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Aspectos jurídicos da união homoafetiva: uma abordagem sobre os alimentos

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TALYTA GOMES DE ALMEIDA

ASPECTOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA: UMA ABORDAGEM SOBRE OS ALIMENTOS

NITERÓI 2013

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TALYTA GOMES DE ALMEIDA

ASPECTOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA: UMA ABORDAGEM SOBRE OS ALIMENTOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Jean Albert de Souza Saadi

NITERÓI 2013

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Universidade Federal Fluminense Superintendência de Documentação

Biblioteca da Faculdade de Direito

A447 Almeida, Talyta Gomes de.

Aspectos jurídicos da união homoafetiva: uma abordagem sobre os alimentos / Talyta Gomes de Almeida. – Niterói, 2013.

63 f.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) – Universidade Federal Fluminense, 2013.

1. União civil entre pessoas do mesmo sexo. 2. União estável. 3. Alimentos (direito de família). 4. Dissolução da sociedade conjugal. 5.Homossexualidade. I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito II. Título.

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TALYTA GOMES DE ALMEIDA

ASPECTOS JURÍDICOS DA UNIÃO HOMOAFETIVA: UMA ABORDAGEM SOBRE OS ALIMENTOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em: 01/08/2013

BANCA EXAMINADORA

Prof. Jean Albert de Souza Saadi – Orientador UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Prof. Fernanda Pimentel

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Prof. Giselle Picorelli

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RESUMO

A presente monografia pretende analisar a possibilidade da obrigação alimentícia pertencente ao Direito de Família ser concedida ao companheiro em caso de dissolução da união estável homoafetiva. Para tanto, primeiro é estudado o histórico da evolução das famílias no Brasil. Após, é analisada a importância do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana nas uniões homoafetivas, principalmente sua influência na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.277, recentemente julgada pelo Supremo Tribunal Federal, que reconheceu e conferiu legitimidade ao instituto da união estável homoafetiva. Em seguida, são averiguadas as particularidades do instituto da obrigação alimentar dentro das relações familiares. Por fim, é feita uma verificação da eficácia da decisão de reconhecimento desta união pelo Supremo Tribunal Federal, refletida na doutrina e nos julgados relativos à obrigação de suprir alimentos ao companheiro homoafetivo.

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ABSTRACT

This thesis aims to analyze the possibility of the obligation to pay alimony pertaining to Family Law be granted to the partner in case of dissolution of the homosexual common law marriage. Therefore, it is first studied the history of the evolution of families in Brazil. After, it is analyzed the importance of the constitutional principle of human dignity in the homosexual common law marriages, especially its influence on the Direct Claim of Unconstitutionality 4.277, recently judged by the Brazilian Federal Supreme Court, which recognized and conferred legitimacy to institute of the homosexual common law marriage. Following, it is investigated the particularities of the obligation to pay alimony in the family relationships. Finally, it is made a verification of the effectiveness of this verdict of recognition of such union by the Brazilian Federal Supreme Court, reflected in the doctrine and in the trials concerning the obligation to supply alimony to homosexual partners.

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Dedico este trabalho ao meu grande amigo Tiago, cujos sonhos são fonte de inspiração.

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AGRADECIMENTOS

À minha família pelo apoio incondicional,

Aos meus colegas de turma pela convivência fraterna,

À minha amiga e colega de trabalho Karla pela sugestão do tema,

À Biblioteca da Faculdade de Direito pelo material de auxílio fornecido, e Ao meu orientador pela condução deste trabalho.

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“Penso no garoto de 15 anos que está vendo essa premiação e pensando: ‘Esse cara é gay, é deputado federal e está recebendo um prêmio. Então eu não preciso viver com vergonha.” (Deputado Federal Jean Wyllys)

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 11

CAPÍTULO I: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO FAMÍLIA ... 13

1.1. Conceito de família ... 13

1.2. Família de acordo com o Código Civil de 1916 ... 15

1.3. A família face à Constituição de 1988 ... 16

1.4. Mudanças trazidas pelo Código Civil de 2002 ... 17

CAPÍTULO II: RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA NO DIREITO 19 2.1. Sociedade de fato ... 19

2.2. União Estável ... 20

2.2.1. Reconhecimento do Supremo Tribunal Federal ... 21

2.2.1.1. Histórico da ADI 4.277 e da ADPF 132 ... 22

2.2.1.2. Eficácia contra todos e efeito vinculante ... 22

2.2.1.3. Críticas à decisão ... 24

2.3. Casamento ... 25

CAPÍTULO III: DOS ALIMENTOS ... 27

3.1. Conceito, Natureza Jurídica e Características ... 27

3.2. Principais características ... 29

3.3. Classificação ... 30

3.4. Requisitos da necessidade, possibilidade e proporcionalidade ... 32

3.5. Questionamento: obrigação solidária ou subsidiária? ... 33

3.6. Alimentos na separação judicial e divórcio ... 34

3.7. Influência da culpa na atribuição dos alimentos ... 35

3.8. Fixação dos alimentos ... 36

3.9. Atualização e revisão dos alimentos ... 38

(11)

3.11. Prisão do devedor de alimentos ... 41

CAPÍTULO IV: ALIMENTOS NA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA ... 44

4.1. Obrigação alimentar na união homoafetiva ... 44

4.2. Casos Especiais ... 49

4.2.1. Possibilidade de fixação de alimentos no caso da Lei Maria da Penha ... 49

4.2.2. Alimentos gravídicos na união estável homoafetiva feminina ... 51

CONCLUSÃO ... 57

(12)

INTRODUÇÃO

Como há muito se sabe, a família é o centro da sociedade, merecendo total proteção estatal, pois, sem ela, não é possível haver vida harmônica social. Com o passar dos anos, devido à natural evolução social, os valores familiares passaram por um processo de transformação, porém, sem nunca deixar de ser o eixo central de qualquer sociedade.

A elaboração e entrada em vigor da Constituição Federal de 1988 foi um grande marco na evolução familiar, que passou a reconhecer não apenas o casamento regulado pelo Estado como entidade familiar, mas também a família formada por um só dos ascendentes e seus descendentes, bem como a união estável entre homem e mulher, demonstrando, dessa forma, a intenção do legislador de adequar o ordenamento jurídico à realidade social, valorizando, acima das formalidades, a afetividade, a estabilidade e o amor.

Tal busca pela harmonia entre legislação e realidade suscitou uma discussão quanto aos direitos a serem percebidos pelos casais homossexuais, que, até então, viviam à margem do mundo jurídico, sendo sua união, vista tão somente, e no máximo, como uma sociedade de fato.

Entretanto, em vista do direito constitucional de constituir família, assegurado a qualquer pessoa, sem especificação de gênero, começou-se a difundir a discussão de que os casais homossexuais deveriam ter o mesmo tratamento legal dos casais heterossexuais, inclusive no tocante ao direito a alimentos na dissolução da união.

Contudo, houve, e existe, ainda, uma grande resistência à aceitação do reconhecimento deste tipo de relação e os direitos inerentes à mesma, principalmente por parte da classe mais conservadora da sociedade, que alega, dentre outros, que o reconhecimento da união homossexual como entidade familiar, não estaria prevista na legislação brasileira, que teria, inclusive, proibido tacitamente a união estável entre indivíduos do mesmo sexo, ao prever expressamente que tal união seria reconhecida para o homem e a mulher apenas, excluindo qualquer outra hipótese, conforme se afere do art. 226, § 3º, da Constituição Federal de 1988 e art. 1.723 do Código Civil de 2002.

Nos tribunais e juízos de primeiro grau se viam decisões variadas quanto ao tema, demonstrando, entretanto, crescente aceitação ao reconhecimento da união estável homoafetiva. Porém, o Superior Tribunal Federal, ao julgar procedente a ADI 4.277, em 05 de

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maio de 20111, pôs fim à discrepância jurisprudencial, uniformizando decisões no sentido de reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo, em vista da força vinculante de sua decisão.

Assim, o presente trabalho buscará avaliar o efeito da recente decisão do STF nos demais tribunais, em juízos de maior ou menor grau, face ao dever de prestação de alimentos entre companheiros na união estável homoafetiva.

Primeiro, analisaremos a evolução histórica do conceito de família na sociedade brasileira. Depois, verificarmos o caminho trilhado até o reconhecimento da união homoafetiva no país. Em seguida, faremos uma análise geral das características dos alimentos no direito de família. Por fim, verificaremos quando os alimentos serão cabíveis aos ex-companheiros de união homoafetiva, com vistas ao dever legal de mútua assistência entre ambos.

Ademais, averiguaremos a proporção em que tais alimentos deverão ser fixados, os prazos de duração das prestações alimentícias, bem como as hipóteses que levarão a sua extinção. Faremos, também, uma breve comparação dos contextos da prestação de alimentos nos casamentos, concubinatos e, inclusive, nas uniões estáveis heteroafetivas,

Por fim, analisaremos as hipóteses de prestação de alimentos entre companheiros homoafetivos nos casos de aplicação da Lei Maria da Penha e da Lei dos Alimentos Gravídicos.

1 ______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.277, julgada em 05 de maio de 2011. Inteiro Teor. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/filedown/dev6/ files/JUS2/STF/IT/ADI_4.277_DF_1319338828608.pdf>. Acesso em 12 fev. 2013.

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CAPÍTULO I: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO FAMÍLIA

1.1. Conceito de Família

O conceito de família é muito amplo e extenso. É difícil se aferir uma definição precisa e que possa ser considerada a única correta, já que podem existir diversas variáveis no entendimento do que possa vir a ser este instituto. Isto porque, conforme apontam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2009, p.2), a família, que é a base da fundação de qualquer sociedade, não pode ser compreendida de outra forma senão à luz da

interdisciplinaridade.

Pois bem, em busca de definições para este instituto, Taísa Ribeiro Fernandes (2004, p. 41) conceituou que “a família é uma instituição que se molda sob influência de concepções religiosas, políticas, sociais e morais de cada período histórico”, sendo “um grupo social elementar, primário, que antecede ao próprio Estado”.

A autora ainda cita a definição de Luiz Edson Fachin (FACHIN,2 2002 apud FERNANDES, 2004, p.41), que conceitua: “A família constitui um corpo que se reconhece no tempo. Uma agregação histórica e cultural como espaço de poder, de laços e de liberdade. Uma aliança composta para representar harmonias e paradoxos”.

De fato, ao longo dos anos, a estrutura familiar passou por inúmeras mudanças, transformações e evoluções, sofrendo influência dos mais variados costumes, dinâmicas históricas e concepções culturais e ideológicas dos grupos sociais, resultando na produção de normas muito específicas e diferenciadas, intrínsecas a cada um dos povos, objetivando disciplinar as relações familiares. Conforme Taísa Ribeiro Fernandes (2004, p. 42) afirma: “O Direito de Família é eminentemente nacional”.

Quanto à importância dos laços afetivos na família, autora (FERNANDES, 2004, p. 42) ainda destaca que a família moderna “não é uma unidade de produção nem é uma sociedade política, mas, sobretudo, o resultado de uma ligação afetiva, em que sobrelevam os sentimentos de solidariedade, lealdade, respeito e cooperação. Trata-se de um organismo ético e moral, além de jurídico”.

Quanto à perspectiva do ser humano dentro do ambiente familiar, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2009, p. 2) também assinalam que na história dos agrupamentos humanos, a família é o que precede os demais. Isto ocorre pois o ser humano já

2

FACHIN, Luiz Edson. Família, direitos e uma nova cidadania, Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família: Família e cidadania, IBDFAM/OAB-MG, Belo Horizonte, 2002, p. 15.

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nasce no seio familiar e, a partir deste ponto, cresce e interage no meio social, desenvolvendo suas potencialidades com o propósito de conviver em sociedade, e formando grupos onde desenvolverá sua personalidade, tudo isto em função de sua busca sua realização pessoal, ou, em outras palavras, pela felicidade.

José Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz concluem que:

A família transforma-se no sentido de que se acentuam as relações de sentimentos entre os membros do grupo: valorizam-se as funções afetivas da família, que se torna o refúgio privilegiado das pessoas contra a agitação nas grandes cidades e das pressões econômicas e sociais. É o fenômeno social da família conjugal ou nuclear ou de procriação, onde o que mais conta, portanto, é a intensidade das relações pessoais de seus membros. diz-se por isso que é a ‘comunidade de afeto e entre-ajuda’.(MUNIZ; OLIVEIRA,3 1999 apud FERNANDES, 2004, p. 43).

Conforme aponta João Baptista Villela (VILLELA,4 1999 apud FERNANDES, 2004, p. 41-42), a família não é invenção do Estado, da Igreja ou do direito, até porque antecede a estes três institutos e, portanto, pela ordem natural das coisas, não está no poder de disposição do Estado ou da Igreja desenhar, a seus arbítrios, o perfil da família. Porém isso não impede que o estado reconheça e conceda proteção legal à família, constituindo essa proteção um direito subjetivo público, oponível ao próprio Estado e à sociedade.

Hoje em dia, a proteção do Estado à família é um princípio universalmente aceito e adotado nas constituições da maioria dos países, independentemente do sistema político ou ideológico, conforme aponta Paulo Lôbo (2009, p. 1).

Nossa Constituição não se furtou desta proteção, conforme se afere de seu art. 226,

caput, que prevê que “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Pela

redação deste dispositivo pode-se perceber a inspiração extraída do artigo 16.3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos5 de 1948, que assegura que “a família é o núcleo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado”.

Paulo Lôbo (2009, p. 2) também distingue as estruturas familiares entre o que ele considera ser vínculos e grupos. Segundo o autor:

3 MUNIZ, Francisco José Ferreira; OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de. Curso de direito de família. 3. Ed. Curitiba: Juruá, 1999. p. 13. In: FERNANDES, Taísa Ribeiro. ob. cit., p. 43.

4

VILLELA, João Baptista. Repensando o Direito de Família, Anais do I Congresso Brasileiro de Direito de Família: Família e cidadania, IBDFAM/OAB-MG, Belo Horizonte, 1999. p. 19. In: FERNANDES, Taísa Ribeiro. ob. cit., p. 41-42.

5

O objetivo central desta declaração é a delineação dos direitos humanos básicos. Ela foi adotada pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948

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Sob o ponto de vista do direito, a família é feita de duas estruturas associadas: os vínculos e os grupos: Há três sortes de vínculos, que podem coexistir ou existir separadamente: vínculos de sangue, vínculos de direito e vínculos de afetividade. A partir dos vínculos de família, é que se compõem os diversos grupos que a integram: grupo conjugal, grupo parental (pais e filhos), grupos secundários (outros parentes e afins).

Importante ainda ressaltar que nem o Código Civil de 1916 nem o de 2002 definem o que é a família, devendo-se entender, conforme interpretação de Taísa Ribeiro Fernandes (2004, p. 49), a partir do art. 226, caput, de nossa atual Constituição, o conceito de “família” no sentido mais amplo, “abarcando tanto a família fundada no casamento, as uniões estáveis, as famílias monoparentais, bem como todas as formas possíveis de comunhão, inclusive as homossexuais”.

1.2. Família de acordo com o Código Civil de 1916

Conforme conceituam Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2009, p. 2), a família no Código Civil de 1916 era: (i) matrimonializada; (ii) patriarcal; (iii) hierarquizada; (iv) heteroparental; (v) biológica; (vi) unidade de produção e reprodução; e (vii) de caráter institucional.

Paulo Lôbo (2009, p. 8) destaca que a legislação sobre a família no Brasil teve suas bases assentadas na origem e evolução histórica da família patriarcal e no predomínio da concepção do homem livre proprietário. Daí se extrai o motivo de tal diploma legal tratar de relações patrimoniais em 151 dos seus 290 artigos dedicados ao Direito de Família, e de relações pessoais nos demais 139 artigos. Essas bases só viriam a ser afetadas a partir da década de 70, com o advento da nova legislação emancipadora das relações familiares.

De acordo com o Código Civil de 1916, a única forma de se constituir uma família era através do casamento civil. Assim sendo, a relação de fato surgida entre uma pessoa casada e uma pessoa solteira era considerada concubinato impuro (apesar de não haver previsão legal deste instituto), e a relação surgida da união entre pessoas sem qualquer impedimento, era considerada concubinato puro (hoje conhecido como união estável (SIMÃO, 2002).

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1.3. A família face à Constituição de 1988

Com o advento da Constituição Federal de 1988, o conceito de família acabou adquirindo um novo significado. Primeiramente, não se pode deixar de mencionar que a família é definida no artigo 226 da Constituição, como “base da sociedade”, tendo, portanto, “especial proteção do Estado”.

A definição de família vai ser ampliada, passando a abranger, ademais do casamento, “a união estável entre o homem e a mulher”, e “a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”, ambas consideradas entidades familiares conforme art. 226, §§ 3º e 4º, respectivamente, da Constituição Federal.

O § 5º do dispositivo legal supramencionado ainda se desvincula da ideia ultrapassada e machista de exercício da chefia da família unicamente pelo homem (conforme impunha o art. 233 do CC/16), passando então a estipular que “os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”.

A família, a partir do novo diploma constitucional, vai passar a simbolizar a afetividade e a conferir uma maior importância à dignidade de cada um dos membros da família e ao relacionamento afetivo existente entre eles, em detrimento da própria instituição em seu sentido original, visando à satisfação e assistência de todos os seus membros.

O ambiente familiar passa então a ser, acima de tudo, um local onde deve se existir harmonia, afeto, proteção e todo o tipo de apoio necessário à resolução de conflitos ou problemas de algum de seus membros, gerando, assim, segurança, conforto, apoio, assistência, equilíbrio e bem estar aos seus integrantes.

Assinala Maria Berenice Dias:

A Constituição Federal de 1988 alargou o conceito de família, passando a integrá-lo as relações monoparentais: de um pai com os seus filhos. Esse redimensionamento, calçado na realidade que se impôs, acabou afastando da ideia de família o pressuposto de casamento. Para sua configuração, deixou de ser exigida a necessidade de existência de um par, o que, consequentemente, subtrai de sua finalidade a proliferação. (DIAS, Maria Berenice. 2004).

Agora o que identifica a família não é nem a celebração do casamento, nem a diferença de sexo do par ou o envolvimento de caráter sexual. O elemento distintivo da família, que a coloca sob o manto da juridicidade, é a identificação de um vínculo afetivo, a unir as pessoas, gerando comprometimento mútuo, solidariedade, identidade de projetos de vida e propósitos comuns.

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Teresa Celina Arruda Alvim Wambier também percebe mudanças na família brasileira moderna:

A “cara” da família moderna mudou. O seu principal papel e de suporte emocional do individuo, em que há flexibilidade e, indubitavelmente, mais intensamente no que diz respeito a laços afetivos. Difícil encontrar uma definição de família de forma a dimensionar o que, no contexto social dos dias de hoje, se insere nesse conceito. É mais ou menos intuitivo identificar família com a noção de casamento, ou seja, pessoas ligadas pelo vínculo do matrimônio. Também vem à mente a imagem da família patriarcal, o pai como a figura central, na companhia da esposa e rodeado de filhos, genros, noras e netos. Essa visão hierarquizada da família, no entanto, sofreu, com o tempo, enormes transformações. Além de ter havido significativa diminuição do número de seus componentes, também começou a haver um embaralhamento de papéis. A emancipação feminina e o ingresso da mulher no mercado de trabalho levaram-na para fora do lar. Deixou o homem de ser o provedor exclusivo da família, sendo exigida a sua participação nas atividades domésticas. (WAMBIER,6 apud TEIXEIRA, 1993, p. 83).

Na nossa atual Constituição, bem como no Código Civil de 2002, o conceito de família passará a ter outras características, que Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2009, p. 2), classificarão como: (i) pluralizada; (ii) democrática; (iii) igualitária substancialmente; (iv) hetero ou homoparental; (v) biológica ou socioafetiva; (vi) unidade socioafetiva; e (vii) de caráter instrumental.

1.4. Mudanças trazidas pelo Código Civil de 2002

Como dito ao final do tópico anterior, o conceito de família no Código Civil de 2002 passou a ter características semelhantes à da Constituição de 1988, ambas radicalmente diferentes do pregado no Código Civil de 1916.

Enquanto no antigo Código Civil o objetivo do casamento era a constituição de família, sendo este inclusive o único meio para se alcançar tal fim, no novo, o casamento é apenas um destes meios, não o único. Por certo o Código Civil de 2002 apenas conferiu reconhecimento ao que, na prática, já vinha ocorrendo a um bom tempo no Brasil.

Após a Constituição de 1988, a união estável é novamente reconhecida como entidade familiar, de acordo com a redação do art. 1.723 do Código Civil de 2002. Assim, novamente é abolida a ideia de “família legítima”, que só poderia ser constituída pelo

6 PINTO, Teresa Celina Arruda Alvim. Um novo conceito de Família: reflexos doutrinários e análise da

jurisprudência. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Direitos de Família e do Menor. 3ª. ed. rev. ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 1993, p. 83.

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casamento formal. Porém, o art. 1.727 ainda manteve que “as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato”.

O Novo Código Civil, de uma maneira geral, trouxe uma significativa alteração nas normas reguladoras do Direito de Família, que foram elaboradas pelo legislador em uma tentativa louvável de prever o maior número possível de hipóteses que pudessem abarcar a diversidade de casos concretos que vinha se mostrando presente na sociedade (VILHENA, 2007, p. 12).

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CAPÍTULO II: RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA NO DIREITO

2.1. Sociedade de fato

Levou-se muito tempo para se incluir as uniões extramatrimoniais dentro do direito de família, sendo elas rebaixadas à posição de concubinato. A solução encontrada pelo Judiciário para conferir justiça às suas decisões foi a de reconhecer a existência de sociedade de fato ao casal de relacionamento de longo prazo, ou seja, uma sociedade formada sem qualquer registro ou capital e cujo patrimônio é constituído quando os sócios adquirem bens a título oneroso ou gratuito (DIAS, 2011, P. 132).

Aliás, o próprio STF veio a versar sobre o tema, editando em 1964 a súmula 380, que dispunha: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”

Conforme aponta Fábio de Oliveira Vargas (VARGAS,7 apud DIAS, 2011, p. 132), as condições para configuração de uma sociedade de fato são: (i) comunhão de interesses; (ii) patrimônio adquirido durante a convivência; e (iii) esforço comum para aquisição deste patrimônio.

Pois foi à condição de sociedade de fato que as uniões homoafetivas foram rebaixadas, especialmente em face da resistência de boa parte da doutrina e da jurisprudência em apelar a normas de regência de casamento e união estável.

As ações então tramitavam em varas cíveis e eram decididas com base no direito das obrigações. Porém conforme destaca Maria Berenice Dias (2011, p. 133), era absurdo se atribuir caráter meramente patrimonial e ainda por cima se ignorar o afeto existente na relação homossexual, conforme palavras da doutrinadora:

Tal entendimento, ademais, procura encobrir o afeto que existe num relacionamento homossexual. Há grande diferença entre affectio societatis e affectio maritalis. Uma dispõe de caráter empresarial e outra diz respeito à entidade familiar. A affectio societatis significa a vontade de desenvolver atividade empresaria, visando ao lucro, sendo requisito fundamental à configuração de natureza societária. Por outro lado, a affectio maritalis é própria do direito das famílias.

A autora (DIAS, 2011, p. 132-133) ainda aponta que apesar desta solução parecer aparentemente justa quando o fim do relacionamento ocorria pela separação dos conviventes, a injustiça era clara no caso de morte de um dos parceiros. Isto ocorria, pois, na separação, cada um recebia a metade do patrimônio comprovadamente construído durante o período de

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vida juntos. Entretanto, quando ocorria o falecimento de um deles, ao sobrevivente restava apenas a meação do patrimônio construído pelos dois, o que acabava gerando o enriquecimento sem causa dos parentes do de cujus que não eram herdeiros necessários, familiares estes que, inclusive, frequentemente hostilizavam a opção sexual do falecido em detrimento de seu companheiro com quem compartilhava a vida e de quem recebia apoio afetivo e moral.

Isso tudo veio mudar, porém, com o início do reconhecimento do instituto da união estável homoafetiva.

2.2. União Estável

Antes da decisão proferida em 2011 pelo STF na ADI 4.277, as letras do art. 1.723 do Código Civil8 e, principalmente, do art. 226, § 3º, da Constituição9 eram utilizadas como fundamento para não aceitação da união estável homoafetiva.

Isso ocorria, pois, ambos os dispositivos preveem com todas as letras que a entidade familiar reconhecida era “união estável entre homem e mulher”, o que, entendemos, representa uma vedação tácita ao reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo.

Assim, o recurso encontrado era apelar ao uso de analogia entre as uniões homoafetivas e as heteroafetivas. Porém a justiça eventualmente começou a conferir status próprio de união estável homoafetiva a estas relações. Emprestamos especial destaque ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que foi o responsável por conceder decisões pioneiras em relação ao reconhecimento da união homoafetiva.

Assim a união homoafetiva passa a ser considerada entidade familiar, por ter o mesmo alicerce que as demais: o afeto. Quando comprovada a existência de relacionamento duradouro, em que há vida em comum, coabitação e laços afetivos, se está à frente de uma entidade familiar, forma de convívio que goza de proteção constitucional (DIAS, 2011, p. 134).

Porém, em razão da hostilização social que o casal homoafetivo ainda enfrenta em nosso país, não é exigida a publicidade desta união para sua legitimação, descabendo a consideração da convivência pública como um requisito para a configuração da união estável

8 CC, art. 1.723: É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.

9

CRFB, art. 226, § 3º: Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

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homoafetiva, figurando esta, no máximo, como uma mera prova adicional para seu reconhecimento.

2.2.1. Reconhecimento do Supremo Tribunal Federal

A união homoafetiva como entidade familiar foi recentemente reconhecida pelo STF. A decisão, fortemente fundamentada na proteção dos direitos humanos dos homossexuais, interpretou o art. 1.723 do Código Civil conforme a Constituição, excluindo qualquer significado que impedisse o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre duas pessoas do mesmo sexo como “entidade familiar”, sendo esta entendida como sinônimo de “família”.

Os julgadores consideraram que o Poder Judiciário deveria cumprir com seu papel de “guardião dos princípios constitucionais” de regência da sociedade, ainda quando a lei é omissa (neste caso, em clara referência ao art. 226, § 3º, da Constituição Federal de 1988 e art. 1.723 do Código Civil de 2002).

Os julgadores também destacaram que os homossexuais devem ter seus direitos fundamentais assegurados, não podendo ser submetidos à tirania do Poder Legislativo, que negava o reconhecimento em função de grupo ultraconservadores, em grande parte de seguimentos religiosos, mesmo sendo o Estado laico, o que acabava resultando, mesmo em pleno século XXI, em uma certa perseguição religiosa, amparada pela omissão da lei.

Aliás, o próprio STF chamou à atenção do Legislativo (em uma recomendação com forte teor de crítica e até, de certa forma, de comando) para que este se manifestasse legislando sobre o assunto, de forma a conferir ratificação legal à decisão do STF, bem como dispor sobre as particularidades formais resultantes do reconhecimento deste outro tipo de união estável.

A decisão ainda mencionou que a Corte não podia compactuar com o quadro que se observava de uma verdadeira ditadura da maioria sobre a minoria, que tinha a garantia e reconhecimento de seus direitos constantemente violados e restringidos, o que acabava afetando a dignidade dos homossexuais como pessoas humanas, dignidade esta que é, inclusive, assegurada pela própria Constituição.

Ademais, se é dever do Estado garantir e ajudar os indivíduos a alcançarem a felicidade, não pode o mesmo contribuir para o seu impedimento, até porque, o reconhecimento da união estável homoafetiva beneficia os homossexuais (garantem-lhe a felicidade) sem afetar aqueles que são contra tal reconhecimento, enquanto que com o não

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reconhecimento, os homossexuais seriam os únicos prejudicados (teriam a sua felicidade impedida), enquanto os grupos contrários não ganhariam nenhuma vantagem com isso, exceto, talvez, no máximo, uma satisfação pessoal de dever cumprido.

2.2.1.1. Histórico da ADI 4.277 e da ADPF 132

O Ministro Celso de Mello, ao extinguir, no ano de 2006, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade10, apontou que o caminho para o reconhecimento da união homoafetiva era o da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental.

Sob esta orientação, em 2008 o Governador do Estado do Rio de Janeiro propôs a ADPF 132, visando a equiparação das uniões homoafetivas às uniões estáveis heteroafetivas, para a aplicação do regime jurídico dos servidores públicos estaduais (DIAS, 2011, p. 202).

Já em 2009, a Procuradoria Geral da República ingressou com a ADPF 178, que foi recebida pelo STF como ADI 4.277. Esta ação foi mais abrangente que a ADPF 132, pois não se restringiu ao âmbito dos servidores públicos estaduais, buscando, de forma geral e indiscriminada, o reconhecimento da união entre duas pessoas do mesmo sexo como entidade familiar, quando presentes os pressupostos da união entre homem e mulher, bem como a extensão dos direitos e deveres dos companheiros das uniões estáveis heteroafetivas às uniões homoafetiva (DIAS, 2011, p. 203).

Assim, em 05/05/2011 iniciou-se o julgamento da ADPF 132 e ADI 4.277 pelo STF, tendo o mesmo se encerrado apenas no dia seguinte. A decisão foi unânime, tendo sido sua eficácia assegurada mesmo antes da publicação ou trânsito em julgado do acórdão.

2.2.1.2. Eficácia contra todos e efeito vinculante

Tendo em vista que a decisão tratou-se de julgamento de mérito proferido em ADI, a decisão possui eficácia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Púbica, não podendo ninguém desobedecer o teor do julgamento proferido (DIAS, 2011, p. 207).

Assim, conforme destaca Maria Berenice Dias (2011, p. 207):

Deste modo nenhum juiz ou tribunal pode negar-se a julgar alegando a impossibilidade jurídica do pedido. Também não mais poderão as ações tramitar nos

(24)

juízos cíveis, devendo haver a remessa, de ofício, para as Varas de Família. Do mesmo modo a união homoafetiva só pode ser identificada como união estável, não mais pode ser reconhecida como sociedade de fato. Assim, não há como negar direito à adoção, benefícios previdenciários, partilha de bens, direito de herança, financiamento conjunto, a condição de dependente e plano de saúde e para fins de imposto de renda, entre outros.

Por certo, a prestação de alimentos, objeto de estudo deste trabalho, também é um direito que não pode ser negado.

Ademais, conforme apontado na citação da autora, as varas competentes para julgar casos referentes às uniões estáveis homoafetivas é a de família, independentemente do regulamento interno dos órgãos judiciários, conforme aponta decisão do STJ, em Recurso Especial, julgado recentemente neste ano, resumidamente abaixo:

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO. COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO. [...] 5. Havendo vara privativa para julgamento de processos de família, esta é competente para apreciar e julgar pedido de reconhecimento e dissolução de união estável homoafetiva, independentemente das limitações inseridas no Código de Organização e Divisão Judiciária local. 6. Recurso especial provido. (STJ, REsp. 1.291.924/RJ, Terceira Turma, rel. Min. Nancy Andrighi, j. 28/05/2013, DJe 07/06/2013)

A autora (2011, p. 207-208) ainda destaca que em caso da insubordinação decorrer de integrante do Poder Judiciário, é possível ser formulada Reclamação perante o próprio STF, que, julgada procedente, fará com que a Corte avoque o processo ou casse a decisão. Outra alternativa é o uso da via recursal, com pedido de liminar.

Porém, caso a insubordinação decorra da Administração Pública, é cabível o uso de mandado de segurança. Já no caso dela decorrer de entidade privada, há possibilidade de busca judicial do direito, inclusive com pedido de tutela antecipada. Os serviços públicos exercidos por função delegada também não podem negar a decisão e, portanto, tabeliães e notários não podem, por exemplo, se negar a lavrar escrituras de uniões estáveis homoafetivas (DIAS, 2011, p. 208).

(25)

2.2.1.3. Críticas à decisão

A principal crítica feita ao julgamento é baseada no fato de muitos entenderem que o STF estava, na verdade, legislando (praticando o chamado “ativismo judicial”11), usurpando atribuição que não lhe cabia, em flagrante afronta ao princípio da separação dos poderes.

Particularmente, inclusive acreditamos que o Legislativo, ao conferir redação específica ao art. 226, § 3º, da Constituição Federal de 1988 e art. 1.723 do Código Civil de 2002, vinculando a ideia de união estável à relação entre “homem e mulher”, vedou tacitamente composição diversa, não havendo, na verdade, qualquer omissão por parte de tal órgão. Porém está é nossa opinião isolada, uma vez que a doutrina majoritária parece aceitar e entender que houve, de fato, esta omissão.

Maria Berenice Dias entende que (2011, p. 206) o “eventual ativismo judicial se justifica pela absoluta omissão e indolência – para não dizer acovardamento – do Legislativo em relação às questões concernentes à homoafetividade”, bem como para “impedir a violação de um punhado de direitos fundamentais consagrados em sede constitucional, que só existem para garantir a dignidade da pessoa humana”.

Porém, também concordamos que, não só devido à bancada conservadora presente no Legislativo, que faz de tudo para impedir avanços de medidas de interesses dos homossexuais de um modo geral, como também à própria morosidade natural dos procedimentos do órgão, não há como se esperar que os direitos dos homossexuais sejam legalmente reconhecidos especialmente se considerando que é a proteção da dignidade deles que está sendo constante e reiteradamente violada, assim como seus direitos constitucionalmente adquiridos, sendo papel do STF intervir e assegurar a garantia dos direitos fundamentais dos homossexuais.

O julgamento também gerou manifestações de repúdio, especialmente de segmentos religiosos, e acirrou manifestações homofóbicas. Ademais em caminho contrário à recomendação do STF, chegaram ao Legislativo uma avalanche de proposições tentando anular a decisão proferida, como se fosse possível uma lei violar decisão judicial (DIAS, 2011, p. 206).

Conforme aponta Maria Berenice Dias (2011, p. 206-207), vários projetos de lei também foram apresentados tentando excluir direitos da população LGBT, bem como para

11 De acordo com o jurista José Afonso da Silva: “O ativismo judicial se caracteriza por um modo pró-ativo de interpretação constitucional pelo Poder Judiciário, de modo que, não raro, os magistrados, na solução de controvérsias, vão além do caso concreto em julgamento e criam novas construções constitucionais”.

(26)

impedir o reconhecimento das uniões homoafetivas. Em contrapartida a estas ações, a OAB apresentou Proposta de Emenda Constitucional e elaborou o Estatuto da Diversidade Sexual.

2.3. Casamento

O art. 226, § 3º, da Constituição, reconhece a união estável entre homem e mulher, estipulando que deve a lei facilitar sua conversão em casamento. Já ultrapassada a questão do reconhecimento da união estável homoafetiva, nos resta agora fazer uma brevíssima análise da hipótese do casamento homoafetivo.

O art. 1.726 do Código Civil não faz qualquer menção ao gênero dos integrantes da união estável, especificando apenas que “a união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil”.

Porém de acordo com o art. 1.514 do Código Civil, “o casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados”. Assim, a lei prevê apenas a hipótese para casais heteroafetivos, sendo, por dedução, tacitamente vedada a possibilidade do mesmo se aplicar às uniões homoafetivas.

Porém sagazmente destaca Maria Berenice Dias (2011, p. 134) que a identidade de sexo dos nubentes não está prevista nos impedimentos matrimoniais, nem nas causas de nulidade ou anulabilidade do casamento, não acarretando, portanto, a expressão “homem e mulher”, qualquer delimitação quando ao casamento homoafetivo. Destaca ainda que o art. 1.511 do Código Civil12, ao não fazer qualquer alusão à oposição de sexos, explicita que a heterossexualidade não é uma condição para o casamento.

Após a decisão proferida na ADI 4.277 pelo STF, onde se reconheceu a inconstitucionalidade da distinção de tratamento legal conferido às uniões estáveis constituídas por pessoas de mesmo sexo, o que se debateu foi a possibilidade de conversão desta união em casamento, conforme estipulado no art. 226, § 3º, da Constituição.

O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do RESP 1.183.378/RS, decidiu inexistir óbices legais à celebração de casamento entre pessoas de mesmo sexo, uma vez que, do contrário, representaria uma “afronta a caros princípios constitucionais, como o da

12

CC, art. 1.511: O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges.

(27)

igualdade, o da não discriminação, o da dignidade da pessoa humana e os do pluralismo e livre planejamento familiar”13

.

Pois quem deu a martelada final no assunto foi o Conselho Nacional de Justiça que, recentemente, em 14 de maio de 2013, através da resolução nº 175, dispôs sobre a habilitação, celebração de casamento civil e conversão de união estável entre pessoas de mesmo sexo em casamento.

De acordo com a resolução, “é vedada às autoridades competentes a recusa de habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas de mesmo sexo”, sob pena de “imediata comunicação ao respectivo juiz corregedor para as providências cabíveis”. A resolução entrou em vigor na data de sua publicação.

13

RESP 1.183.378/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, QUARTA TURMA, julgado em 25/10/2011, DJe 01/02/2012.

(28)

CAPÍTULO III: DOS ALIMENTOS

3.1. Conceito, Natureza Jurídica e Características

De acordo com Paulo Lôbo (2009, p. 347), no direito de família, os alimentos podem ser valores, bens ou serviços destinados às necessidades existenciais da pessoa, em virtude de

relações de parentesco, quando ela própria não pode se manter com seu trabalho ou

rendimentos, ou em virtude de deveres de assistência, decorrentes do rompimento de relações matrimoniais ou de união estável, ou ainda do necessário dever de amparo aos idosos.

Para Orlando Gomes14, “alimentos são prestações para satisfação das necessidades vitais de quem não pode provê-las por si”.

Já para Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, os alimentos são “o conjunto de meios materiais necessários para a existência das pessoas, sob o ponto de vista físico, psíquico e intelectual”. De acordo com os autores, nos alimentos são incluídas despesas ordinárias (ex.: gastos com alimentação, moradia, saúde, vestuário, educação e até mesmo cultura e lazer) e extraordinárias (ex.: gastos com remédios, uniforme e livros escolares), concluindo que a expressão “alimentos”, juridicamente, abrange bem mais que alimentação.

Dentro da convivência familiar, não se cogita a obrigação de alimentos. O que há é o dever dos pais de sustento do filho (ECA, art. 22), o dever de mútua assistência material entre os cônjuges e companheiros (CC, art. 1.566, III e 1.724), bem como o dever de amparo ao idoso (art. 230 da CRFB e art. 3º do Estatuto do Idoso). O descumprimento de qualquer desses deveres faz nascer a obrigação de prestar alimentos e sua pretensão, ambos de caráter estritamente pessoal.

De acordo com Paulo Lôbo (2009, p. 348), a doutrina resiste em admitir a obrigação a alimentos em relação ao ex-cônjuge, após a ruptura do casamento, pois com isso o dever de assistência se extingue. Assim, a rigor técnico, os alimentos seriam apenas admissíveis entre parentes.

Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2010, p. 666) destacam o caráter solidário dos alimentos, que, para eles, “cumprem relevante função de garantir a própria manutenção de pessoas ligadas por vínculo de parentesco” e, assim, “a obrigação alimentar é, sem dúvida, expressão da solidariedade social e familiar (enraizada em sentimentos humanitários) constitucionalmente impostas como diretriz da nossa ordem jurídica”.

14

GOMES, Orlando. Direito de Família, p. 427. In: FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. ob. cit., p. 668.

(29)

Os autores (2010, p. 663-665) ainda ressaltam que os alimentos, na perspectiva do Direito Civil Constitucional, são utilizados como instrumento de afirmação da dignidade da pessoa humana. Dessa forma, “toda e qualquer decisão acerca de alimentos deve ser presidida pelo (fundamental) princípio da dignidade do homem, respeitando as personalidades do alimentante ou alimentado, [sob] pena de incompatibilidade com o Texto Magno”.

Quanto à natureza jurídica, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2010, p. 669) apontam que “se os alimentos se prestam à manutenção digna da pessoa humana, é de se concluir eu a sua natureza é de direito da personalidade, pois se destinam a assegurar a integridade física, psíquica e intelectual de uma pessoa humana”. Os autores reconhecem, porém, que o tema não é pacífico na doutrina, havendo quem entenda que os alimentos possuem “natureza mista, eclética, com conteúdo patrimonial e finalidade pessoal, ‘apresentando-se como uma relação patrimonial de crédito-débito’15”.

De acordo com o Paulo Lôbo (2009, p. 349):

“Os alimentos tem por objetivo a preservação do que o Código Civil denomina ‘viver de modo compatível com a sua condição social’16

, além de atender “às necessidades de sua educação”. A separação dos cônjuges e companheiros nunca preserva inteiramente a ‘condição social’, inclusive quanto aos filhos, pois as despesas que antes eram compartilhadas passam a ser assumidas individualmente, o que significa queda do padrão anterior. Onde havia uma família passam a ser duas, com suas despesas próprias e conjuntamente superiores ao que tinha antes, em comum. Mas o direito propugna pela aproximação possível das anteriores condições de vida.”

A aferição do referido estilo de vida compatível com a respectiva condição social do alimentando é de análise extremamente subjetiva. Porém um padrão deve ser estabelecido para se alcançar o resultado desejado. Nesse sentido, Rolf Madaleno entende que “para mensurar a contribuição alimentar, serão considerados o patrimônio e os recursos do casal ao tempo de sua coabitação, pois são marco que exteriorizam a padronagem social e econômica do casal”17.

É importante frisar que pretensão aos alimentos é de natureza personalíssima, não podendo ser objeto de cessão entre vivos ou de sucessão hereditária. Entretanto, em consonância com a dicção do art. 1.997 do Código Civil18, a herança responde pelo débito de

15 DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil, p. 556. In: FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. ob. cit., p. 669.

16 CC, art. 1.694. 17

MADALENO, Rolf. Obrigação, dever de assistência e alimentos transitórios. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.). Afeto, ética, família e novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 567. In: LÔBO. Paulo. ob. cit., p. 349.

18

CC, art. 1.997: A herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube.

(30)

alimentos, sendo que, caso feita a partilha, deve os herdeiros do devedor responderem por tal débito, até o limite das forças da herança19, proporcionalmente às suas respectivas quotas hereditárias.

Caso o credor da obrigação alimentar seja herdeiro necessário (ascendentes, descendentes ou cônjuge) do devedor falecido, em concorrência com outros herdeiros, sua quota hereditária deverá responder inteiramente pelos alimentos devidos. Porém enquanto não houver partilha, o herdeiro pode propor ação de alimentos contra o espólio.

Porém caso não haja herança, cabe ao credor dos alimentos voltar-se para os indivíduos legitimados a responderem pela obrigação alimentar, que ocupe a posição subsequente em sua linha familiar de dever assistencial.

A referida linha de dever assistencial é construída ao longo dos artigos 1.696, 1.697 e 1.698 do Código Civil, que determina o seguinte:

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.

Art. 1.697. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais. Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.

3.2. Principais características

A doutrina é pacífica quanto ao entendimento de que os alimentos possuem como principais características: a indisponibilidade, a irrenunciabilidade, a incompensabilidade, a

irrepetibilidade e a impenhorabilidade.

Primeiramente, cumpre esclarecer que a indisponibilidade não é ilimitada, já que, ademais de não haver molde pré-definido para aferição quantitativa dos alimentos, há possibilidade de conciliação e transação.

Quanto à irrenunciabilidade, antes do Código Civil de 2002 a entendimento majoritário da jurisprudência era no sentido de que a renúncia não era admitida no âmbito de parentesco, apenas admitindo a suspensão da obrigação alimentícia em caso de alteração da

19

IV Jornada de Direito Civil, 2006, do Conselho da Justiça Federal: “343 – A transmissibilidade da obrigação alimentar é limitada às forças da herança”.

(31)

situação econômica de alguma das partes, pelo tempo que tal alteração perdurar. Já no âmbito dos ex-cônjuges, tal renúncia não só era admitida, como era irrevogável.

Entretanto, o Código Civil de 2002 traz em seu art. 1.707 disposição que determina que “pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos”. Porém esta norma não é aplicável aos ex-cônjuges e ex-companheiros, pois, de acordo com o enunciado 263 da III Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal:

O art. 1.707 do Código Civil não impede seja reconhecida válida e eficaz a renúncia manifestada por ocasião do divórcio (direto ou indireto) ou da dissolução da “união estável”. A irrenunciabilidade do direito a alimentos somente é admitida enquanto subsista vínculo de Direito de Família.

A incompensabilidade dos alimentos está prevista no art. 1.707 do Código Civil. De acordo com este pressuposto, não pode ser pleiteada a compensação de qualquer débito com uma obrigação de natureza alimentar, já que não é admitida a compensação de dívida de natureza econômica com dívida de natureza existencial. Tal vedação, entretanto, não se aplica aos alimentos in natura.

Já quanto à irrepetibilidade dos alimentos, consta frisar que o alimentante (devedor dos alimentos) não os pode repetir, ou seja, pedi-los de volta, bem como que não está o alimentando (titular dos alimentos) obrigado a devolvê-los, mesmo que indevidamente recebidos. Entretanto os alimentos podem ser repetidos por quem não estava obrigado a provê-los, desde que provado que o parente que os devia já os pagou, incluindo os atrasados.

Por fim, a impenhorabilidade, também prevista no art. 1.707 do Código Civil, assegura que os alimentos não possam ser objeto de penhora para garantia de dívidas de seu titular.

3.3. Classificação

A doutrina distingue alimentos “naturais” dos “civis”. Os naturais seriam os alimentos exigidos estritamente para mantença da pessoa, enquanto os civis seriam fixados de acordo com os haveres do alimentante e da qualidade e situação pessoal do alimentando20. Porém para Pontes Miranda21 esta distinção não tem mais razão de ser, pois o Código Civil

20

PEREIRA, Lafayette Rodrigues. Direitos de Família, p. 272. In: LÔBO. Paulo. ob. cit., p. 349.

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anterior e o atual fazem referência aos alimentos em conjunto, abrangendo “o sustento, a cura, o vestuário e a casa (...) além de educação, se ele for menor”22.

Podem haver dois tipos de prestação de alimentos: a prestação em dinheiro, conhecida como “pensão alimentícia”, que é o caso em que uma soma em dinheiro é entregue ao alimentando, ou a prestação em “alimentos in natura”, que é o caso em que é fornecido ao alimentante os próprios bens necessários à sobrevivência, tais como: moradia, pagamento de plano de saúde e/ou mensalidade escolar dos filhos etc. 23.

Há também os alimentos provisórios, que são aqueles que possuem natureza antecipatória, sendo concedidos em ações com pretensão de alimentos, de forma liminar, bastando que reste provada, já de plano, a existência da obrigação alimentícia (no caso em estudo, existência do vínculo de união estável), conforme previsto no art. 4º da Lei 5.478/68 (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 732-733).

Já os alimentos provisionais são aqueles concedidos pelo juiz, em caráter ainda não definitivo, antes e durante as ações com tal finalidade, ou nas ações que envolvam dissolução de sociedade conjugal ou da união estável, ou na investigação da paternidade ou maternidade. A finalidade desses alimentos é a de prover o autor da ação com os meios para buscar a concretização seu direito (incluindo a procura e a produção de provas), para arcar com as custas judiciais e honorários do advogado (LÔBO, 2009, p. 352). O pedido de tais alimentos está amparado pelo art. 852 do CPC, sendo considerado um procedimento cautelar específico. Os alimentos definitivos são aqueles fixados por sentença proferida em ação de pretensão de alimentos ou decorrentes de acordo celebrado entre as partes e referendado pelos seus advogados, pela Defensoria Pública ou pelo Ministério Público. Eles são fixados para, em tese, perdurarem enquanto estiver em curso a situação fática que os justificou. Tais alimentos podem ser alterados quando modificada a necessidade de quem os recebe ou a capacidade contributiva de quem os presta, através de nova decisão judicial ou acordo entre os interessados (FARIAS; ROSENVALD, 2010, p. 735).

Por outro lado, os alimentos transitórios são aqueles cuja prestação é fixada durante um certo tempo ou até que se implemente determinada circunstância no tempo. Uma vez que ocorra a condição prevista na sentença ou no acordo, extingue-se automaticamente a

22 CC, art. 1.920.

23 Conforme estipula o CC, art 1.701, caput: A pessoa obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o alimentando, ou dar-lhe hospedagem e sustento, sem prejuízo do dever de prestar o necessário à sua educação, quando menor.

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obrigação alimentar, independentemente do ingresso de qualquer ação de exoneração ou de revisão (MADALENO24, apud LÔBO, 2009, p. 352-353).

Por fim, insta ressaltar que a pretensão aos alimentos é imprescritível. É prescritível, porém, a pretensão de haver prestações alimentares já estabelecidas, que só podem ser cobradas judicialmente até dois anos após seus respectivos vencimentos.

3.4. Requisitos da necessidade, possibilidade e proporcionalidade

Conforme estipulado no art. 1.694, § 1º, do Código Civil25, a pretensão aos alimentos se assenta no binômio necessidade/possibilidade. Em outras palavras, exige-se a comprovação da necessidade de quem reclama os alimentos e a possibilidade de quem os deve.

De acordo com Paulo Lôbo (2009, p. 353), a necessidade do requerente é verificada através de prova da queda desarrazoada das condições de vida do titular do direito ou de sua dificuldade de obter os rendimentos necessários, por inexistência de patrimônio, renda ou incapacidade para o trabalho. A necessidade não precisa ser comprovada quando se tratar de filhos ou parentes menores, já que nestes casos ela já é legalmente presumida. A necessidade se evidencia quando o cônjuge ou companheiro que reclama os alimentos não exercia nenhuma atividade remunerada durante a constância da união, principalmente por imposição ou indução do outro parceiro.

Já a possibilidade do requerido deve ser constatada nos rendimentos que possam servir de lastro ao pagamento dos alimentos, porém em nível que não comprometa as condições de sua manutenção, o que redundaria em prejuízos tanto para o devedor, quanto para o credor dos alimentos (LÔBO, 2009, p. 354).

A razoabilidade, denominada por alguns de proporcionalidade, é um terceiro requisito que a doutrina e a jurisprudência acrescentam para estabelecer um equilíbrio entre os outros dois requisitos tradicionais (necessidade e possibilidade) (LÔBO, 2009, p. 354). Está contida no art. 1.694, caput e § 1º, do Código Civil, nos trechos que preveem que cabe aos titulares da obrigação pedir “alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social”26 e que “os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades

24 MADALENO, Rolf. Obrigação, dever de assistência e alimentos transitórios, p. 580.

25 CC, art. 1.694, §1º: Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

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do reclamante”27. Este requisito estipula que o juiz não deve se limitar a verificar apenas a necessidade e possibilidade dos envolvidos na ação, mas também a razoabilidade do montante a ser concedido.

3.5. Questionamento: obrigação solidária ou subsidiária?

Exceto quando o destinatário for um idoso28 (indivíduo com 60 anos ou mais), a obrigação alimentar não é solidária, uma vez que o credor de alimentos não pode escolher livremente qualquer um dos obrigados para pagar, devendo se observar a ordem dos graus de parentesco em linha reta (que são infinitos) e em linha colateral (que são finitos), recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, nos termos do art. 1.696 do Código Civil.

Assim, conforme se afere dos artigos 1.696, 1.697 e 1.698 do Código Civil, já estudados no presente trabalho, primeiro são chamados os ascendentes, depois os descendentes e, na falta destes, os colaterais. Intentada ação contra qualquer das pessoas obrigadas a prestar alimentos, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide. Tal chamamento é direito do autor e do réu, que poderão requerê-lo para que o juiz defina as quotas que todos os obrigados deverão assumir, em função de seus respectivos recursos (LÔBO, 2009, p. 356).

Desses dois artigos podemos aferir que primeiro devem ser chamados para prestar alimentos os ascendentes, depois os descendentes e, na falta destes, os colaterais. Dentro da mesma classe, os de grau mais próximo têm precedência sobre os de grau mais distante. Porém dentro do mesmo grau, os parentes assumem obrigação em quotas proporcionas aos recursos financeiros de cada um (LÔBO, 2009, p. 355).

Ficará caracterizada a obrigação subsidiária quando, de um grau de parentesco para o subsequente, o indivíduo de grau mais distante vir a, eventualmente, complementar o valor devido pelo de grau mais próximo, no evento dos rendimentos deste serem insuficientes. A ação de alimentos não pode ser ajuizada diretamente ao parente mais distante, mesmo que este tenha mais condições de arcar com os alimentos pretendidos, sem que haja comprovação de que o devedor originário está impossibilitado de cumprir com seu dever.

27 CC, art. 1.694, §1º. 28

Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), art. 12: A obrigação alimentar é solidária, podendo o idoso optar entre os prestadores.

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3.6. Alimentos na separação judicial e divórcio

O Código Civil de 2002 igualou os ex-cônjuges e os ex-companheiros aos titulares dos alimentos, legitimados pela relação de parentesco. A princípio, os alimentos entre ex-cônjuges apenas são devidos em razão de separação amigável ou litigiosa e da consequente conversão da separação em divórcio (LÔBO, 2009, p. 357).

Os artigos 1.702 e 1.704, parágrafo único, do Código Civil, preveem que:

Art. 1.702. Na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e desprovido de recursos, prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz fixar, obedecidos os critérios estabelecidos no art. 1.694.

Art. 1.704. [...]

Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.

Assim, na separação judicial, o pagamento integral dos alimentos dependerá da inocência do cônjuge, sendo que, se ele for culpado, a obrigação se restringirá ao mínimo existencial.

Nesse sentido nos ensina Paulo Lôbo (2009, p. 357-358):

Apesar do divórcio direto dissolver inteiramente o casamento e o respectivo dever de assistência, o direito brasileiro, em razão do princípio da solidariedade, admite a projeção ou a transferência do dever de assistência, assegurando ao ex-cônjuge necessitado o direito aos ali mentos, ainda que sem perquirição de sua culpa29. Note-se que os ex-companheiros apenas podem exigir alimentos após a dissolução da união estável, que é a situação de fato, independente da decisão judicial ou acordo que os fixem. O direito a alimentos persiste para o divorciado ou para o ex-companheiro até que se configure hipótese de extinção, como ulterior casamento, união estável, concubinato ou procedimento indigno (art. 1.708).

Ademais, o direito aos alimentos não pode estimular a ociosidade. Assim, ainda que o indivíduo não possa temporariamente prover seu sustento por seu próprio trabalho, a obrigação alimentar não pode perdurar indefinidamente, devendo o alimentando se inserir no mercado de trabalho tão logo possível.

29 Em sentido contrário, a jurisprudência dos tribunais, mesmo depois do Código Civil, tem entendido que após a decretação do divórcio, não tendo havido estipulação a respeito, não pode o ex-cônjuge exigir do outro alimentos, por não mais vigorar p dever de assistência e pelo rompimento de todos os vínculos pessoais. Ex.: TJRS, Ap. 70010766905, 2005; TJMG, Ap. 1.0024.04.308153-8/001, 2005.

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Dessa forma, deve ser levado em conta o nível de desemprego existente na área de qualificação do alimentante, o eventual impedimento ou a indução do alimentante ao abandono ou a não inserção no mercado de trabalho pelo ex-cônjuge ou ex-companheiro, bem como a possível decisão do casal quanto à prioridade a ser dada à criação dos filhos (LÔBO, 2009, p. 358).

3.7. Influência da culpa na atribuição dos alimentos

Conforme destaca Paulo Lôbo (2009, p. 361), “o Código Civil introduziu espécie de alimentos de segundo nível, fundado na ocorrência de culpa do alimentando”. Pois tal culpa pode decorrer do art. 1.694, § 2º, ou art. 1.704, parágrafo único, do Código Civil, que dispõem:

Art. 1.694. [...]

§ 2o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.

Art. 1.704. [...]

Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.

Assim, de acordo com o art. 1.694, § 2º, caso o alimentando parente tenha dado causa à sua própria necessidade de alimentos, o alimentante será obrigado a prestar apenas os alimentos necessários para à sobrevivência do parente.

Já de acordo com o art. 1.704, parágrafo único, caso o cônjuge tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial, o dever de alimentos não é afastado, porém é limitado ao mínimo existencial para o ex-cônjuge. Claro que antes devem ser analisados os pré-requisitos de o cônjuge culpado não ter parentes em condições de lhe prestar os alimentos nem ter ele a possibilidade de trabalhar.

Paulo Lôbo (2009, p. 362) ainda acrescenta:

Se o cônjuge culpado não exercer qualquer atividade econômica, mas tenha qualificações profissionais para fazê-lo, não fará jus a esses alimentos. O juiz levará em conta as reais possibilidades do mercado de trabalho na região de domicílio dos cônjuges, que deve ser considerado em benefício da convivência dos filhos menores

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com ambos, a eventual existência de poupança pessoal que permita iniciar empreendimento lucrativo, além do tempo em que o cônjuge culpado esteja afastado de sua atividade profissional, se antes a exercera.

Segundo entendimento de Paulo Lôbo (2009, p. 363), “a, regra de culpa não é aplicável à dissolução de união estável em virtude de apenas estar fundada em causa objetiva de separação de fato, sem requisito temporal”.

De acordo com o art. 1.724 do Código Civil, as relações pessoais entre companheiros deverão obedecer o dever de assistência, “cuja ruptura leva ao dever de alimentos, se estiver consubstanciado o binômio necessidade/possibilidade, independentemente de culpa” (LÔBO, 2009, p. 363). Com isso chega-se à conclusão de que o Código tratou de maneira desigual os cônjuges e companheiros, isentando os últimos da restrição da prestação alimentos em caso de culpa do alimentando.

Novamente cabe mencionar o Projeto de Lei nº 4.947/05, que pretende fazer com que, não só nos casos de dissolução de união estável, mas também nos de separação judicial e divórcio, seja a prestação alimentar concedida integralmente, independentemente de culpa, desde que provada, no entanto, a necessidade.

Insta ainda mencionar que o Direito de Família já caminha para a desconsideração do elemento “culpa”, passando a substituí-lo por responsabilidade civil, através da aplicação da teoria do abuso de direito, com ênfase no art. 187 do Código Civil30.

3.8. Fixação dos alimentos

Como já dito, os alimentos constituem obrigação de dar (ex.: dinheiro) ou de fazer (ex.: hospedagem). A modalidade mais comum é a fixação percentual sobre os rendimentos do devedor, quando são conhecidos (LÔBO, 2009, p. 363).

Conforme nos esclarece Paulo Lôbo (2009, p. 364):

A lei não exige que as condições de vida social e econômica que o cônjuge alimentando desfrutava sejam mantidas. O que se exige é que os alimentos assegurem compatibilidade com sua condição social (...). No sentido de condição social não está o de garantia de aquisição de bens e serviços supérfluos. O que determina a lei é que, considerando os recursos do alimentante, o ex-cônjuge não seja obrigado a baixar na chamada escala social com prejuízo das relações e grupos sociais que integravam seu modo de vida.

30

CC/02, Art. 187: Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

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