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A construção dos números

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Universidade Federal de São Carlos Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia

Departamento de Matemática

A construção dos números

Autora: Gabriela Maria Machado Orientador: Luiz Hartmann

Disciplina: Trabalho de Conclusão do Curso Curso: Licenciatura em Matemática

Professores Responsáveis: Karina Schiabel Silva Sadao Massago Vera Lúcia Carbone

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A construção dos números

Autora: Gabriela Maria Machado Orientador: Luiz Hartmann

Disciplina: Trabalho de Conclusão do Curso Curso: Licenciatura em Matemática

Professores Responsáveis: Karina Schiabel Silva Sadao Massago Vera Lúcia Carbone Instituição: Universidade Federal de São Carlos

Centro de Ciências Exatas e de Tecnologia Departamento de Matemática

São Carlos, 13 de Março de 2014.

Gabriela Maria Machado

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Agradecimentos

Agradeço,

À minha família (minha mãe Maria José, meu pai Geraldo, meus irmãos, Cristina, Ricardo e Arenildo e meu alhado Arthur), pela devoção e suporte desde sempre.

À XDani, por toda dedicação, companheirismo, paciência e estímulo que tornaram possível esta realização.

Aos meus amados amigos, pela partilha de toda e qualquer emoção. À todos os professores, pela contribuição à minha formação.

Em especial, ao Professor Hartmann, pela conança, oportunidade de aprendizado e exce-lente forma de ndar meu curso e à Professora Liane, que muito contribuiu e ajudou durante todo o trabalho.

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Conteúdo

1 Considerações Iniciais 6 1.1 Relações de Equivalência . . . 6 2 Números Naturais 15 2.1 Axiomas de Peano . . . 15 2.2 Adição de elementos de A . . . 17

2.3 Multiplicação dos Números Naturais . . . 21

2.4 Relação de ordem em N . . . 24

3 Números Inteiros 30 3.1 Relação de Equivalência em N × N . . . 30

3.2 Adição de números inteiros . . . 31

3.3 Multiplicação dos inteiros . . . 34

3.4 Relação de Ordem em Z . . . 38

3.5 Conjuntos enumeráveis e a Hipótese do Contínuo . . . 47

4 Números Racionais 50 4.1 Construção dos números racionais . . . 50

4.2 Operações em Q . . . 51 4.3 Relação de Ordem em Q . . . 55 5 Números Reais 64 5.1 Cortes de Dedekind . . . 64 5.2 Relação de ordem em C . . . 68 5.3 Operações em C . . . 69

5.4 Representação decimal dos números reais . . . 84

5.5 R não é enumerável . . . 86

6 Números Complexos 89 6.1 Construção dos complexos . . . 89

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Resumo

Apresentamos a construção dos conjuntos numéricos, com o enfoque voltado para o ensino e formação de um educador com todo o rigor matemáco necessário. Foram desenvolvidas as construções dos números inteiros, dos racionais, dos reais e dos complexos a partir do conjunto dos números naturais, este introduzido através dos axiomas de Peano.

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Introdução

A noção de número e suas generalizações estão intimamente ligadas à história da humani-dade. E a própria vida está impregnada de matemática. Grande parte das comparações que o homem formula, assim como gestos e atitudes cotidianas, aludem conscientemente ou não a juízos aritméticos e propriedades geométricas. Sem esquecer que a ciência, a indústria e o comércio nos colocam em permanente contato com o amplo mundo da matemática.

Em todas as épocas da evolução humana, mesmo nas mais atrasadas, encontra-se no homem o sentido do número. Esta faculdade lhe permite reconhecer que algo muda em uma pequena coleção (por exemplo, seus lhos, ou suas ovelhas) quando, sem seu conhecimento direto, um objeto tenha sido retirado ou acrescentado.

O primeiro estudo esquemático dos números como abstração é comumente atribuído aos lósofos gregos Pitágoras e Arquimedes. Entretanto, estudos independentes também ocorreram por volta do mesmo período na Índia, China, e Mesoamérica.

Os números naturais e as frações têm sua origem das atividades de contagem e medida, o que talvez tenha levado os membros da escola pitagórica a postularem que na natureza tudo é número devido acreditarem que tudo podia ser contado, logo atribuído um número, e que a qualquer medida também se poderia atribuir um número ou uma razão entre números.

Iniciamos o trabalho fazendo uma abordagem ao conceito de relação de equivalência, dado que foi bastante usado no decorrer dos estudos. Para isto, introduzimos os conceitos de partes de um conjunto, denição de par ordenado, produto cartesiano, denição de operação, assim como conceito de relação.

Fizemos a formalização no conjunto dos naturais através dos Axiomas de Peano, conside-rando o zero como um número natural. Assumimos que existe um conjunto satisfazendo tais axiomas e fomalizamos todas as propriedade, demonstrando-as através dos Axiomas. Após isto, denotamos este conjunto por N e chamamos de Naturais. O que zemos, foi formalizar e demonstrar rigorosamente o que já sabíamos intuitivamente desde o Ensino Básico, seguindo a construção consistente que foi desenvolvida no século XIX por Giuseppe Peano.

Richard Dedekind (1831-1916) estabeleceu uma relação de equivalência entre pares ordena-dos de números naturais e fez referência da subtração como inversa da adição: a − b = c − d, logo a + d = b + d. Dedekind demonstrou que esta relação é de equivalência, e que o conjunto das classes de equivalência é o conjunto dos números inteiros. Na construção dos inteiros que zemos neste trabalho, utilizamos esta construção, de forma que, denimos um inteiro como uma classe de equivalência e o conjunto dos números inteiros como o conjunto dessas classes de equivalência.

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conceito de relação de equivalência, mas esta construção se da de forma mais rápida do que a dos inteiros, por ter muitas consequências diretas deste.

A construção dos números reais feita neste trabalho foi baseada na construção feita por Dedekind, através dos chamados Corte de Dedekind, que considera o conjunto de todos os cortes, denindo a adição e a multiplicação nele e, em seguida, mostrando que ele possui as propriedades aritméticas de Q e mais uma propriedade que Q não possui, a chamada completude dos reais.

Por m, mas não menos importante, a construção dos números complexos, que foram de-nidos como pares ordenados de números reais e, a partir disto, foram provadas todas as propri-edades aritméticas, mostrando que o conjunto dos números comeplexos possui uma estrutura de corpo, assim como os reais e racionais, mas possuindo uma grande diferença dos anteriores, pois não possui uma relação de ordem.

Estas construções provêm de estudos de matemáticos do século XIX e início do século XX que foram em busca dos fundamentos da matemática acumulados até a época, principalmente a partir de cálculo diferencial e integral de Newton e Leibniz, no século XVII.

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Capítulo 1

Considerações Iniciais

No decorrer deste trabalho lidaremos diretamente com o conceito de relação de equivalência, por isso faremos uma abordagem tratando desta questão. Trabalharemos com conceitos prévios e com a noção intuitiva de conjuntos durante todo o trabalho e, em particular neste capítulo, trabalharemos intuitivamente com os conjunto numéricos e as propriedades básicas de suas operações, lembrando que estudaremos o conceito rigoroso desses conjuntos numéricos nos capítulos seguintes.

Utilizaremos, usualmente, N, Z, Q, R e C para representar os conjuntos dos números natu-rais, inteiros, racionais, reais e complexos, respectivamente.

1.1 Relações de Equivalência

Denição 1.1.1. Dado um conjunto A qualquer, o conjunto das partes de A, ou conjunto potência de A, denotado por P(A), é o conjunto cujos elementos são todos os subconjuntos de A.

Seguem alguns exemplos: Exemplo 1.1.2.

1. Se A = {a, b}, então P(A) = {∅, {a}, {b}, A};

2. Se A = {1, 2, 3}, então P(A) = {∅, {1}, {2}, {3}, {1, 2}, {1, 3}, {2, 3}, A}; 3. Se A = ∅, então P(A) = {∅}, pois o ∅ é o único subconjunto de A; 4. Se A = P({1}), então A = {∅, {1}}, logo, P(A) = {∅, {∅}, {{1}}, A}.

Denição 1.1.3. Seja A um conjunto não vazio com a, b ∈ A. Denimos o par ordenado (a, b) como sendo o conjunto {{a}, {a, b}}.

Observação: (a, b) ⊂ P(A).

Desde o Ensino Fundamental consideramos um par ordenado como um par de objetos onde a ordem tem importância. A denição acima formaliza matematicamente esta ideia intuitiva. O teorema seguinte mostra que um par ordenado é exatamente o que idealizamos intuitivamente. Teorema 1.1.4. Seja A um conjunto onde a, b, c, d ∈ A. Temos que:

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(a, b) = (c, d) ⇔ a = c e b = d Demonstração.

(⇐)Suponhamos a = c e b = d. Dessa forma, é claro que (a, b) = (c, d).

(⇒)Seja, agora, (a, b) = (c, d), isto é, {{a}, {a, b}} = {{c}, {c, d}}. Temos assim, dois casos: • a = b.

Nesta situação (a, b) = (a, a) = {{a}, {a, a}} = {{a}, {a}} = {{a}}. Dessa forma, {{a}} = {{c}, {c, d}}, ou seja, {c} = {a} e {c, d} = {a}. Assim, c = a e d = a. Como a = b, obtemos a = c = b = d.

• a 6= b.

Por hipótese {{a}, {a, b}} = {{c}, {c, d}}. Se {a, b} = {c}, então, a = b = c, contradi-zendo a hipótese a 6= b. Logo, {a, b} = {c, d}, o que acarreta c 6= d. Disso, concluímos que {a} não pode ser igual a {c, d}, logo, {a} = {c}, ou seja, a = c. Já concluímos que {a, b} = {c, d}, a 6= b, c 6= d, de onde segue que b = d.

 Denição 1.1.5. Seja A um conjunto qualquer. Denimos o produto cartesiano de A por A, denotado por A × A, como o conjunto de todos os pares ordenados compostos por elementos de A, isto é, A × A = {(x, y) | x, y ∈ A}.

Seguem alguns exemplos: Exemplo 1.1.6.

1. Se A = {a, b} então A × A = {(a, a), (b, b), (a, b), (b, a)} 2. Se A = ∅, então A × A = ∅

3. Se A = {a1, a2, a3, . . . , an}, tem n elementos, A × A possui n2 elementos, pois, tem-se n

possilidades para o primeiro elemento do par ordenado e n para o segundo.

Denição 1.1.7. Dados dois conjuntos A e B, se x ∈ A e y ∈ B, então x, y ∈ A ∪ B. Denimos o produto cartesiano de A por B como sendo o conjunto A × B = {(x, y) | x ∈ A e y ∈ B}.

Observação: (x, y) = {{x}, {x, y}} ⊂ P(A ∪ B), pois, como x, y ∈ A ∪ B, obviamente, {x}, {x, y} ∈ P(A ∪ B)

A seguir temos alguns exemplos: Exemplo 1.1.8.

1. Seja A = {x} e B = {y}. Temos que A × B = {(x, y)} = {{x}, {x, y}} e B × A = {(y, x)} = {{y}, {y, x}}. Para que A × B = B × A, precisaríamos que {x} = {y} ou {x} = {x, y}, ou seja, x = y. Como x e y são quaisquer, não podemos dizer que A × B = B × A.

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2. Sejam A = ∅ e B um conjunto qualquer. Suponhamos que exista (x, y) ∈ A × B. Por denição de par ordenado, x ∈ A e y ∈ B, o que é uma contradição, pois, por hipótese, A = ∅. Portanto, não existe (x, y) pertencente a A × B.

Denição 1.1.9. Dado um conjunto A não vazio, uma operação em A é uma função ∗ : A × A −→ A. A imagem ∗((x, y)) de um par ordenado (x, y) pela função ∗ é usualmente denotada por x ∗ y.

Levando em conta o nosso conceito intuitivo de conjuntos numéricos e de suas operações aritméticas, podemos ver que, das quatro operações, apenas a soma e o produto são de fato operações, no sentido da denição acima, no conjunto dos números naturais.

Denição 1.1.10. Uma relação binária R num conjunto A é qualquer subconjunto do produto cartesiano A × A, isto é, R ⊂ A × A.

Exemplo 1.1.11. Se A = {a, b, c}, então R = {(a, a), (b, a), (c, b), (c, a)} é uma relação binária, dado que é um subconjunto de

A × A = {(a, a), (a, b), (a, c), (b, a), (b, b), (b, c), (c, a), (c, b), (c, c)}.

No contexto deste trabalho, diremos que a está relacionado com b (escreve-se aRb) se R é uma relação binária em A e se (a, b) ∈ R, isto é, (a, b) ∈ R ⇔ aRb. Uma relação binária será chamada apenas de relação. No exemplo 1.1.11, temos bRa, mas não aRb.

Denição 1.1.12. Seja dado um conjunto A e uma relação R sobre ele. Diz-se que R é uma relação de equivalência se possuir as seguintes propriedades:

1. Reexiva: aRa, para todo a ∈ A;

2. Simétrica: se a, b ∈ A, e aRb, então bRa;

3. Transitiva: para a, b, c ∈ A, se aRb e bRc, então aRc.

A relação R do exemplo 1.1.11 não é reexiva, pois, b ∈ A e (b, b) /∈ R, nem simétrica, dado que bRa, mas não aRb. Entretanto, ela é transitiva (basta ver que cRb, bRa e cRa). Como não satisfaz as três propriedades, ela não é uma relação de equivalência.

Exemplo 1.1.13. Seja A = {1, 2, 3} R = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 2), (2, 1)} é uma relação de equivalêcia, pois:

1. Vale a reexiva: 1, 2, 3 ∈ A, 1R1, 2R2 e 3R3; 2. Vale a simétrica: 1, 2 ∈ A, 1R2 e 2R1; 3. Vale a transitiva: 1, 2 ∈ A, 1R2, 2R1 e 1R1.

No exemplo seguinte será usada uma noção intuitiva de conjuntos numéricos e suas pro-priedades aritméticas básicas, mas apenas a título de esclarecimento do conceito de relação de equivalência. A construção dos conjuntos não dependerá deste exemplo.

Exemplo 1.1.14. Seja a, b ∈ Z com a 6= 0. Diremos que a divide b se existir c ∈ Z, tal que b = ac. Escrevemos a|b para simbolizar que a divide b. Esta relação de divisibilidade em Z não é uma relação de equivalência, pois, apesar de ser reexiva e transitiva, ela não é simétrica:

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1. Vale a reexiva: para todo a ∈ Z, a = ac com c = 1 ∈ Z, portanto aRa.

2. Não vale a simétrica: Se a, b ∈ Z e a divide b, temos que, b = ac1 para algum c1 ∈ Z. Se

b dividisse a, teríamos a = bc2 para algum c2 ∈ Z e assim, a = ac1c2 ⇒ a = ac ⇒ c =

c1c2 = 1, o que signica que c1 = c2 = 1, ou c1 = c2 = −1, o que leva a conclusão que só

vale a simétrica quando a = b ou a = −b, portanto, não vale a simétrica para quaisquer a, b ∈ Z onde a divide b.

3. Vale a transitiva: Se a, b, c ∈ Z, a divide b e b divide d, temos b = ac1 e d = bc2 com

c1, c2 ∈ Z, logo d = ac1c2 ⇒ d = ac, com c = c1c2 ∈ Z, logo, a divide d.

Exemplo 1.1.15. Seja A um conjunto. Temos que A × A = {(x, y) | x, y ∈ A} é uma relação de equivalência em A. De fato,

1. Vale a reexiva: seja x ∈ A, claramente (x, x) ∈ A × A, portanto, xRx, para todo x ∈ A. 2. Vale a simétrica: sejam x, y ∈ A e xRy, ou seja, (x, y) ∈ A × A. Como x, y ∈ A, é

imediato que (y, x) ∈ A × A, logo, yRx.

3. Vale a transitiva: sejam x, y, z ∈ A, xRy e yRz, ou seja, (x, y), (y, z) ∈ A × A, como x, z ∈ A, (x, z) ∈ A × A, ou seja, xRz.

Exemplo 1.1.16. R = {(x, x) | x ∈ A} é uma relação de equivalência em A. Esta relação se chama igualdade em A (ou identidade de A), e se denota por “ = ”. Logo (x, x) ∈ R para todo x ∈ A, que escrevemos usalmente como x = x, ∀ x ∈ A. Mostremos que esta relação, de fato, é de equivalência em A.

1. Reexiva: seja a ∈ A qualquer. Claramente (a, a) ∈ R, ou seja, a = a.

2. Simétrica: se a, b ∈ A e (a, b) ∈ R, temos que existe x ∈ A tal que (a, b) = (x, x), de onde concluímos que a = b. Como (x, x) = (a, b) ∈ R e a = b, então (x, x) = (b, a) ∈ R;

3. Transitiva: se a, b, c ∈ A, (a, b) ∈ R e (b, c) ∈ R, procedendo como no item anterior, obtemos que a = b e b = c, portanto, a = c. Logo, (a, c) ∈ R.

Exemplo 1.1.17. Qualquer relação de equivalência em A está compreendida entre os dois exemplos anteriores, ou seja, “ = ” ⊂ R ⊂ A × A. De fato, seja A um conjunto e R uma relação de equivalência qualquer sobre A. Obviamente R ⊂ A × A, por denição de relação. Temos que “ = ” = {(x, x) | x ∈ A}. Tomemenos (x, x) ∈ “ = ” para um x pertencente a A qualquer. Claramente, (x, x) ∈ R (pela propriedade reexiva, que nos garante que, para todo x em A, xRx). Logo, “ = ” ⊂ R. Dessa forma “ = ” ⊂ R ⊂ A × A, como queríamos.

Denição 1.1.18. Sejam R uma relação de equivalência em A e a ∈ A um elemento xado arbitrariamente. O conjunto a = {x ∈ A | xRa} chama-se classe de equivalência de a pela relação R. Ou seja, a é o conjunto constituído dos elementos de A que se relacionam com a. Exemplo 1.1.19. As classes de equivalência dadas pela relação R do exemplo 1.1.13 são 1 = {1, 2}, 2 = {2, 1} e 3 = {3}

Observe, neste exemplo, que 1 = 2, isso se deve ao fato de que 1R2. O seguinte teorema mostra isso de forma generalizada.

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Teorema 1.1.20. Seja R uma relação de equivalência em um conjunto A e a, b elementos quaisquer de A, então: 1. a ∈ a; 2. a = b ⇔ aRb; 3. a 6= b ⇔ a ∩ b = ∅ Demonstração.

1. a = {x ∈ A | xRa}. Como R é uma relação de equivalência, aRa (pela propriedade reexiva), logo a ∈ a;

2. (⇒) Suponhamos a = b, onde a = {x ∈ A | xRa} e b = {y ∈ A | yRb}. Seja a ∈ a, de onde segue que, a ∈ b (pois por hipótese a = b). Logo, pela denição de b, aRb;

(⇐) Suponhamos agora aRb. Devemos mostrar que a = b, ou seja, a ⊂ b e b ⊂ a. Pois bem:

• Seja a ∈ a. Como, por hipótese, aRb, temos que a ∈ b, logo, a ⊂ b;

• Seja b ∈ b. Por hipótese, aRb e como R é uma relação de equivalência, temos que bRa e portanto b ∈ a. Logo b ⊂ a.

3. (⇒) Seja a 6= b, com a = {x ∈ A | xRa} e b = {y ∈ A | yRb}. Suponhamos que exista c ∈ a ∩ b, ou seja, c ∈ a e c ∈ b. Sendo assim, cRa e cRb, que nos garante que aRb. Assim, pelo item 2 deste teorema, concluímos que a = b, o que contradiz a nossa hipótese. Portanto, não existe c qualquer na intersecção de a e b.

(⇐) Seja a ∩ b = ∅. Suponhamos a = b, que signica, pelo item 2 deste teorema, que aRb, ou seja, a ∈ b. Claramente a ∈ a, sendo assim, a está em a e em b, o que contradiz a hipótese de que a ∩ b = ∅. Portanto, a 6= b.

 O teorema anterior nos fornece propriedades muito importantes. Ele nos fornece a ideia de que todo elemento de uma classe de equivalência a tem a mesma classe de equivalência que a, ou seja, a pode ser representado por x, para todo x ∈ a. Ele nos garante também que duas classes de equivalência distintas são disjuntas.

Da mesma forma que já zemos anteriormente nesta sessão, o seguinte exemplo faz referência aos números inteiros, mas ele serve apenas para clarear a ideia de classe de equivalência e não inuenciará nas construções seguintes.

Exemplo 1.1.21. Sejam A = Z e R a relação dada por: aRb quando o resto das divisões de a e b por 2 forem iguais. Por exemplo, (5, 21) ∈ R, (6, 14) ∈ R, mas (5, 8) 6= R. Vamos vericar se esta relação é de equivalência em Z:

1. Reexiva: seja x ∈ Z. A divisão x por 2 tem resto t e obviamente t = t, portanto, xRx, para todo x ∈ Z;

2. Simétrica: sejam x, y ∈ Z e xRy, ou seja, x e y divididos por 2 têm o mesmo resto s, logo yRx;

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3. Transitiva: sejam x, y, z ∈ Z, xRy e yRz. Dessa forma, x e y divididos por 2 possuem o mesmo resto t, assim como y e z divididos por 2 possuem o mesmo resto s. Como y dividido por 2 possui o resto t e também o resto s, concluímos que r = s e, portanto, o resto da divisão de x e z por 2 é o mesmo, ou seja, xRz.

Usando esta relação de equivalência, temos os seguintes exemplos: 1 = {. . . , −3, −1, 1, 3, . . .} = 3 = 7 = −5 2 = {. . . , −4, −2, 0, 2, 4, . . .} = 0 = 4 = −2

Sabemos ainda que todo número inteiro é classicado como ímpar ou par, onde o par pode ser escrito da forma a = 2n e o ímpar da forma a = 2n + 1. Sendo assim, quando dividimos um número par por 2, obetemos a = 2n+0, ou seja, o resto da divisão é 0. Já quando dividimos um número ímpar por 2, obtemos a = 2n + 1, ou seja, resto 1. Dessa forma, a divisão de qualquer inteiro por 2 nos fornece restos 1 ou 0. Portanto, só existem duas classes de equivalência distintas para esta relação de equivalência. Mais precisamente, tem-se a = 0 para a par e a = 1 para a ímpar.

Denição 1.1.22. Seja R uma relação de equivalência num conjunto A. O conjunto constituído das classes de equivalência em A pela relação R é denotado por A/R e denominado conjunto quociente de A por R. Assim, A/R = {a | a ∈ A}

Veja os exemplos que seguem: Exemplo 1.1.23.

1. Se R é a relação do exemplo anterior, então A/R = {0, 1} 2. Se A = {1, 2, 3}, temos que,

A × A = {(1, 1), (1, 2), (1, 3), (2, 1), (2, 2), (2, 3), (3, 1), (3, 2), (3, 3)}.

Dessa forma, temos as classes de equivalência 1 = {x ∈ A | xR1} = {1, 2, 3}, 2 = {y ∈ A | yR2} = {1, 2, 3} e 3 = {z ∈ A | zR3} = {1, 2, 3}, assim 1 = 2 = 3. Como A/A×A = {a | a ∈ A}, então A/A×A = {1, 2, 3}, ou apenas A/A×A = {1} = {2} = {3} 3. Consideremos a relação de equivalência denotada por “ = ”, isto é, R = {(x, x) | x ∈ A}. Se A = {1, 2, 3}, então R = {(1, 1), (2, 2), (3, 3)} e, portanto, 1 = {x ∈ A | xR1} = {1}, 2 = {y ∈ A | yR2} = {2} e 3 = {z ∈ A | zR3} = {3}, logo A/R = {a | a ∈ A} = {1, 2, 3}. Exemplo 1.1.24. Seja ∼ uma relação em Z, denida como segue: x ∼ y quando os restos das divisões de x e y por 3 forem iguais. Esta é uma relação de equivalência. Com efeito,

1. Reexiva: Claramente, para todo x ∈ Z, x ∼ x;

2. Simétrica: Sejam x, y ∈ Z e x ∼ y, ou seja, o resto das divisões de x e y por 3 é o mesmo, logo, y ∼ x;

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3. Transitiva: Se x, y, z ∈ Z, x ∼ y e y ∼ z, temos que, o resto das divisões de x e y por 3 é o mesmo, digamos t, e o resto das divisões de y e z por 3 é o mesmo, digamos s. Sendo assim, o resto da divisão de y por 3 é dado por s e por t, logo s = t. Portanto, o resto das divisões de x e z por 3 é o mesmo, o que siginica que x ∼ z, como queríamos. O resto da divisão de um número x ∈ Z por 3, é sempre 0, 1, ou 2, portanto, as clas-ses de equivalência são 0 = {. . . , −6, −3, 0, 3, 6, . . .}, 1 = {. . . , −7, −4, −1, 1, 4, 7, . . .} e 2 = {. . . , −8, −5, −2, 2, 5, 8, . . .}. Sendo assim, temos que o conjunto quociente Z/ ∼ = {0, 1, 2}. Exemplo 1.1.25. Seja A o conjunto de todas as pessoas e R a relação em A dada por: xRy quando x for mãe de y. Esta relação não é de equivalência. De fato,

1. Não vale a reexiva: seja x ∈ A qualquer, x não pode ser mãe de x;

2. Não vale a simétrica: sejam x, y ∈ A e xRy, ou seja, x é mãe de y. Dessa forma, y não é mãe de x;

3. Não vale a transitiva: sejam x, y, z ∈ A, xRy e yRz. Assim, x é mãe de y e y é mãe de z, isso signica que x é avó de z e não mãe.

Exemplo 1.1.26. Seja A o conjunto de todas as pessoas e R a relação em A dada por: xRy quando x for irmão de y, ou quando x e y forem a mesma pessoa (diremos aqui que x e y são irmãos quando são lhos biológicos dos mesmos pais). Esta é uma relação de equivalência, pois:

1. Vale a reexiva: se x ∈ A, xRx pois, x e x são a mesma pessoa;

2. Vale a simétrica: sejam x, y ∈ A e xRy, ou seja, x é irmão de y, portanto y é irmão de x, logo, yRx;

3. Vale a transitiva: sejam x, y, z ∈ A, xRy e yRz. Como x é irmão de y e y é irmão de z, claramente os três possuem os mesmo pais biológicos, portanto, x é irmão de z, ou seja, xRz.

Observe que, se a relação fosse denida apenas como “xRy quando x for irmão de y”, não teríamos uma relação de equivalência pois não valeria a reexiva (xRx).

Exemplo 1.1.27. Seja A um conjunto e A = A1∪ A2∪ A3. . . ∪ An uma partição nita de A,

isto é, uma decomposição de A como união nita de uma família de subconjuntos de A que são dois a dois disjuntos e não vazios. Para x e y ∈ A, denimos a seguinte relação: xRy quando x e y pertencem ao mesmo elemento da partição, isto é, xRy ⇔ existe i ∈ {1, . . . , n} tal que x, y ∈ Ai. Esta é uma relação de equivalência. De fato,

1. Reexiva: se x ∈ A, claramente x ∈ Ai e assim, xRx;

2. Simétrica: se x, y ∈ A e xRy, temos que x, y ∈ Ai, portanto, yRx;

3. Transitiva: sejam x, y, z ∈ A, xRy e yRz. Dessa forma, x, y ∈ Ai e y, z ∈ Aj com

i, j ∈ {1, . . . , n}. Como y está em Ai e em Aj, e sabemos que os conjuntos são disjuntos

dois a dois, concluímos que i = j e portanto, x e z estão no mesmo conjunto Ai=j, logo,

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Observe que se os conjuntos não fossem disjuntos dois a dois, ou seja, Ai∩ Aj 6= ∅, poderíamos

ter y na intersecção de Ai e Aj e assim não nos valeria a transitiva e, portanto, esta relação

não seria de equivalência.

Exemplo 1.1.28. Seja A = {1, 2, 3}. Já vimos que A × A, assim como “ = ” são relações de equivalêcia em A. Vimos também que quaisquer outras relações de equivalência neste conjunto estão entre essas duas. Seguem estas relações:

R1 = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 2), (2, 1)};

R2 = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (1, 3), (3, 1)};

R3 = {(1, 1), (2, 2), (3, 3), (2, 3), (3, 2)}.

Exemplo 1.1.29. Sejam A = {x ∈ Z | −5 ≤ x ≤ 10} e R a relação sobre A denida por: xRy ⇔ x2 = y2. Vamos verifcar que R é uma relação de equivalência:

1. Reexiva: se x ∈ A, claramente x2 = x2, portanto, xRx;

2. Simétrica: se x, y ∈ A e xRy, temos que x2 = y2, portanto y2 = x2, ou seja, yRx;

3. Transitiva: se x, y, z ∈ A, xRy e yRz, então , x2 = y2 e y2 = z2, logo, x2 = z2 e assim

xRz.

Exemplo 1.1.30. Seja A como no exemplo anterior e S uma relação denida por: xSy ⇔ existe k ∈ N tal que x2 = y2+ k. Veriquemos agora a relação S:

1. Reexiva: seja x ∈ A. Existe k = 0 ∈ N, tal que que x2 = x2+ k, portanto xSx;

2. Simétrica: sejam x, y ∈ A e xSy, ou seja, existe k1 ∈ N tal que x2 = y2+ k1. Disso temos

que x2 ≥ y2. Consideremos dois casos:

• Seja x2 = y2. Neste caso, existe k

2 = 0 ∈ N tal que y2 = x2+ k2, ou seja, yRx.

• Seja x2 > y2. Neste caso, é impossível que exista k

2 ∈ N tal que y2 = x2 + k2, pois,

se isto acontecesse, teríamos y2 ≥ x2, que contradiz a hipótese de que x2 > y2

Sendo assim, temos que a simétrica só vale quando x2 = y2. Como a propriedade deve

valer pra quaisquer x, y ∈ A, temos que a simétrica não é válida. O par ordenado (−5, −4) é um exemplo que mostra que essa relação não é simétrica, pois (−5, −4) satisfaz a con-dição da relação, ou seja, existe k ∈ N tal que (−5)2 = (−4)2+ k, porém, (−4, −5) não a

satisfaz.

3. Transitiva: se x, y, z ∈ A, xSy e ySz, temos que existem k1, k2 ∈ N, tais que x2 = y2+ k1

e y2 = z2 + k

2. Subtituindo a segunda na primeira, obtemos x2 = z2 + k2 + k1. Como

k1, k2 ∈ N, claramente k1+ k2 = k ∈ N, assim, x2 = z2+ k, logo xSz.

Com isso concluímos que apenas a simétrica não é válida, o que é suciente para que a relação S não seja de equivalência.

Observemos que se a relação do exemplo anterior nos desse a condição com k ∈ Z no lugar de k ∈ N, teríamos que a relação seria de equivalência. Com efeito, seja x, y ∈ A e xSy, ou seja, existe k1 ∈ Z tal que x2 = y2 + k1, e assim, y2 = x2− k1 ⇒ y2 = x2+ k2 com k2 = −k1 ∈ Z.

(22)

Exemplo 1.1.31. Seja A ainda como no exemplo 1.1.29 e T denida como segue: xT y ⇔ existe k ∈ Z tal que x − y − 3k = 0. Vamos vericar se T é uma relação de equivalência.

1. Reexiva: seja x ∈ A. Claramente x − x − 3k = 0 com k = 0 ∈ Z, ou seja, xT x;

2. Simétrica: sejam x, y ∈ A e xT y, ou seja, existe k1 ∈ Z, tal que x − y − 3k1 = 0, o que

implica que −x + y + 3k1 = 0 e disso obtemos y − x + 3k1 = 0, que pode ser escrito como

y − x − 3k2 = 0 com k1 = −k2 ∈ Z e, portanto, yT x;

3. Transitiva: se x, y, z ∈ A, xT y e yT z, temos que existem k1, k2 ∈ Z tais que x−y−3k1 = 0

e y − z − 3k2 = 0. Isolando o y na segunda equação e substituindo na primeira obtemos

x − (z + 3k2) − 3k1 = 0 e assim, x − z − 3(k2+ k1) = 0, que signica x − z − 3k = 0, com

k = k1 + k2 ∈ Z, ou seja, xRz.

(23)

Capítulo 2

Números Naturais

Desde os primórdios existe a necessidade de contagem e são exatamente os números naturais que estão envolvidos com esta ideia de quantidade, que é considerada básica nos dias atuais. Os números naturais tiveram suas origens nas palavras utilizadas para a contagem de objetos, começando com o número um.

O primeiro grande avanço na abstração foi o uso de numerais para representar os números. Isto permitiu o desenvolvimento de sistemas para o armazenamento de grandes números. Um avanço muito posterior na abstração foi o desenvolvimento da ideia do zero com um número com seu próprio numeral. Um dígito zero tem sido utilizado como notação de posição desde cerca de 700 a.C. pelos babilônicos, porém ele nunca foi utilizado como elemento nal. Os Olmecas e a civilização maia utilizaram o zero com um número separado desde o século I AC, aparentemente desenvolvido independentemente, porém seu uso não se difundiu na Mesoamérica. O conceito da forma que ele é utilizado atualmente se originou com o matemático indiano Brahmagupta em 628. Hoje temos este conceito de zero formalizado, poratanto, nossa construção foi feita incluindo o zero como um número natural, porém, outros matemáticos, preferem seguir a tradição antiga e excluir o zero dos números naturais.

Formalizaremos este conceito utilizando uma axiomática, método que, apesar de ser con-siderado uma construção, na verdade, apenas assume a existência do conjunto dos naturais, satisfazendo axiomas que caracterizam rigorosamente a ideia intuitiva. Em outras palavras, assumiremos a existência do conjunto e mostraremos que ele obedece a tais axiomas.

Esta axiomatização foi dada por Giuseppe Peano, no nal do século XIX, e se apresenta aqui de forma adaptada a simbologia matemática atual.

2.1 Axiomas de Peano

Durante a formação de um matemático, muito se ouve falar sobre o Princípio da Indução Finita, que é, na verdade, um conceito menos intuitivo e imediato do que a ideia de que o conjunto dos Naturais começa no 0 e prossegue de um em um.

Suponhamos que A seja um subconjunto dos números naturais, contendo o 3 e a propriedade de que possui o sucessor natural de qualquer elemento seu, ou seja, se x ∈ A, então x + 1 ∈ A. Dessa forma, A contém o 4, pois contém o 3 e, claramente, possui o 5, já que contém o 4, e assim segue. Logo A contém {3, 4, 5, 6, . . .}. Se esse nesse conjunto tivesse como hipótese inicial que o 0 está nele, no lugar do 3, teríamos que A é o conjunto dos naturais.

(24)

Os Axiomas de Peano apresentam a formalização rigorosa destas ideias intuitivas, utilizando conceitos já conhecidos ou admitidos aqui, como segue:

Axioma 2.1.1 (AXIOMAS DE PEANO). Existe um conjunto A e uma função s : A −→ A vericando:

1. s é injetora;

2. Existe um elemento em A, que denotaremos por 0, e chamaremos de zero, que não está na imagem de s, isto é, 0 /∈ Im(s).

3. Se um subconjunto X de A satiszer os subitens abaixo, então X = A: (a) 0 ∈ X;

(b) Se k ∈ X, então s(k) ∈ X.

A função s é chamada função sucessor, de modo que, se x ∈ A, então s(x) é chamado sucessor de x. Os axiomas anteriores nos dizem que cada x de A possui sucessor diferente e expressam, ainda, o fato de que 0 não é sucessor de nenhum elemento de A.

Temos garantido que tal A é diferente de vazio, pelo segundo axioma de Peano. Como 0 /∈ Im(s) e s(0) ∈ Im(s), concluímos que 0 6= s(0), e, portanto, A possui pelo menos dois elementos: 0 e s(0). Da mesma forma, podemos observar que s(s(0)) é diferente de 0, pois 0 /∈ Im(s), e diferente s(0), pois s é injetora, ou seja, s(0) 6= 0 ⇒ s(s(0)) 6= s(0). Assim, A possui pelo menos três elementos: 0, s(0) e s(s(0)). Prosseguindo desta forma, concluímos que s(s(s(0))) também está em A e é diferente de 0 (pois 0 /∈ Im(s)), diferente de s(0) (0 6= s(s(0)) ⇒ s(0) 6= s(s(s(0))), pois s é injetora) e diferente de s(s(0)) (s(0) 6= s(s(0)) ⇒ s(s(0)) 6= s(s(s(0))), pois s é injetora). Agora temos que A possui pelo menos quatro elementos: 0, s(0), s(s(0)) e s(s(s(0))).

Tomando estes sucessores de forma repetida, vemos que cada elemento novo é diferente dos anteriores mencionados. Isto será provado rigorosamente neste capítulo. Prosseguindo assim, consideramos A como um conjunto innito, que vamos denir formalmente a seguir.

Denição 2.1.2. Dado um conjunto X, dizemos que ele é innito se existir uma função injetora f : A −→ X. Um conjunto é dito nito quando não é innito.

Em outras palavras, podemos dizer que X é innito quando possui um subconjunto Y em bijeção com A, ou ainda, dizendo que este Y é equipotente a A. Uma outra denição de conjunto innito, equivalente a esta, que existe devido a Georg Ferdinand Ludwig Philipp Cantor (1845-1918)(ele rompeu com o paradigma grego de que o todo é sempre maior do que qualquer uma das suas partes próprias), é a seguinte: um conjunto diz-se innito quando existir uma bijeção entre ele e um subconjunto próprio dele.

O terceiro axioma de Peano é conhecido como Princípio de Indução Finita e ele é utilizado na demonstração de propriedades que dizem respeito aos números naturais. Veremos muitos exemplos no decorrer deste capítulo.

Já o segundo axioma de Peano fala que 0 /∈ Im(s). O teorema a seguir nos diz quem é Im(s).

(25)

Teorema 2.1.3. Se s : A −→ A é a função sucessor, então, tem-se:

1. s(n) 6= n, para todo n ∈ A, ou seja, nenhum número de A é sucessor de si mesmo; 2. Im(s) = A \ {0}, isto é, 0 é o único elemento de A que não é sucessor de nenhum outro

elemento de A. Demonstração.

1. Consideremos um subconjunto B de A, constituído dos n ∈ A tais que s(n) 6= n, isto é B = {n ∈ A | s(n) 6= n}. Vamos, através do princípio de indução nita, mostrar que B = A, isto é, s(n) 6= n, para todo n ∈ A

(a) Pelo axioma 2 de Peano, temos que 0 /∈ Im(s), sendo assim, 0 6= s(0), e, portanto, 0 ∈ B;

(b) Seja k ∈ A, ou seja, k 6= s(k). Como, pelo axioma 1, s é injetora, obtemos que s(k) 6= s(s(k)) e, portanto, s(k) ∈ B.

Assim, pelo princípio de indução nita, B = A.

2. Novamente usaremos indução nita. Seja B ⊂ A dado por B = {0} ∪ Im(s): (a) Claramente, 0 ∈ B;

(b) Seja k ∈ B. Com isso s(k) ∈ Im(s) ⊂ B, daí, s(k) ∈ B. Logo, B = A. Como 0 /∈ Im(s), concluímos que Im(s) = A \ {0}.

 Todo elemento de A\{0} é sucessor de um único elemento de A, que se chama seu antecessor.

2.2 Adição de elementos de A

Vamos, agora, formalizar a operação que chamaremos de adição e representaremos por (+), que é, na verdade, a operação que já conhecemos do ensino básico.

Denição 2.2.1. Dado m ∈ A, denimos recursivamente: (

m + 0 = m, m + s(n) = s(m + n).

Isto é, xado m, se p = 0, m + p = m e se p 6= 0, p = s(n) para algum n ∈ A, daí m + p = m + s(n) = s(m + n).

Esta denição nos fornece o seguinte:

m + s(0) = s(m + 0) = s(m), ou ainda,

(26)

e assim por diante. Esta é a idéia intuitiva que iremos formalizar a seguir utilizando o Princípio da Indução, que mostra que m + n está denido para todos m, n ∈ A.

Proposição 2.2.2. A soma m + n está denida para todo par m, n de A.

Demonstração. De fato, vamos denir o conjunto Sm = {n ∈ A | m + n está denida}, para

cada m ∈ A xado arbitrariamente.

1. m + 0 está denido, portanto, 0 ∈ Sm.

2. Seja k ∈ Sm, isto é, m + k está denido. Temos que m + s(k) = s(m + k) está denido,

logo s(k) ∈ Sm.

Logo, pelo axioma 3, Sm = A. Como m é arbitrário, Sm = A para todo m ∈ A. Sendo assim,

m + nestá denida para todo par (m, n) de A × A, o que signica que a adição é, de fato, uma operação em A.

 Introduziremos agora a notação para os números naturais que é conhecida desde o ensino básico.

Denição 2.2.3. Indica-se por 1 e lê-se um o elemento de A que é sucessor de 0, ou seja, 1 = s(0).

Proposição 2.2.4. Para todo m ∈ A, tem-se s(m) = m + 1 e s(m) = 1 + m. Portanto m + 1 = 1 + m.

Demonstração. Provemos as duas igualdades:

• Temos que m + 1 = m + s(0) = s(m + 0) = s(m), ou seja, m + 1 = s(m);

• Consideremos agora o conjunto B = {m ∈ A | s(m) = 1 + m} e provemos por indução que B = A:

1. Claramente 1 + 0 = 1 = s(0), sendo assim, s(0) = 1 + 0 e portanto, 0 ∈ B.

2. Seja, agora, m ∈ B, isto é, s(m) = 1+m. Daí s(1+m) = s(s(m)) e como s(1+m) = 1 + s(m), obtemos que s(s(m)) = 1 + s(m) e, portanto, s(m) ∈ B.

Sendo assim, B = A.

 Já temos as notações 0 e 1 = s(0). Vamos denir, agora, a continuação:

s(1) = 2 (dois), s(2) = 3 (três), s(3) = 4 (quatro), s(4) = 5 (cinco)

e assim sucessivamente. Esta é a notação indo-arábica de base dez para os elementos de A. Dessa forma, A contém o seguinte conjunto:

(27)

O teorema seguinte mostra que os axiomas de Peano formalizam a ideia intuitiva do conjunto dos números naturais, isto é, A não contém elementos além desses.

Teorema 2.2.5. A = {0, 1, 2, 3, . . .}

Demonstração. Seja N = {0, 1, 2, 3, . . .} subconjunto de A. Veriquemos por indução que N = A:

1. Por construção 0 ∈ N;

2. Novamente por construção, N contém o sucessor de qualquer elemento contido nele, ou seja, se n ∈ N, então s(n) ∈ N.

Logo, N = A.

 Denição 2.2.6. Chamaremos este conjunto A de Conjunto do Números Naturais e denota-remos, a partir daqui, por N.

Utilizando a notação anterior, temos as seguintes adições em N: 1. 1 + 1 = s(1) = 2;

2. 2 + 1 = s(2) = 3; 3. 3 + 1 = s(3) = 4;

4. 3 + 2 = 3 + s(1) = s(3 + 1) = s(4) = 5;

5. 0 + 2 = 0 + s(1) = s(0 + 1) = s(1 + 0) = s(1) = 2.

Denição 2.2.7. Seja f : X −→ X e IdX a função identidade no conjunto X. Sendo assim,

denimos f0 = Id

X e, para n ≥ 1, fn= f ◦ (fn−1). Chamamos a função fn de n-ésima iterada

de f, ou ainda, dizemos que f foi iterada n vezes.

Proposição 2.2.8. Se m e n são naturais quaisquer, então vale a igualdade m + n = sn(m),

isto é, somar n a m é somar 1 a m iteradamente n vezes.

Demonstração. Seja Sm = {n ∈ N | m+n = sn(m)}para um m natural xado arbitrariamente.

Provemos por indução que Sm = N

1. s0(m) = m = m + 0, portando 0 ∈ S m;

2. Seja k ∈ Sm, ou seja, m + k = sk(m). Temos ainda que m + s(k) = s(m + k), daí, pela

hipótese, m+s(k) = s(sk(m)) = s ◦ sk(m). Por denição, s◦sk(m) = sk+1(m) = ss(k)(m),

e assim, m + s(k) = ss(k)(m), logo, s(k) ∈ S m.

Como m foi xado arbitrariamente, temos Sm = N para todo m ∈ N.

 Exemplo 2.2.9. Segue um exemplo do que acabou de ser demonstrado:

(28)

Vamos enunciar e demonstrar agora uma proposição que será fundamental para a prova do próximo teorema.

Proposição 2.2.10. Para todo m ∈ N, temos que m+0 = m = 0+m, isto é, m é um elemento neutro da adição em N.

Demonstração. Por denição m+0 = m. Provemos agora que 0+m = m. De fato, consideremos o conjunto A0 = {m ∈ N | 0 + m = m}.

1. Por denição 0 + 0 = 0, portanto 0 ∈ A0;

2. Suponhamos k ∈ A0, isto é, 0 + k = k e provemos que s(k) ∈ A0. Com efeito, 0 + s(k) =

s(0 + k) = s(k), ou seja, s(k) ∈ A0.

Logo, por indução, concluímos que A0 = N.

 O seguinte teorema mostra as propriedades da adição que são admitidas intuitivamente desde a escola.

Teorema 2.2.11. Se m, n e p são números naturais arbitrários, temos que as seguintes ar-mações são verdadeiras:

1. Propriedade associativa da adição: m + (n + p) = (m + n) + p. 2. Propriedade comutativa da adição: n + m = m + n.

3. Lei do cancelamento da adição: m + p = n + p ⇒ m = n. Demonstração.

1. Para esta prova, consideremos o conjunto A(m,n) = {p ∈ N | m + (n + p) = (m + n) + p}

com m e n naturais xados arbitrariamente. Vamos aplicar indução sobre este conjunto. (a) Temos que m + (n + 0) = m + n = (m + n) + 0, logo, 0 ∈ A(m,n);

(b) Suponhamos que k ∈ A(m,n), isto é, m + (n + k) = (m + n) + k. Agora, provemos que

s(k) ∈ A(m,n). De fato,

(m + n) + s(k) = s((m + n) + k), e por hipótese, (m + n) + s(k) = s(m + (n + k)), daí,

(m + n) + s(k) = m + s(n + k), o que signica, (m + n) + s(k) = m + (n + s(k)), logo, s(k) ∈ A(m,n).

2. Para esta prova, consideremos o conjunto An = {m ∈ N | n + m = m + n}, com n xado

arbitrariamente e provemos que N = An.

(a) Temos, pela proposição 2.2.10, que n + 0 = 0 + n, portanto, 0 ∈ An;

(b) Suponhamos que k ∈ An, ou seja, n + k = k + n, e provemos que s(k) ∈ An. De fato,

n + s(k) = s(n + k) = s(k + n) = (k + n) + 1, daí, pelo primeiro item deste teorema,

n + s(k) = k + (n + 1), e pela proposição 2.2.4 obtemos n + s(k) = k + (1 + n) = (k + 1) + n e assim,

(29)

Concluímos assim, por indução, que An = N.

3. Consideremos o conjunto A(m,n) = {p ∈ N | m + p = n + p ⇒ m = n}. Provemos agora

que A(m,n) = N.

(a) Temos que 0 ∈ A(m,n), pois m + 0 = n + 0 ⇒ m = n, pela proposição 2.2.10;

(b) Suponhamos k ∈ A(m,n), isto é, m + k = n + k ⇒ m = n. Temos que

m + s(k) = n + s(k) ⇒ s(m + k) = s(n + k) ⇒ (m + k) + 1 = (n + k) + 1

⇒ m + (1 + k) = n + (1 + k) pelos itens anteriores ⇒ (m + 1) + k = (n + 1) + k

⇒ s(m) + k = s(n) + k

⇒ s(m) = s(n) por hipótese ⇒ m + 1 = n + 1 ⇒ m = n Logo, m + s(k) = n + s(k) ⇒ m = n, ou seja, s(k) ∈ A(m,n).

Desta forma, concluímos que A(m,n) = N.

 O teorema anterior deixa bem claro a importância da Indução Finita nas demonstrações. A seguinte proposição é um complemento da proposição 2.2.10.

Proposição 2.2.12. Suponhamos que exista u ∈ N tal que m + u = m (ou u + m = m), para todo m ∈ N. Então u = 0. Assim, 0 é o único elemento neutro para a operação de adição. Demonstração. Temos 0 = 0 + u = u para u como na hipótese.



2.3 Multiplicação dos Números Naturais

Assim como foi denida a adição, deniremos agora a operação que chamaremos de multi-plicação:

Denição 2.3.1. Dado m ∈ A, denimos recursivamente: (

m · 0 = 0, m · (n + 1) = m · n + m.

Ou seja, xado m, se p = 0, m · p = 0 e se p 6= 0, p = n + 1, para algum n ∈ N, daí m · p = m · (n + 1) = m · n + m.

Para designar m · n, usaremos a notação de justaposição mn. Será enunciado e provado, a seguir, um teorema com as propriedades da multiplicação, mas antes disso, enunciaremos duas proposições que serão úteis para a demonstração de tal teorema.

(30)

Demonstração. Consideremos o conjunto S = {m ∈ N | 0 · m = 0} e utilizemos indução para mostrar que S = N:

1. 0 · 0 = 0 por denição, portanto, 0 ∈ N;

2. Suponhamos que k está em S, ou seja, 0 · k = 0 e provemos que s(k) ∈ S. De fato, 0 · s(k) = 0(k + 1) = 0k + 0, por denição, e ainda, 0k + 0 = 0k = 0, por hipótese de indução. Logo, 0 · s(k) = 0, ou seja, s(k) ∈ S

Dessa forma, concluímos que S = N.

 Proposição 2.3.3. Sejam m, n ∈ N tais que m + n = 0. Então m = n = 0.

Demonstração. Suponhamos n 6= 0, isto é, n = s(n1) = n1+ 1, para algum n1 ∈ N. Sabemos

que 0 = m + n = m + (n1+ 1) = (m + n1) + 1 = s(m + n1), o que é um absurdo pois 0 não é

sucessor de nenhum elemento de N. Logo, n = 0, sendo assim, m+n = 0 ⇒ m+0 = 0 ⇒ m = 0, como queríamos.

 Teorema 2.3.4. Sejam m, n, p ∈ N, então são válidos os itens abaixo:

1. mn ∈ N, isto é, a multiplicação é uma operação em N; 2. Existe um elemento neutro multiplicativo: 1 · n = n · 1 = n; 3. Distributividade: m(n + p) = mn + mp e (m + n)p = mp + np; 4. Associatividade: m(np) = (mn)p;

5. mn = 0 ⇒ m = 0 ou n = 0; 6. Comutatividade: mn = nm Demonstração.

1. Consideremos o conjunto Sm = {n ∈ N | mn está denido} para m ∈ N xado

arbitra-riamente.

(a) m · 0 = 0 está denido, logo, 0 ∈ Sm;

(b) Suponhamos k ∈ N e provemos que s(k) ∈ N. De fato, m·s(k) = m(k+1) = mk+m. Por hipótese de indução mk está denido e, como visto na seção anterior, a soma de quaisquer dois naturais também. Logo, m · s(k) = mk + m está denido, o que signica que s(k) ∈ Sm.

Sendo assim, por indução Sm = N. Como m foi xado arbitrariamente, a igualdade vale

para qualquer m ∈ N.

2. Temos que n·1 = n(0+1), e por denição n(0+1) = n·0+n = n, logo, n·1 = n. Agora, para mostrar que 1 · n = n para todo n ∈ N, consideremos o conjunto S = {n ∈ N | 1 · n = n}, e mostremos que N = S.

(31)

(a) Temos que 1 · 0 = 0, por denição, logo, 0 ∈ S;

(b) Suponhamos que k ∈ S, ou seja, 1 · k = k. Sabemos que 1 · (k + 1) = 1 · k + 1, daí, por hipótese de indução, 1 · (k + 1) = k + 1. Portanto, k + 1 ∈ S.

Sendo assim, por indução S = N.

3. Sejam m, n naturais xados arbitrariamente e usemos indução sobre p. Seja Am,n = {p ∈

N | m(n + p) = mn + mp}.

(a) De fato, 0 ∈ Am,npois m(n+0) = mn e mn+m·0 = mn, ou seja, m(n+0) = mn+m·0;

(b) Mostremos agora que, se k ∈ Am,n, isto é, m(n+k) = mn+mk, então (k +1) ∈ Am,n.

Com efeito, m(n + (k + 1)) = m((n + k) + 1) = m(n + k) + m = (mn + mk) + m = mn + (mk + m) = mn + (m(k + 1)). Todas estas igualdades se justicam com base em propriedades estabelecidas anteriormente. Sendo assim, (k + 1) ∈ Am,n.

Assim, concluímos, por indução, que Am,n = N.

4. Novamente, consideremos m, n ∈ N xados arbitrariamente e apliquemos indução sobre p. Seja Sm,n = {p ∈ N | m(np) = (mn)p}:

(a) m(n · 0) = m · 0 = 0 e (mn) · 0 = 0, logo, m(n · 0) = (mn) · 0. Assim, 0 ∈ Sm,n;

(b) Suponhamos que k ∈ Sm,n, isto é, m(nk) = (mn)k. Consideremos as seguintes

igualdades: m(n(k + 1)) = m(nk + n) = m(nk) + mn = (mn)k + mn = (mn)(k + 1). Dessa forma, k + 1 ∈ Sm,n

Logo, Sm,n = N.

5. Seja mn = 0. Suponhamos n 6= 0. Então n = n1 + 1 para algum n1 em N. Assim,

mn = 0 ⇒ m(n1+ 1) = 0 ⇒ mn1+ m = 0, daí, pela proposição 2.3.3, mn1 = m = 0. Da

mesma forma, supondo m 6= 0, concluímos que n = 0. Como queríamos.

6. Suponhanhamos Sm = {n ∈ N | mn = nm}, para um m ∈ N xados arbitrariamente.

Mostremos que Sm = N:

(a) Por denição, m · 0 = 0 e, pela proposição 2.3.2, 0 · m = 0, logo, m · 0 = 0 · m, isto é, 0 ∈ Sm;

(b) Suponhamos k ∈ Sm, ou seja, mk = km. Temos que m(k + 1) = mk + m = km + m,

por hipótese de indução, e ainda, km + m = (k + 1)m. Sendo assim, m(k + 1) = (k + 1)m, que signica k + 1 ∈ Sm.

Logo, por indução, Sm = N. Como m é arbitrário, a igualdade vale para todo m em N.

 Novamente pudemos perceber o quão é importante a existência do terceiro Axioma de Peano. Completaremos agora esta parte, mostrando que o elemento neutro, visto no segundo item do teorema anterior, é único.

Proposição 2.3.5. Se p ∈ N é tal que np = n (ou pn = n), para todo n ∈ N, então p = 1. Demonstração. Para um tal p, 1 = 1p = p, como queríamos.

(32)

2.4 Relação de ordem em N

A ideia intuitiva que trazemos desde a escola, de que 0 é menor que 1, que é menor que 2 e assim sucessivamente, vem da relação de ordem que existe nos naturais, que nos permite comparar os números deste conjunto, formalizando a ideia intuitiva.

Denição 2.4.1. Seja R uma relação binária em um conjunto não vazio A e x, y, z elementos quaisquer de A. Dizemos que R é uma relação de ordem em A quando satisfaz as seguintes condições:

1. Reexividade: xRx;

2. Antissimetria: se xRy e yRx, então x = y; 3. Transitividade: se xRy e yRz, então xRz.

Dizemos ainda que tal A, diferente de vazio e munido de uma relação R, é chamado de conjunto ordenado.

Vamos denir agora uma relação de ordem em N através da operação adição, o que o torna um conjunto ordenado.

Denição 2.4.2. Dados m, n ∈ N, dizemos que mRn se existir p ∈ N tal que n = m + p Exemplo 2.4.3.

1. Temos que 2R7, pois 7 = 2 + 5; 2. 4R4, dado que 4 = 4 + 0.

Proposição 2.4.4. A relação R da denição 2.4.2 acima é uma relação de ordem em N Demonstração. De fato, vejamos que valem as propriedades reexiva, antissimétrica e transi-tiva:

1. Reexiva: dado m ∈ N, claramente m = m + p, para p = 0 ∈ N, logo, mRm;

2. Antissimétrica: sejam m, n ∈ N, mRn e nRm, isto é, existem p, q ∈ N, tais que n = m + p e m = n + q. Substituindo a primeira igualdade na segunda, obtemos, m = (m + p) + q ⇒ m = m + (p + q), o que signica que p + q = 0, assim, pela proposição 2.3.3, p = q = 0, logo, m = n;

3. Transitiva: Sejam l, m, n ∈ N, lRm e mRn, ou seja, existem p, q ∈ N tais que m = l + p e n = m + q. Substituindo a primeira igualdade na segunda, obtemos, n = (l + p) + q, ou ainda, n = l + (p + q). Temos que p + q = r ∈ N, portando, podemos reescrever a última equação como segue: n = l + r. Sendo assim, concluímos que, lRn.

Logo, a relação R é de ordem em N, como queríamos.

 Denição 2.4.5. Sejam m, n ∈ N e R a relação da denição 2.4.2 acima. Se mRn, diremos que m é menor ou igual a n e passaremos a escrever m ≤ n no lugar de R, ou seja, m ≤ n signicará mRn.

(33)

Seja (A, +) um grupo abeliano e ≤ uma relação de ordem em A que satisfaz a ≤ b ⇔ b = a + c para algum c ∈ A. Denotamos por A∗ = A \ {0}, B+ = {x ∈ B | x ≥ 0} e

B− = {x ∈ B | x ≤ 0}.

Seguem algumas variações desta notação:

• m ≤ n pode ser escrito como n ≥ m. Leremos n é maior ou igual a m; • Se m ≤ n, mas m 6= n, escrevemos m < n e dizemos que m é menor que n; • m < npode ser escrito como n > m e leremos n é maior que m.

Proposição 2.4.6. Para todo n ∈ N∗, 0 < n. Em particular, 0 < 1.

Demonstração. Devemos mostrar que existe p ∈ N tal que n = 0 + p (p 6= 0, pois, 0 ≤ n, mas n 6= 0). De fato, como n 6= 0, dado que n ∈ N∗, podemos dizer que, n = s(n1) = s(n1) + 0 =

0 + s(n1), para algum n1 ∈ N. Sendo assim, encontramos, n = 0 + p, com p = s(n1) ∈ N∗, como

queríamos. Temos ainda que 1 = 0 + 1, portanto, 0 < 1.

 Proposição 2.4.7. Para todo n ∈ N, s(n) > n.

Demonstração. Novamente, devemos mostrar que s(n) = n + p, com p 6= 0. De fato, temos que s(n) = n + 1, claramente 1 6= 0, logo, s(n) > n.

 Proposição 2.4.8 (Lei da Tricotomia dos Naturais). Para quaisquer m, n ∈ N temos que uma, e somente uma, das relações seguintes ocorre:

1. m < n; 2. m = n; 3. m > n.

Demonstração. Vamos mostrar primeiro que duas delas não podem ocorrer simultanemante e depois mostrar que obrigatoriamente uma delas deve ocorrer.

• Claramente, 1 e 2, não podem ocorrer simultanemante, pois, teríamos n = m + p com p ∈ N∗ e m = n, daí, subtituindo a segunda igualdade na primeira, obteríamos que, m = m + pe disso, p = 0, o que é uma contradição, pois, p ∈ N∗. Da mesma forma, 2 e 3 não podem ocorrer juntas. Suponhamos agora que 1 e 3 ocorram ao mesmo tempo, isto é, n = m + p e m = n + q, com p, q ∈ N∗. Substituindo a primeira igualdade na segunda,

obtemos, m = (m + p) + q ou ainda, m = m + (p + q), que nos remete a 0 = p + q. Pela proposição 2.3.3, concluímos que p = q = 0, o que é uma contradição, pois p, q ∈ N∗.

• Mostremos esta parte por indução. Seja M = {x ∈ N | x = m ou x > m ou x < m} com m sendo um natural qualquer.

(34)

2. Suponhamos agora que k ∈ M, isto é, k = m ou k > m ou k < m. Analisemos os três casos:

(a) k = m ⇒ k + 1 = m + 1 ⇒ k + 1 > m ⇒ k + 1 ∈ M;

(b) k > m ⇒ k = m + p para p ∈ N∗ ⇒ k + 1 = (m + p) + 1 ⇒ k + 1 = m + (p + 1) ⇒

k + 1 > m ⇒ k + 1 ∈ M;

(c) k < m ⇒ m = k + p para p ∈ N∗. Como p 6= 0, temos que p = p

1+ 1com p1 ∈ N.

Logo, m = k + p ⇒ m = k + (p1+ 1) ⇒ m = (k + 1) + p1. Se p1 = 0 teremos

m = k + 1e portanto, k + 1 ∈ M. Se p1 6= 0, então, k + 1 < m, logo, k + 1 ∈ M.

Sendo assim, conluímos que, se k ∈ M, então k + 1 ∈ M. Logo, por indução, N = M.

 A Proposição 2.4.8 anterior nos fornece o fato de que dois naturais são sempre compará-veis pela relação de ordem acima denida. Chamamos uma relação de ordem que obedece a tricotomia de relação de ordem total. Veja a seguir uma relação de ordem que não obedece a tricotomia. Neste caso diremos que é uma relação de ordem parcial.

Exemplo 2.4.9. Sejam X um conjunto e R a relação de inclusão entre os elementos de P(X). Esta é uma relação de ordem em, P(X), mas só é de ordem total quando X é vazio ou unitário. De fato, seja X um conjunto qualquer. Vamos vericar primeiramente que esta é uma relação de ordem:

1. Reexiva: seja Y um elemento qualquer de P(X). Como Y = Y , claramente, Y ⊂ Y ; 2. Antissimétrica: sejam Y e Z elementos de P(X), Y ⊂ Z e Z ⊂ Y . Disso já temos que

Y = Z;

3. Transitiva: sejam Y , Z e W elementos de P(X), Y ⊂ Z e Z ⊂ W . Obviamente, Y ⊂ W . Concluímos, assim, que esta é uma relação de ordem. Precisamos agora vericar se é de ordem total.

Consideremos primeiro X diferente de vazio e não unitário, por exemplo, X = {a, b}. Com isso, P(X) = {∅, {a}, {b}, {a, b}}. Vemos facilmente que {a} * {b} e {b} * {a}, portanto, não obedece a tricotomia. Concluímos então que esta é uma relação de ordem parcial em X diferente de vazio e não unitário.

Suponhamos agora X = ∅ e assim, P(X) = {∅}. Esta é uma relação de ordem total, pois o único subconjunto de P(X) é o conjunto vazio, e, obviamente, ∅ = ∅, além de ∅ não está propropriamente contido em ∅.

Seja agora X um conjunto unitário qualquer, digamos X = {a}. Sabemos que P(X) = {∅, {a}}. O vazio é subconjunto de qualquer conjunto, sendo assim, ∅ ⊂ {a} e ainda, {a} * ∅, ou seja, satisfaz a tricotomia. Vericamos, assim, que a relação de inclusão é de ordem em todo caso, mas é relação de ordem total apenas quando X é vazio ou unitário.

Teorema 2.4.10. Sejam a, b, c ∈ N. Valem os seguintes itens: 1. a ≤ b ⇔ a + c ≤ b + c;

(35)

2. a ≤ b ⇔ ac ≤ bc com c 6= 0; Demonstração.

1. (⇒) a ≤ b ⇒ existe p ∈ N tal que b = a + p. Daí, b + c = (a + p) + c = (a + c) + p, logo b + c ≥ a + c.

(⇐) a + c ≤ b + c ⇒ b + c = (a + c) + ppara algum p ∈ N. Daí temos, b+c = (a+c)+p ⇒ b + c = (a + p) + c ⇒ b = a + p, logo a ≤ b.

2. (⇒) a ≤ b ⇒ b = a + q para algum q ∈ N. Suponhamos que bc < ac, ou seja, ac = bc + p para algum p ∈ N∗. Substituindo a primeira igualdade nesta última ob-temos ac = (a + q)c + p ⇒ ac = ac + qc + p ⇒ 0 = qc + p, daí, pela proposição 2.3.2, qc = p = 0, o que é uma contradição, pois p ∈ N∗. Logo, ac ≤ bc, como queríamos. (⇐) ac ≤ bc ⇒ bc = ac + p para algum p ∈ N. Suponhamos b < a, ou seja, a = b + q para q ∈ N∗. Substituindo esta igualdade na anterior, obtemos, bc = (b + q)c + p ⇒ bc =

bc + qc + p ⇒ 0 = qc + p ⇒ 0 = qc = p, daí, pelo item 5 do teorema 2.3.4, obtemos que q = 0ou c = 0. Como c 6= 0, nos resta que, q = 0, o que é uma contradição, pois q ∈ N∗ . Portanto, pela tricotomia, a ≤ b.

 Note que o teorema anterior é válido com < no lugar de ≤ e a demostração segue da mesma forma.

Teorema 2.4.11 (Lei do cancelamento da multiplicação). Sejam a, b, c ∈ N, com c 6= 0, tais que ac = bc, então a = b.

Demonstração. Suponhamos que a 6= b. Pela tricotomia devemos ter a < b ou b < a. Se a < b, pelo teorema anterior, temos, ac < bc, contradizendo a hipótese de que ac = bc, da mesma forma, b < a ⇒ bc < ac, também contradiz a hipótese. Logo, a = b.

 Teorema 2.4.12. Sejam a, b ∈ N. Temos que a < b se, e somente se, a + 1 ≤ b.

Demonstração.

(⇒) a < b ⇒ b = a + p, com p ∈ N∗, assim, podemos escrever p = s(p1) = p1+ 1, com p1 ∈ N.

Temos: b = a + p ⇒ b = a + (p1+ 1) ⇒ b = (a + 1) + p1 ⇒ b ≥ a + 1.

(⇐) a + 1 ≤ b ⇒ b = (a + 1) + p, p ∈ N ⇒ b = a + (p + 1) ⇒ b = a + s(p). Obviamente s(p) ∈ N∗, logo, b > a, como queríamos.

 Concluímos da relação de ordem em N que, se a ∈ N, então, a < s(a), pois s(a) = a + 1. Dessa forma 0 < 1 < 2 < 3 < . . .. Notemos, ainda, que não existem naturais entre a e s(a), para todo a ∈ N, pois a < r < a + 1 implicaria, pelo teorema anterior, que a + 1 ≤ r < a + 1, ou seja, a + 1 < a + 1, o que não pode acontecer.

(36)

O próximo teorema aborda um conceito intuitivamente claro desde o Ensino Fundamental: todo subconjunto não vazio de números naturais possui um menor elemento. Mas antes dele introduziremos o conceito de menor elemento.

Denição 2.4.13. Dado um conjunto ordenado A, dizemos que a ∈ A é um menor elemento de A se a ≤ x para todo x ∈ A.

Proposição 2.4.14. Se A é um conjunto ordenado que admite um menor elemento, então este menor elemento é único e chamado de elemento mínimo de A e denotado por minA.

Demonstração. Sejam a1 e a2 menores elementos de A. Como a2 é um menor elemento de A,

temos que a2 ∈ A e ainda, como a1 ≤ x, ∀x ∈ A, temos que a1 ≤ a2. Da mesma forma,

a1 ∈ A e a2 ≤ x, ∀x ∈ A, logo a2 ≤ a1. Se a1 ≤ a2 e a2 ≤ a1, pela antissimetria a1 = a2,

como queríamos.

 De modo análogo ao que foi feito no teorema anterior, maxA é o maior elemento ou elemento máximo de um conjunto ordenado.

Teorema 2.4.15 (Princípio da Boa Ordem). Todo subconjunto não vazio de números naturais possui um menor elemento.

Demonstração. Seja S um tal subconjunto de N e consideremos o conjunto M = {n ∈ N | n ≤ x, ∀x ∈ S}. Claro que 0 ∈ M. Como S 6= ∅, tomemos s ∈ S. Então s + 1 /∈ M, pois s + 1 não é menor ou igual a s. Assim, M 6= N. Como 0 ∈ M e N 6= M, deve existir k ∈ M tal que k + 1 /∈ M, caso contrário, pelo princípio de indução, M = N.

Armamos que este k é o menor elemento de S, isto é, k = minS.

Como k ∈ M, então k ≤ x, ∀x ∈ S. Só falta mostrar que k ∈ S. Suponhamos que k /∈ S. Então k < x, ∀x ∈ S. Pelo teorema anterior teríamos k + 1 ≤ x, ∀x ∈ S, o que signicaria que k + 1 ∈ M, contradizendo a escolha de k.

Logo k ∈ S, como queríamos.

 Vimos que o Princípio de Indução implica no Princípio da Boa Ordem. Estes dois princípios são equivalentes. Neste caso assumimos o Princípio de Indução e provamos o da Boa Ordem, mas poderíamos ter assumido o da Boa Ordem e demonstrado o outro como teorema, conseguindo os mesmo resultados.

Proposição 2.4.16. Seja X um subconjunto de N satisfazendo os dois itens abaixo: 1. a ∈ X;

2. n ∈ X ⇒ n + 1 ∈ X.

Então, temos que {a, a + 1, a + 2, . . .} ⊂ X.

Demonstração. Queremos mostrar que se m ∈ N então a + m ∈ X, ou seja, queremos mostrar que Y = {m ∈ N | a + m ∈ X} = N. Consideremos Y dessa forma e apliquemos indução sobre ele:

(37)

1. 0 ∈ Y pois a + 0 = a ∈ X por denição de X;

2. Suponhamos agora k ∈ Y e provemos que k + 1 ∈ Y . Se k ∈ Y , então a + k ∈ X, daí, por denição de X, (a + k) + 1 ∈ X, ou ainda, a + (k + 1) ∈ X, o que signica que k + 1 ∈ Y . Logo N = Y .

 Proposição 2.4.17. Seja s : N −→ N a função sucessor. Para cada n ≥ 1, tem-se sn(0) 6=

sk(0), para todo k < n.

Demonstração. Seja X = {n ∈ N∗ | sn(0) 6= sk(0), ∀k < n}. Vamos mostrar, usando a

proposição anterior, que X = N∗:

1. 1 ∈ X, pois s1(0) = s(0) = 1 6= 0 = s0(0);

2. Seja n ∈ X, isto é, sn(0) 6= sk(0), para todo k < n. Apliquemos s a ambos os lados

dessa desigualdade, isto é, sn+1(0) 6= sk+1(0), para todo k < n. Podemos dizer que

sn+1(0) 6= sl(0) para todo l de 1 até n. Temos ainda que, sn+1(0) 6= 0 = s0(0), daí

sn+1(0) 6= s1(0), para todo l < n + 1, o que diz que n + 1 ∈ X, como queríamos. Sendo assim, por indução X = N∗.

(38)

Capítulo 3

Números Inteiros

Por conta do rigor matemático, não é adequado seguir a ideia de número inteiro que é introduzida na escola. Faremos aqui uma construção rigorosa com todas as demonstrações precisas deste conjunto numérico, através das noções básicas de Teoria dos Conjuntos e de relações de equivalência.

3.1 Relação de Equivalência em N × N

Deniremos aqui, um número inteiro como uma classe de equivalência dada por uma relação de equivalência no conjunto N × N. Dessa forma, o conjunto Z dos inteiros será o conjunto destas classes de equivalência. Em seguida, iremos denir duas operações em Z e mostrar que Z possui uma cópia algébrica de N. Deniremos a operação subtração em Z e nalizaremos a sua construção.

Comecemos então denindo esta relação em N × N e provando que é de equivalência: Denição 3.1.1. Sejam (a, b), (c, d) ∈ N × N. Dizemos que (a, b) está relacionado com (c, d) quando a + d = b + c. Denotaremos por (a, b) ∼ (c, d).

Teorema 3.1.2. A relação descrita acima é de equivalência. Demonstração.

1. Reexiva: Se (a, b) ∈ N × N, então a + b = b + a, por herança da comutativa em N, logo, (a, b) ∼ (a, b).

2. Simétrica: Se (a, b), (c, d) ∈ N×N e (a, b) ∼ (c, d), então, a+d = b+c, e disso, c+b = d+a, que signica, (c, d) ∼ (a, b).

3. Transitiva: Se (a, b), (c, d), (e, f) ∈ N × N, (a, b) ∼ (c, d) e (c, d) ∼ (e, f), temos que, a + d = b + c e c+f = d+e. Assim temos a+d+e = b+c+e e a+c+f = a+d+e, daí,

b + c + e = a + c + f ⇒ b + e = a + f ⇒ a + f = b + e. Logo, (a, b) ∼ (e, f).

(39)

Pensando de forma intuitiva, por um momento, considerando a subtração de inteiros, no-tamos que a + d = b + c é equivalente a a − b = c − d, isto é, dois pares ordenados são equivalentes, segundo a denição acima, quando a diferença entre suas coordenadas, na mesma ordem, coincidem.

Esta foi a forma encontrada pelos matemáticos do século XIX para iniciar a construção do conjunto Z sem mencionar a subtração, mas trazendo a sua essência, tendo como ponto de partida os naturais e suas operações.

Denotaremos por (a, b) a classe de equivalência do par ordenado (a, b) pela relação ∼, isto é, (a, b) = {(x, y) ∈ N × N | (x, y) ∼ (a, b)}. Exemplo 3.1.3. 1. (3, 2) = {(2, 1), (3, 2), (4, 3), (5, 4), . . .}; 2. (1, 7) = {(0, 6), (1, 7), (2, 8), (3, 9), . . .}; 3. (5, 4) = {(2, 1), (3, 2), (4, 3), (5, 4), . . .}. Podemos ver que (3, 2) = (5, 4).

Denição 3.1.4. O conjunto quociente N × N/ ∼ constituído pelas classes de equivalência (a, b) será denota por Z e chamado de conjunto dos números inteiros. Assim, Z = N × N/ ∼= {(a, b) | (a, b) ∈ N × N}.

3.2 Adição de números inteiros

Deniremos agora a operação (+) em Z que denominaremos por adição. Voltando à nossa intuição, se (a, b) expressa, em essência, a diferença (a − b) e (c, d) expressa (c − d), a mate-mática elementar nos dá (a − b) + (c − d) = (a + c) − (b + d). Esta última expressão se traduz em (a + c, b + d). Esta é a motivação para a denição formal de (a, b) + (c, d), que daremos a seguir.

Denição 3.2.1. Sejam (a, b), (c, d) ∈ Z. A soma (a, b) + (c, d) é dada por (a + c, b + d). Vamos mostrar a seguir que esta operação de adição está bem denida.

Teorema 3.2.2. Se (a, b) = (a0, b0) e (c, d) = (c0, d0), então, (a, b) + (c, d) = (a0, b0) + (c0, d0),

isto é, a adição de números inteiros está bem denida.

Demonstração. Como (a, b) = (a0, b0), temos que, (a, b) ∼ (a0, b0), ou seja,

a + b0 = b + a0 (3.1)

Da mesma forma,

(40)

Temos, por denição, que (a, b) + (c, d) = (a + c, b + d) e (a0, b0) + (c0, d0) = (a0+ c0, b0+ d0).

Devemos mostrar que (a + c, b + d) = (a0+ c0, b0+ d0). De fato, somando os primeiros e

segun-dos membros de (3.1) e (3.2), na ordem dada, obtemos,

(a + b0) + (c + d0) = (b + a0) + (d + c0) ⇒ (a + c) + (b0+ d0) = (b + d) + (a0+ c0). Portanto, (a + c, b + d) = (a0+ c0, b0+ d0), como queríamos.

 Teorema 3.2.3. A adição em Z é comutativa, associativa e tem (0, 0) como elemento neutro. Demonstração.

1. Comutativa: Devemos mostrar que, dados (a, b) e (c, d) em Z, temos (a, b) + (c, d) = (c, d) + (a, b). De fato, (a + b) + (c + d) = (a + c, b + d) = (c + a, d + b) = (c, d) + (a, b). 2. Associativa: Queremos mostrar que, dados (a, b), (c, d) e (e, f) em Z, temos (a, b)+((c, d)+

(e, f )) = ((a, b) + (c, d)) + (e, f )

(a, b) + ((c, d) + (e, f )) = (a, b) + ((c + e, d + f )) = (a + (c + e), b + (d + f )) = ((a + c) + e, (b + d) + f ) = (a + c, b + d) + (e, f ) = ((a, b) + (c, d)) + (e, f ) 3. Elemento Neutro: Dado (a, b) e (0, 0) em Z.

(a, b) + (0, 0) = (a + 0, b + 0) = (0 + a, 0 + b) = (0, 0) + (a, b) = (a, b)

 Teorema 3.2.4 (Cancelamento da Adição). Dados α, β, γ ∈ Z e α + β = γ + β, então α = γ. Demonstração. Seja α = (a, b), β = (c, d) e γ = (e, f). Assim,

(a, b) + (c, d) = (e, f ) + (c, d) ⇒ (a + c, b + d) = (e + c, f + d)

⇒ (a + c) + (f + d) = (b + d) + (e + c) ⇒ a + f = b + e

⇒ (a, b) = (e, f )

 Teorema 3.2.5. Vale a propriedade do elemento oposto: dado (a, b) ∈ Z, existe um único (c, d) ∈ Z tal que (a, b) + (c, d) = (0, 0). Este (c, d) é o elemento (b, a).

(41)

Demonstração. Provaremos inicialmente a existência deste elemento oposto e, em seguida, a sua unicidade.

Seja (a, b) ∈ Z. Tomemos (c, d) = (b, a) ∈ Z e assim,

(a, b) + (c, d) = (e, f ) ⇒ (a, b) + (b, a) = (e, f ) ⇒ (a + b, b + a) = (e, f ) ⇒ a + b + f = b + a + e ⇒ f + 0 = e + 0

⇒ (f, e) = (0, 0)

⇒ (a, b) + (c, d) = (0, 0).

Sendo assim, existe um elemento (c, d) = (b, a) ∈ Z, tal que, (a, b) + (c, d) = (0, 0). Suponhamos que existam dois elementos distintos desta forma, (c, d), (c0, d0) ∈ Z, isto é,

(c, d) 6= (c0, d0) ⇒ c + d0 6= d + c0. (3.3)

Como ambos são opostos a (a, b), temos:

(a, b) + (c, d) = (0, 0) ⇒ (a + c, b + d) = (0, 0)

⇒ a + c = b + d (3.4) e

(a, b) + (c0, d0) = (0, 0) ⇒ (a + c0, b + d0) = (0, 0)

⇒ a + c0 = b + d0 (3.5) Somando o primeiro membro de (3.4) ao segundo de (3.5) e o primeiro de (3.5) com o segundo de (3.4) obtemos:

a + c + b + d0 = b + d + a + c0 ⇒ c + d0 = d + c0,

o que contradiz (3.3). Portanto, (c, d) = (c0, d0), com queríamos.

 Denição 3.2.6. Dado α ∈ Z, o único β ∈ Z, tal que, α + β = (0, 0) chama-se simétrico de α (ou oposto de α, ou inverso aditivo de α). Sua unicidade permite que o denotemos por −α.

Dessa forma, α + (−α) = (0, 0) e, como visto, −α = (b, a). A existência e unicidade de oposto de um número inteiro permite que denamos uma terceira operação em Z, denominada subtração.

Denição 3.2.7. A subtração em Z, denotada por (−), é a operação denida da seguinte forma: se α, β ∈ Z, então α − β = α + (−β).

Assim, a subtração α − β é a soma de α com o oposto de β. Proposição 3.2.8. Para α, β, γ ∈ Z, vale:

(42)

1. −(−α) = α; 2. −α + β = β − α; 3. α − (−β) = α + β; 4. −α − β = −(α + β); 5. α − (β + γ) = α − β − γ; Demonstração.

1. Seja α = (a, b), então, −α = (b, a), e assim,

−(−α) = −(b, a) = (a, b) = α.

2. Seja α = (a, b) e β = (c, d). Claramente, −α = (b, a). Temos: −α + β = (b, a) + (c, d) = (b + c, a + d)

= (c + b, d + a) = (c, d) + (b, a) = β − α.

3. Seja α = (a, b) e β = (c, d), e assim, −α = (b, a) e −β = (d, c). α − (−β) = (a, b) − (d, c)

= (a, b) + (c, d) = α + β. 4. Se α = (a, b) e β = (c, d), teremos, −α = (b, a) e −β = (d, c), e assim:

−α − β = (b, a) − (c, d) = (b, a) + (d, c) = (b + d, a + c) = −(a + c, b + d) = −((a, b) + (c, d)) = −(α + β).

5. Se α = (a, b), β = (c, d) e γ = (e, f), então, −α = (b, a), −β = (d, c) e −γ = (f, e) e assim:

α − (β + γ) = (a, b) − ((c, d) + (e, f )) = (a, b) − (c + e, d + f ) = (a, b) + (d + f, c + e) = (a, b) + (d, c) + (f, e) = α − β − γ.



3.3 Multiplicação dos inteiros

Deniremos a seguir outra operação em Z, a qual denotaremos por (·) e chamaremos de produto. Pensando intuitivamente, se (a, b) nos expressa (a − b), (c, d) expressa (c − d) e

(43)

(a − b) · (c − d) = a · c + b · d − (a · d + b · c), temos a motivação para a seguinte denição. Denição 3.3.1. Dados (a, b) e (c, d) em Z, denimos o produto (a, b) · (c, d) como sendo (a · c + b · d, a · d + b · c).

Teorema 3.3.2. A multiplicação em Z está bem denida, isto é, se (a, b) = (a0, b0) e (c, d) =

(c0, d0), então, (a, b) · (c, d) = (a0, b0) · (c0, d0).

Demonstração. Seja (a, b) = (a0, b0), isto é, a + b0 = b + a0, que nos fornece:

ca + cb0 = cb + ca0 (3.6) e

da + b0d = bd + a0d. (3.7) Somando as equações (3.6) e (3.7) obtemos

ac + bd + a0d + b0c = ad + bc + a0c + b0d (ac + bd, ad + bc) = (a0c + b0d, a0d + b0c)

(a, b) · (c, d) = (a0, b0) · (c, d). (3.8)

Do mesmo modo, (c, d) = (c0, d0) ⇒ c + d0 = d + c0, de onde obtemos:

a0c + a0d0 = a0d + a0c0 (3.9) e

b0c + b0d0 = b0d + b0c0. (3.10) Novamente somando as equações (3.9) e (3.10) obtemos

a0c + b0d + a0d0+ b0c0 = a0d + b0c + a0c0+ b0d0 (a0c + b0d, a0d + b0c) = (a0c0+ b0d0, a0d0+ b0c0)

(a0, b0) · (c, d) = (a0, b0) · (c0, d0). (3.11)

Dessa maneira, observando (3.8) e (3.11), obtemos que

(a, b) · (c, d) = (a0, b0) · (c0, d0),

como queríamos.

 Teorema 3.3.3. A multiplicação em Z é comutativa, associativa, tem (1, 0) como neutro mul-tiplicativo e é distributiva em relação a adição. Além disso, vale a propriedade do cancelamento multiplicativo, isto é, se α, β, γ ∈ Z, com γ 6= (0, 0) e αγ = βγ, então α = β.

Referências

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