Neste novo ambiente, o da Educação Física, houve a necessidade de uma ampliação do mapa conceitual que, paralelamente a história da educação do final do século XX (conforme o olhar da pedagogia), tinha sua própria história, suas próprias visões.

Na abordagem da Educação Física, principalmente sob o prisma do Desporto Adaptado, conforme referencia Araújo(1998), é possível perceber uma nítida e ampla modificação conceitual desde 1980/81, porém essa se refletiu muito mais no ambiente social e das competições esportivas, ou mesmo produzindo mudanças na concepção da formação do professor da Educação Física, mas, muito pouco migrou para a prática da Educação Básica.

Como proposto por Araújo (1998), vivenciamos três recortes temporais e conceituais nesta temática da tratativa das deficiências: enfoque médico/corretivo, num primeiro momento, sua transição para o psicopedagógico, e num terceiro momento para o enfoque pedagógico. Nosso caminho de formação acadêmica se deu no período de transição do enfoque

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médico para o terapêutico (período do primeiro encontro entre os alunos em sua fase infanto-juvenil), a transição do terapêutico para o pedagógico (período do segundo encontro com nosso amigo na graduação) e o período de sedimentação do pedagógico (primeiros anos de experiência profissional como coordenador pedagógico).

Durante a experiência de construção do texto da dissertação de mestrado, nos dedicamos principalmente as discussões desse ultimo paradigma – o enfoque pedagógico. Porém, naquele então, sinalizávamos uma tendência crescente, em virtude das mudanças na legislação e no alinhamento das discussões nacionais, de transição para um novo paradigma – enfoque Social e econômico (SANCHES, 2009).

Considerando diversos dispositivos legais nos âmbitos federais, estaduais e municipais que disciplinam ou regulamentam temas tais como cotas (faculdade e empresas), exigências prediais, tratamento discriminatório, normatização de nomenclaturas, cadastros oficiais da educação básica, etc., a mudança para esse novo paradigma não somente parece real, mas acrescenta aos problemas já existentes, outros novos.

Esses novos problemas estão principalmente ligados à gestão dos processos de inclusão, tais como: aferir os resultados da inclusão, definir seus indicadores de estado, monitorar a eficiência das ações adotadas, validar a eficácia dos modelos implementados, monitorar em tempo real e não histórico/estatístico as transições dos fenômenos gerenciais das políticas definidas, só para apontar alguns.

Se a acelerada tentativa de inclusão sob o enfoque pedagógico adotada pelo sistema regular de ensino imposta pela redação da LDBN de 1996, parece estar obtendo resultados não tão satisfatórios quanto se imaginava, o problema parece aumentar quando tentamos olhá-lo sob o enfoque social e econômico, pois saímos de um ambiente relativamente controlável como a escola, e voltamos nosso olhar para a sociedade e a economia, ambientes não somente amplos, mais de variáveis extremamente complexas.

Se no auge do período de enfoque pedagógico, Silva, Araújo e Duarte (2004), apontavam a existência de um período de transição, de encontros e desencontros no lidar com as diferenças, sinalizando a necessidade de que algo devesse ser feito na direção de alcançar os objetivos daquele novo momento do processo, hoje, poderíamos apontar que é urgente a necessidade de que alguma coisa seja feita no sentido de garantir, no cenário que se desenha,

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eficiência e eficácia da imensidão de regulamentações, apontamentos e incursões sócio-econômico-educativas para inclusão.

Posto que carentes de dados atualizados, realidade apontada por Sanches (2009) quanto aos dados disponíveis sobre a população de inclusão, vivemos hoje um abismo ainda maior, pois a carência não se faz somente nos dados e sua atualização, mas na sincronicidade e alinhamento dos mesmos, uma vez que no contexto social, as demandas são não somente mais amplas, mas diversas e dinâmicas exponencialmente.

Nesse recorte temporal, a Educação Física aparece como uma experiência interessante a partir do momento em que figura como um híbrido de áreas que suscita diversos debates. Diferente da pedagogia, que se força a um olhar multidisciplinar apesar de que ela mesma, enquanto concepção inicial tenha enfoque único, a Educação Física naturalmente é multidisciplinar, à começar pelo nome – Educação – Física, e quando sob o enfoque de seus conteúdos, enxergando o Homem por seus pressupostos de desenvolvimento, estrutura, saúde, cultura, imagem corporal, lazer e adaptabilidade, ao mesmo tempo em que deva visualizá-lo sob o prisma da Educação.

Esta visão multidisciplinar aponta para necessidades de um olhar múltiplo quando sob o enfoque social e econômico da inclusão, porém, este olhar exige não só isso, mas uma percepção inter e transdisciplinar, uma vez que nas interligações sociais, políticas e econômicas, há muito mais fenômenos “nas entrelinhas” que “nas linhas”, e os modelos convencionais de desenho, planejamento, monitoramento e mensuração se mostram suficientes para enxergar tais entrelinhas.

Conforme proposto por Sassaki(1997) que inclusão social se daria por um processo bilateral onde pessoas excluídas, e a sociedade buscassem, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos, há que se garantir que o desenho deste processo seja em primeiro lugar visível, em segundo lugar correto, em terceiro lugar implementável, e em quarto lugar rastreável, a fim de que garanta seu resultado, sob pena de o processo não passar de uma política utópica.

Frente a esta necessidade, conforme Gonçalves(2013) os métodos, técnicas e abordagens clássicas de identificação e caracterização de problema, parecem não satisfazer e responder plena e prontamente aos problemas complexos da sociedade contemporânea.

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A resolução de problemas complexos dificilmente é alcançada com ações isoladas; demanda o engajamento de competências plurais, de equipes transdisciplinares. (BACHELARD, 2004; GATTAZ SOBRINHO, 2001).

Na busca de uma metodologia que desse conta de simular, emular e encenar os cenários que o contexto social e econômico exigem, apontando com clareza indicadores de estado/transição que garantissem afirmar e reafirmar a inclusão, a problemática deste trabalho se configurou do seguinte modo: que contribuições uma abordagem de resolução de problemas complexos, contemplando os princípios de desenho de processos orientados a valor, propiciam ao processo de gestão pública, como forma de tornar possível uma visualização da realidade da execução das ações da inclusão, tanto no estabelecimento de um diagnóstico mais preciso dos métodos e processos de inclusão, quanto no ferramental capaz de clarificar os caminhos e descaminhos de sua implementação?

Como percurso inicial, o presente trabalho percorreu uma breve revisão histórica e conceitual da inclusão, seu entrelaçamento com a Educação Física, e as implicações de uma visão inter, multi e transdisciplinar da problemática da inclusão, bem como a caracterização dos elementos da gestão como de fato um problema complexo, que carece de uma abordagem diferenciada do lugar comum (modelos monodisciplinares e binomiais na análise e seleção de variáveis).

Num segundo momento, discorremos sobre os processos metodológicos da pesquisa, e análise das possibilidades da aplicação tanto do método – Abordagem de Resolução de Problema Complexo Orientada aos Princípios de Processo – ARPCOOP (Gonçalves, 2013) – quanto da utilização de um instrumento de aferição e monitoramento de resultados para desenho, modelagem e validação de processos de gestão para o qual adotamos a plataforma PArchitect.

Pressupomos que a utilização de tal metodologia e adoção de uma ferramenta de modelagem, permitirá não somente a identificação clara do fenômeno, mas também a definição precisa de soluções que garantam a eficácia das inserções no âmbito da gestão dos processos de inclusão, e do alinhamento das políticas públicas às reais necessidades advindas da pessoa com deficiência.

Nesse contexto, o presente trabalho teve como objetivo analisar as contribuições de uma abordagem de resolução de problemas complexos, contemplando os princípios de desenho de processos orientados a valor para o processo de gestão pública, como

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forma de tornar possível uma visualização da realidade da execução das ações da inclusão, tanto no estabelecimento de um diagnóstico mais preciso dos métodos e processos de inclusão, quanto no ferramental capaz de clarificar os caminhos e descaminhos de sua implementação.

A opção pelo município de Hortolândia se dá em parte pela necessidade de ampliação da visão e apontar de caminhos resultantes de percepções advindas da trajetória do Mestrado, e num segundo plano, por nossa própria aproximação com a prefeitura, resultante das incursões do curso de Educação Física da Faculdade Adventista de Hortolândia como agência formadora de profissionais para o município seja nas ações de pesquisa do curso, quanto em suas atividades de extensão. Tal proximidade possibilitou um olhar mais próximo e interno das questões da gestão municipal, o que motivou e justificou a experiência deste trabalho.

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2 A Inclusão

2.1

O Persistente Desafio Da Conceituação

Dialogar sobre as questões da inclusão é, no mínimo, correr o risco de adentrar o olho do furacão de um aparente interminável debate de formas e conceitos que divergem tanto entre si quanto a distância entre os polos. É arriscar adentrar num debate que divisa longe seu final, conceitos estes, que passam por uma compreensão em franca construção, numa discussão acirrada que envolve "amores e humores" que se inflamam, seja pela convergência e encanto do tema, seja pelas posturas paradigmáticas que defendem seus pontos de vista como a verdade última ou descoberta dos segredos de uma caixa de pandora (SANCHES, 2009).

Esta ebulição de conceitos, aliada a uma infinidade de tentativas pragmáticas de se provocar a inclusão, conduz a uma tarefa ainda mais difícil que é a de, em pleno processo, definir termos que expliquem ou delimitem o fenômeno, sem com isso torna-lo estanque, polarizado ou radicalizado.

Talvez apresentar visões e contextualizá-las no tempo e movimento conceitual seja a maneira mais prática de tentar perceber onde estamos, por onde trilhamos e, por fim, para onde estamos nos direcionando.

Ao buscarmos uma abordagem que em lugar de conceitos fechados, encontre visões em movimento, que num olhar linear e transversal abstraia da história, que é por natureza dinâmica, multifacetada e interdependente, suas nuances e enfoques quando sob o recorte da inclusão, estaremos, de certo modo, identificando conceitos que lhe foram aplicados, ao mesmo tempo em que clarificamos o fato de que distamos muito de algo que se possa atribuir como conceito final.

Como apresentado por Seabra Jr., Silva, Araújo e Almeida (2004), o termo inclusão surge nos tempos modernos a partir de um movimento de formação e ampliação de espaço em diversos segmentos da sociedade, redirecionando conceitos e práticas das relações sociais.

Sendo assim, podemos visualiza-lo como produto em formação resultante de uma dinâmica que perpassa o sujeito, os sujeitos de seu entorno que lhe impactam o olhar, seus governos e sistemas que lhe apontam caminhos, sedimentam novos conceitos e lhe propõe

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políticas. Nesse esforço, ora formal e intencional, ora reativo, informal e quase amorfo, percebemos um paradoxo no discurso formador do conceito que parece delimitar que a compreensão da inclusão surja como resposta ao conceito e percepção que se dá a exclusão.

Ainda que tal noção não esgote a questão conceitual, lança uma luz sobre o método (ainda que nem sempre consciente) com que os debatedores se projetam para estabelecer seus conceitos, e consequentemente práticas de inclusão.

A partir deste olhar reverso, uma série de visões sobre exclusão podem ser elencadas, e para cada excluído, resultará um fenômeno inclusivo que lhe corresponda. Não somente isso, como a história é linear, conduzida no tempo e espaço, cada nova visão de exclusão muda o conceito linear da inclusão, mas provoca efeitos colaterais não visíveis de imediato, que reconduzem o tema a uma nova geração conceitual de excluídos, que resultará em um novo conceito de inclusão. E embora sejamos tentados as vezes a pensar que a história seja cíclica, o que nos parece realmente cíclico é o método e não a história.

Sem generalizações, pois tratamos aqui de um tema subjetivo, poderíamos parafrasear Newton em sua terceira lei – a toda ação “de exclusão” há sempre uma reação oposta e de igual intensidade “ainda que não descoberta, ou somente teórica” para inclusão: ou as ações mútuas de dois corpos um sobre o outro “Exclusão-Inclusão” são sempre iguais e dirigidas em sentidos opostos.

A ilusão cartesiana deste modelo das exatas reside no marco zero do tempo em que a reação se dá. Enquanto que na física, por seu modelo preciso de componentes e reações, a resposta surge imediata, no campo das ações humanas, subjetivas e imprecisas como são, as reações não acontecem no tempo e espaço da física, mas no tempo virtual e impreciso da história e dos movimentos da sociedade.

Daí o fato de que estabelecer um conceito por um recorte cartesiano, ou análises puramente binomiais ou por caminhos quantitativos clássicos que esgotem um tema, não parece possível quando a questão envolve fatores de ordem humana, social, política e econômica.

Isso pode ser demonstrado de forma simples com o agrupamento das perguntas e respostas aos termos Exclusão – Inclusão, e aplicando a visão dos opostos induzida pela paráfrase anterior, podemos fazê-lo identificando por exemplo, cinco perspectivas pelas quais a inclusão pode ser abordada, como na figura abaixo.

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Figura 1. Perspectivas da Inclusão FONTE: SANCHES, 2009.

Para cada perspectiva, podemos delinear perguntas que resultam respostas sobre exclusão, e apontam a reação oposta que é a abordagem de inclusão.

Sob o ponto de vista conceitual, por exemplo, seguindo uma abordagem puramente cartesiana, para respondermos perguntas como – O que é? O que não é? – estarão condicionadas às respostas dadas ao que entende por quem foi excluído. Mas a reação binomial, produzirá irremediavelmente um efeito colateral não visível a priori que gerará uma nova exclusão e reativará o processo.

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Figura 2. Perspectiva Conceitual da Inclusão

Tal fenômeno ocorre, dentre outras razões, pelo efeito míope gerado a partir da indução reducionista da resposta dada ao elemento exclusão, sem levar em conta a natureza do problema onde a exclusão ocorre, no caso simples acima – o Jogo em processo. Ao se reduzir o tema ao fenômeno SELEÇÃO do time, ignorou-se o desenvolvimento da atividade, as competências, as diferenças intrínsecas e extrínsecas aplicadas às competências, etc.

Stainback e Stainback(1996), já sinalizavam que a exclusão nas escolas como as sementes do descontentamento e da discriminação social. Ou em outros termos, os caminhos adotados numa visão equivocada ou desconhecida do problema, produz uma reação contraditória à eficácia.

Isto implica dizer que o reducionismo na abordagem conceitual, não somente produz um reducionismo reativo ao fenômeno Inclusão, mas pode, e na grande maioria das vezes provoca, uma ilusão de resultado, pois, o conceito pragmático aplicado à inclusão gera resultados altamente satisfatórios de eficiência, mas erra completamente o alvo na eficácia.

Em outras palavras, nos tornamos especialistas, altamente qualificados em eficiência, sustentamos o fenômeno com dados estatísticos de crescimento, mas erramos o alvo.

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Obviamente, nos extremos, a diferença conceitual é cristalina e facilmente identificável. Porém, o campo cinza que permeia os extremos traz riqueza e confusão ao mesmo tempo na tentativa de encontrar caminhos que conduzam a conceituação.

O mesmo ocorre ao aplicarmos essa metodologia às outras perspectivas.

Quando rotulamos cartesianamente o sujeito, o efeito da consequente conceitual primária, resultará o delineamento do sujeito a ser incluído, a forma de abordagem, os processos metodológicos e a desculpa presumida do fracasso, além de definir com tremenda eficiência, mas não proporcional eficácia o conceito de inclusão. (Fig. 3)

Figura 3. Perspectiva do Sujeito/Objeto da Inclusão – Enfoque Negativo

Sob a mesma ótica, se mudamos o tom negativo da resposta à exclusão para um modelo positivo, os efeitos primários e colaterais denotarão novas frentes de ação, conforme figura 4.

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Figura 4. Perspectiva do Sujeito/Objeto da Inclusão – Enfoque Positivo

Porém, o que nos chama a atenção, mais do que a polarização conceitual resultante das inversões cartesianas de respostas, é o fato de que os efeitos colaterais persistem, quer na forma positiva quer na negativa, o que nos leva a reflexão de que a algo que vai além do jogo superficial e fixista das perguntas cartesianas. Ainda que estas nos sirvam para o início do debate, há que se buscar uma alternativa que de conta de tratar dos efeitos colaterais e da minimização de riscos.

Embora, para efeitos didáticos tenhamos abordado exemplos relativamente simples que nos permitam perceber a dinâmica que os métodos clássicos de análise e solução de problemas evidenciam, e o universo de entrelinhas que deixam escapar na análise, ao tratarmos do conceito primário e do sujeito, ainda estamos no campo mais objetivo da discussão. As coisas se tornam confusas, complexas ou difusas mesmo, quando adentramos o campo dos motivos. Tentar desenhar os motivos, caracterizá-los, explicitá-los é percorrer um caminho confuso de paixões, humores, amores que se espalham e sedimentam nos mais variados nichos da sociedade.

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Ao discutirmos os porquês, não raras vezes ocorre um descolamento das análises e dos conceitos. Não é incomum encontrarmos porquês desconexos do conceito de sujeito e do conceito de inclusão, e mais, é igualmente comum encontrarmos dicotomia de abordagem entre os motivos explicitados nos textos das políticas, das regulamentações, dos planos, e os motivos do discurso da construção real, os motivos verdadeiramente incorporados pelo sujeito.

O debate dos motivos nos conduz, a respostas que percorrem desde a assistencialista amenização de consciência e culpa até as questões mais profundas da visão do ser humano como ser responsável, vivo e igual em direitos e deveres. Os ideais perpassam tanto razões político-partidárias superficiais quanto percepções sociais legítimas oriundas de educadores e pesquisadores conscientes das necessidades impostas pelo tema (SANCHES, 2009). Numa cadeia de motivos e conceitos que só faz demonstrar o tamanho e a complexidade do problema, as duas perspectivas finais nos conduzem aos inevitáveis quem faz e onde faz. Alinhadas todas as discussões precedentes, o que escolhermos como resposta para “o que é exclusão”, “quem é o excluído”, “por que”, “para que” e “para quem deveria ser incluído”, as resultantes serão: Quem se responsabiliza pela tarefa e onde deverá realiza-la.

Nesse campo, surgem os pontos mais sensíveis do fenômeno – a caça aos culpados. No binômio exclusão-inclusão, somos tentados a estigmatizar e, do mesmo modo reducionista anterior, limitar os culpados, afinal de contas, isso simplifica a responsabilização.

Mas quando olhamos com atenção os efeitos colaterais anteriormente abordados como exemplo, nos damos conta de que a questão passa longe, bem longe mesmo de uma responsabilização simplista de culpa, pois o modelo é sistêmico, difuso, amplo, dinâmico, o que resulta em uma apresentação igualmente distribuída de culpa e responsabilização.

Finalmente resta a questão do local da inclusão, onde será processada essa inclusão, em que local deverá viver o incluso, sob que demandas ambientais.

Se por excluído entendemos o doente, seu lugar é o hospital (seja de que forma este se apresente) até que se cure, e seu processo é a reabilitação; se por excluído entendemos um aprendiz, seu lugar é a escola até que aprenda, se por excluído entendemos o que não trabalha, seu local é o trabalho, e o processo é a oportunidade ou paliativamente algum tipo de benefício, se por motivos entendemos a ação e vida plena em sociedade, seu destino final é a vida comum e

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igual, mas todas estas questões depreendem de outras ainda mais profundas como o que é igualdade e o que é diferença, o que é habilidade e competência e o que é deficiência.

O panorama histórico, como visto a seguir, nos permite visualizar a dinâmica conceitual a luz dos enfoques do momento vivido por cada grupo de atores, no tempo e no espaço, bem como o efeito reativo das reflexões aqui abordadas na mesma linha temporal em que os fenômenos aconteciam e geravam seus próprios efeitos colaterais.

Perfazendo essa necessidade de se encontrar uma abordagem, uma metodologia, um método e técnicas que deem conta de abarcar toda classe de problemas complexos, como proposto por Ramamoorthy(2000,2012) e Simon(1987), conhecidos ou não, com soluções conhecidas ou não frente a esse emaranhado de possibilidades que entremeiam a discussão, para esse trabalho de pesquisa, escolhemos analisar a evolução do conceito de inclusão e suas consequências para, no dialogo destas cinco variáveis (conceito, objeto, motivo, responsável e local), encontrar indicadores que nos possibilitem verificação do estado da inclusão, suas transições necessárias e principalmente a resposta a uma sexta variável – O COMO.

2.2 Breve Panorama Histórico da Inclusão

A inclusão é o resultado da soma de oportunidades bem sucedidas que são possibilitadas a qualquer cidadão e não somente dos decretos, sem oportunizar o real acesso às oportunidades e aos meios para superar os desafios que promovam o seu desenvolvimento. (Araújo: 2003, p. 89)

2.2.1 O Sujeitos da Inclusão e a Evolução das Terminologias

Ao longo da história percebemos que estão presentes segregações de toda ordem, sociais, econômicas, políticas, raciais e físicas.

Tomando-se a guisa de exemplo a escola como um recorte interno da sociedade, as variantes de segregação, de algum modo, em maior ou menor grau, de forma direta ou indireta, afetam a construção de currículo, escolha de métodos e abordagens, o perfil docente,

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sua formação profissional, posto que esta se dá também numa escola, suas interações para dentro e para fora do espaço escolar.

O recorte escolar como exemplo, não é uma escolha casual, mas resulta de um movimento intrincado de alimentação e retroalimentação de conceitos que permeiam todas as áreas de formação de pessoas que interagem em sociedade, afinal, da academia nascem conceitos que formam pessoas, mas estes conceitos, também refletem de certo modo o entorno, o contexto, as pressões impostas pelas mesmas pessoas que ocupam este espaço.

Conforme estabelece Pierucci (1990, apud Seabra Jr., 2006 p.55), aspectos comuns que definem etnia, gênero, nacionalidade, economia além de outros, parece representar, por questões de poder e dominação, linhas demarcatórias, de superioridade e inferioridade, habilidade e deficiência, sucesso e fracasso.

Pelas mesmas razões de complexidade abordadas no tópico de conceituação, abarcar todas estas perspectivas e tipologias de sujeitos em um único panorama, pelo menos à luz de um olhar clássico, resulta inviável. Tal impossibilidade, parece conduzir os estudos a uma necessidade de especificação de fenômenos e variáveis.

O produto desta especificação é invariavelmente a adoção de terminologias que possibilitem o recorte, a redução de objeto/sujeito observável. Ainda que necessária para efeito de análise, o perigo de tais recortes, é a perda de foco do problema em si, para uma discussão, carregada de certa dose de “preciosismos” e “milindres”, de terminologias e rótulos que, na melhor das vezes dever-se-iam aplicar exclusivamente ao reducionismo do recorte, sendo mais importante o conceito envolvido do que o nome em si. A despeito disto, Seabra(2006,2008), Filus(2011), Araújo(2003,2008) Silva(2005, 2008) e Sanches(2009) apontam em suas reflexões pelo menos três recortes sobre o sujeito da exclusão:

a. a pessoa em condição de deficiência(PCD), b. a com necessidades especiais(PNE) ou

c. aquelas com necessidades educativas especiais (PNEE).

Ao produzirem tal recorte, porém, esbaram nas mesmas dificuldades: a evolução e transição dos termos, e não somente isso, as implicações ideológicas que estes inferem.

Embora não seja nosso objetivo, a discussão da terminologia, para clareza de entendimento é necessário destacar a abrangência dos mesmos.

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Silva, Seabra Jr. e Araújo (2008) ao abordarem os termos conceituais decorrentes dos documentos elaborados pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPS) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS), na XXIII Conferência Sanitária Pan-Americana (realizada em Washington, 1990):

Deficiência: qualquer perda de função psicológica, fisiológica ou anatômica que caracterize anormalidades, quer temporárias ou permanentes em membros, órgãos ou estruturas do corpo, inclusive os sistemas próprios da função mental.

Incapacidade: qualquer restrição, devida a uma deficiência da capacidade de realizar uma atividade, caracterizada pelo desempenho insatisfatório de ações pelo indivíduo, quer temporárias ou permanentes, reversíveis ou irreversíveis, nos aspectos psicológicos, físicos ou sensoriais.

Menos valia: situação desvantajosa para uma pessoa, causada por uma devida deficiência ou incapacidade que o limita ou impede de desempenhar um papel, caracterizado pela diferença entre o rendimento do indivíduo e suas próprias expectativas, ou as do grupo a que pertence.

Esta abordagem parece percorrer de forma sintética, porém, suficientemente abrangente as questões da PCD e PNE no que tange as questões aparentes da deficiência, porém, pela exacerbação da atenção à diferença e potencial estigmatização conforme as idéias de Pierucci (1990, apud Seabra Jr., 2006, p.54), deixa de fora o que Seabra Jr. (2006) destaca como ponto cego na ação da inclusão que são as questões não aparentes nas necessidades educativas e que de igual maneira pontuam aspectos de exclusão escolar (obesidade, baixa experiência motora, timidez, hiperatividade, superdotação, etc) as quais atribui o termo PNEE.

Conclui em sua abordagem que referenciar as diferenças e a PNEE no ambiente escolar implica a importância de entendermos que o papel da escola, como espaço inclusivo, deve ser o de suscitar desafios, reflexões e debates denotem a coexistência de diferenças na diferença.

Tal discussão, nos conduz ao dilema expresso por Filus(2011) em seu alinhamento com a proposta de Jannuzzi (1985), e com o qual concordamos, que a discussão sobre a terminologia torna-se sem relevância, posto que as intermináveis discussões e substituições somente amorteceram por algum tempo sua pejoratividade.

Precisamente essa é a diferença entre o rótulo e o conceito. Enquanto o conceito e a caracterização nos mergulham no conhecimento real do problema, o rótulo nos distancia dele

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e artificializa a discussão. Se mais importante que o nome é a compreensão do significado, para a inclusão como fenômeno complexo, mais importante são seus indicadores, protocolos, valores e transições descritas de forma clara no processo, do que a discussão etérea de termos.

2.2.2 Caminhos e Descaminhos da Inclusão - da Sociedade para a Escola e Vice Versa

Dados os termos, e identificado o sujeito objeto da exclusão, nos cabe indagar sob que ótica foi este sujeito tratado ao longo da história, e de que forma ao longo do tempo, esse tratamento construiu as bases para o que hoje se aplica nas questões da inclusão.

A tratativa destas questões nos remete a duas grandes abordagens presentes na literatura, conforme apresentado por Seabra Jr. (2006):

• Primeiramente, a exclusão total, por serem as PCD consideradas inválidas ou improdutivas, resultando em ações destruição, eliminação e menosprezo.

• Posteriormente, a tolerância, aceitação e apoio, marcando o atendimento a PCD, primariamente com características assistencialistas, visando abrigo, alimentação e saúde, realizadas por instituições de caridade, e que figuram como embriões de um atendimento posterior que migra para entidades especializadas por tipo de deficiência.

Ao estudarmos as civilizações antigas, nos deparamos com a associação tanto da deficiência quanto das doenças como uma ação deletéria proveniente dos Deuses. Tais pessoas, portanto, eram relegadas à indigência ou marginalização, condenadas a mendicância, exclusão e abandono à sua própria sorte, sob pena de "contaminar" os que com elas convivessem. Conforme Silva (1986) em sua apresentação da Epopéia Ignorada, a maioria dos povos primitivos indicava o extermínio como solução para o problema de crianças ou adultos com defeitos físicos, ou ainda com problemas intelectuais marcantes, o que pode ser observado entre os índios Ajore, Creek, Dene, Dieri, Junkun, Navajo, Salvia, e outros.

Como apresentado por Gugel (2007), tal atitude também ocorria entre algumas das grandes civilizações como a Grega. Platão, no livro “A República”, e Aristóteles, no livro “A Política”, ao abordarem as questões do planejamento das cidades gregas descrevem a indicam que as pessoas nascidas “disformes” deveriam ser eliminadas. Outros que não adotavam o extermínio como regra geral, permitiam aos pais decidirem sobre o destino dos filhos com

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deficiência. É o caso dos romanos, que conforme sua Lei das Doze Tábuas, permitia aos pais o afogamento de crianças deficientes, ou deixá-los em cestos no Rio Tibre. As que sobrevivessem poderiam ser exploradas por "esmoladores" ou como entretenimento em circos aos mais ricos da sociedade.

Ainda que sob o período da prática da exclusão, Pessoti e Adams (1985, apud Gugel, 2007) dão conta de que paradoxalmente, civilizações deste mesmo período (China, Grécia e Roma) acreditavam que exercícios físicos, bem como massagens e banhos, contribuíam preventiva ou terapeuticamente para alívio de distúrbios físicos e certas doenças. Personagens históricos como Heródico, Hipócrates, Galeno e Aurelianos enfatizaram em suas obras os valores da ginástica para essas questões.

Como estágio embrionário, porém não descolado por completo, estão ligados a esse mesmo período as atividades desportivas dos históricos jogos olímpicos, e por que não os primórdios da hoje conhecida Atividade física/Educação Física e também da Educação Física Adaptada - EFA.

Curiosamente, dentro do domínio romano, com o surgimento do cristianismo, estas concepções passam por transformações e os registros dão conta de que a partir do Século IV, durante o hiato das perseguições aos cristãos, surgem os primeiros hospitais de caridade que abrigam indigentes e pessoas com deficiência.

Em Alexandria foi criada a primeira universidade de estudos filosóficos e teológicos de grandes mestres. Dentre eles, Dídimo, o Cego, conhecia e recitava a Bíblia de cor. No período em que começava a ler e escrever aos cinco anos de idade, Dídimo perdeu a visão mas continuou seus estudos, tendo ele próprio gravado o alfabeto em madeira para utilizar o tato.

A tolerância, aceitação e convivência não apagaram por completo o contexto discriminatório tão marcante dos períodos anteriores.

Conforme Gugel (2007) na idade média ainda se faziam presentes a ridicularização e o misticismo. Os ditos deficientes (como rotulados à época) eram vistos como castigados por Deus. Outros, supersticiosos, lhes atribuíam poderes especiais de feitiçaria ou bruxaria. Não raras vezes, crianças sobreviventes às precárias condições da época medieval eram separadas de suas famílias e serviam, como os anões e corcundas, como foco de diversão dos mais abastados. Uma clara repetição da ação do Império Romano.

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No mesmo período Medieval, conforme Gugel (2007) Luís IX funda o primeiro hospital para pessoas cegas, o Quize-Vingts.1

A proximidade do término da era medieval, no movimento de passagem conhecido como Idade Moderna, os movimentos de reforma religiosa, a ampliação dos estudos e o crescimento da visão humanista e científica, como constatam, Carmo (1991), Silva (2004) Van Munster (2004) e Gugel (2007), possibilitaram mudanças significativas no campo da reabilitação física e alterações importantes ao atendimento das PCD e PNE.

Tais contribuições, como aponta Gugel (2007) ocorrem em diversas áreas como por exemplo: o método de ensinar pessoas surdas a ler e escrever por meio de sinais, de Gerolamo Cardomo (1501-1576) e Ponce de Leon (1520-1584); os textos do espanhol Juan Pablo Bonet (1579-1633) sobre as causas das deficiências auditivas e dos problemas da comunicação, e sua demonstração do alfabeto na língua de sinais; o método de ensino de leitura labial defendido pelo inglês John Bulwer (1600-1650); o método cirúrgico para amputações e religações de artérias proposto pelo francês Ambroise Paré (1510-1590), a cadeira de rodas de Stephen Farfler em 1955 na Alemanha; a indicação de tratamento especializado às pessoas com deficiência em hospitais. Havia assistência especializada em ortopedia para mutilados de guerra, cegos e surdos; a indicação de Philippe Pinel (1745-1826) de que pessoas com perturbações mentais devessem ser tratadas como doentes, e não serem acorrentadas ou tratadas com violência e discriminação; e muitas outras ações.

Proeminentes pesquisadores desse período e pessoas de prestígio, mas que apresentavam algum tipo de diferença também contribuíram para a mudança de concepção e atendimento a PCD e PNE, conforme apresentado por Carmo (1991) e Gugel (2007), tais como Luís de Camões, John Milton, Galileo Galilei, Johannes Kepler, que completaram suas obras com ausência da visão.

2.2.3 A Educação Especial e a EFA

1 Quinze-Vingts - 15 X 20=300 - número de cavaleiros cruzados que tiveram os olhos vazados na 7a Cruzada.

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Neste contexto, e com todas estas abordagens no sentido de um tratamento especializado das PCD e PNE, são lançadas as bases de um atendimento educacional especializado que dê conta desta demanda de diferenças. No escopo do surgimento da Educação especial, se delineia a atividade física adaptada como elemento presente das terapias, da reabilitação e de suporte ao ensino (EFA).

Até esse momento, o escopo da inclusão aparece alijado do processo educacional regular. O foco nas diferenças e na deficiência herdados do período mais antigo, deram à inclusão uma característica de correção ou reabilitação, e esta visão separou os indivíduos.

Silva, Seabra Jr. e Araújo (2008) descrevem cronologicamente, a partir da Idade Moderna, a construção destas idéias e a formação da Educação Especial ao mesmo tempo em que lança luz sobre o que possivelmente seja a origem da EFA num movimento da EF para a Educação Especial:

• John Lock (1690) – Inicia outro momento histórico que é o marco inicial da Educação Especial. Tinha como lema ‘A experiência é o fundamento de todo o saber’;

• Rousseau (1754) – Seguidor de Lock, enfatiza a necessidade de um trabalho corporal para desenvolver a inteligência;

• Itard (1800) – Ressalta a importância da individualidade na aprendizagem; • Séguin (1846) – Em seu método aponta para a necessidade do sistema

motor; cria os primeiros internatos para pessoas em condição de deficiência mental na França e Estados Unidos;

• Outros como Pestalozzi e sua didática natural e Montessori que prossegue com os trabalhos de Itard e Séguin e os transforma em método educativo também participam e colaboram nessa construção;

• EUA (1919) - Após o retorno dos veteranos da I Guerra Mundial, houve a necessidade de uma mudança no programa até então utilizado, quando surge a EF corretiva com terapias físicas e corretivas;

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• Inglaterra, 1944 - Sir Ludiwig Guttman (neurologista e neurocirurgião) cria um programa de tratamento no centro de lesão medular do Hospital Stoke Mandeville, onde introduziu várias modalidades desportivas;

• 1948 - A EFA passa de um modelo médico para um modelo pedagógico • 1952 - Surge o conceito de EFA, englobando a EF corretiva.

2.2.4 A Educação Especial e EFA X Escola Regular e EF

Conforme relata Silva (2005) para as pessoas em geral e as PCD a EFA não se diferencia da Educação Física (EF) em seus conteúdos, mas compreende técnicas, métodos e formas de organização que podem ser aplicadas ao indivíduo com necessidades especiais. É um processo de atuação docente com planejamento, visando atender às necessidades de seus educandos. A EFA passa a ser vista como veículo de promoção para PCD. Promoção no sentido de crescimento, tendo em vista, a ampliação de possibilidades de desenvolvimento cognitivo, afetivo, psicomotor, e psicossocial.

O mesmo fenômeno parece se dar com a Educação Especial que pode ser vista como uma variação técnico-metodológica na direção do atendimento de necessidades específicas dos alunos. E de igual modo a EFA, ser percebida como promotora no sentido de crescimento, tendo em vista, a ampliação de possibilidades de desenvolvimento cognitivo, afetivo, psicomotor, e psicossocial da PCD ou PNE.

Tal conceito, posto que atraente pelas promessas, faz por construir uma nova fase da segregação - os nichos.

Para a variável "onde" incluir, em que local praticar a inclusão, abre-se uma lacuna entre a escola regular (para os ditos normais) e a educação especial, e no que se refere a EF e EFA o mesmo sucede.

Ao descrever os primórdios da tensão exclusão-inclusão nos EUA, Stainback e Stainback(2006) relata questões pontuais desta metodologia a partir da última década de 1700, com a introdução do conceito de educação da PCD por Benjamin Rush. No fim da Guerra Americana da Independência, em 1783, grupos de cidadãos ricos estabeleceram várias sociedades

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filantrópicas cuja principal preocupação era garantir que grupos marginais não ameaçassem a República e os valores norte-americanos.

Essas iniciativas tiveram papel importante na separação entre escolas públicas e instituições de reabilitação. A partir de então, tem início uma série de ações, públicas e de iniciativa privada, que estabelecem as bases para cristalizar esse modelo:

• 1817 - Thomas Galludet estabelece o Asilo Norte-Americano para Educação e Instrução de surdos e mudos;

• 1829 - Asilo para a Educação de Cegos;

• 1846 - Escola Experimental para o ensino e Treinamento de Crianças Idiotas.

Ainda sobre esse tema, Stainback e Stainback(2006) identifica os indivíduos que ingressavam em tais instituições como: indigentes, pessoas com comportamentos fora dos padrões, pessoas com deficiência visível, minorias e muitos imigrantes recém-chegados. Finalmente conclui:

Os motivos da assistência social e do controle eram interligados no funcionamento dessas instituições. Alguns líderes da educação especial da época, ... fizeram notáveis esforços para promover a idéia de que todas as crianças, incluindo as com deficiência, deveriam ter direito ao ensino. Entretanto, o fato de as escolas de treinamento para pessoas com deficiência serem organizadas como asilos, com uma estrutura militar, condenava-as a locais em que eram mais controladas do que ensinadas. Esta tendência para a segregação, para o controle dos indesejáveis, atingiu seu ponto alto durante o século XX (STAINBACK, 2006, p. 37).

Stainback e Stainback (2006) ainda destacam que tanto as instituições regulares quanto as de educação especial tiveram forte expansão na América até a década de 1950, fruto da obrigatoriedade do ensino em todos os estados norte-americanos, o que só fez por agravar ainda mais a segregação. Ressalta ainda que os alunos com déficits importantes, mas que não enquadrados em deficiência visível, compunham a última fila das salas de aula regulares, e as que fossem consideradas ineducáveis eram excluídas.

Em 1954, conforme Stainback (2006), em conseqüência da ação legal entre Brown e (versus) Board of Education, que determinou que o aluno segregado não é igual aos demais alunos, rechaça determinantemente as opções segregacionistas para educação de alunos.

Referências

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Quando Goffman (1985) fala em palco e cenário, atores e platéia, papéis e rotinas de representação, necessidade, habilidades e estratégias dramatúrgicas,

ter se passado tão lentamente como muda uma montanha, aos nossos olhos eternamente parada e cujas mudanças só são percebidas pelos olhos de Deus” (DOURADO, 1999, p.

xii) número de alunos matriculados classificados de acordo com a renda per capita familiar. b) encaminhem à Setec/MEC, até o dia 31 de janeiro de cada exercício, para a alimentação de

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