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Desigualdades e progressividade
Autor(es):
Almeida, Aníbal
Publicado por:
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
URL
persistente:
URI:http://hdl.handle.net/10316.2/26088
Accessed :
10-Feb-2021 22:27:20
digitalis.uc.pt impactum.uc.pt
D
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Progre
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i
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idade
(Em complemento de uma lição recente deJ. J.
Teixeira Ribeiro)1. Teixeira Ribeiro proferiu, há pouco tempo, uma das suas justamente apreciadas Lições de Finanças Pâblicas na Faculdade de Direito, sobre O Imposto
U,1;CO
de Rendimetlfo Pessoal(1).
O problema nuclear que se coloca e se resolve nessa lição é o seguinte: Por imperativo constitucional, 'O imposto sobre o rendimento visará a dinúnuição das desigualdades e será único e progressivo' (Art.o 107.o,n.o1, da Constituição de 1976 (2)), posto o que cabe definir, para (I) Ver a 'Reconstituição, sob tópicos pormenorizados, de uma lição feita em 17 de Outubro de 1987 ao Curso da Faculdade de' Direito de Coimbra de 1962-1967, aquando da reunião deste para comemorar os 20 anos de formatura' (segundo a nota ao título), no Boleti", de Ciências Ecollómicas da Faculdade de Direito de Coimbra, vol. XXX (1987), pp. 171-84. O texto da lição começa com 'Vimos na última aula .. :, com remissão para a nota I, que esclarece: 'A última aula é aquela que precedia esta no programa da cadeira de Finanças. Cfr. TBIXEIRA RmBIRO, Lições de Final/ÇlI. P,íblicas, 2.' ed., Coimbra Editora, Coimbla, 1984, pp. 284 e segs.'. Não por casualidade, já outro curso encomendou outra lição ao mesmo Professor, attualmente Jubilado. Serve-me de pr<'texto, ao fazer desta, a recentíssima reedição do texto dessa aula como décima segunda peça da recolha A reforma fiscal (Coimbra Editora, 1989), em que o autor agrupa catorze artigos sobre a «reforma dos anos sessenw, a cuja comissão presidiu (os primeiros quatro), e sobre a «actual reforma> (os dez restantes, sendo o último inédito).
(2) De ambos os textos constitucionais que o autor in.voca, após a revisão de 89 ficou incólume o Art.o 107.° (os quatro números que o
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este efeito, «I'el1dimento~ como «rendimento-acréscimo» (<<primeira caracterí tica»), após o que nos surge a questão principal:
'Segunda característica, a progressividade. Talvez se julgue
que da é consequência necessária do objectivo da diminuição das desigualdades. Mas não. Porque o imposto proporcional, sempre, e o imposto regres ivo, quase sempre, também as fazem diminuir
(O imposto reg r ivo só não as faz diminuir quando a sua taxa desce na mesma Oll em maior proporção do que aquda em que
aumenta a matéria colectável). Vale a pena mostrá-lo através de
um exemplo, já que isto não tem sido ?centuado, nem entre nós,
nem lá fora:
Imposto Rendimento Diferença
A B
100 1000 900
Progressivo 10°'0 90 20% 800 710 Proporciol/al 10°'0 90
10%
900 810 Regressil'CI 10°'0 90 5°'0 950 860Como se ê, em qualquer dos casos a Jifc.rença -e, portanto,
a desigualdade- diminui (porque a desigllaldade é a difertnça e não a relação. Que não é relação resulta logo deste exemplo:
Rendimento A 100 500 B 1000 4000 Diferença 900 3500 Relação 10 8
Se o rendimento de A passa de 100 para 500 e o de B de 1 000 para 4 000, a difere/Iça aumenta de 900 para 3 500, enquanto a rdação baixa de 10 para 8. Ora, se a desigualdade fosse a relação, teria
substancialmente o quadro constitucional do problema, uma vez que o objectivo _repartição iiualitária da riqueza e dos rendimentos> (actualmente, -repartição justa dos rendimentos e da riquezv), embora
desvitalizado, não se alterou (dando lugar a outro); e, embora hoje
precedido por outro que antes antecedia (.satisfação das necessidades
frnancfiras do Estado.) --() que é bem sintomático ... - , abre agora caminho directamente par? o n. o 1 do Art.O 107.~, perante o qual se põe (e se. resolve) toda a questão.
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de admitir-se que aquela é maior na momentO'· inicial dO' que !lO último, quando sucede obviamente o contrário). Simplesmente, se a taxa inicial for a mesma, como no exemplo, o imposto progressivo faz diminuir mais as desigualdades dO' que o impostO' proporcional, e este do que o imposto regressivo. Por conseguinte, O' ter-se optado pelO' impostO' progressivo significa pretender-se que a
tribu-tação cO'ntribua o mais poss(vel para a diminuiçãO' das desigual-dades' (3).
É claro, portanto, que não subsiste, neste caso, qualquer questão jurfdica ou problema de direito, dado que a norma constitucional do n. o 1 do Art. 107. o demanda apenas uma
singela «interpretação enunciativa», uma vez que do exegeta
ap~nas se requer que saiba ler que hoje, entre nós, o IRS seria
materialmente insconstitucional se se intentasse promover o objectivo diminuição das desigualdades mediante um impo~to
proporcional
(4),
sendo, portanto, estranho à razão exegéticatodo o problema de teoria dos efeitos económicos dos impostos
(5)
que constitui o núcleo teorético desta lição de(3) J. J. T~IRA RIBmRo, O Imposto Ullico de Reudimento Pessoal, nO' :SCE XXX (1987), pp. 174-5 (reimpressO' em A reform~fiscal, pp: 212-3) e nO'tas 2 e 1 àquelas páginas; cO'IO'quei entre parênteses O' cO'nteúdO' de ambas as nO'tas e grifei quantum satis. Extractei tO'dO' O' núcleo essencial da liçãO' pelO'S mO'tivos óbviO'S que já constam dO' títulO' e que se expõem em se.guida.
(4) Daí, precisamente, que O' autO'r considere materialmeute incons-titucionais as nO'rmas dO'S Art. o· 74. o e 75. o dO' Dec.-lei n.O 442-A/88, de 30 de NO'vembrO' (<<CódigO' dO' IRS.), que instituem as «taxas liberatórias. (cfr. os seus Comentários ao C6digo do IRS, secçãO' I, em A reforma fiscal, .p. 238). Deixa-se PO'r tratar aqui O' prO'blema dO' ,impO'stO' únicO'. (cfr. J. J.TBIXEIRA RIBEIRO, Lições de Final/ças Públicas, § 35), sendO', cO'ntudO', certO' que a eventual omultiplicidade. do IRS também feriria de incO'ns-tituciO'nalidade material as nO'rmas que o instituíssem. NãO' se faz referência à eventualidade de se pretener lançar mãO' de um «impO'stO' decrescentemeute regressivo» para O'bter um tal efeitO', pela simples razãO' de eu descO'nhecer qualquer exemplO' (históricO' O'U COCVO') de impO'stO' de taxa regressiva, e de nem tal me parecer cO'ncebível.
(5) Trata-se, comO' é óbvio, de um efeitO' imediato da tributaçãO' sO'bre O'S rendimentO's dispO'níveis dO'S cO'ntribuintes, e nãO' de um dos efeitO's mediatos (pO'r iI/terferência de um qualquer fmecanismO' de reacçãO'»)
mestre e da presente nota, e que o autor tratou, uma vez mais, da forma rigorosa, sucinta e acessível a que no tem habituado e a que nada ocorre tirar nem pôr.
Contudo, o autor enunciou «literariamentet o
teo-rema, sem demonstrar o seu enunciado.
Visa suprir esse defeito esta sucinta nota, precisamente destinada a pôr o problema em equação e a demo1lstrnr o teorema fundamental sobre «desigualdades e progressivi-dade» que o Professor Teixeira Ribeiro se limitou a ilustrar
'através de um exemplo' .
2. Se denotarmos à partida, como o autor, por A e B
dois rendimentos globais (obviamente existentes e, assim,
maiores que zero) ganhos por (A) e (B) sobre que incide um
imposto de rendimento directo e único, denotando por
II
o número de vezes que A cabe em B como múltiplo de A,obtemos imediatamente
B
=
/tA>
A => B - A=
(/t -
l)A>
O,(1)
definindo o dOllÚl1ÍO de " E IR
>
1; desta maneira, sabemos logo que, sendo B múltiplo II de A, a diferençaB -A é dada por um múltiplo 1/-1 de A (B= 1IA
=
10 XX A e B - A
=
(II
-l)A=
9 X A, no exemplo do autor).É, pois, desde logo evidente que nos interessa supor
submetidas à incidência de um imposto (uúco duas matérias
colectáveis, A e B, para indagar o que sucede à diferença (note-se bem: em sentido aritmético) inicial entre B e A (um
dos impostos que a teoria ("conómica usa versar a propósito do subsector .Administração pública» do sector público da economia, sob a rubrica <efeitos económicos dos imposto~: cfr.
J
.
J
.
TEIXEIRA R.lBIlIRO, Ljfõ~s de Fillnnçns Plíblicns, §§ 42-3.237
múltiplo It - 1 de
A)
e não àrelação
entre elas (um múltiplo/I de A): é que uma
diferwça
é umadesigualdade,
como logo secolhe do implicado da expressão
(1).
Depois, se denotarmos por
tlm (m>
O) a taxa do imposto incidente ~obre a matéria colectável B, sendo a constante t (1)t>
O) a taxa do imposto incidente sobre a matéria colectável A, teremos como expressão dos rendi-mentos disponíveis (após o imposto) de(B)
e(A)
respecti-vamente [1 -{tlm)]B
e (1 - t)A, donde se segue que, Humsegundo momento (ap6s o imposto),
se nos depara adiferença
t
B
(l -
-
)
B -(1 -
t)A=
B - A+
(A - - )t,m m
donde resulta facilmente
(6)
queti >
B-A
+
(l-- )tA= B-A-.>m < > m= rl, <
(2.1)
(2.2)
i. e., que a
difermça
entre os rendimentos disponíveis de(B)
e(A)
após o imposto serásuperior, igualou inferior
à inicial, consoante arelação
entre as taxas de A eB,
tl{tlm)
=
m,
(6) Embora não -imediatamente>; contudo, as manipulações
necessárias para passar do 1. o ao 2. o membro da equação (2.1) são 6bvias e elementares, tal como para passar deste ao 1. o membro da inequ~ção (2.2),
bastando, para o efeito, substituir B pelo seu equivalente nA, pondo A em evidência, para isolar o factor 1 - (nlm) do produto por tA de que resulta i",ediatamwte a equivalência que era de demonstrar. E tudo isto se
sucede claramente sem pressupor outros conhecimentos mais apurados
que os que eu este ano ministrei aos meus alunos de Economia e Fil/al/fas P,íblicas em um -texto de apoio> que poderia intitular -Matemática /II(nilllll para jllristaso, obviamente ao alcance do suposto .age6metrv que tenha perpassado pelas noções versadas até ao fim do actual nono ano da
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for superior, igualou i/lferior à relação entre B A, BI A = Ilo
Sucede, pois, que o «ponto crítico» para que vale a equação restrita constante de
(2.2)
(manutenção da diferença ou dadesigualdade inicial) ocorn.. para til
=
n, podendo um«imposto regressivo» diminuir essa diferwça (desigualdade) em
t do o intervalo
II
>
III
>
1 (sendo, obviamente, m=
1 => => tlm=
t o c so do impo to proporcioNal), o que imediata-mente verifica a tese do autor:'o
imposto regressivo s6 nãofaz diminuir as diferenças quando a ua taxa desce na
mesma ou em maior proporção do que aquela em que
aumenta a matéria colectável', i. e., no(s) caso(s) III ~ tJ;
assim, por e emplo, para os dados do autor
(A
= 100;II = 10; t = 0,1), o «ponto crítico» til = II (<<posição de
itldiferença») ocorre para m
=
Il=
10, com t=
0,1 == 10% incidindo sobre A, e tlm=
lf10 = 0,01 == 1 % incidindoobre B, donde decorre que [1 - (t/m)]B - (1 - t)A
=
=
990 - 90=
B - A=
1 000 - 100=
900, lIIalltendo-se adiferença (desigualdade) inicial
(7).
3. Ao enunciar o seu teorema sobre desigualdades e
progressividade, Teixeira Ribeiro sentiu necessidade de
COllVencer o audit6rio e os futuros leitores: 'Vale a pena
mostrá-lo através de um exemplo, já que isto não tem sido
acentuado, nelll wtre /16s, lIem lá fora'. Porém, o seu
argumenro 'é uma teoria matemática, isto é, se a sua
exposição pode fazer-se em linguagem ordinária, a sua
(1) Por sacrifício à simetria e à compleição, teremos, para um
valor de III> II, p. ex. o para /1/ = 11> II = 10, tlm = 0,0(09) == 0,(90)%,
donde decorre que [1-(tlm)] B = (1- 0.0(09)) x 1000 = 990, (90) e
(1 - t) A = (1- 0,1) x 100 = 90, e uma diferença de 900, (90) > 900;
e. para /1/
<
n, p. ex.O para //I = 9<
n = 10, tlm = 0,0(1) == 1,(1)%,239
demonstração é impossível sem recorrer às matemáticas', como dizia Osório ~obre a «economia pura» de Walras
(8).
Que a proposição nuclear do autoré
verdadeira fica assim demonstrado de uma forma acessível, rigorosa e sucinta, e insusceptível de se «falsificar>>> por meio de um «contra-exemplo».ANfBAL ALMEIDA
Faculdade d. Direito de Coimbra
(8) ANTÓNIO OSÓRIO, A matemática na economia pura, «1.0 volume,
AtroclP, Lx.', 1911, ed. do autor, §11, p. 23. Uma alusão muito recente a este mesmo tema pode conferir-se no meu PreMdio a uma reconstrução da t:Cotloll1ia poUtica, em curso de publicação, parte já publicada, no BCE XXXI (1988), nota 80, p.117.