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Desenvolvimento profissional de educadores matemáticos participantes de uma comunidade fronteiriça entre escola e universidade

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

VANESSA MOREIRA CRECCI

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OMUNIDADE

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RONTEIRIÇA ENTRE

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NIVERSIDADE

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação

da Universidade Estadual de

Campinas para obtenção do título de Doutora em Educação, na área de concentração de Ensino e Práticas Culturais.

Supervisor/Orientador: Prof. Dr. Dario Fiorentini

O ARQUIVO DIGITAL CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA VANESSA MOREIRA CRECCI, E ORIENTADA PELO PROF. DR. DARIO FIORENTINI.

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AMPINAS

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FACULDADE DE EDUCAÇÃO

VANESSA MOREIRA CRECCI

D

ESENVOLVIMENTO

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ROFISSIONAL DE

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DUCADORES

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ATEMÁTICOS

PARTICIPANTES DE UMA

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OMUNIDADE

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RONTEIRIÇA ENTRE

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SCOLA

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NIVERSIDADE

Autora: Vanessa Moreira Crecci

COMISSÃO JULGADORA: Prof. Dr. Dario Fiorentini Profa. Dra. Cármen Lúcia Brancaglion Passos Profa. Dra. Dilma Maria de Mello Prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado Profa. Dra. Laurizete Ferragut Passos

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora consta no processo de vida acadêmica do aluno.

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A minha gratidão...

Ao Felipe, pelo incomensurável apoio em todos esses anos de generosa convivência, e, a nossas famílias por nos ensinarem a conviver em comunidade. Em especial, aos meus pais, pela

compreensão incondicional e à minha irmã, pelas trocas afetivas e pedagógicas. Ao professor Dario, pela generosa orientação, amizade e por ter compartilhado comigo as ideias

que estão reificadas neste estudo.

À Fapesp, pelo apoio financeiro para o desenvolvimento deste estudo.

Aos professores do comitê de avaliação deste estudo: Prof. Dr. Dario Fiorentini, Profa. Dra. Dione Lucchesi de Carvalho, Profa. Dra. Laurizete Ferragut Passos, Profa. Dra. Cármen Lúcia

Brancaglion Passos, Profa. Dra. Dilma Maria de Mello, Prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado, Profa. Dra. Adair Mendes Nacarato, Profa. Dra. Maria Auxiliadora Bueno Andrade

Megid e Profa. Dra. Adriana Varani.

À leitura cuidadosa das professoras Dione e Lauri, que estiveram presentes na banca de qualificação.

Aos professores Dilma, Cármen, Guilherme e Lauri, que participaram da banca de defesa. Aos participantes do grupo Prática Pedagógica em Matemática (PRAPEM). Aos participantes do Grupo de Sábado (GdS), em especial, a Eliane, Roberto e Dario, pela

generosidade de compartilhar suas vidas e seus sonhos comigo. Aos professores que participaram da primeira fase deste estudo.

Aos professores do Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Formação de Professores de Matemática (GEPFPM), pelas inúmeras aprendizagens.

Aos professores da Faculdade de Educação da Unicamp, em especial, aos professores da área de Educação Matemática com os quais convivi: Profa. Dra. Anna Regina Lanner de Moura, Prof. Dr. Antonio Miguel, Prof. Dr. Dario Fiorentini, Profa. Dra. Dione Lucchesi de Carvalho, Profa.

Dra. Maria Ângela Miorim, Prof. Dr. Sérgio Lorenzato.

À Profa. Dra. Paola Sztajn, por me receber no College of Education, da North Carolina State University.

(6)

Aos membros do Centre for Research for Teacher Education and Development (CRTED), em especial, à Profa. Dra. Jean Clandinin, à Profa. Dra. Janice Huber e à Profa. Ms. Jinny Menon.

À Profa. Dra. Maria Cecília Martins e ao grupo TIME, do NIED. À Profa. Leda, pela cuidadosa e paciente revisão do texto.

Aos funcionários da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. Em especial aos funcionários da Pós-graduação: Luciana, Nadir e Diego.

À família de Patrícia Rijavec, Dennis Leclair e suas adoráveis filhas, Marie-Helene, Jasmine e Olivia, pela estadia em Edmonton, no Canadá.

A Ingrid, Priscila, Jenny, Juscier, Marina, e, à tantos outros estudantes de graduação e pós-graduação que por ali passaram, pela bem-humorada convivência no Centro de Estudos, Memória

e Pesquisa em Educação Matemática (CEMPEM).

Aos amigos e amigas que, no coletivo, tornam o cotidiano mais leve e bem-humorado! Não ousaria denominá-los para não correr o risco de injustos esquecimentos, eles e elas sabem quem são! Aos queridos colegas da academia pelas manhãs descontraídas e por me ensinarem a gostar de

atividades físicas.

À Dra. Magda pela compreensão e cuidados com minha saúde de mulher nesta fase de minha vida.

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Resumo

Este estudo tem por objetivo compreender as experiências de desenvolvimento profissional e a constituição da profissionalidade de educadores matemáticos que participam de uma comunidade fronteiriça, entre escola e universidade, denominada Grupo de Sábado (GdS). Surgida em 1999, congrega professores, formadores de professores, pesquisadores e futuros professores que se reúnem para investigar e refletir sobre o ensinaraprender matemática. Os textos de campo são constituídos por um diário com notas das reuniões do grupo, materiais publicados sobre e pela comunidade, memórias e transcrições de encontros do grupo e entrevistas com os participantes da pesquisa. A metodologia deste estudo ocorreu com base na pesquisa narrativa, que compreende um processo tridimensional de produção e análise dos textos de campo e de pesquisa, envolvendo temporalidade (diacronia), interações pessoais e sociais e o lugar (cenário) onde se situa o fenômeno a ser investigado e narrado. Para isso, em uma perspectiva diacrônica, a pesquisadora tomou como referência sua própria experiência dentro dessa comunidade e, sobretudo, sua convivência com três de seus participantes, ao longo de oito anos. Para composição dos textos de pesquisa, foram constituídas narrativas das experiências de desenvolvimento profissional e de constituição da profissionalidade dos três participantes do estudo. Essas narrativas foram analisadas com base em três eixos analíticos: 1) mapeamento dos espaços de experiências de desenvolvimento profissional; 2) compreensões sobre as experiências de desenvolvimento profissional em uma comunidade fronteiriça; e 3) reverberações da participação em uma comunidade fronteiriça. Os resultados apontaram para aspectos que são específicos às experiências constituídas em um espaço que não tem a regulação e o controle institucional da escola e da universidade. Nessa comunidade, os participantes narram suas experiências vividas em diferentes espaços relativos às suas vidas pessoais e profissionais, tecem outras experiências e produzem diferentes compreensões sobre o ensinaraprender matemática. As reverberações decorrentes da participação nessa comunidade fronteiriça se evidenciam, intrinsecamente, nos próprios modos de ser/estar como educadores matemáticos, destacando-se a postura problematizadora e investigativa sobre a própria prática, sobre as políticas públicas que a condicionam e também sobre as possibilidades e os limites dos conhecimentos científicos, curriculares e didáticos pedagógicos tanto da própria escola como de outros contextos. As reverberações extrínsecas são evidenciadas pelas constituições de outras comunidades, pelas sistematizações, teorizações e publicações dos participantes, as quais ajudam a promover mudanças: na prática de ensinaraprender matemática nas escolas, tornando-a mais exploratória, problematizadora e inclusiva, sobretudo para estudantes das escolas públicas; na formação inicial e continuada de professores de matemática, motivando-os a serem estudiosos e investigativos em comunidades docentes; na formação de novos pesquisadores, com destaque para a pesquisa sobre a própria prática.

Palavras-chave: Desenvolvimento profissional; Profissionalidade docente; Postura investigativa; Educação matemática.

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Abstract

This study aims to understand the experience of professional development and the professionalism constitution of math educators who participate in a borderland community, between school and university. Called Saturday Group (GdS) which Emerged in 1999, congregating teachers, teachers’ educators, researchers and future teachers that come together to investigate and to think about the mathematics teachinglearning. The field texts are constituted by a field notes diary of the group meetings, publications about and by the community, memories and transcriptions of group meetings and interviews with the research participants. The methodology of this study is based on the narrative inquiry, which consists of a tridimensional process of production and analysis of the field texts, involving temporality (diachrony), personal and social interactions and the place (scenery) where is the phenomenon to be investigated and narrated. For this, in a diachronic perspective, the researcher took as reference her own experience inside this community and, above all, her relationship with three community participants, over eight years. For the composition of the research texts, narratives of the experience of professional development and of professionalism constitution of the three participants of the study were constituted. These narratives were analyzed based on three analytical axes: 1) the mapping of spaces of professional development experience; 2) the understandings about the professional development experience in a borderland community; and 3) reverberations of the participation in a borderland community. The results showed aspects that are specific of experiences constituted in a space that does not have the institutional regulation and control of school and university. In this community, the participants describe their experiences in different spaces in their personal and professional lives, they compose other experiences and produce different understandings about the mathematics

teachinglearning. The reverberation resulting from the participation in this borderland

community is evidenced, intrinsically, in its owns ways of being as mathematics teachers, detaching the problematical and investigative position about its own practice, about public politics that put it in proper condition, also about the possibilities and the limits of scientific, curricular and pedagogical didactic knowledge in the school and in other contexts as well. The extrinsic repercussions are evidenced by the constitutions of other communities, by the participants’ systematizations, theorizations and publications, which help to promote the changes: in the practice of mathematics teachinglearning in the schools, becoming more exploratory, problematical and inclusive, above all for students in the public schools; in the initial and continuous training of mathematics teachers, motivating them to be studious and investigative in teaching communities; in the formation of new researchers, highlighting the research about their own practice.

Keywords: Professional development; Teaching professionalism; Inquiry as stance; Math educators.

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ADUNICAMP - Associação de Docentes da Unicamp

Anped - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação BNCC - Base Nacional Curricular Comum

CRTED - Centre for Research for Teacher Education and Development

CEMPEM - Centro de Estudos Memória e Pesquisa em Educação Matemática CAp/UFRJ - Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro COTUCA - Colégio Técnico de Campinas

Capes - Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior CONEP - Comissão Nacional de Ética em Pesquisa

CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação COLE - Congresso de Leitura do Brasil

CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico COCEN - Coordenadoria de Centros e Núcleos Interdisciplinares de Pesquisa EM - Educação Matemática

Enem - Encontros Nacionais de Educação Matemática ETI - Escola de Tempo Integral

EMeLP - Espaço Matemático em Língua Portuguesa Faal - Faculdade de Administração e Artes de Limeira FE - Faculdade de Educação

FORPRED - Fórum Nacional de Coordenadores de Programas de Pós-Graduação em Educação

Fapesp - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo Famaf - Grupo Colaborativo da Universidade de Córdoba

GCEEM - Grupo Colaborativo de Estudos em Educação Matemática Grucomat - Grupo Colaborativo de Matemática

GCMM - Grupo Colaborativo em Modelagem Matemática

GEPFPM - Grupo de Estudo e Pesquisa sobre Formação de Professores de Matemática

(10)

Grupad - Grupo de Estudos Alfabetização em Diálogo

Forpromat - Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Formação de Professores que Ensinam Matemática

Gepee - Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Estatística e Matemática EMFoco - Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática

GEPEC - Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Educação Continuada GEPFPM - Grupo de Estudo, Pesquisa sobre Formação de Professores de Matemática

Grepem - Grupo de Estudos e Práticas em Educação Matemática

Gepemf - Grupo de Estudos e Práticas em Educação Matemática da Faal Geoom - Grupo de Estudos Outros Olhares para a Matemática

GPAAE - Grupo de Pesquisa em Álgebra Elementar

Gpefcom - Grupo de Pesquisa Formação Compartilhada de Professores – Escola e Universidade –

GPNEP - Grupo de Pesquisa Narrativa e Educação de Professores GdS - Grupo de Sábado

HIFEM - História, Filosofia e Educação Matemática HTPC - Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo IC - Iniciação Científica

IFCH - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas IM - Investigações Matemáticas

IDESP - Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IEL - Instituto de Estudos da Linguagem

IMECC - Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica MEC - Ministério de Educação

MMM - Movimento da Matemática Moderna Nied - Núcleo de Informática Aplicada à Educação OBEDuc - Observatório da Educação

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PIBID - Programa de Iniciação à Docência

PPGE - Programa de Pós-Graduação em Educação

PECIM - Programa de Pós-Graduação Multiunidades em Ensino de Ciências e Matemática

PIBID - Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência Seesp - Secretaria de Educação do Estado de São Paulo

SHIAM - Seminários Nacionais de Histórias e Investigações de/em Aulas de Matemática

Apeoesp - Sindicado dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo Sindutemg - Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais Saresp - Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo Sbem - Sociedade Brasileira de Educação

TCC - Trabalho de Conclusão de Curso UofA - Universidade de Alberta

UPF - Universidade de Passo Fundo

Unicamp - Universidade Estadual de Campinas UNESP - Universidade Estadual Paulista

Unifei - Universidade Federal de Itajubá UFPE - Universidade Federal de Pernambuco UFSCar - Universidade Federal de São Carlos UFU - Universidade Federal de Uberlândia UFPA - Universidade Federal do Pará

UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro UFTM - Universidade Federal do Triângulo Mineiro

(12)

Figura 1 - No Campo (1997), Beatriz Milhazes ... 21

Figura 2 - Encontro GdS. Acervo Pessoal 1 ... 22

Figura 3 - Encontro GdS. Acervo Pessoal 2 ... 36

Figura 4 - Fiorentini e Carvalho (2015, p. 28) ... 38

Figura 5 - Abertura Enem, Salvador, 2010 ... 43

Figura 6 - Cortesia (2000), Beatriz Milhazes ... 49

Figura 7 - Grupo de Sábado, Entre dois mundos ... 110

Figura 8 - Santo Antonio Alburquerque (1994), Beatriz Milhazes ... 114

Figura 9 - Reunião no CRTDE ... 128

Figura 10 - Beleza Pura (2006), Beatriz Milhazes ... 145

Figura 11 - SHIAM, 2008 ... 148

Figura 12 - Serpentina (2003), Beatriz Milhazes ... 236

Figura 13 - Espaços de Desenvolvimento Profissional, Roberto ... 241

Figura 14 - Espaços de Desenvolvimento Profissional, Eliane ... 241

Figura 15 - Espaços de Desenvolvimento Profissional, Dario ... 242

Figura 16 - Reverberações ... 277

(13)

Introdução ... 15

Organização do texto de pesquisa ... 18

Capítulo 01 – Encontro com o Grupo de Sábado ... 22

Narrativa inicial ... 22

Experiências investigativas e profissionais ... 28

História e estudos sobre o Grupo de Sábado ... 36

Interlocução com outros Grupos Colaborativos ... 42

Capítulo 2 – Desenvolvimento Profissional e Profissionalidade em Comunidades de Aprendizagem Docente ... 50

Desenvolvimento Profissional Docente ... 51

Desenvolvimento Profissional do Formador ... 61

Profissionalidade Docente ... 66

Profissionalidade do Formador de Professores ... 76

Comunidades de Aprendizagem Docente ... 78

Pressupostos das Comunidades de Aprendizagem Docente ... 86

Experiências de Desenvolvimento Profissional e Constituição da Profissionalidade em Comunidades Fronteiriças... 102

Capítulo 03 - Caminhos dessa Pesquisa Narrativa ... 115

Um breve panorama das pesquisas narrativas desenvolvidas no PRAPEM ... 119

Experiência e o Processo de Pesquisar Narrativamente ... 122

Construção do Objetivo e da Questão Investigativa ... 126

Escolha dos participantes da pesquisa ... 130

Composição e Análise dos Textos de Campo e de Pesquisa ... 131

Tridimensionalidade da Pesquisa Narrativa ... 136

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Experiências que se encontram em uma Comunidade Fronteiriça ... 148

Experiência de Desenvolvimento Profissional de Roberto ... 156

Experiências de Desenvolvimento Profissional de Eliane ... 175

Experiência de Desenvolvimento Profissional de Dario ... 202

Capítulo 05 – Cartografias, Compreensões e Reverberações das Experiências de Desenvolvimento Profissional ... 237

Mapeamento dos espaços de experiências de desenvolvimento profissional ... 239

Compreensões sobre as experiências de desenvolvimento profissional em uma comunidade fronteiriça ... 252

Reverberações da participação em uma comunidade fronteiriça ... 276

À Guisa de concluir... ... 290

Referências Bibliográficas ... 303

(15)

Introdução

No momento em que precisei definir uma data para o início desta pesquisa, dei-me conta de que ela começou em uma manhã de fevereiro de 2007, na sala LL03, do Centro de Estudos Memória e Pesquisa em Educação Matemática (CEMPEM). Naquele momento, iniciava minha participação no Grupo de Sábado (GdS), como bolsista trabalho1, aluna do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação (FE) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), realizando atividades de gravação, transcrição e relato dos encontros do grupo. Alguns anos depois, no contexto do GdS, definiria o objeto de estudo desta tese.

No mestrado, mediante ingresso no grupo Prática Pedagógica em Matemática (Prapem), sob a orientação do professor Dario, tinha como objetivo investigar como os professores de matemática se desenvolvem profissionalmente e constituem a profissionalidade docente mediante participação em grupos de estudos que seriam analisados com base na ideia de comunidades investigativas de Cochran-Smith e Lytle (1999, 2009).

Após distribuir um questionário, obtive o retorno de 27 professores, participantes de 8 diferentes grupos de estudos, constituídos de modos heterogêneos. Após a análise desses primeiros dados da pesquisa, que foram tratados e publicados (CRECCI; FIORENTINI, 2013), compreendi que conhecia mais meu campo de pesquisa do que os dados pareciam me dizer. Por essa razão, após anos de trabalho, envolvimento e intensa interlocução com o Grupo de Sábado, resolvi que era preciso assumir um lugar próprio nesta pesquisa. Para isso, optei pela pesquisa narrativa, embasada, sobretudo, nos estudos de Clandinin e Connelly2 (2011) e Clandinin (2013).

1 Destinada a alunos de graduação, independente do seu ano de ingresso. O critério para a concessão da

bolsa é socioeconômico, por meio de participação no Processo Seletivo Anual.

2 Agradeço à Profa. Dra. Dilma Maria de Mello o envio do livro Pesquisa narrativa – experiências e história

em pesquisa qualitativa, de Jean Clandinin e Michael Connelly, traduzido sob sua coordenação pelo Grupo

(16)

A opção por este tipo de pesquisa foi especialmente influenciada pelas interlocuções com o professor Dario e pelos estudos e pesquisas de participantes do grupo Prática Pedagógica em Matemática (PRAPEM), dentre os quais inúmeras teses e dissertações. Outros momentos importantes marcaram esse movimento que chamarei de “virada narrativa”. Em março de 2012, apresentei partes desta tese no Prapem, em um momento que temos chamado de pré-qualificação, no qual apresentamos nosso texto de pesquisa para uma banca constituída por integrantes do grupo. Naquela ocasião as participantes Cândida3, Dione4 e Eliane5 foram parte da banca para qual submeti meu texto. Foram muitas as contribuições recebidas nesse momento. Uma, em especial, convergia: a necessidade de colocar-me mais em meu próprio texto. Em maio do mesmo ano, essa também seria uma indicação da professora Laurizete6, no momento da banca de qualificação.

Em 2014, por ocasião do 19º Congresso de Leitura do Brasil (COLE), organizamos o minicurso intitulado “A Análise Narrativa na Pesquisa sobre Aprendizagem e Desenvolvimento Profissional Docente”. No processo dessa organização, entrei em contato com as leituras de Clandinin e Connelly (2011).

Após a qualificação, com a indicação da banca e a passagem para o doutorado, haveria mais tempo. Decidimos, então, que seria pertinente realizar um estágio de pesquisa no exterior. Julgamos pertinente uma estadia no Centre for

Research for Teacher Education and Development (CRTED), na Universidade de

Alberta (UofA), sob supervisão da professora Jean Clandinin.

Desse momento em diante, com as contínuas interlocuções com o professor Dario e com a supervisão das professoras Jean Clandinin e Janice Huber, vinculadas ao CRTED, esta pesquisa tomou diferentes rumos: passei a falar a partir de minha experiência no GdS e da convivência com outros três participantes.

3 Profa. Dra. Maria Cândida Muller (UNIR), que na ocasião realizava estudos de pós-doutoramento no

Prapem e era participante do GdS.

4 Profa. Dra. Dione Lucchesi de Carvalho, professora (Unicamp) participante do Prapem e do GdS. 5 Profa. Dra. Eliane Matesco Cristóvão (UNIFEI), participante do Prapem, do GdS e GEPFPM. 6 Profa. Dra. Laurizete Ferragut Passos (PUC-SP).

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Naquele contexto foi Janice quem, em especial, chamou-me a atenção para o fato de que não só os professores aprendiam em uma comunidade com a dinâmica do GdS. Era algo que já reconhecíamos, mas que não era foco de nossas pesquisas. Na interlocução com Janice, ela revelou que gostaria de saber quais seriam as aprendizagens e de que modo pesquisadores e formadores se desenvolviam profissionalmente. Seu comentário chamou-me a atenção, pois parecia fazer sentido ampliar nosso olhar, uma vez que, após o texto do professor Dario publicado em 2013, estávamos começando a compreender o grupo como comunidade fronteiriça, sem regulações da escola ou da universidade.

Os estudos sobre Pesquisa Narrativa, as indicações da banca de pré-qualificação e pré-qualificação constituídas pelos professores Dario, Laurizete e Dione, minha relação com o campo, os comentários de Janice e a compreensão do grupo como comunidade fronteiriça fizeram com que ampliasse o objetivo deste estudo: o objeto deixou de ser o desenvolvimento profissional e a constituição da profissionalidade docente em diferentes comunidades investigativas e passou a ser “as experiências de desenvolvimento profissional e a constituição da

profissionalidade de educadores matemáticos que participam de uma comunidade fronteiriça denominada Grupo de Sábado (GdS) ”.

Ao invés do uso dos questionários e da seleção de sujeitos de diferentes comunidades investigativas, como o GdS constituía uma comunidade fronteiriça, decidi que seria adequada a inclusão de participantes que viviam em diferentes “mundos” e que conviviam comigo em uma mesma comunidade. Por essa razão escolhi três participantes que têm a educação matemática como campo científico e/ou profissional: Roberto, professor da escola; Eliane, formadora, pesquisadora e professora da escola básica; Dario, formador e pesquisador.

(18)

Organização do texto de pesquisa

No primeiro capítulo, situo o lugar – contexto - desta pesquisa, isto é o Grupo de Sábado (GdS). Desse modo, apresento sua história, produção escrita e o modo como tem estabelecido interlocução com outras comunidades de educadores matemáticos. Como, também, é próprio da pesquisa narrativa, neste capítulo também narro minha relação, minha história e minhas percepções sobre esse espaço.

No segundo capítulo, teço revisões e discussões teóricas sobre o desenvolvimento profissional e a constituição da profissionalidade por meio da participação em comunidades de aprendizagem docente. Neste mesmo capítulo, discuto as ideias subjacentes às comunidades de aprendizagem docente.

No terceiro capítulo, exponho as razões que me levaram a realizar uma pesquisa narrativa: narro os caminhos desta pesquisa, sua metodologia e seus aspectos éticos. Teço, ainda, um breve levantamento sobre as pesquisas que utilizaram narrativas realizadas no contexto do Prapem, apresento o modo de análise desta pesquisa e seus conceitos epistemológicos.

No quarto capítulo, tendo por base transcrições de entrevistas, memórias dos encontros, escritos do GdS, produções dos participantes deste estudo e minhas interações com outros três participantes do grupo, narro suas histórias de experiência de desenvolvimento profissional e a constituição de suas profissionalidades no GdS.

E, no quinto capítulo, retomo as narrativas com base em eixos transversais: 1) mapeamento dos espaços de experiências de desenvolvimento profissional; 2) compreensões sobre as experiências de desenvolvimento profissional em uma comunidade fronteiriça; e 3) reverberações da participação em uma comunidade fronteiriça.

À guisa de concluir, algumas considerações são tecidas, tendo vista as possibilidades da compreensão das comunidades fronteiriças como espaços

(19)

autônomos de experiências de desenvolvimento profissional e de constituição da profissionalidade. Por fim, dou a ver o modo como percebo meu próprio desenvolvimento profissional mediante a realização deste estudo.

De partida, destaco alguns termos aqui utilizados. Em se tratando do título deste estudo, tomando por base a noção de Fiorentini e Lorenzato (2006), compreendo como educador matemático o profissional que atua no campo científico e profissional da área. Segundo esses pesquisadores, o educador matemático é aquele que concebe a matemática como um meio, pois ele educa através da matemática – suas atividades se desenvolvem nas escolas, nas Secretarias de Educação e na formação de professores. Em se tratando do campo científico, suas pesquisas são realizadas, utilizando essencialmente fundamentação teórica e métodos das Ciências Sociais e Humanas. Tendo em vista as experiências de Roberto, Eliane e Dario, compreendi que o qualificativo que os aproximava era “educador matemático”.

Os dois formadores participantes deste estudo possuem dedicação exclusiva e atuam como professores em universidade estadual e federal. Por essa razão, formação, pesquisa e extensão estão relacionadas a suas carreiras. Portanto, quando me referir a Dario e a Eliane como formadores, estarei falando de profissionais que atuam nesse tripé.

Acerca da leitura do GdS enquanto uma comunidade fronteiriça, Fiorentini (2013a) tem destacado que neste tipo de comunidade, normalmente, os participantes possuem “mais liberdade de ação e de definição de uma agenda própria, sem serem monitoradas institucionalmente pela escola ou pela universidade” (FIORENTINI, 2013a, p 04-05). Este, portanto, constitui-se como “um lugar livre e, por isso também de perigo, de transgressão do instituído, de aventuras na construção e problematização do conhecimento” (ibidem). Como destaco no capítulo teórico, esse tipo de uma comunidade está relacionado à constituição de comunidades investigativas, por essa razão, em diversos momentos, os estudos das autoras Cochran-Smithe e Lytle (1999, 2009) são referenciados e discutidos nesta tese.

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Nessas comunidades fronteiriças, costuma ocorrer a reunião de “interessados de comunidades diferentes que definem suas agendas de estudo e trabalho, podendo ser também investigativas” (FIORENTINI, 2013a, p. 05). Sem a regulação da Universidade ou da escola, o GdS tem se constituído a partir das experiências que seus participantes trazem de outras comunidades, por essa razão, temos compreendido esse espaço como uma comunidade fronteiriça.

Um outro termo bastante utilizado por mim nesse estudo que pode, em um primeiro momento causar estranhamento, é a palavra composta ensinaraprender. Emprego esta palavra composta para expressar, de acordo com Carvalho e Fiorentini (2013, p.11), “a complexidade e a dialética de como percebemos a relação entre o ensino e a aprendizagem”. Ou seja, “o ensino só tem sentido, se promover aprendizagens”. Além disso, “embora o professor, ao ensinar, tenha como meta uma determinada aprendizagem, (...) as aprendizagens podem ser múltiplas e nem sempre alinhadas às expectativas que o professor estabelece para o estudante”.

As obras artísticas que antecedem cada um dos capítulos dessa tese são da artista brasileira Beatriz Milhazes e são acompanhadas de poemas, canções e excertos da literatura brasileira e latino-americana. Escolhi as obras de Milhazes, pois seus círculos sobrepostos uns aos outros, lembram-me as tantas comunidades e espaço que participamos ao longo do tempo e influenciam nosso desenvolvimento profissional. Lembram-me, também, as tantas comunidades que estão sobrepostas em uma comunidade fronteiriça.

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Figura 1 - No Campo (1997), Beatriz Milhazes

E é inútil procurar encurtar caminho e querer começar já sabendo que a voz diz pouco, já começando por ser despessoal. Pois existe a trajetória, e a trajetória não é

apenas um modo de ir. A trajetória somos nós mesmos. Em matéria de viver, nunca se pode chegar antes. A via-crucis não é um descaminho, é a passagem única, não

se chega senão através dela e com ela.

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Capítulo 01 – Encontro com o Grupo de Sábado

Figura 2 - Encontro GdS. Acervo Pessoal 1

Neste capítulo, narro minhas primeiras aproximações com o Grupo de Sábado (GdS), cenário privilegiado deste estudo e de encontro com os protagonistas Eliane, Roberto e Dario. Relato também aspectos de minha trajetória acadêmica e profissional que se relacionam com os interesses de estudo desta tese. Em seguida, trago um histórico, descrevo os estudos sobre o GdS e, ao final, destaco interlocuções com outros grupos colaborativos.

Narrativa inicial

Pesquisadores narrativos são chamados a começar suas pesquisas com explicações de sua relação com o puzzle do estudo, isto é, com o problema de suas

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pesquisas. No caso deste texto, compreendo que devo narrar minha relação com a intenção de pesquisar a “compreensão das experiências de desenvolvimento profissional e a constituição da profissionalidade de educadores matemáticos que participam de uma comunidade fronteiriça” denominada Grupo de Sábado (GdS).

Para Clandinin (2013), as justificativas relacionadas ao puzzle são importantes por diferentes razões: primeiro porque devemos compreender nossa posição na pesquisa. Em segundo lugar, porque, sem a clareza do que nos traz ao estudo, corremos o risco de iniciar um processo no qual não estabeleceremos relação alguma. Terceiro, porque, sem a compreensão de quem somos, corremos o risco de não compreender as experiências de nossos participantes. Por essa razão, a história que segue relata minha própria relação com esse espaço, aqui tratado como uma comunidade fronteiriça entre a escola e a universidade.

No ano de 2006, ao final do primeiro ano do curso de Pedagogia, após um período trabalhando como professora auxiliar na educação infantil, na rede privada de ensino7, fui contemplada com uma bolsa-trabalho8, que tem como proposta a participação de estudantes de graduação em projetos de professores da universidade.

Naquele período havia apenas dois projetos disponíveis na área de ciências humanas: um que se envolvia análise de livros didáticos de português, no Instituto de Estudos da Linguagem - IEL, e outro que se desenvolvia na Faculdade de Educação, no grupo denominado “Grupo de Sábado” (GdS). O bolsista deveria comparecer aos encontros e gravá-los, transcrevê-los e elaborar uma “memória”, indicando os principais acontecimentos.

Para mim, não havia problemas ir à universidade aos sábados nem tampouco fazer transcrição de diálogos... O problema é que se tratava de um grupo voltado para a matemática, disciplina que eu havia vivido, na maior parte de minha

7Uma versão modificada dessa narrativa pode ser conferida em Crecci (2009, p. 59-68).

8Destinada a alunos de graduação, independente do seu ano de ingresso. O critério para a concessão da

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escolarização, dentro do paradigma do exercício, aquele modelo de ensino da matemática baseado em resoluções de exercícios repetitivos, segundo o qual só há uma resposta correta. Assim, sobretudo após os anos iniciais, como para Silvia Orthof (p. 1987, p. 101), “essa coisa abstrata de símbolos que viravam teoremas, letras, x, e frações para mim eram um verdadeiro suplício”.

Em razão dessa relação difícil com a matemática escolar de uma perspectiva procedimental, a princípio, nem considerei ingressar como bolsista-trabalho em tal projeto. Dessa forma, restando-me somente o outro projeto, fui até o IEL procurar pela professora responsável por ele. O prazo para entregar o plano de atividades assinado pelo orientador da bolsa já estava se encerrando, e o contato com a professora foi impossível. Contrariada, resolvi procurar o professor Dario Fiorentini, responsável pelo “Grupo de Sábado”. Consegui a assinatura do professor e fiquei satisfeita tão somente por ter garantido a bolsa.

Quando iniciei minhas atividades, estava sem muitas expectativas de me identificar com o grupo. No primeiro encontro de 2007, o professor Dario começou fazendo uma retrospectiva do que vinha sendo o grupo de sábado, e ressaltou que:

[...] o grupo constitui-se em uma comunidade de professores e investigadores interessados em assumir, eles próprios, os desafios de melhorar a prática do ensino de matemática nas escolas e de desenvolver-se profissionalmente, tendo como aportes a reflexão, a colaboração, a investigação e a escrita sobre a prática do ensino da matemática nas escolas. Ou seja, no GdS, os professores aprendem e desenvolvem-se profissionalmente pelo simples fato de participar e compartilhar ativamente suas experiências, reflexões e investigações sobre a prática do ensino da matemática nas escolas. (Excerto da memória do encontro do dia 10/02/2007).

Dando um destaque à questão da colaboração entre os diferentes sujeitos que participam do grupo, o professor acrescentou que uma alternativa para enfrentar os problemas trazidos pelos professores da escola e a mudança da prática escolar é a parceria entre professores formadores, professores da escola e os futuros professores, em um trabalho colaborativo. Os professores formadores podem colaborar com “os aportes teóricos e metodológicos que promovem a análise e o

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relativos à educação matemática e à educação”, enquanto os futuros professores

podem colaborar com o “domínio da informática, da matemática e da didática

atual”. E os professores da escola colaboram com “o conhecimento experiencial relativo ao ensino nas escolas atuais em diferentes contextos”. Ainda, segundo o

professor, essa comunidade de prática de trabalho colaborativo se pauta no “diálogo

cultural, científico e profissional, tendo como foco de estudo problemas e desafios da prática docente na escola”.

Após tais explanações, foi a vez de cada participante se apresentar e indicar o que gostariam de discutir no ano de 2007. A partir de situações do cotidiano de práticas pedagógicas vivenciadas em diferentes contextos escolares, os professores indicaram os seguintes assuntos: condições dos professores da escola pública, alunos defasados em idade e aprendizado, alunos com necessidades especiais, progressão continuada, relação professor titular e professor especialista em educação especial, estatística na educação de jovens e adultos, currículo, formação de professores, ensino para deficientes auditivos, fracasso escolar e escrita no ensino-aprendizagem da matemática.

Logo no primeiro encontro, percebi que não estava em um grupo de matemáticos preocupados em encontrar apenas o valor de “x” ou “y”, visão que eu tinha, até então, da matemática. Desmistificado o que tanto receava, comecei a compreender que se tratava de um grupo de professores de matemática e formadores preocupados em investigar e compartilhar suas práticas de sala de aula. E assim fui me animando.

Minha identificação com essa prática do grupo de levantar problemas para investigá-los, perceptível logo no primeiro encontro, não teria sido por acaso. Quando penso em minha relação com o conhecimento escolar, como professora ou estudante, expressões como “sentido”, “pesquisa”, “trabalhos em grupo” vêm a minha memória... Em especial, lembro-me, com nostalgia e carinho, das propostas de trabalho de duas professoras, Marilda e Sônia.

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A primeira fora minha professora nos anos iniciais do ensino fundamental, mais precisamente o que seria hoje o terceiro ano, em uma escola pública da rede estadual de Campinas. Com ela, aprendíamos, por exemplo, frações, dividindo maçãs e chocolates. Naquela época, a matemática era doce! Lembro-me, também, das exposições culturais que realizávamos na sala, nas quais podíamos levar e contar narrativas sobre os brinquedos que faziam parte de nosso cotidiano, ainda vivido na simplicidade da rua. Leituras, quantas leituras deliciosas que recomendava! Também eram frequentes as interrupções, em suas aulas, para acompanharmos fenômenos sociais ou naturais. Eleições, greves, condições de vida e de trabalho dos professores eram assuntos frequentes em suas aulas. Lembro-me de um eclipse solar que certa vez acompanhamos. Meu pai, serralheiro, levou até a escola as placas usadas nas máscaras de proteção de solda, para que pudéssemos olhar a lua sobrepondo-se ao sol. Naquele dia, eram contas e mais contas que fazíamos, sonhos que criávamos, imaginando como estariam nossas vidas no próximo eclipse solar. Marilda, como ninguém, criou verdadeiros espaços de letramento em meus anos iniciais de escolarização.

Sônia, por sua vez, fora minha professora no segundo ano do ensino médio. Ela me apresentou a clássica literatura brasileira. Através de sua mediação, eu adentrava o mundo dos adultos, compreendendo a complexidade das relações humanas pela literatura. Em trabalhos propostos, investigávamos a vida de personagens literários, compreendíamos seus contextos, suas histórias e seus sentimentos. Tínhamos debates calorosos sobre o famoso Dom Casmurro, de Machado de Assis. Nos intervalos, eu me lembro de ficar aborrecida com colegas que defendiam Bentinho! Lia e relia o livro, procurando indícios de que eu tinha razão, de que Capitu não o traíra, mostrando que na narrativa só conhecemos a perspectiva de um personagem.

Certa vez, Sônia dividiu a sala em grupo, propôs a leitura de diversos livros. Ao meu grupo coube a leitura da coletânea Várias histórias, de Machado de Assis. Com uma atenção especial, se dirigiu ao meu grupo, disse para prestarmos atenção e sermos cuidadosos com aquele trabalho, pois esse livro estava na lista da Unicamp,

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o que, até então, não dizia muita coisa para mim. O trabalho consistia na leitura cuidadosa de cada conto, descrevendo o enredo, os principais personagens e o contexto. Ao final, Sônia nos chamou e mostrou surpresa com a discussão que tínhamos realizado. Disse que aquele parecia ser um trabalho de nível acadêmico. De algum modo, essa foi a primeira vez que cogitei seriamente da possibilidade de prestar o vestibular na Unicamp. Até então, a universidade não era um desejo ou um sonho para mim ou para a maior parte daqueles alunos do ensino médio do início dos anos 2000, filhos da “torta progressão continuada paulista”9, de décadas de governo tucano. Com um pequeno gesto de Sônia, eu mudaria minha perspectiva sobre literatura e, sobretudo, minha perspectiva sobre mim mesma.

Essas experiências de levantar problemáticas para investigá-las, embora raras, também não eram inéditas para as estudantes do curso de pedagogia. Sobretudo nas disciplinas de estágio, éramos convidadas a problematizar o contexto escolar em suas diferentes faces. Mas, como cheguei ao grupo no início do segundo ano do curso, em que são privilegiadas as disciplinas de fundamento no currículo (Sociologia da Educação, História da Educação e Filosofia da Educação), fiquei encantada por finalmente ter contato com a realidade escolar. Talvez essa seja a palavra mais adequada para o que aconteceu naquele encontro – encantamento.

Volto a falar daquele primeiro contato com o GdS: passamos ao planejamento dos próximos encontros, e observei que não havia uma relação hierárquica estática estabelecida no grupo, uma vez que a coordenação dos encontros, assim como as revisões das memórias (atas dos encontros) seriam feitas num sistema de rodízio entre os participantes dispostos a colaborar.

Dizem que são as primeiras impressões que ficam. Neste caso, o ditado fez sentido. Ao longo de nove anos, pude, de fato, vislumbrar um ambiente colaborativo, inclusive, com tensões próprias e relações de poder que, volta e meia, foram contornadas pelo bom senso do grupo e pela liderança de Dario e Dione. O fato é que, em uma comunidade como essa, conflitos também podem e devem ser

9 Ao utilizar a expressão “torta progressão continuada paulista” faço referência à falta de eficácia desse

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postos “na mesa”. As decisões, como a agenda de trabalho do semestre ou o nome de um palestrante a ser convidado para os eventos que são organizados, são negociadas em um movimento no qual nossas vozes se misturam, em um espaço que se estabelece nas fronteiras de nossas vidas acadêmicas, afetivas, profissionais e pessoais.

Em estudos recentes, o professor Dario tem denominado o GdS como uma comunidade fronteiriça. Penso que esse é o adjetivo mais adequado para o que temos vivido naquele espaço. Comunidades com essas características “possuem, normalmente, mais liberdade de ação e de definição de uma agenda própria, sem serem monitoradas institucionalmente pela escola ou pela universidade” (FIORENTINI, 2013a, p. 04-05).

Naquela dinâmica colaborativa, fui cada vez mais me sentindo integrada àquela comunidade, envolvida nas discussões, construindo coletivamente ideias, projetos, narrativas e utopias de um modo de ensinaraprender matemática mais inclusivo e de um “mundo” no qual professores e acadêmicos tenham condições parecidas de vida e suas posições sejam igualmente valorizadas pelas políticas públicas... Colaborava para além de minhas funções como bolsista.

Experiências investigativas e profissionais

Em 2008, participei da elaboração e da gestão de um blog do Grupo de Sábado10 no qual pudemos publicar notícias dos encontros do grupo, bem como atividades realizadas em sala de aula. Engajada pela repercussão do blog, procurei o Núcleo de Informática Aplicada à Educação (Nied)11 para realizar uma pesquisa de iniciação científica. A bem da verdade, naquela época, ainda por certa insegurança com o conteúdo matemático, propriamente, achava que, por estar me formando em pedagogia, não haveria espaço de pesquisa e trabalho para mim em uma

10 http//: www.grupodesabado.blogspot.com

11 O NIED é uma unidade especial de pesquisa, vinculada diretamente à Coordenadoria de Centros e

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comunidade de educadores matemáticos. Assim, meio por questões práticas, procurei outros espaços.

No NIED, dentro de um projeto financiado pela Fapesp, desenvolvi práticas de formação com professores da escola para o uso das novas tecnologias e mídias interativas12, no contexto de um projeto maior do Programa Melhoria do Ensino Público13. Para saber o que aprenderam e como se desenvolveram profissionalmente a partir das práticas que desenvolvi, realizei entrevistas semiestruturadas com as professoras participantes do projeto. De certo modo, a perspectiva de escutar o que os professores tinham a dizer não era uma novidade para quem já vinha de uma prática colaborativa como a do GdS.

No ano seguinte, em 2009, entusiasmada pelas discussões sobre currículo no GdS14, procurei o professor Dario para orientar meu trabalho de conclusão de curso (TCC). Escrevemos, então, um projeto para a Fapesp, intitulado: “A profissionalidade docente e a gestão do currículo em face às políticas públicas no Estado de São Paulo - o caso São Paulo faz escola". A partir da aprovação, concomitante ao desenvolvimento do TCC de mesma temática, desenvolvemos uma pesquisa (CRECCI, 2009; CRECCI; FIORENTINI, 2014) em que investigamos como os professores do segundo segmento do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) e do Ensino Médio utilizaram o material a eles enviado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (Seesp) no contexto da implantação do programa “São Paulo faz Escola”; como fizeram a gestão do currículo proposto por esse programa; e quais as implicações

12Os resultados dessa pesquisa, que contou com a orientação da pesquisadora Dra. Maria Cecília Martins,

podem ser conferidos em: Crecci (2010).

13 Iniciado em 1996, esse Programa financia pesquisas aplicadas sobre problemas concretos do ensino

fundamental e médio, em escolas públicas paulistas. Elas deverão ser desenvolvidas por meio de parceria entre instituições de pesquisa e escolas da rede pública (estadual e municipal), visando desenvolver experiências pedagógicas inovadoras que possam trazer benefícios imediatos à escola. (Fonte: http://www.fapesp.br/46).

14No contexto da implementação da proposta curricular “São Paulo Faz Escola” e das posições dos

gestores da Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo, no Grupo de Sábado (GdS), os professores articularam-se para escrever e publicar a carta “E os professores... O que pensam de sua secretária?”:http://grupodesabado.blogspot.com/search/label/Políticas%20Públicas

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dessa política no processo de desenvolvimento profissional do professor e na constituição de sua profissionalidade docente.

Os sujeitos dessa pesquisa foram professores que lecionavam matemática na rede estadual de educação do estado de São Paulo. Os dados foram obtidos, numa primeira fase, pela aplicação de questionários a professores da região de Campinas e, numa segunda fase, por entrevistas semiestruturadas e visitas às instituições em que atuavam, para observação da sua prática cotidiana. Os resultados do estudo apontaram que, se a intenção da Seesp foi mobilizar os professores para que implementassem, em todas as escolas, um currículo mínimo de matemática, a presente pesquisa mostrou que, na prática, isso foi pouco eficaz.

Ao finalizar esse estudo, em síntese, consideramos que os professores investigados, embora pressionados para pôr em prática tal proposta curricular, demonstraram capacidade de resiliência15 diante das pressões externas, sobretudo

quando contavam com apoio de grupos de estudo ou da própria comunidade escolar. Outro resultado, mais subjetivo foi o fato de ter iniciado um processo de

escuta sensível nas entrevistas semiestruturadas que realizei com professores da

escola por ocasião dessa experiência. Em cada entrevista, uma vida de professor se revelava em seu devir. Lembro-me, com respeito e carinho, dos momentos em que generosos professores me receberam para contar suas histórias.

Após concluir o curso de Pedagogia, em 2010, tornei-me professora de informática em uma Escola de Tempo Integral (ETI), na rede pública estadual paulista. Essa experiência docente, por si só, renderia muitas páginas. Por um lado, é possível que as relações de alteridade com professoras e professores aprendidas/vividas no GdS tenham sido importantes para o estabelecimento de vínculos com a comunidade discente e docente, vínculos esses que fizeram com que eu não apenas passasse pela escola, mas que a vivesse plenamente, mesmo em um

15 De acordo com Vergara (2008), “resiliência”, para a psicologia, é a propriedade de uma pessoa

recuperar-se e manter um comportamento adequado após um dano. É a propriedade que ela tem, não de voltar à sua forma original, como os objetos da física, mas de minimizar ou dominar os efeitos nocivos da adversidade, em uma resposta ao risco.

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curto período. Por outro lado, as práticas investigativas observadas no grupo também me davam ideias para desenvolver com os estudantes.

Certa vez, em ano de eleição, com o propósito de ensinar os estudantes a usarem o Excel, eles foram a campo, investigaram as preferências de candidatos de acordo com idade, gênero e renda. Ao final, comparávamos com os dados oficiais divulgados por agências de pesquisa como IBGE e Vox Populi. Mas por qual razão consultávamos dados de agências diferentes? Nos meses anteriores a essa experiência, recebemos no GdS a visita do Prof. Paulinho Niterói, do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (IMECC), a convite da participante Juliana. Na ocasião, ele nos alertou para as diferentes metodologias e os diferentes espaços nos quais as pesquisas eram realizadas pelas diferentes agências. Por essa razão, poderia haver discrepâncias influenciadas por questões socioeconômicas relacionadas à origem dos entrevistados. Em síntese, problematizamos que haveria diferenças entre entrevistar trabalhadores em um terminal de ônibus e transeuntes em um shopping de um bairro nobre. Levei, então, esse tipo de discussão para os estudantes. Naquele processo de medição e comparação, problematizávamos o perfil socioeconômico dos entrevistados. Desse modo, especulávamos a correlação entre o perfil socioeconômico dos entrevistados e as preferências ideológicas dos candidatos.

Nesse período, também, comecei a atuar como formadora de professores. Como contratada de uma consultoria, trabalhei em um município da região de Campinas. A minha função era dirigir-me às escolas para ensinar aos professores a integrar as tecnologias da informação e comunicação em suas aulas. Em parceria com uma amiga, também pedagoga, propúnhamos práticas interativas, promovendo a participação ativa dos envolvidos na criação de animações em softwares específicos, por exemplo. Apesar disso, eu sabia que vários dos professores para os quais dávamos o curso teriam condições de fazer melhor, com mais conhecimento da realidade de suas escolas. E muitos deles, na formação, manifestavam esse desejo. Para mim, não fazia nenhum sentido a atuação de alguém externo como formadora naquela realidade. Apesar da boa remuneração para uma

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recém-formada, resolvi que aquela situação não tinha razão de continuar e, no ano seguinte, resolvi não mais atuar naquela consultoria.

Em 2011, com meu ingresso no mestrado, no grupo Prática Pedagógica em Matemática (Prapem), sob a orientação do professor Dario, a partir de uma convergência de interesses de estudo, constituímos o projeto que integra a presente pesquisa, submetido e aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), cujo título inicial era “A Constituição da Profissionalidade Docente em Comunidades Investigativas”. O objetivo era investigar como os professores de matemática se desenvolvem profissionalmente e constituem a profissionalidade docente em comunidades investigativas.

Em meio a essa experiência, professor Dario e eu também escrevemos um projeto de estágio de pesquisa no exterior: “Concepções de Desenvolvimento Profissional de Professores que Ensinam Matemática”, realizado no departamento de Elementary Educacion do College of Education (North Carolina State University), sob a generosa supervisão da professora Dra. Paola Sztajn. O principal objetivo desse estudo foi analisar e compreender conceitos de desenvolvimento profissional além de vivenciar outros processos de investigação nessa área de estudo. Uma revisão bibliográfica sobre os estudos desenvolvidos em comunidades de aprendizagem docente, orientada pela professora Paola, está presente no capítulo teórico desta tese.

Na qualificação de mestrado, em maio de 2013, a banca indicou a passagem para o doutorado. Uma vez aceita por mim, teria mais tempo para organizar a versão final desta pesquisa. Tempo e reflexões que levaram, inclusive, a repensar o objeto deste estudo. Nesse período eu também desenvolvia uma experiência que considero ter sido de natureza investigativa, em parceria com o professor Dario, no trabalho com a disciplina Práticas Pedagógicas em Matemática, do curso de licenciatura em Matemática, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Fui auxiliar docente, no contexto de um programa da Universidade, para colaborar com os professores e ter alguma experiência de docência no desenvolvimento das disciplinas da

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graduação. A proposta didático-pedagógica daquela disciplina consistia na realização, pelos licenciandos, de estudos e análises de diferentes práticas de

ensinaraprender matemática na Escola Básica.

Em 2013, tentamos desenvolver a disciplina, tendo como principal objetivo a problematização e a análise de práticas sociais de ensinaraprender matemática, trazidas e documentadas pelos próprios licenciandos em diferentes contextos escolares. Para assumir esse desafio, nós, como formadores, precisávamos abandonar nossa zona de conforto, onde tínhamos controle sobre as problematizações e as análises das práticas com base em literatura prévia selecionada, tendo em vista um enquadramento teórico predefinido. Passamos, a partir de então, a convidar os estudantes a visitar diferentes tipos de escola, com o intuito de documentar práticas e experiências de ensinaraprender tradicionais ou inovadoras e, depois, analisá-las e problematizá-las, tendo como aportes a literatura profissional e acadêmica disponível e mais conveniente para cada caso. Os estudantes, em seguida, deveriam escrever um artigo no qual analisavam um episódio da prática observada no contexto escolar, tendo por base a literatura indicada (FIORENTINI; CRECCI, no prelo).

Apesar de ter prazer em realizar e desenvolver trabalhos que exigiam algum tipo de pesquisa, nunca fui dada a cópias enfadonhas, a exercícios sem sentido, a repetições e memorizações. Como pedagoga, viria a aprender, nas palavras de Charlot (p. 158-159), que “só aprende quem tem uma atividade intelectual”. E “o aprendiz tem de encontrar um sentido para isso. Um sentido relacionado com o aprendizado, pois, se esse sentido for completamente alheio ao fato de aprender, nada acontecerá”.

Naquele período entre a passagem do mestrado para o doutorado, retornei à rede estadual paulista como professora alfabetizadora de alunos dos anos iniciais. Fui contratada para trabalhar em um projeto que funcionava como uma espécie de reforço para os alunos que apresentavam dificuldades na leitura e na escrita. A princípio, tentava seguir uma linha crítica, visando à leitura de mundo, selecionava notícias de jornais para que os alunos tivessem contato com a “realidade”.

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Obviamente, não escolhia quaisquer notícias, mas aquelas relacionadas ao cotidiano deles, como o aumento da passagem do ônibus. Rapidamente, percebi que, por um lado, não adiantaria trabalhar apenas com textos longos e, por outro lado, eram crianças e deveriam ser felizes no espaço escolar. A crítica deveria ser parte da escolarização, assim como o prazer em aprender. Foi aí que notei, mobilizada pela ideia de participação em comunidades de prática, outra influência do GdS. Poderia propiciar práticas de participação em ambientes de aprendizagem e, ao mesmo tempo, práticas que engajariam e mobilizavam prazer.

Essas ideias também foram influências das leituras que realizávamos no contexto de preparo e desenvolvimento da disciplina de Estágio Interdisciplinar I, outro curso no qual auxiliei o professor Dario, no ano de 2013. A leitura de Charlot (2013, p. 159) me fazia compreender que “só aprende quem encontra alguma forma de prazer no fato de aprender. Quando digo ‘prazer’ não estou opondo a esforço. Não se pode educar uma criança sem fazer-lhe exigências. [...] Não há contradição entre prazer e esforço”

Foi, então, que aprendi a trabalhar com o lúdico e com a imaginação. Como se tratava de uma escola em um bairro rural, de repente, estávamos todos no chão: sentamos, escrevendo com giz na quadra, brincando de escrever quais eram os animais que víamos ao redor da escola ou quais eram nossas comidas prediletas, pretexto para discutirmos boas práticas alimentares. De repente, estávamos lendo contos de fadas para depois modificar o final ou, até mesmo, a moral da história.

Certa vez, Maria Clara largou o príncipe para se casar com um cantor de

rapper. Um dia, Lucas, menino franzino que falava baixinho, começou a ficar com a

postura ereta e a olhar em meus olhos no momento de tentar ler a composição das letras. Juliano começava a colecionar os jornais de preço do mercadinho do bairro para compormos listas de compra nas aulas de reforço. De repente, estava novamente envolvida em cenários de letramento – a sensação que tinha era parecida como aquelas das aulas da professora Marilda.

Seis meses após a passagem do mestrado para o doutorado, o projeto foi aprovado pela Fapesp. O valor da bolsa era pelo menos três vezes superior ao salário

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que recebia na rede estadual, sem contar os benefícios para o desenvolvimento da pesquisa, com a reserva técnica e a possibilidade de estágio no exterior. Em um mundo com tamanha fluidez, com o tempo vamo-nos acostumando com recomeços. Eu não tinha muito o que dizer às crianças. Além do mais, em se tratando de professores, elas já estavam acostumadas com recomeços. Quando contei que sairia da escola, ficaram muito tristes. Abraçavam-me com força! A tristeza era tamanha que dali alguns minutos, para minha paz de espírito, estavam correndo, correndo felizes pelo pátio da escola.

Foi, então, que vieram a dedicação exclusiva ao doutorado e o estágio de pesquisa no Canadá, que será narrado com mais detalhes no capítulo metodológico, pois foi naquele contexto que os rumos desta pesquisa ficaram mais delineados. Por ora, posso afirmar que, com a participação em diferentes comunidades, fui constituindo minhas experiências de desenvolvimento profissional e minha profissionalidade em diferentes cenários. Durante esses anos, mantive-me participante atuante no Grupo de Sábado. Concomitantemente, estive ora na escola como professora, ora atuando como formadora de professores, ora na universidade como pesquisadora, ora no mundo da escola e da universidade. Os espaços fronteiriços não me são estranhos. Na verdade, eu gosto deles, pois não há do que se entediar na passagem. Talvez daí venha meu encantamento pelo espaço que conecta os três personagens principais deste estudo – o Grupo de Sábado, aqui compreendido como uma comunidade fronteiriça.

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História e estudos sobre o Grupo de Sábado

Figura 3 - Encontro GdS. Acervo Pessoal 2

O Grupo de Sábado (GdS) foi fundado em 1999 pelo professor Dario, por 2 professores que ensinavam matemática na escola básica (Rodrigo e Juliana) e 2 pós-graduandos (Alfonso e Renata). Atualmente, o grupo realiza diversas atividades. Quinzenalmente temos encontros aos sábados pela manhã, na FE/Unicamp. Atualmente, contamos com a presença de cerca de 12 participantes por encontro. Desde 2006, a cada 2 anos temos realizado os Seminários Nacionais de Histórias e Investigações de/em Aulas de Matemática (SHIAM). O grupo também já conta com 6 livros publicados, com histórias e narrativas escritas por professores ou formadores sobre o ensinaraprender matemática.

Assim como o grupo Prática Pedagógica em Matemática (PRAPEM), o GdS também é coordenado pelos professores Dario e Dione. Em recente capítulo de livro publicado, para eles, o processo de aprendizagem e de formação que ali ocorre

[...] não é baseado em cursos, como tem sido tradicionalmente concebidos e desenvolvidos pela universidade e pelas agências públicas, mas na realização de práticas de estudo, reflexão, análise e problematização sobre o que ensinamos e aprendemos em

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diferentes espaços educativos (FIORENTINI; CARVALHO, 2015, p. 15).

Como destaquei no início deste capítulo, usualmente, no primeiro encontro de cada semestre, é realizada uma avaliação e elaborado o cronograma do grupo. A constituição dessa agenda de atividades é compartilhada por professores e acadêmicos. A partir das questões que os professores trazem das escolas, os encontros são organizados, tendo em vista a problematização da complexidade das práticas docentes, mediante seus diversos contextos, e a busca por alternativas ao ensino e à aprendizagem da matemática nas escolas. Nesse movimento que emerge das práticas são estabelecidas interlocuções com referenciais teóricos da educação e da educação matemática. Assim, a prática docente se torna objeto de investigação e de ação do grupo. Portanto, levar para o grupo os problemas do campo prático não implica

[...] que os estudos acadêmicos não tenham lugar no processo de formação continuada dos participantes do GdS. Eles continuam importantes, não como verdades absolutas ou referenciais a serem utilizados e aplicados nas práticas dos professores, mas como mediação ou caixa de ferramentas que ajudam os professores a perceberem outras relações da prática e, portanto, compreenderem melhor o mundo do trabalho docente e perspectivar mudanças e melhorias da mesma (FIORENTINI; CARVALHO, 2015, p. 16).

De acordo com o professor Dario, uma das motivações que levaram à formação desse grupo colaborativo foi a tentativa de reduzir a distância entre a pesquisa acadêmica e a prática de ensinar e aprender matemática nas escolas. Destaca que, como formadores e pesquisadores da universidade, assumiram, como hipótese de trabalho, que os professores da escola e da universidade, mestrandos e doutorandos e futuros docentes podiam, juntos, aprender a enfrentar o desafio da escola atual, negociando e construindo outras práticas de ensinar e aprender matemática potencialmente formativas aos alunos que despertem neles o desejo de aprender e de se apropriar dos conhecimentos fundamentais à sua inserção social e cultural (FIORENTINI, 2009).

Atualmente, em razão das referências bibliográficas que temos utilizado, temos substituído, nas produções escritas, o termo “grupo colaborativo” por

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“comunidade”. Mas, quando nos referimos aos encontros, não substituímos a palavra “grupo”. Na figura 04, Fiorentini e Carvalho (2015) referem-se ao GdS como uma comunidade investigativa. Na mesma figura é possível conhecer o suposto objetivo comum das comunidades que fazem parte do GdS.

Figura 4 - Fiorentini e Carvalho (2015, p. 28)

Uma especificidade dessa comunidade é a voluntariedade da participação. Segundo Fiorentini (2013a, p. 5), uma comunidade na qual os participantes não possuem vínculos institucionais, tal como ocorre no GdS, pode ser caracterizada como fronteiriça, em que há mais liberdade de ação e de definição de uma agenda própria, podendo se tornar “um lugar livre e, por isso também de perigo, de transgressão do instituído, de aventuras na construção e problematização do conhecimento”.

Em consonância com essa característica, um espaço dentro do encontro que tem sido especial momento para trocas mais pessoais têm sido os cafés. Em todo encontro, ao final do primeiro bloco, fazemos um intervalo no qual é possível

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socializar aspectos para além de nossas vidas profissionais. Nesse momento, é comum escutarmos histórias de outras comunidades como, por exemplo, da família.

Acerca das publicações, atualmente, o grupo tem seis livros publicados contendo histórias e narrativas de experiências e práticas de sala de aula que tiveram como foco o ensinaraprender matemática. Nesses livros, professores da escola básica que ensinam matemática e, até mesmo, formadores narram suas experiências sobre o ensinaraprender matemática, tomando por base episódios acontecidos em sala de aula que foram problematizados por eles no GdS.

Em 2001, o então Grupo de Pesquisa em Álgebra Elementar (GPAAE), lançou seu primeiro livro (FIORENTINI et. al., 2001), intitulado “Histórias de aulas de matemática: trocando, escrevendo, praticando e contando”. Participavam, então, do grupo, 14 professores das redes pública e particular de ensino da cidade de Campinas e região, dois doutorandos e o professor Dario. As cinco narrativas desse primeiro livro, caracterizam-se por serem relatos de experiências de episódios de aulas de matemática. Nenhum dos textos trazem referências bibliográficas explicitas. Apesar de curtas, os relatos publicados traziam significações de professores e de estudantes sobre os assuntos abordados.

O segundo livro do grupo (FIORENTINI; JIMENEZ-ESPINOSA, 2003) segue a mesma linha do primeiro. Nele encontramos dez histórias de aulas matemática e um texto escrito por acadêmicos sobre a dinâmica do GdS. Na maioria das narrativas, encontramos diálogos com a literatura sobre educação matemática.

Lançado em 2006 (FIORENTINI; CRISTOVAO, 2006), o terceiro livro foi dividido em duas partes: 1) Histórias de Reflexão sobre o Ensino de Matemática, e, 2) Investigações Matemáticas em Aulas da Escola Básica. Lançado em 2006, a primeira parte foi constituído por sete capítulos que discutiam: a escrita no processo de aprender matemática e outros contextos. Enquanto que a segunda parte foi dedicada a discussão de atividades e aulas investigativas.

Acompanhei a organização e a escrita dos últimos três livros, a dinâmica de escrita desses tem sido bastante formativa. Uma primeira versão do texto é lida no

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