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Reservas extrativistas estaduais de Rondônia: uma história em construção

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Academic year: 2021

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VALDINÉIA DE OLIVEIRA SANTANA

RESERVAS EXTRATIVISTAS ESTADUAIS DE RONDÔNIA: UMA HISTÓRIA EM CONSTRUÇÃO

MARÍLIA-SP 2007

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VALDINÉIA DE OLIVEIRA SANTANA

RESERVAS EXTRATIVISTAS ESTADUAIS DE RONDÔNIA: UMA HISTÓRIA EM CONSTRUÇÃO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - campus de Marília, como requisito para a obtenção do Título de Mestrado em Ciências Sociais.

Orientador:

Prof. Dr. Mauro de Mello Leonel Junior

MARÍLIA-SP 2007

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VALDINÉIA DE OLIVEIRA SANTANA

RESERVAS EXTRATIVISTAS ESTADUAIS DE RONDÔNIA: UMA HISTÓRIA EM CONSTRUÇÃO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - campus de Marília, como requisito para a obtenção do Título de Mestrado em Ciências Sociais.

Data: 15 de Fevereiro de 2007. Banca Examinadora

_______________________________________ Prof. Dr. Mauro de Mello Leonel Junior

FFC/UNESP

(Presidente da banca e orientador)

_______________________________________ Prof. Dr. Francisco Luiz Corsi

FFC/UNESP

______________________________________ Profa. Dra. Rosa Ester Rossini

USP

_______________________________________ Profa. Dra Mirian Claudia Lourenção Simonetti FFC/UNESP (1ª Suplente)

_______________________________________ Profa. Dra Wilma Marques Leitão

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DEDICATÓRIA

Para Walter, com todo amor

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AGRADECIMENTOS

A Deus, Criador, pelo dom da vida.

Aos meus pais Nésio e Anésia, minha irmã Lucilene e meu irmão Eduardo por incentivarem essa realização.

Aos Seringueiros e Seringueiras de Rondônia - sem os quais este trabalho não seria possível - por compartilharem sua história.

Ao Prof. Dr. Mauro de Mello Leonel Junior, pela paciência, pelas orientações valiosas, pela indicação de focalizar este estudo nas áreas de Reserva Extrativista de Rondônia. Meu agradecimento por mostrar o caminho para um estudo que me fez entrar em contato com uma região por mim antes desconhecida, mas que hoje carrego no coração.

Ao Prof. Dr. Francisco Luiz Corsi, por sua orientação ainda na graduação e pela leitura minuciosa do texto. Suas considerações em muito ajudaram na construção deste texto e com certeza também ajudarão na construção de futuros trabalhos.

À Profª Dra. Rosa Ester Rossini, que conheci no dia da qualificação. A ela que já teve a oportunidade de trabalhar na região de Rondônia e que conhece a realidade local, por colaborar com este trabalho, com sua experiência e através de uma leitura cuidadosa do texto, contribuindo através de suas sugestões.

À Profª Dra. Mirian Claudia Lourenção Simonetti, que também me acompanha desde a graduação, um agradecimento especial, porque foi graças a ela, que entrei em contato com a questão ambiental, ainda durante suas aulas.

À Profª Dra. Wilma Marques Leitão, que ainda não tive o prazer de conhecer, mas que se mostrou muito atenciosa através de nossa comunicação via e-mail, obrigada por aceitar tão prontamente fazer parte desta banca de mestrado, ainda que como suplente.

Um agradecimento especial a todos os professores e funcionários da UNESP, da graduação e pós-graduação, em especial à funcionária Aline, à Profª Célia Tolentino, Prof. Aluísio Schumacher, Profª Ethel, Prof. Giovanni Alves, Prof. Marcos Alvarez, Prof. Tullo, Profª Sueli Mendonça, Prof. Edemir, Profª Carmem. Não cito todos aqui, mas obrigada, por tudo, a todos.

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RESUMO

Este trabalho consistiu em uma investigação, desenvolvida numa perspectiva sócio-ambiental, das 21 reservas extrativistas estaduais de Rondônia, da organização política de seus gestores e das condições de vida de sua população. Em geral, as reservas do Estado vêm sofrendo fortes pressões causadas por invasões, geralmente com a finalidade de extrair madeira de forma ilegal. Os moradores de reserva têm hoje como grande desafio a criação de condições principalmente econômicas que possibilitem sua permanência dentro do perímetro da reserva, mas ainda há outros desafios, como buscar a educação dos filhos, condições dignas de saúde. A criação das reservas extrativistas permite a permanência das populações tradicionais (seringueiros, ribeirinhos) nas áreas, mas a preservação ambiental é requisito essencial para sua manutenção. A propriedade da reserva é cedida de forma coletiva aos moradores através de concessão real de uso. Espera-se com ela uma redução das taxas de desmatamento e uma gestão democrática dos recursos ambientais.

Trabalhamos com as Reservas Extrativistas Estaduais de Rondônia, avaliando a participação política de seus habitantes, reunidos em associações ligadas à OSR (Organização dos Seringueiros de Rondônia), na luta pela preservação de seu espaço e pela estruturação do movimento de defesa das reservas extrativistas estaduais e federais existentes no estado.

Palavras-chave: Reservas Extrativistas; Desenvolvimento Sustentável; Preservação ambiental.

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ABSTRACT

This work consisted of on an investigation, developed in a socio environmental perspective, of 21 Extractive Reserves of Rondonia, of the political organization of their authors, and the life conditions of is population. In general, the state reserve is having strong pressures caused by invasions, usually with the objective of having the wood extraction in an illegal way. The inhabitants of these reserves have as a big challenge the creation of mainly economical conditions which can provide its staying inside the reserve perimeter, but, there are other challenges; how to provide the children education, and an honored health situation.

The creation of extractive reserves provides the staying of the traditional population (rubber tree collectors, and riparian) in these areas, but the environmental preservation is an essential requirement for its maintenance. The reserve property is given in a collective way to the inhabitants through the real concession of its use. Its expected from this a reduction in tax deforestation and a democratic stewardship of the environmental resources.

We worked with the State Extractive Reserves of Rondonia, evaluating the political participation of its inhabitants, united in organizations connected to the OSR (Rubber Tree Collectors Organization from Rondonia), in the battle for its space preservation and for the building of the defense movement of state and federal extractive reserves existing in the state.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ---12

CAPÍTULO I: PERSPECTIVAS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL ---16

1.1 Desenvolvimento e sustentabilidade: essa combinação é possível? ---16

1.2 O Movimento Ambientalista no Brasil e a valorização da experiência extrativista ---28

1.3 Amazônia: sua biodiversidade, ocupação e seus ciclos econômicos---39

1.3.1 Amazônia: um espaço a ser preservado ---39

1.3.2 Ocupação e ciclos econômicos ---46

CAPÍTULO II: EXTRATIVISMO NA AMAZÔNIA BRASILEIRA: AS EXPERIÊNCIAS DO ACRE E DE RONDÔNIA---57

2.1 Acre: uma história de extrativismo e luta---57

2.2 Rondônia: da ocupação territorial à formação das atuais reservas extrativistas---63

2.2.1 Ocupação territorial ---63

2.2.2 Zoneamento Sócio-Econômico Ecológico---79

CAPÍTULO III: PERSPECTIVAS PARA O EXTRATIVISMO EM RONDÔNIA ---84

3.1 Gestão das reservas extrativistas do Estado---84

3.2 Reservas extrativistas estaduais de Rondônia---98

3.3 Unidades de Conservação e desmatamento no Acre e Rondônia---112

3.4 Os principais produtos extrativistas ---115

3.5 Manejo Florestal Madeireiro---121

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CONSIDERAÇÕES FINAIS ---129

BIBLIOGRAFIA ---132

ANEXOS ---139

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SIGLAS

ABES Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental AGAPAN Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural AGUAPE Associação dos Seringueiros do Vale do Guaporé ASAEX Associação de seringueiros do Baixo Rio Ouro Preto

ASBSAA Associação dos Soldados da Borracha e Seringueiros Agroextrativistas de Ariquemes

ASM Associação de Seringueiros de Machadinho D'Oeste

ASMOREMA Associação de Seringueiros e Moradores da Reserva Rio Preto Jacundá Tabajara

ASMOREX Associação dos Seringueiros e Moradores da Reserva Rio Preto Jacundá Tabajara

ASMUCUN Associação dos Moradores da Reserva Extrativista do lago do Cuniã ASROP Associação dos Seringueiros da Reserva Extrativista do Rio Ouro Preto ASVA Associação de Seringueiros do Vale do Anari

BASA Banco da Amazônia S. A.

BENTIVI Associação dos Seringueiros e Moradores da Reserva Jaci-Paraná CNMAD Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento CNPT Centro Nacional de Desenvolvimento Sustentado das Populações

Tradicionais

CNS Conselho Nacional de Seringueiros

CNUMAD Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento COOSERON Cooperativa de Seringueiros Extrativistas de Rondônia

CPDS Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional

CUNPIR Coordenação da União das Nações Indígenas de Rondônia, Noroeste do Mato Grosso e Sul do Amazonas

ECOPORE Ação Ecológica do Vale do Guaporé ELETRONORTE Centrais Elétricas do Norte do Brasil

FBCN Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza FUNAI Fundação Nacional do Índio

GTA Grupo de Trabalho Amazônico

IAMA Instituto de Antropologia e Meio Ambiente

IBAMA Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis IBDF Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária INDIA Instituto de Pesquisa em Defesa da Identidade Amazônica

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SIGLAS

MAB Movimento dos Atingidos pelas Barragens MFC Manejo Florestal de Base Comunitária

MIRAD Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário

MMA Ministério do Meio Ambiente

ONG Organização Não-Governamental

ONU Organização das Nações Unidas

OSR Organização dos Seringueiros de Rondônia PAD Projeto de Assentamento Dirigido

PAE Projeto de Assentamento Extrativista PIC Projetos Integrados de Colonização

PAIC Programa de Apoio às Iniciativas Comunitárias PIN Projeto de Integração Nacional

PLANAFORO Plano Florestal de Desenvolvimento Agroflorestal de Rondônia. PNF Programa Nacional de Florestas

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente

POLONOROESTE Programa Integrado de Desenvolvimento Agroflorestal de Rondônia PPA Plano Plurianual do Governo Federal

PRIMAVERA Associação de Seringueiros do Rio Pacaás Novos

PROARCO Programa de Prevenção e Controle de Queimadas e Incêndios Florestais na Amazônia Legal

PROBOR Programa de Incentivo à Produção da Borracha Natural PWCC Public Works Construction Company

RESEX Reservas Extrativistas

SADEN Secretaria de Assessoramento da Defesa Nacional

SAEPR Secretaria de assuntos Estratégicos da Presidência da República SEDAM Secretaria do Estado de Desenvolvimento Ambiental

SEMTA Serviço Especial de Mobilização de Trabalhadores para a Amazônia SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservação

SPVA Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia SUDAM Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia

SUDHEVEA Superintendência da Borracha

TORMB Taxa de Organizização e Regulamentação do Mercado da Borracha UICN União Internacional para a Conservação da Natureza

WWF Worldwide Fund for Nature (Fundo Mundial para a Natureza)

ZEE Zoneamento Econômico-Ecológico

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INTRODUÇÃO

No mundo todo o discurso em torno do desenvolvimento sustentável e de sua necessidade tem crescido, já que a idéia de preservar os recursos de hoje para que não faltem às futuras gerações, colocada como central para aqueles que defendem esta forma de desenvolvimento, ganhou muitos adeptos.

Neste trabalho estão contribuições de vários autores, de diferentes áreas, mas todos, cada qual a sua maneira, vislumbram o futuro do saber científico e suas implicações para a realidade. Conforme Demo (1995, p.11):

Reconhecendo o caráter problematizante da metodologia, decorre ser mister aceitar que tudo em ciência é discutível, sobretudo nas ciências sociais. Não há teoria final, prova cabal, prática intocável, dado evidente. Isto é uma característica, não uma fraqueza, o que funda, ademais, à necessidade inacabável da pesquisa, seja porque nunca esgotamos a realidade, seja porque as maneiras como a tratamos podem sempre ser questionadas. O objetivo de nosso trabalho é contribuir para o estudo do tema Reservas Extrativistas que, resumidamente, são áreas da União usadas mediante concessão, sob regulamentação do governo federal e/ou estadual. Não há título de propriedade individual da terra e nelas residem grupos e culturas tradicionais que se dedicam à extração de produtos de valor comercial, como o látex, a castanha-do-pará e óleos vegetais, além da caça e da pesca não predatórias e roçados de subsistência (GIANSANTI,1998).

A Lei Federal nº 7804, de 18 de julho de 1989, prevê:

Art. 9º [...]

VI – a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público Federal, Estadual e Municipal, tais como áreas de proteção ambiental de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas.

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A importância deste trabalho encontra-se principalmente na tentativa de vincular os danos ambientais existentes em nosso país a uma longa trajetória de desigualdades sociais e muitas vezes de descaso com a população menos favorecida, e também vinculá-lo a questão da participação política, ou da participação mais democrática desses grupos nas políticas públicas que envolvem seu espaço.

Tratamos aqui da importância do avanço do movimento ambientalista no Brasil e fizemos um breve comentário sobre a questão do desenvolvimento sustentável. Foi necessário para esse trabalho conhecer um pouco sobre a região da floresta amazônica - afinal, lá estão a maioria das reservas extrativistas existentes - e de como foi se dando sua ocupação tendo como pano de fundo o crescimento da exploração da borracha e a perspectiva de lucros que ela seria capaz de gerar. Trabalhamos um pouco com o conceito de reservas extrativistas e sua criação, para partirmos enfim para a formação das Reservas Estaduais Extrativistas de Rondônia, observando certos antecedentes que justificavam seu nascimento. Fez-se importante ainda perceber a situação das reservas extrativistas nos dias atuais, as condições de vida das populações que nelas vivem e as perspectivas de vida e de manutenção da reserva. Discutimos também o papel do governo no que diz respeito à criação de políticas públicas para a defesa e manutenção das reservas. Para alcançar nossos objetivos foi realizada uma pesquisa bibliográfica, com o objetivo de conhecer as contribuições científicas que pudessem nos guiar para o entendimento do tema escolhido. Nosso objetivo foi selecionar, analisar e interpretar essas contribuições.

Fizemos também uma Pesquisa Documental, utilizando dados do IBAMA, do Ministério do Meio Ambiente, de Organizações Não-Governamentais e outros que puderam contribuir para o estudo do tema.

Por fim, realizamos algumas entrevistas com alguns líderes de associações de seringueiros extrativistas que estiveram no mês de maio de 2005 na cidade de Porto Velho e

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com alguns moradores das reservas extrativistas localizadas em Machadinho D`Oeste – cidade onde estão 17 das 21 Reservas Extrativistas Estaduais de Rondônia, todas oriundas de antigos seringais desativados. Além de visita à Reserva Extrativista Castanheira, onde pudemos realizar também entrevistas e ter uma noção de como é organizada internamente uma reserva extrativista.

Nosso intuito, através das entrevistas, era falar com as pessoas e deixar que elas dessem suas impressões sobre o lugar onde vivem, trabalham, como moram, onde estudam, se tem assistência à saúde, se saem ou não da reserva. As entrevistas colhidas foram gravadas para posterior transcrição.

No que se refere à construção do saber científico, optamos por uma pesquisa descritiva e apostamos em um diálogo interdisciplinar entre as ciências. Isso se deve ao fato de estudos relacionados à temática ambiental exigirem uma abordagem mais ampla que permita entender a dinâmica que envolve a relação homem e natureza.

Podemos afirmar que o debate ambiental caracteriza-se em nossos dias pela exigência mínima de uma pluralidade de olhares e suas conseqüências para o coletivo e para os sujeitos. Essa exigência é necessária para que pensemos toda a dinâmica sócio-ambiental levando em conta os diferentes níveis de degradação e contaminação de recursos naturais, e as transformações sócio-culturais e tecnológicas que afetam a sociedade atual (BARBOSA, 1998).

A contribuição dos estudiosos do tema pode nos ser útil em momentos diferentes da construção do saber. Reconhecemos que todas as metodologias têm suas limitações (FEYERABEND, 1975). Graças a isso podemos compreender que a ciência é um processo de construção e que não necessariamente precisa de um fim em si mesma. Além do mais a idéia de um conhecimento cumulativo (KUHN, 1960), não nos deixa esquecer que a produção do conhecimento passa por um processo de aperfeiçoamento contínuo, ao longo da história da

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humanidade, em que o resgate e o estudo do pensamento de diversos autores é essencial para a construção e renovação dos saberes.

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1. Perspectivas para o desenvolvimento sustentável no Brasil

1.1. Desenvolvimento e sustentabilidade: essa combinação é possível?

Não podemos esquecer que o termo desenvolvimento sustentável tem sido usado para indicar um meio de se preservar os recursos de hoje para que não faltem às gerações futuras. Leonel (1998) já salientava que “há sempre uma contradição a ser superada entre desenvolvimento, que quer dizer crescimento e ampliação de uso dos recursos, e sustentabilidade, que busca sua poupança” (p.240) e que “a sustentabilidade oferece uma representação alternativa do desenvolvimento e não apenas a recusa ideológica de qualquer desenvolvimento” (p.241).

O termo, no entanto, tem causado muitas polêmicas, já que muitas vezes é apropriado de diferentes maneiras por diferentes grupos sociais.

Três posições diferentes a respeito de qual seria a melhor maneira de adotar o desenvolvimento sustentável seriam predominantes no Brasil: a estatista, a comunitária e de mercado. Na estatista, o Estado através dos mecanismos normativos, reguladores e promotores, é o lócus privilegiado da nova forma de desenvolvimento sócio-ambiental; na comunitária, são as comunidades organizadas, seja através dos movimentos sociais ou Organizações Não-Governamentais que através da promoção de um novo sistema de valores baseado na solidariedade, atuam como lócus privilegiado para uma alocação social e ambientalmente sustentável dos recursos; por fim vem o mercado que espera ser também o lócus privilegiado desse desenvolvimento ambientalmente sustentável, através de taxas e tarifas de poluição comercializáveis (VIOLA, 1992).

A maioria do ambientalismo específico e do sócio-ambientalismo identifica-se com a posição comunitária; entre os cientistas predomina a posição estatista, já a posição de

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mercado é predominantemente entre os empresários que se orientam para a sustentabilidade (VIOLA, 1992).

O conceito de desenvolvimento sustentável seria creditado a um engenheiro florestal norte-americano, Gifford Pinchot, primeiro chefe do serviço de florestas do país no século XIX, que segundo destaca A. Diegues (1994 apud GIANSANTI, 1998, p.9), defendia a preservação apoiada em três princípios básicos: “o uso dos recursos naturais pela geração presente, a prevenção do desperdício e o desenvolvimento dos recursos naturais para muitos e não para poucos cidadãos”.

Em 1969, durante a Assembléia Geral da ONU a degradação ambiental já era tema de preocupações gerais, mas foi o desastre ecológico na Baía de Minamata, no Japão, contaminando pescadores e moradores por mercúrio vertido de indústrias locais, que denotou a solicitação sueca de que a ONU votasse uma resolução a favor da realização de uma conferência internacional sobre meio ambiente (HERCULANO, 1992).

A proposta foi aprovada e a decisão de que a Conferência fosse em Estocolmo foi decidida pela XXIV Assembléia Geral.

Na XXVI Assembléia Geral da ONU, ainda em 1971, os países primeiro-mundistas pretenderam passar uma resolução que transformava os recursos naturais em patrimônio da humanidade e os colocava sob a administração de um Fundo Mundial (HERCULANO, 1992). Em 1972, realizou-se na Suécia a Conferência da Organização das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), ou simplesmente Conferência de Estocolmo.

A preocupação básica da Conferência era conter as várias formas de poluição, o que fez com que os debates fossem marcados pela polarização entre os defensores do chamado crescimento zero (representantes de países centrais e membros da comunidade científica, reunidos no chamado Clube de Roma) e os adeptos do desenvolvimentismo. Os primeiros

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advogavam a contenção dos índices de crescimento econômico dos países pobres, diante da ameaça de esgotamento dos recursos naturais que o ritmo da exploração da natureza poderia causar. Já os desenvolvimentistas, em boa parte representados por enviados de países do Terceiro Mundo, entre eles o Brasil, reivindicavam o direito ao desenvolvimento, mesmo trazendo impactos ambientais, entre eles o Brasil (GIANSANTI, 1998).

Em decorrência da Conferência de Estocolmo foram criados o PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), o Programa Observação Terra (Earthwatch) que monitoram as diversas formas de poluição e também a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNMAD). Essa Comissão composta por 21 países-membros da ONU, durante cinco anos (1983/1987) pesquisou a situação de degradação ambiental e econômica do planeta (HERCULANO, 1992).

Conforme Giansanti (1998), o debate em torno de desenvolvimento e sustentabilidade ganhou novos contornos, quando em 1973 Maurice Strong (secretário da CNUMAD) apresentou o conceito de ecodesenvolvimento para servir como alternativa de desenvolvimento de áreas rurais de países subdesenvolvidos e Ignacy Sachs economista reformulou o conceito estendendo-o às áreas urbanas para designar um enfoque de planejamento de estratégias para adequar crescimento econômico e gestão racional do meio ambiente.

De acordo com Barbieri (1997, p.38):

O conceito tradicional de sustentabilidade tem sua origem nas Ciências Biológicas e aplica-se aos recursos renováveis, principalmente os que podem se exaurir pela exploração descontrolada, como são os casos dos cardumes de peixe e das espécies vegetais das florestas naturais.

Vale ressaltar que a idéia de desenvolvimento sustentável tem suas bases na idéia de ecodesenvolvimento. Em linhas gerais ambas tratam de uma forma de pensar novas modalidades de desenvolvimento, que não seguissem nem a tendência de desenvolvimento

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zero, como pregava o Clube de Roma, nem a dos desenvolvimentistas. De acordo com Barbieri (1997), Sachs defendia que a idéia de sustentabilidade não deveria se limitar apenas à visão tradicional de estoques e fluxos de recursos naturais e capitais, mas considerar também outras dimensões como a sustentabilidade social, econômica, ecológica, espacial e cultural. Isso envolveria entre outras coisas, uma melhoria nos direitos e condições de vida das populações; uma gestão eficiente dos recursos, a adoção de tecnologias limpas que poupassem recursos; uma melhor distribuição do território, contemplando a questão rural-urbana e a concentração excessiva em áreas metropolitanas e envolveria ainda concepções de desenvolvimento que respeitassem as peculiaridades de cada ecossistema, de cada cultura e cada local.

Em 1980, a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) lança o documento Estratégia Mundial para a Conservação, visando a elaboração de políticas de desenvolvimento sustentável.

Em 1987 a idéia de desenvolvimento sustentável ganhou reconhecimento efetivo, a partir da publicação do Relatório Nosso Futuro Comum, que ficou conhecido como Relatório ou Informe Brundtland. Esse Relatório leva o nome da primeira-ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland coordenadora dos trabalhos da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU. O conceito de desenvolvimento sustentável adotado é o de que é

aquele que supre às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade das futuras gerações atenderem as suas próprias necessidades.

O relatório apresenta 109 recomendações visando concretizar propostas definidas em 1972.

Em Junho de 1992, no Rio de Janeiro foi realizada a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano (CNUMAD), organizada pela ONU (Organização das Nações Unidas), sobre as possibilidades de desenvolvimento sustentável,

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dando continuidade à Conferência de Estocolmo/1972. Paralelamente a este evento realizou-se o Fórum Global de ONGs, reunindo em torno de 4.000 entidades da sociedade civil e do mundo todo. Aos dois eventos se denominou popularmente Eco-92 (BARBIERI, 1997), ou Rio-92. O conceito de desenvolvimento sustentável adotado foi o mesmo da Comissão Brundtland de que seria aquele que supre as necessidades do presente, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprirem suas próprias necessidades. Como resultado da Conferência foi elaborada a Agenda 21, seu documento mais importante, com propostas que implementadas contribuiriam para um desenvolvimento sustentável.

O Brasil foi um dentre os 178 países que assinaram a Agenda 21, se comprometendo a mudar sua postura frente à questão ambiental, e assim como todos os outros signatários, assumiu o compromisso de implementar a sua própria Agenda 21.

O texto da Agenda 21 Global está estruturado em quarenta capítulos divididos em quatro seções, intituladas respectivamente: Seção I- Dimensões sociais e econômicas; Seção II – sem título, Seção III- Fortalecimento dos papéis dos grupos principais, Seção IV- Meios de implementação (BARBIERI, 1997). Os capítulos tratam dos mais diversos temas, envolvendo cooperação internacional, combate à pobreza, padrões de consumo, demografia, desflorestamento, ecossistemas, agricultura, recursos hídricos, organização dos grupos sociais. Dentro das metas da Agenda 21 Global foi criada a Agenda 21 Brasileira, que tendo por objetivo a instituição de um modelo de desenvolvimento sustentável que levasse em conta as potencialidades e vulnerabilidades do país, enfocou 06 (seis) temáticas principais: Agricultura Sustentável; Cidades Sustentáveis; Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Sustentável; Infra-Estrutura e Integração Regional; Gestão de Recursos Naturais e Redução das Desigualdades Sociais.

Dez anos após a Eco-92, ocorreu a Conferência RIO + 10, em Johannesburgo na África do Sul, de 26 de Agosto a 04 de Setembro de 2002.

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Houve poucas mudanças em relação à Conferência de 1992, discutiu-se muito a melhor maneira de tornar viável os objetivos decididos nas Conferências.

Entre os principais assuntos abordados estão a questão da água e do saneamento básico, o objetivo é que até 2015, haja uma diminuição pela metade da quantidade de pessoas sem acesso a eles. Outra questão trata da eficiência energética e do uso de energia renovável. Espera-se ainda que até 2010, os países em desenvolvimento tenham acesso a tecnologias alternativas que visem diminuir a emissão de produtos que interferem na camada de ozônio. Espera-se a redução da perda de biodiversidade até 2010; a reversão da tendência de degradação dos recursos naturais e a restauração de pesqueiros até 2015, e o estabelecimento de áreas marinhas protegidas até 2012. Espera-se ainda que até 2020, os produtos químicos sejam utilizados e produzidos de forma a minimizar os prejuízos à saúde e que haja também cooperação para reduzir a poluição do ar (englobando os gases do efeito estufa). Ficou também estabelecido um empenho em buscar maior acesso a mercados alternativos (por exemplo, por meio de blocos econômicos) com o fito de o país se desenvolver, em diminuir subsídios às exportações e também em promover um conjunto de programas, no prazo de dez anos, para incentivar o consumo e a produção sustentável (DINIZ, 2002).

Quanto ao Brasil, o que temos é uma tentativa de ampliar os esforços para a realização prática de nossa Agenda 21.

A primeira fase foi a construção da Agenda 21 Brasileira. Esse processo que se deu de 1996 a 2002, foi coordenado pela Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 Nacional (CPDS) e teve o envolvimento de cerca de 40.000 pessoas de todo o Brasil. O documento Agenda 21 Brasileira foi concluído em 2002.

Já a partir de 2003, a Agenda 21 Brasileira não somente entrou na fase de implementação assistida pela CPDS, como também foi elevada à condição de Programa do Plano Plurianual.

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Em 2004 o Programa Agenda 21 passou a integrar o Plano Plurianual do Governo Federal (PPA), tornando-se uma das bases para a formulação das políticas públicas estruturais do país no quadriênio 2004/2007. O objetivo seria implantar os princípios e estratégias da Agenda 21 Brasileira na formulação de políticas públicas locais e nacionais, de forma a estabelecer prioridades a serem definidas e executadas em parceria governo-sociedade civil visando a promoção de um desenvolvimento sustentável. Mas para que tal aconteça ainda falta implementar as Agendas 21 locais, que sejam baseadas na Agenda 21 Brasileira, e não fujam das estratégias da Agenda Global. O Ministério do Meio Ambiente prevê a formação continuada de agentes regionais que promovam esse desenvolvimento local, por meio da disseminação dos princípios da agenda e que contribuam no processo local de formação e implementação da mesma (BRASIL, 2006).

Conforme palavras da Ministra Marina Silva (BRASIL, 2006), retiradas do site do Ministério do Meio Ambiente:

Estamos vivendo um momento em que a sociedade brasileira aos poucos está conhecendo os fundamentos da Agenda 21, compreendendo o nosso esforço em favor da sustentabilidade socioambiental em âmbito nacional e local. Inclusão social e qualidade ambiental constituem o elemento novo do ciclo de desenvolvimento que o nosso governo está estimulando. É com esses princípios que estaremos assegurando a participação social no debate e na proposição de políticas e ações apropriadas em todas as áreas de governo. O compromisso do MMA tem sido contribuir para que se realize essa transição que propõe a Agenda 21.

Embora muito se fale sobre o desenvolvimento sustentável, temos de reconhecer que há várias formas de tratar a polêmica em torno dele, e que muitas vezes ele se apresenta como a proposta de uma nova sociedade, um equívoco que temos de evitar, pois longe de um novo estilo de desenvolvimento, a proposta de desenvolvimento sustentável que temos visto significa sim “uma soma de mecanismos de ajustes em prol de um capitalismo soft” (HERCULANO, 1992, p.44).

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Seja como for, gostaríamos de acrescentar aqui que o conceito de desenvolvimento sustentável é construído historicamente. Thomas (1988), tratando das mudanças de atitude em relação às plantas e aos animais na Inglaterra, do período de 1500 a 1800, nos fornece a noção de como se desenvolve toda uma nova sensibilidade em torno de plantas e animais que permite respeitá-los hoje em dia.

Em maior ou menor quantidade, essa discussão não deixa de passar pelo viés da teologia. A tradição judaico-cristã teria sido decisiva na questão da separação entre humanidade e natureza.

Na Inglaterra dos Períodos Tudor e Stuart a visão tradicional era de que o mundo fora criado para o bem da humanidade e as outras espécies seriam subordinadas aos seus desejos e necessidades. Qualquer teólogo ou intelectual que quisesse justificar essa idéia poderia apelar para os filósofos clássicos e mesmo para a Bíblia (THOMAS, 1988).

Alguns fatores, no entanto, influenciam no processo que aos poucos introduz mudanças na visão antropocêntrica do mundo, como a astronomia, a botânica e a zoologia, que embora em seu início tenham se voltado para a utilidade que teriam para o homem, serviram também para ampliar seu olhar sobre o mundo e aumentar a percepção de que fazemos parte de um ecossistema maior.

A botânica em princípio nasceu para identificar usos e virtudes das plantas, essencialmente para a medicina, mas também para a culinária e a manufatura (THOMAS, 1988). Do mesmo modo teria sido com a zoologia que em fins do século XIX, tinha por objetivo aclimatar e desenvolver novos animais domésticos não somente por sua diversidade e beleza como também utilidade para o gênero humano.

Já a invenção do microscópio em fins do século XVII, revelou milhões de seres animados, protozoários e bactérias, “que viviam em completa indiferença às preocupações

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humanas, ocupando um mundo de beleza e complexidade sobre o qual nenhum homem jamais pousara os olhos” (THOMAS, 1988, p200).

A genealogia intelectual que dá origem ao chamado homem de sentimento teria sua origem entre os teólogos latitudinários1 do período da Restauração, os quais, em reação a Hobbes, ensinavam que os instintos inatos do homem eram generosos, não sendo natural encontrar prazer na crueldade (THOMAS, 1988).

Em relação à questão teológica, o autor faz a seguinte colocação:

No entanto, sugerir que a preocupação com os direitos dos animais se tenha desenvolvido logicamente a partir de elementos latentes na tradição judaico-cristã é apenas uma petição de princípios. Pois se a possibilidade intelectual sempre esteve presente, por que somente nos inícios do período moderno se consumou?

A resposta parece ser a seguinte os processos puramente intelectuais precisaram ser estimulados pela transformação social externa (THOMAS, 1988, p.217).

Entre outros fatores podemos perceber que com a emergência de uma ordem industrial, que principia na Inglaterra, os animais foram ficando à margem do processo de produção. Aos poucos as pessoas começam a trabalhar em indústrias movidas por meios não animais, principalmente após a introdução do vapor, o que também gera mudanças e os animais em muitos casos passam a ser considerados bichos de estimação. Em algum momento, infligir dor aos animais passa a ser considerado por algumas pessoas ato de crueldade. Com a flora, se dá processo semelhante, de forma que possa vir a existir um dilema campo ou cidade:

... Esse antigo ideário pastoral sobreviveu moderno mundo industrial adentro. Pode ser visto nas imagens do campo tão utilizadas para anunciar bens de consumo; e no vago desejo de tantas pessoas de findar seus dias numa cabana no campo. Por sentimentais que sejam, tais sensibilidades refletem o desconforto gerado pelo progresso da civilização humana; e uma relutância a aceitar a realidade urbana e industrial que caracterizava a vida moderna (THOMAS, 1988, p.301-302).

1 Teólogos que compartilhavam da idéia de que a igreja anglicana tivesse bases mais amplas, acolhendo em seu

seio todo particularismo, mediante o reconhecimento mútuo dos artigos da fé cristã, sendo que todos que acreditassem em Cristo pudessem ser inscritos nela, ainda que interpretassem de forma diferente as Escrituras.

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Thomas (1988) afirma que em 1969 já se apresentava uma das contradições da civilização moderna que é o conflito entre as novas sensibilidades (o respeito à fauna e à flora) e os fundamentos materiais das sociedades humanas.

Hoje podemos crer que a questão apenas foi reformulada, porém manteve sua essência. No lugar dos fundamentos materiais se coloca a busca por um desenvolvimento econômico capitalista que se pretende ilimitado e no lugar das novas sensibilidades a idéia de sustentabilidade ambiental que também envolveria uma sustentabilidade econômica, mas que não se encaixa na idéia de desenvolvimento econômico material vigente.

Reafirmamos que é necessário pensar que os conceitos são construídos historicamente, e que há todo um processo gerador das mudanças. O avanço da ciência e da tecnologia tem grande influência sobre nossas formas de perceber e interpretar o mundo.

A tecnologia acabou se tornando sinônimo de competição global, sendo que com vistas à participação no mercado global, cada dia novas tecnologias são criadas, para que aumente a acumulação e novos investimentos possam ser feitos em tecnologia. Trata-se do esquema clássico do progresso técnico que se apresenta como necessidade inalienável do capital e uma de suas fatalidades. Na metáfora marxista ao promover sua expansão o capital cria condições para sua destruição, assim tem de estar continuamente superando as barreiras que ele mesmo estabelece, ainda que gerando outras em nível superior (DUPAS, 2000).

Não é à toa, que o conceito de desenvolvimento sustentável, vem à tona em nossos dias, seria ótimo aliar desenvolvimento (enquanto crescimento econômico) e sustentabilidade (“economia” de recursos), porque ambos os conceitos nos parecem importantes, mas é correntemente aceito que essa fórmula não é possível, o possível é criar mecanismos para tentar amenizar o impacto causado pelo avanço do desenvolvimentismo ávido de novos espaços para aumento da acumulação. Capra (1982, p.13) acredita que nossa sociedade como um todo se encontra numa crise de percepção, temos taxa de inflação, desemprego, crise

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energética e também na saúde, poluição, desastres ambientais e uma onda crescente de violência e crimes, segundo o autor tudo “são facetas diferentes de uma só crise, que é essencialmente, uma crise de percepção”.

O problema estaria no fato de que crescimento econômico e desenvolvimento tecnológico estariam inextricavelmente ligados, e que os indivíduos e instituições, entusiasmados com as maravilhas tecnológicas, acreditassem que para todos os problemas, inclusive de natureza política, psicológica, ou ecológica, haveria uma solução tecnológica:

Ao consumo exagerado de energia contrapõe-se a energia nuclear, a falta de visão política é compensada pela fabricação de mais bombas e mísseis, e o envenenamento do meio ambiente natural é remediado pelo desenvolvimento de tecnologias especiais que, por seu turno, afetam o meio ambiente de forma ainda ignorada. Ao procurarmos soluções tecnológicas para todos os problemas, limitamo-nos usualmente a transferi-los de um ponto para outro no ecossistema global, e, com muita frequência, os efeitos colaterais da “solução” são mais perniciosos do que o problema original (CAPRA, 1982, p.209-210).

A solução seria uma redefinição da tecnologia, uma mudança em sua direção acompanhada de uma reavaliação de seu sistema de valores, que nos voltássemos a tecnologias brandas, que promovessem a resolução de conflitos, os acordos sociais, a cooperação, a reciclagem e a redistribuição de riqueza (CAPRA, 1982).

De fato talvez seja esta a essência que deva assumir o desenvolvimento sustentável hoje. Sendo desenvolvimento e sustentabilidade coisas diferentes, sabemos que estamos em um momento histórico em que não podemos abrir mão de nenhum deles, então que se use a tecnologia voltada ao desenvolvimento de uma forma mais coerente, que reduza os impactos sobre o ambiente, e que envolva a relação custo-benefício social e não apenas individual e que na tomada de decisões a seguinte pergunta seja respondida: há mesmo necessidade deste ou daquele uso?

Além de que existem recursos renováveis e não-renováveis. Os não renováveis, como o petróleo, o carvão mineral e os minérios não admitem o rigor de um uso sustentável. Apesar

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da reciclagem de alguns deles, há sempre perdas das reservas que são finitas e necessitam de novas alternativas, e existem alguns recursos que hoje são renováveis, mas que podem não ser a longo prazo. Exemplo pode ser a exploração da castanha-do-pará na Amazônia, que embora se restrinja a coleta de frutos caídos, sem a derrubada das árvores inviabiliza a sua reprodução natural. O plantio de cana, para a produção de álcool é outro exemplo, já que grande parte da Mata Atlântica foi destruída para seu plantio, o que priva as gerações futuras de boa parte da diversidade desta área (CAMARA, 2004).

A convergência entre ecologia e economia, dentro do modo de produção capitalista, não é tarefa fácil. O conceito de desenvolvimento sustentável serve bem aos propósitos capitalistas, porque induz a pensar que este é um modo de produção possível, que pode se sustentar durante longo prazo, mas a realidade nos mostra que se continuarmos com nossos padrões atuais de consumo dos recursos naturais, estaremos nos condenando a um futuro incerto.

A ecologia exige que a Terra seja considerada bem comum e que valores globais substituam os interesses particulares para que haja o surgimento de instituições e regras que a coletividade de atores esteja disposta a respeitar, tornando realistas as utopias de transformação. Daí decorre também a importância do ambientalismo para tornar visível e inegável a necessidade de mudança, de ajuste entre a realidade, as consciências e as expectativas (LEIS, 1998).

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1.2. O Movimento Ambientalista no Brasil e a valorização da experiência extrativista

Gostaríamos de fazer uma breve análise do Movimento Ambientalista no Brasil, que permitiu a partir da última década (1990), o aumento do número de unidades de conservação da natureza (áreas destinadas à proteção e preservação da flora, fauna, recursos hídricos, paisagens e monumentos naturais), entre elas o aumento do número de reservas extrativistas (áreas nativas ou parcialmente alteradas, ocupadas por populações de tradição extrativista que vivem da coleta de seus recursos naturais renováveis para sua subsistência).

A fase fundacional do ambientalismo brasileiro pode ser considerada do período que vai de 1971 a 1986, como um período de denúncia e criação de consciência pública sobre os problemas de deterioração sócio-ambiental. Após este período, de 1987 a 1991, o ambientalismo brasileiro seria caracterizado por um processo de institucionalização dos grupos ambientalistas, já com capacidade crescente para atuar em projetos específicos de preservação ambiental e também de grande esforço para articular a questão ambiental com o desenvolvimento econômico e com a busca do desenvolvimento sustentável (VIOLA, 1992).

De 1992 aos dias atuais, vivemos o período pós Eco-92, ou seja, uma fase de busca por realizações práticas, com o objetivo de cumprir os compromissos firmados entre os diversos países. A emergência de problemas ambientais, como o aquecimento global, por exemplo, tem ganhado cada vez mais atenção por parte da opinião pública.

Seriam três, segundo Viola (1992), as principais abordagens teóricas utilizadas para a análise do ambientalismo: grupo de interesse, novo ambientalismo e movimento histórico. O enfoque do grupo de interesse dá relevância às organizações ambientalistas não governamentais que dispõem de recursos para influenciar o sistema político. O enfoque do novo movimento social ao setor ideologicamente radical do ambientalismo (sejam ONGs ou grupos de base). Ambos agem de forma sinergética estimulando a incorporação da proteção

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ambiental ao conteúdo normativo da democracia. Já o movimento histórico dá relevância ao conjunto de ONGs e grupos comunitários, independentemente da ideologia de cada instituição, e enfatiza a rede de relações que estes estabelecem com outros setores, empresários, cientistas, agências governamentais e intergovernamentais, assumindo uma posição intermediária esse grupo tem um componente normativo, mas assume a crise da ordem social, consegue perceber que há grupos sociais que operam numa lógica convencional e outros que já se orientam para a sustentabilidade.

De fato quando observamos a fase de criação do ambientalismo brasileiro, vemos um interesse que não tem suas origens primeiramente no território nacional, mas vem como uma idéia importada.

Um breve resumo adaptado do que foi apresentado por Viola (1992) mostra-nos o movimento ambientalista no Brasil no período de 1971-1986:

• 1958- Criada a Fundação Brasileira para a Conservação da natureza (FBCN), no RJ, vinculada à União Internacional para a Conservação da Natureza (fundada na Suíça em 1947). Sua atuação foi limitada na década de 60, pois não havia preocupação com a problemática ambiental na opinião pública brasileira.

• 1971- É fundada em Junho a AGAPAN (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural) em Porto Alegre, em defesa da fauna da vegetação, combate a inseticidas, fungicidas, herbicidas, poluição industrial, domiciliar, luta pela salvação da humanidade da destruição, entre outros.

• 1972- Acontece a Conferência de Estocolmo, mas seu impacto é mínimo na opinião pública brasileira.

• Segunda metade da década de 1970- surgem grupos ambientais nas principais cidades do Sul e Sudeste. Ex: ABES (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental), luta pela expansão do saneamento básico.

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• 1977- Movimento contra a construção do aeroporto de Caucaia do Alto, um dos poucos remanescentes da Mata Atlântica. O aeroporto acaba sendo transferido para Guarulhos (1978).

• 1980- A década de 80 é marcada pelo aumento de grupos ambientalistas, em boa medida devido às pressões da juventude da classe média educada.

• 1986- A maioria do ambientalismo entra na arena política cheia de expectativas a respeito das eleições do Congresso Constituinte. Por diferentes razões, entre elas divergências, quanto a quem ou quais seriam os candidatos ou partidos apoiados, somente Fábio Feldman, de São Paulo foi eleito deputado.

Mostra ainda o período posterior que vai de 1987-1991:

• Década de 80- O número de grupos ambientalistas continua crescente, e há certa expansão no centro-Oeste, Norte e Nordeste (exceto Brasília). Muitos desses grupos são amadores, formados por pessoas que aderem a causa ambiental sem compreender sua complexidade, a maioria dura menos de um ano. Os grupos ambientalistas já formados, considerados semiprofissionais, tratam de profissionalizar-se. O processo de profissionalização destes grupos está ligado ao engajamento em projetos que lhes garantem alcançar seus objetivos e se manter financeiramente, assim a maioria busca a captação de recursos junto a Fundações e ONGs, principalmente da Europa e Estados Unidos. Exemplo: AGAPAN, União Protetora do Ambiente Natural (RS), Associação Catarinense de Preservação da Natureza, Associação de Preservação e Equilíbrio do Meio Ambiente (SC), Epocatu-Oby (PR), Associação de Defesa do Meio Ambiente (PR), a OIKOS (SP), a ECO (SP), a Coovida (RJ), a Associação Mineira de Defesa Ambiental (MG). As entidades profissionais têm nítida influência sobre as agências estatais do meio

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ambiente, o legislativo e o empresariado, e além disso constituem um agente social de introdução de um novo estilo administrativo no país. Exemplos do tipo são: SOS Mata Atlântica, FUNATURA, Ecotrópica, Instituto de Estudos Amazônicos, Fundação Mata Virgem, Amigos da Terra, GreenPeace Brasil, Fundação Biodiversitas.

Na segunda metade da década de 80, os grupos ambientalistas começam a influenciar vários movimentos sociais, que embora não tivessem como eixo de ação a questão ambiental, incorporavam a questão ambiental como algo importante em seu trabalho.

Viola (1992) chama esses grupos de sócio-ambientalistas, referindo-se a todos os movimentos sociais influenciados pelo ambientalismo. Estariam incluídos aí desde o Movimento dos Atingidos pelas Barragens (MAB), até o Movimento dos Seringueiros, foco de nosso trabalho.

Vale ressaltar que desde meados dos anos 70 e 80, vêm se consolidando novos movimentos sociais que escapam à lógica das relações clientelísticas. Mesmo tendo nos sindicatos suas expressões maiores, esses grupos têm se mobilizado organizadamente em núcleos, se dividindo em comissões, conselhos, associações, comunidades de resistência, são eles índios, seringueiros, garimpeiros, assentados, atingidos por barragens, etc. Alguns movimentos estão se articulando internamente e com outros movimentos principalmente através de Encontros onde podem discutir sua situação. O governo, no entanto, nem sempre pareceu favorável, ao diálogo e à negociação, permitiu que os grupos discutissem isoladamente com a ELETRONORTE, a Vale do Rio Doce, o IBAMA, o INCRA e outros órgãos do governo, mas manteve os conflitos agrários como matéria de segurança nacional. A questão ambiental esteve direta ou indiretamente ligada os quadros da SADEN (Secretaria de Assessoramento da Defesa Nacional), numa época de transição à democracia, em que não

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se preconizava medidas coercitivas para resolver antagonismos sociais. Para que tal acontecesse houve a neutralização dos instrumentos básicos de reforma agrária de 1986-1988, o esvaziamento do MIRAD (Ministério da Reforma e Desenvolvimento Agrário), da FUNAI e do IBDF (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal), deixando vago o espaço de interlocução das demandas advindas dos vários movimentos sociais. Isso demonstra que apesar do afloramento dos vários movimentos sociais, o governo ainda tratava da região da Amazônia dentro de uma estratégia de desenvolvimento e segurança nacional (ALMEIDA, 1989).

Pudemos observar que o movimento ambientalista no Brasil, já nasce influenciado por movimentos internacionais e que o movimento começa já por um perfil de institucionalização, embora muitos dos grupos ambientais tenham agido no anonimato, sem registro e acabado antes mesmo de completar um ano.

Esse avanço da institucionalização do movimento ambientalista, antes muito forte no Sul e no Sudeste, aos poucos começa a ganhar importância no Centro Oeste, no Nordeste e no Norte, de forma que, o CNS (Conselho Nacional de Seringueiros) é criado em 1985.

Fearnside (1992), se referindo às áreas de reserva extrativista, aponta para o fato de que em 1985 teria surgido a oportunidade para que áreas da floresta amazônica fossem mantidas sob uso sustentado, foi então que o Conselho Nacional de Seringueiros (CNS), e o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri e Brasiléia (Acre) propuseram a criação de uma série de reservas denominadas extrativistas.

A proposta de criação das reservas teve origem nos próprios seringueiros, segundo Carvalho (1996), ela teria surgido no Primeiro Encontro Estadual dos Seringueiros de Rondônia (que visava preparar um grupo para o Primeiro Encontro Nacional), e teria sido inspirada na reserva indígena. Por ser requisito para o desembolso de recursos pelos bancos multilaterais de desenvolvimento, foi aceita também pelo governo brasileiro.

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Por se tratar de populações que dependem da floresta e que sabem usar seus recursos de forma adequada, o melhor mesmo é que permaneçam na terra, já que a reserva acumula as funções de unidade de reforma agrária, de conservação ambiental e de desenvolvimento econômico e social, combinando o controle dos grupos sociais com a atuação do Estado na definição de políticas públicas para as áreas (ALEGRETTI, 1989).

Rueda (2006) salienta que em 1980, talvez influenciados pela política de parcelamento das terras promovido pelo governo, os extrativistas desejavam ter lotes individuais e que uma minoria ainda não assimilava bem a idéia de não ter um título de propriedade individual. Talvez seja essa a razão que faz com que em nossos dias ainda exista a venda irregular de colocações dentro da reserva. A população local, tanto quem compra, como quem vende, talvez não tenha assimilado bem o sistema de concessão de uso, mas com certeza não é essa a única, nem a principal razão para que ocorram as irregularidades. Atualmente não existem dados sobre a quantidade de pessoas vivendo em reserva que não concordam com essa forma de organização, mas de qualquer forma a criação das reservas foi decidida de forma coletiva pela maioria, através dos Encontros de Seringueiros. Foi através das entrevistas em Rondônia que ocorreram referências a pessoas que não participam das associações, mas os atuais dirigentes estão num processo de organização freqüente, e se dirigem a essas pessoas na intenção de dar orientações sobre o movimento extrativista hoje e sua importância para a manutenção da reserva e da floresta. É fato que as colocações são muito distantes umas das outras e algumas pessoas não tem a compreensão de todo o processo de organização em que estão envolvidas.

No Norte do país, é o encontro do Movimento Ambientalista com a luta dos seringueiros, que permite a elaboração do programa das reservas extrativistas, de relevância internacional após a morte de Chico Mendes. Vale ainda observar, como aponta Viola (1992) que as características do movimento ambientalista no Sul e Sudeste têm um perfil ocidental,

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influenciado principalmente por idéias da Europa e dos EUA. Já na Amazônia, “confluem organizações das populações nativas da floresta com organizações ambientalistas do sul do Brasil e internacionais que apóiam aquelas populações” (VIOLA, 1992, p.65).

Em 1988, já é possível observar uma significativa abertura no ambientalismo brasileiro para a problemática do desenvolvimento sustentável. A visibilidade internacional que têm as queimadas na Amazônia, o assassinato de Chico Mendes (em dezembro de 1988), e os protestos de lideranças indígenas fizeram com que o Brasil se tornasse alvo da mídia internacional, fazendo com que os ambientalistas brasileiros se percebessem importantes no cenário internacional e com que as autoridades brasileiras não pudessem mais fugir à responsabilidade que tinham sobre os acontecimentos naquela região, sendo praticamente obrigadas a dar uma resposta à inquietação dos estrangeiros.

O próprio movimento ambientalista brasileiro está se organizando sob bases mais consistentes, amparado na Constituição Federal de Outubro de 1988. No que se refere à questão do extrativismo leis foram criadas garantindo certos direitos às comunidades tradicionais extrativistas, e na década de 90 já foram demarcadas e criadas as primeiras reservas.

A partir de 1990, não se fala mais no Brasil de proteção ambiental independente do desenvolvimento econômico. Agora se fala em qual tipo de desenvolvimento sustentável seria desejável.

É também nesse contexto que é realizada no Brasil a Eco-92 e, paralelamente a ela, o Fórum das ONG’s em 1992.

A importância da questão ambiental estaria, no entanto, estabelecida no nível do discurso, nos formadores de opinião e no conjunto da população que se considera informada. Importância que se traduz numa legislação relativamente avançada. Porém os comportamentos individuais cotidianos, não refletem essa consciência ambiental. As políticas

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públicas estariam a meio caminho entre um discurso-legislação bastante ambientalizado e um comportamento individual-social bastante predatório. Desta maneira temos por um lado as políticas públicas que têm contribuído para estabelecer um sistema de proteção ambiental no país e por outro lado um poder público que “é incapaz de fazer cumprir aos indivíduos e às empresas uma proporção importante da legislação ambiental” (VIOLA, 1992, p.70).

A constatação de que haveria um distanciamento das práticas cotidianas do indivíduo e a estrutura normativa estatal, com suas leis e regras para serem seguidas, mas inoperantes por serem ineficazes no que se refere às punições de infratores, é relevante quando lembramos a luta dos seringueiros da Amazônia.

Quando consideramos as reservas extrativistas como resultado de um processo histórico que relegou à pobreza as populações da região amazônica e quando consideramos que essa mesma população, sem ter leis eficazes para recorrer, teve ela própria, que criar mecanismos de defesa para continuar sobrevivendo. Mecanismos estes que poderiam ter sido, por exemplo, de combater a violência com a violência, mas, ao contrário, essas populações em alguns casos como no Acre, preferiram, nos anos 80, realizar os chamados empates “...ações coletivas em que homens, mulheres e crianças dirigiam-se às áreas de corte da mata e, ocupando-as pacificamente, procuravam convencer os empregados das madeireiras a abandonar as motosserras” (GIANSANTI, 1998, p.93).

O exemplo Acreano, não foi esquecido. Não nos esquecemos é claro, que a Amazônia é uma região onde nem sempre as coisas se resolveram de modo pacífico, ao contrário, houve e ainda há muitos conflitos entre índios, mineradores, seringueiros, madeireiros, e aqueles que ousaram enfrentá-la. Mas é certo que o exemplo dos seringueiros pode muito nos ensinar.

A estratégia dos empates feita pelos seringueiros também gerou conflitos. Mas ao realizar os empates, estabelecer seus objetivos e lutar por eles, os seringueiros vão construindo sua identidade enquanto grupo. Ao entrar em contato com outros grupos, ONGs

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Nacionais e Internacionais, e outros do movimento ambientalista, os seringueiros conseguem os meios necessários para institucionalizar seus objetivos.

A luta dos seringueiros ganhou visibilidade principalmente no Acre, sob a liderança de Chico Mendes, que pagou com a vida pela sua audácia.

Segundo Gonçalves (2001, p.173), Chico Mendes percebeu:

... que era preciso inventar uma figura jurídica que protegesse o trabalhador rural contra as pressões a que ficam submetidos quando têm acesso à propriedade, como demonstram diferentes experiências. Sabia que ações deveriam se empreendidas para garantir créditos, e todo um conjunto de políticas que tornasse possível a sobrevivência dessas populações. No entanto, procurou investir para que houvesse um caráter de propriedade comunitária que, respeitando o trabalho individual e familiar, servisse de respaldo jurídico contra as pressões a que fatalmente se vêem submetidos. Foi assim que, inspirado na figura jurídica de Reserva Indígena, foi protagonista da proposta de Reserva Extrativista, que é formalmente propriedade da União, que envolve dezenas e até centenas de famílias, que seria gerida através de um plano de uso elaborado e posto em prática pelas próprias populações por meio de suas organizações de base comunitária (Sindicatos, cooperativas, escolas, associações de mulheres etc.).

Qualquer mudança no status quo da região Amazônica corre, infelizmente, o risco de ser obstacularizada pelos fortes interesses políticos e econômicos das oligarquias regionais e também de grandes grupos nacionais e internacionais atuantes na região, e muitas vezes fragilizados por suas condições econômicas e também pela desorganização política e social, alguns sujeitos sociais, principalmente os pequenos produtores rurais só contam com a aliança do Estado para enfrentar esses obstáculos (BOTELHO, 1992).

No que se refere às questões ambientais em áreas de conflito como a região amazônica, uma regulação advinda das políticas governamentais pode se apresentar como uma alternativa de sobrevivência, pelo menos no que se refere à propriedade da terra, no caso das reservas extrativistas, mas não podemos esquecer de levar em conta a própria população para realizar essas regulações.

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A presença da burocracia estatal é necessária para de certa forma (através de políticas públicas, por exemplo) manter a ordem na região. O problema é como essa burocracia vai se apresentar na resolução de conflitos e como vai atuar sobre suas causas.

O contexto histórico, político e social da região amazônica e também da sociedade brasileira deve ser sempre levado em conta ao se pensar em desenvolver sustentavelmente a região. As políticas públicas devem revelar comprometimento com a diversidade histórica e sócio-cultural de seus habitantes. Botelho (1992), considera que a demarcação tanto de terras indígenas, quanto de terras de trabalhadores extrativistas pode não contemplar a realidade interna dos grupos, como também ignorar a cadeia de relações existente entre eles e outros segmentos sociais da região, que pode ficar abalada pela criação de “enclaves” que essas medidas fomentariam.

A critica da autora faz referência ao fato de que os formuladores dessas políticas públicas parecem ignorar que a questão do acesso à terra não se resolve exclusivamente por respostas localizadas, mas sim pelo acesso à terra pelas pessoas que dela necessitam (BOTELHO, 1992).

O descompromisso com os aspectos históricos e sociais das populações locais estaria ainda na postura oficial adotada com relação aos garimpeiros, que são acusados de predadores e poluidores dos rios, e têm sido retratados indiscriminadamente, tanto pelos órgãos oficiais como pela mídia, como os grandes vilões do processo de devastação ambiental na Amazônia. A realidade do garimpo esconde outras facetas, já que os garimpeiros, em sua grande maioria, trabalham para organizações poderosas e inescrupulosas, que com eles mantém uma relação de exploração que se aproxima da escravidão, devido às precárias condições de trabalho. Muitos são trabalhadores sem acesso à terra, para quem o garimpo é a única alternativa de sobrevivência. Só com outras alternativas de sobrevivência, que atendessem às suas necessidades básicas poderiam haver mudanças que talvez dessem fim as suas práticas. Porém

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se essas alternativas não surgirem, “não há dinamitação de pistas de aviões que os farão desistir de garimpar, porque, afinal, é isso o que lhes garante a sua sobrevivência e a de sua família” (BOTELHO, 1992, p.107).

Os exemplos apresentados por Botelho (1992), servem-nos de lição para analisar que para muitos grupos existentes na região amazônica, tudo o que importa é a sobrevivência. No que diz respeito aos seringueiros, o encontro de suas reivindicações com a expansão do Movimento Ambientalista no Brasil, influenciado pelo contexto internacional foi o que possibilitou a criação das reservas extrativistas.

Uma critica de Botelho (1992) refere-se as reservas extrativistas ou reservas indígenas, como enclaves dentro da região amazônica. Se as reservas são ou não enclaves, é uma questão importante, a ser pensada principalmente pela população local, neste momento neste trabalho, não temos uma resposta pronta, apenas podemos colocar uma nova pergunta: afinal existiriam outras alternativas? Importa-nos deixar a idéia de que deve haver um entendimento entre as populações envolvidas a respeito da criação ou não das reservas e as instâncias governamentais envolvidas.

E como as reservas já existem, temos que pensar na melhor forma para que elas cumpram a função de preservação ambiental e ao mesmo tempo seu papel social na manutenção das populações tradicionais em seu espaço.

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1.3. Amazônia: sua biodiversidade, ocupação e seus ciclos econômicos

1.3.1. Amazônia: um espaço a ser preservado

A floresta amazônica é a maior floresta do mundo e é formada por três tipos de vegetação: a mata de igapó (cujo símbolo é a vitória-régia), quase sempre submersa pelos rios; a mata de várzea (com seringueiras, palmeiras e jatobás), inundada só nos períodos de cheias; e a mata de terra firme (que ocupa 90% da região), com árvores de 65 metros de altura.

A área ocupada pela floresta amazônica abrange um total de 40% das florestas tropicais remanescentes no planeta e se estende por oito países, ocupando grande parte do território da América do Sul, três quintos do território Brasileiro e uma vigésima parte da superfície terrestre. Em seus rios encontram-se um quinto da água doce disponível no mundo. Aproximadamente 69% das áreas da floresta amazônica estão em território brasileiro, distribuídas em nove estados, são eles: Pará, Amazonas, Tocantins, Maranhão, Mato Grosso, Acre, Amapá, Rondônia e Roraima.

O Estados do Maranhão (oeste do meridiano 44o), o Estado de Goiás (norte do paralelo 13o de latitude sul atualmente Estado de Tocantins) e Mato Grosso (norte do paralelo 16o latitude Sul), foram incorporados à Amazônia Brasileira apenas em 1953, através da Lei 1.806, de 06/01/1953 (criação da SPVEA), foi quando a Amazônia Brasileira passou a ser chamada Amazônia Legal.

Conforme Becker (1998), em 1966, A SPVEA2 foi substituída pela SUDAM (Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia), que demarcou então os limites da

2 SPVEA= Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia. Criada em 1953 vinculada à

Presidência da República, como o objetivo de elaborar planejamentos qüinqüenais (de 05 em 05 anos) para a valorização econômica da Amazônia.

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atuação governamental, somando, aos 3.500.000 Km² da região Norte, 1.400.000 Km², e assim constituindo a Amazônia Legal.

Em 1966, pela Lei nº 5.173, de 27/10/1966, o conceito de Amazônia Legal é reinventado para fins de planejamento. Assim pelo artigo 45 da Lei Complementar nº 31, de 11/10/1977, a Amazônia Legal tem seus limites ainda mais estendidos.

Com a Constituição Federal de 1988, são criados o estado de Tocantins e os Territórios Federais de Roraima e do Amapá são transformados em Estados Federados.

Para fins de planejamento econômico o governo instituiu a Amazônia Legal, envolvendo estados da macroregião Norte (Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins), da macroregião Centro-Oeste (Mato Grosso) e da macroregião Nordeste (parte do Maranhão). A área total da Amazônia Legal é de aproximadamente 5,2 milhões de Km², ou cerca de 61% do território brasileiro (CAMPOS, 2002).

Seus solos são geralmente fracos para a pecuária e a agricultura, apesar de estas atividades, juntamente com o extrativismo vegetal, estarem presentes em quase todos os Estados. O extrativismo mineral existe, nos Estados do Amapá, Amazonas e no Pará, onde existe uma importante indústria de transformação da bauxita em alumínio. A exuberância da mata pode ampliar atividades econômicas como o turismo ecológico, que movimenta no mundo, todos os anos, centenas de bilhões de dólares (CAMPOS, 2002).

A Amazônia abriga cerca de 50% da biodiversidade mundial. Isso representa uma fonte quase inesgotável de conhecimento. Dali podem surgir achados para a produção de cosméticos ou mesmo para as inovações em outras áreas. Ao todo os cientistas calculam que existem na região entre cinco milhões e 30 milhões de plantas diferentes, mas somente parte delas já foi estudada. Apenas 30 mil, identificadas por gênero e espécie, representam 10% de todas as plantas do planeta (CAMPOS, 2002).

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