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A solução dos transatlânticos 1

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Academic year: 2021

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A solução dos transatlânticos

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Maria Helena Werneck

João do Rio anuncia a abertura da temporada de teatro do inverno de 1908 no Rio de Janeiro e, em seguida, toma partido do público carioca contra o queixume dos artistas nacionais diante da lotação nas salas onde se apresentam espetáculos de companhias europeias.2 Segundo o cronista, com a chegada das “andorinhas estrangeiras”, nossos artistas apanham o rumo das estradas para a peregrinação estadual em regime mambembe, enquanto cada teatro “oferece permanentemente o espetá-culo de uma enchente e ganha dinheiro a zarzuela, ganham dinheiro o drama e a opereta italiana, ganham dinheiro as companhias portugue-sas” (Peixoto, 2009, v. i: 71).

Embora não sejam exigentes, as plateias do Rio de Janeiro sabem reconhecer quando a troupe trabalha com ordem, disciplina, “em esforço contínuo, persistente, desesperado de agradar”, segundo o

escri-1 Este texto resulta de pesquisa que integrou o projeto Poéticas do cotidiano no contexto

lusófono, Cátedra PE. António Vieira de Estudos Portugueses – PUC-Rio/FAPERJ, 2010. O

levantamento de textos de atores portugueses foi realizado no Museu Nacional do Teatro em Lisboa, contando com o entusiasmo de seu diretor, Dr. José Alvarez, e com a eficiên-cia da bibliotecária Guida Bruno. Reflete-se aqui, também, a participação da autora no Workshop Teatrical Trade Routes, realizado em março de 2011, no instituto de Teatro da Universidade de Munique, no âmbito do Projeto Global Theatre Histories, coordenado por Christopher Balme, cuja proposta encontra-se publicada na parte final desse volume.

2 João do Rio é o pseudônimo mais conhecido de Paulo Barreto. Nas colunas sobre teatro

também assinou como José Antonio José e Joe (Peixoto, 2009, v. i: 16). Sobre a obra de

João do Rio, verificar também “João do Rio: o artista, o repórter e o artifício à entrada de uma modernidade periférica” (Gomes, 2005).

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tor. Mesmo quando o resultado é modesto e não se tem a qualidade de mise-en-scène, de vozes e de repertório, como em apresentações de Antoine, de Réjane ou de Guitry, percebe-se que há trabalho, há ensaio, há atores querendo sobressair, com “vontade louca de subir no conceito do público”.

Enquanto o público compara espetáculos em cena e vai ao estran-geiro, como João do Rio fará algumas vezes, alguns atores nacionais também correm aos navios, fazendo opção inversa dos que preferem as praças de teatro no próprio país. Em outro movimento, certas compa-nhias estrangeiras estendem sua permanência no Brasil por oito meses, muito mais, às vezes, do que o tempo despendido em temporadas nos países de origem. Assistindo a tudo, João do Rio proclama uma nova era para as artes da cena: “artistas transatlânticos, teatro transatlântico”. Para superar, portanto, a decadência que identifica no panorama no teatro nacional, uma solução moderna se apresenta: a solução dos transatlân-ticos (Peixoto, 2009, v. I: 73).

A bordo do Rei de Portugal, da Mala Real Portuguesa (1893), do

Melange (1899), do Paquete Clyde, da Mala Real Inglesa (1902 e 1905), do Danube (1903) entre outros navios, viajou Carlos Santos, filho de grandes

atores portugueses da segunda metade do século XIX, Amália Vieira e José Carlos Santos. Sua descrição das turnês e de algumas viagens “abala-das” ao Brasil constroem uma visão, por vezes pitoresca e entusiasmada, com doses de observação realista acerca dos empreendimentos de circu-lação do teatro e das rotas de teatro na passagem dos séculos.

As viagens de navio se faziam longas o suficiente para que se tor-nassem oportunidade de convívio entre atores unidos pelo empresário responsável pela turnê ou, em certos casos, a ocasião de participar de rituais de estrelato. Narrativas de Carlos Santos indicam que o trajeto transatlântico aproxima atores e atrizes que, antes da travessia, tinham contrato em diferentes companhias, nas quais desenvolviam repertórios diversos. A lógica das turnês é, portanto, a de primeiro reunir grandes nomes, e garantir-lhes as suas “possibilidades artísticas” em peças em que atuaram e tiveram sucesso comprovado, de modo a se constituírem variantes de programas. A esses grandes nomes, integram-se outros ato-res que possam se incumbir de papéis menoato-res, uma fórmula convertida

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em “lucros apreciáveis”. Quando, em 1892, parte para uma temporada no norte e nordeste do Brasil, com responsabilidade de organizar a com-panhia e o respectivo repertório, o ator, fazendo às vezes de empresá-rio, sabe que conta com três estrelas: Georgina Pinto, protagonista de

A estrangeira, que “já havia desempenhado o mesmo papel no D.

Amé-lia, quando fazia parte da Companhia Rosas e Brasão”; Fernando Maia, fazendo a “perversão desdenhosa e altaneira do Duque de Sepmonts”, na mesma peça; e Amélia Vieira, sua mãe, que encabeça o elenco de Tosca, de Sardou, tal como fez por anos no Teatro do Príncipe Real, em Lisboa, e em ano anterior no Rio de Janeiro.

A Carlos Santos, nas turnês, sempre couberam papéis menos importantes, o que, se por um lado lhe garante uma percepção clara de seus limites como intérprete (a ponto de recusar papel que lhe exigi-ria empenho incompatível com a velocidade das turnês e, no entanto, ter ainda garantido o alento dos colegas brasileiros em espetáculo em homenagem a ele), por outro imprime aos relatos uma percepção menos central e menos ególatra dos acontecimentos. Dois episódios de navio são interessantes no sentido da constituição de diferentes atmosferas de cotidiano de artistas em turnês, narrados por quem não está no centro dos acontecimentos.

Quando viajava no Clyde, integrando elenco arregimentado por Eduardo Vieira em 1904, para turnê que começaria em São Paulo, no Teatro Santana, Carlos Santos pôde “observar discretamente, durante a travessia, a vida exterior dessa colmeia artística chefiada pelo drama-turgo Nicodemi”, de que fazia parte a atriz Réjane, contratada para uma récita no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, além de outros franceses (Santos, s/d: 146).

O que chamou atenção do ator português foi o protocolo que Réjane exigia de seus colegas, durante a viagem, de modo a manter “mais espe-taculosa sua superioridade de primeira figura”:

Assim, chegada a hora do jantar, já com todos os passageiros em toilette, ocupando as respectivas mesas espalhadas pelo salão, jorros de luz artis-ticamente distribuídos, é dentro desse cenário que os seus colegas aguar-dam, em torno da mesa que lhe está reservada, a aparição de Mme. Réjane, que tem a coragem de esperar que o sexteto de bordo ataque o primeiro número do concerto, para fazer sua entrada até ocupar a cabeceira do

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tabernáculo! Então, Grand, dum lado, e Duboc, do outro, despojam-na da capa que lhe põe a descoberto a toilette, uma e outra variando dia a dia. Dessa forma a grande comediante começa já a bordo a preparar, à laia de pró-logo, o reclamo da próxima exibição no palco do Municipal. (Ibidem: 147).

O saboroso relato tem continuidade numa cena de convés, ainda na penumbra do amanhecer, quando o ator é confundido pela atriz com o namorado Nicodemi. A consequência do engano ou “pequena tragédia, provocada por um café temperado com amor”, indevidamente oferecido ao desconhecido, não foi a curiosidade ou a simpatia da atriz em relação ao ator português, mas o insistente olhar “de soslaio com visível antipa-tia” durante o resto da viagem (Ibidem: 147).

Quando se trata de seguir a costa do sul do Brasil, partindo de São Paulo, rumo a Santos, Rio Grande e Porto Alegre, com uma empreitada de Eduardo Victorino, a vantagem do longo convívio desfaz “a morri-nhenta nostalgia que se apodera de cada artista” (Santos, s/d: 150). No relato, destacam-se Chaby Pinheiro em “imitações chocarreiras de crou-pier da baccará, de fakir ou conferente sobre os mais absurdos e dispara-tados problemas” (Ibidem: 150) e outros integrantes da trupe que fazem as vezes de quiromantes, promovem saraus e bailes à fantasia, ocasião em que os figurinos das peças do repertório são distribuídos a todos os passageiros.

Chaby Pinheiro, em sua primeira travessia rumo ao Brasil, também no Rei de Portugal, narra como a companhia colaborava no entreteni-mento dos passageiros:

A viagem durou dezassete dias e não teve incidente de notar. O comandante Fife, e todos, eram atenciosíssimos para nós; e a comida bastante boa. Uma noite, demos espetáculo, com a comédia em três actos Que sogra! E monólogos. Os oficiais distribuíam caixas de doces às atrizes e caixas de charutos aos homens; estava eu a sentir-me roubado, visto que nunca fumei, quando a Izabel Berardu me propôs trocar a minha caixa pela dela – que eram de grandes ameixas de Elvas. Assim se fez. O António de Sousa já então fumava desalmadamente. (Colaço; Braga, 1938: 86).

Este clima de boa camaradagem que cerca as turnês no decurso da viagem marítima decorre do bom planejamento econômico da emprei-tada, incluindo a publicidade providenciada pelo empresário e a certeza de acolhimento pelo público nas cidades a serem visitadas pelos

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espetá-culos.3 Estamos já distantes da visão segundo a qual a metrópole deseja desenvolver nas colônias uma missão civilizatória, paralelamente à sua expansão econômica, tal como pensava Portugal no século XVIII e se pretendeu realizar com o Teatro Real de São João no início do século no Rio de Janeiro.

Não há exatamente, no contexto pós-colonial, consumada a inde-pendência e a república no Brasil, resquícios, no início do século XX, da justificativa de levar ao outro lado do oceano o passado histórico e artístico da Europa, através de gêneros teatrais, tal como ainda praticada em relações coloniais envolvendo países do Oriente. McClellan analisa a função civilizatória da instalação da ópera pelos franceses na Indochina. Segundo ele, a presença física dos edifícios teatrais em combinação com as menos tangíveis performances da ópera corporifica ao mesmo tempo o glorioso passado da metrópole e o triunfante futuro da colônia. Se, inicialmente, chegavam à Indochina pequenos grupos de espetáculos musicais no formato café-concerto, e não havia oferta formal de teatro, o panorama se altera na última década do século XIX, quando começam a aportar em Hanói e Haipong trupes mais numerosas. O governo colonial decide constituir uma comissão teatral a quem cabe analisar propostas e contratar um empresário para cada temporada. Depois de contratado, o empresário parte para cidades europeias em busca de elencos para os espetáculos. Na semana de estreia em ambas as cidades, a comissão teatral supervisiona os espetáculos, tendo poder de veto a artistas e a espetáculos ainda na primeira semana da turnê. Todo o planejamento e supervisão, no entanto, pode desmoronar quando não há compati-bilidade entre o espetáculo e os espaços disponíveis na cidade para a

3 Fazendo uma análise da temporada de 1908, Elza de Andrade identifica que o teatro

bra-sileiro era praticamente despejado pelas companhias estrangeiras. “Ao teatro brabra-sileiro cabiam os meses de janeiro a abril, novembro e dezembro, que são até hoje os piores. Até mesmo a Companhia de Dias Braga se retira do seu teatro em 27 de abril para dar lugar à Companhia Portuguesa Taveira, que só se despede do público depois de auferir ótima bilheteria: A Companhia Taveira despediu-se solenemente do público e após cento e tantas noites com boas casas regressou a Lisboa. (...) Com exceção de uma revista já muito batida, todas as peças apresentadas agradaram; as récitas em que tomou parte a Sra. Palmyra Bastos constituíram a nota mais brilhante da saison de opereta (como se diz em linguagem smart) e o Sr. Rangel Júnior, que soube organizar com tino a temporada, deve estar, senão capitalista, como disse João do Rio, pelo menos satisfeito com a sua estreia como empresário. (O Malho, 19 set.1908, À luz das gambiarras) (Andrade, 1996: 49).

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apresentação do repertório selecionado pelo empresário. Em decorrên-cia dessas decisivas incompatibilidades entre repertório e espaço, tem início, então, um segundo movimento civilizatório, determinado pela defesa da construção de edifício da Ópera Municipal, que deveria refor-çar o sentimento de que a cidade era de fato uma extensão de Paris. (McClellan, 2003: 22).

Diferentemente, portanto, da retórica da expansão colonial como compromisso com a elevação educacional dos povos, pratica-se no Bra-sil, no início do século XX, o discurso da oferta livre do divertimento como manifestação cultural. Estaríamos, assim, próximos da ideia de circulação e troca como processo que menos transmite significados e mais se constitui em si mesmo como ato. Há, nesse caso, uma noção de performatividade no contato realizado nas turnês entre atores portu-gueses e público, entre atores e outros artistas e intelectuais locais, que permite novas perspectivas de análise do fenômeno:

Se circulação serve como uma construção útil para a análise cultural, é pre-ciso considerá-la mais do que movimento de pessoas, ideias e mercadorias de uma cultura para outra. No lugar disso, trabalhos recentes indicam que circulação é um processo cultural com suas próprias formas de abstração, avaliação e restrição, as quais são criadas pela interação de diferentes tipos de formas de circulação e das comunidades interpretativas construídas em torno delas (Lee; Lipuma, 2002: 192).

Percebido como processo de circulação de formas culturais, o tea-tro português apresentado em turnês pelo Brasil pressupõe a existência de comunidades interpretativas com suas próprias formas de recepção e avaliação. Elas não só determinam linhas de interpretação, mas também fundam instituições e estabelecem limites em suas próprias dinâmicas (Lee; Li Puma, 2002: 192).

Carlos Santos narra a passagem pelo Rio de Janeiro, em 1910, numa longa viagem que, partindo de Lisboa, fez escala em Cádiz, para que embarcasse uma companhia espanhola, rumando à Buenos Aires. Entre as lembranças da parada no Rio de Janeiro, destaca-se o Teatro Munici-pal, como lugar de palestras e discussões nas quais se empenhavam em ocasiões anteriores e na recente viagem homens como Arthur Azevedo, Coelho Neto, Olavo Bilac, Paulo Barreto. Em certa ocasião, inclusive, não faltaram convites de Coelho Neto para que os atores ministrassem

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aulas na Escola Dramática,4 marcando uma convivência respeitosa na esfera pública teatral.5

Já Chaby Pinheiro não faz diferença entre as relações com os inte-lectuais, os homens ricos da sociedade carioca e os membros da família, que reencontra nas turnês:

Mas voltemos ao Rio de Janeiro.

Entre as muitas pessoas a quem Lucinda (Lucinda Simões) amavelmente me apresentou, contavam-se Arthur Azevedo – o Sarcey brasileiro –, Olavo Bilac, Guimarães Passos, Luiz Murat, José do Patrocínio; mais tarde Emí-lio de Menezes, Henrique Câncio, os Bernardelli, o Dr. Barbosa Romeo, e a família Neto Machado, que então dava recepções semanais em seu pala-cete em Botafogo. (Colaço; Braga, 1938: 89).

Também é possível perceber que as turnês consideram especial-mente a presença de representantes da colônia portuguesa na plateia dos espetáculos. A nostalgia da pátria distante cria o principal apelo para a presença das companhias, explicando-se a diversidade no repertório como uma forma de oferecer uma gama de produtos que pudesse aten-der a gostos diferenciados do público e provocar a curiosidade de assis-tir a toda a programação.

Ao relatar o sucesso da turnê de 1902 pela região Norte e Nordeste do Brasil, Carlos Santos explica:

A nossa Companhia deparou o mesmo êxito de público e imprensa, tanto em Pernambuco como na Bahia, agrado este que sem dúvida beneficiou do acolhimento, por vezes delirante, que lhe dispensara a plateia do Pará. Esse agrado há que atribuí-lo à escolha selecionada do repertório, que ia do alto drama à comédia desopilante, servido por uma Companhia devi-damente organizada, apta a defrontar um público inteligente e acolhedor e a quem também não seria estranho o sentimento patriótico da colónia portuguesa, que via nesses artistas uma espécie de embaixada teatral por 4 Carlos Santos informa ter sido convidado por Coelho Neto para se estabelecer no Rio de

Janeiro como professor. Tendo declinado do convite, o lugar foi aceito por outro ator da companhia, Augusto de Melo, mas apenas durante a temporada carioca (Santos, 1950: 177).

5 A proximidade com autores brasileiros não resulta em circulação europeia do teatro, no

sentido de adoção de textos brasileiros nos repertórios das companhias, assim como são pouco frequentes no início do século XX as turnês de artistas brasileiros em palcos de

Por-tugal. O retorno dos artistas aos palcos lisboetas é, frequentemente, apresentado como um período de reposicionamento de atores e atrizes nos teatros locais para que seja dada partida a novas temporadas (Santos, 1950: 125).

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forma a facultar-lhe com seus aplausos o ensejo de mitigar saudades da pátria distante. (Santos, 1950: 125).

Mais do que saudades, a presença dos artistas portugueses se posiciona num circuito eficaz de trocas de interesses e apoios mútuos, reforçam sociedades civis que mobilizam fortes redes de empregados do comércio urbano. Segundo Moraes, ainda são necessárias pesquisas acerca do potencial associativo e atuante da população portuguesa como consumidora e promotora de cultura na cidade do Rio de Janeiro, já que “numerosos e capitalizados, os portugueses do Rio de Janeiro ainda apresentariam outra característica fundamental, seu ‘perfil associativo’”, que se revela em inúmeras agremiações e associações.6

Nos relatos de Chaby Pinheiro, encontra-se a descrição valiosa do funcionamento cotidiano dessa rede de apoios entre comerciantes e artistas portugueses, apresentada com a pena da comédia de costumes:

Alguns dias depois de chegar ao Rio, estava eu na Rua do Ouvidor, ponto obrigatório depois dos ensaios, quando fui abordado por um indivíduo que sobraçava um grande embrulho de oleado, amarrado com correias. Cumprimentou-me, risonho, com uma pregunta afirmativa: – “O senhor é que é o Chaby?” E eu respondi-lhe a sorrir: – “Dizem que sim”.

– Pois eu estou encarregado pelo Comendador Ramalho Ortigão, dono do Parc Royal, de o levar lá ao estabelecimento. É aqui a dois passos, no Largo do São Francisco. E não se admire. Nós cá somos assim. Não pode-mos perder tempo com salamaleques e apresentações. O Comendador não pode andar pela rua porque não quer largar o estabelecimento, e eu ando sempre pela rua porque sou caixeiro de praça da casa João Reinaldo, Coutinho & Cia; chamo-me Pantaleão, e tem um criado às suas ordens. Quere acompanhar-me? Achei-lhe graça, e lá fomos para o Parc-Royal. Da entrada, amigo Pantaleão bradou:

– Comendador ! Cá está o homem!

6 Algumas agremiações tinham funções comerciais, trabalhistas ou beneficientes, tais como

a Comissão Portuguesa pró-pátria, o Clube Lusitano de Niterói, o Clube Ginástico Portu-guês ou a Sociedade Beneficente Bittencour da Silva. Atividades destas e de muitas outras associações lusitanas eram anunciadas diariamente pelas colunas das seções portuguesas de jornais de grande circulação da capital federal, como o Jornal do Commercio ou O Paiz. Certas agremiações davam prioridade às atividades culturais : o do Liceu Literário Português ou do Clube Dramático Português com suas apresentações em sedes locais ou mesmo nos palcos propriamente comerciais da cidade. (Moraes, Lire en ligne, Arteo-logie I), <http://librairie.immateriel.fr/fr/read_book/9788564941007/lucchesi_moraes>. Acesso em: 29 jan. 2012.

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– Oh Pantaleão ! Você é danado! Respondeu-lhe lá do fundo, um rapaz alto, magro, com bigode fino a torcer-se-lhe num sorriso irônico igual ao do senhor seu pai. O filho do grande escritor era das figuras mais insi-nuantes e mais cultas da colónia portuguesa. Estou a ouvi-lo, enquanto me indicava amalvelmente uma cadeira:

(...)

– Trata-se do seguinte. Nós somos da direção de uma Sociedade de Recreio, formada de rapazes do comércio, a Euterpe; a sede é ali defronte, na Rua do Teatro. Costumamos promover umas festas, e tínhamos o maior empenho que você fosse lá recitar, dando assim as primícias dos seus monólogos a um auditório português.

Acedi logo, e no sábado seguinte, depois do espetáculo, enverguei a casaca e lá fui; acolheram-me com uma ovação estrondosa, mal anunciei “Um romance”, versos de Júlio Dantas... Mais tarde, a um canto do bufete, e entre duas taças de Champangne, Vasco Ortigão preguntou-me, como por desfastio:

– Você faz aqui seu benefício?

Chaby Pinheiro. Montevidéu, 1899.

Foto: Dolce Hnós.

Museu Nacional do Teatro, Lisboa.

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