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ANÁLISE DE
CASOS
Conflitos entre a propriedade
intelectual e o direito da concorrência
no aftermarket automotivo
Direito Econômico II
Professor Dr. Leandro Novais e Silva Expositor: Diogo Lucas Martins
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Interface entre PI e
Concorrência
///
Surgimento de novas tecnologias no final do século XIX – PI como elemento-chave nas teorias que explicam o desenvolvimento econômico
Teoria de Joseph Alois SCHUMPETER (1883-1950) - “Capitalismo, sociedade e democracia”( 1942) - Conceito de “destruição criadora”
As inovações, quando implementadas por setores líderes na economia, em um primeiro momento promovem uma expansão que distancia a economia de seu ponto de equilíbrio, gerando altos lucros para o inovador. Com o tempo, a rentabilidade vai se dissipando, à medida que as inovações vão sendo adotadas por um número cada vez maior de seguidores. Por fim, a economia se contrai, tendendo a retornar a seu ponto de equilíbrio.
Assim, cada nova tecnologia retira ou diminui o valor de tecnologias anteriores, sendo o progresso consequência lógica desse processo, que é, ao mesmo tempo, destruidor e criativo (BRANCHER, 2008).
4
Interface entre PI e
Concorrência
///
Direitos de PI como INCENTIVO ao processo inventivo
Exclusividade = “recompensa” pelo esforço e custos empregados (P&D), mas… que limita a concorrência no momento imediato (também chamada de concorrência estática), por vezes criando uma espécie de monopólio temporário, ainda que, posteriormente, tal proteção fomente a concorrência de uma perspectiva mais dinâmica.
“Monopólio instrumental” – “a exclusividade recai sobre um meio de se explorar o mercado, sem evitar que, por outras soluções técnicas diversas, terceiros explorem a mesma oportunidade de mercado” (Dênis Borges Barbosa)
“TENSÃO” entre PI e CONCORRÊNCIA = exclusividade temporária
pode ser objeto de eventuais abusos por parte de agentes
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Caso ANFAPE
• Quem?
ANFAPE (Associação de
FIAPs
)
• Quer o quê?
Abertura de Procedimento Administrativo com vistas à
não oposição aos FIAPs dos registros de desenho industrial.
• De quem?
FIAT, Volkswagen, Ford
(Montadoras)
• Por quê?
Abuso do direito de propriedade industrial. Ações judiciais
(busca e apreensão de peças paralelas) e extrajudiciais (notificações)
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O que é a
Associação
Nacional dos
Fabricantes
Auto
PEças?
///
Criada em 14/06/2007Sede em São Paulo (capital)
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Representa empresas do segmento automotivo independente2
Processo Administrativo
nº
08012.002673/2007-51
FIAPs =
Fabricante Independente de Autopeças7 EDUCATIO N COMMERCI AL
Mercado
Secundário
Aftermarket/Pós-vendas
Montadoras X Independentes Serviços PeçasMercado
Primário
Foremarket Equipamentos Peças mecânicas(motor, freio, suspensão)
X
Peças sobressalentes
must-match/crash parties
(capô, para-choque, lanterna, porta)
Cenári
o
Montadora X Montadora Venda veículo8
Qual é o
9
Tutela do Desenho
Industrial
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///
o que é Desenho
Industrial ?
Criação estética. (art. 95 da Lei 9.279/96)
Newton Silveira (Direito de Autor no Design. São Paulo: Saraiva, 2012, Pág.70):
- Objetos de caráter meramente ornamental
- Forma desvinculada da função técnica (modelo de utilidade)
Requisitos:
a) ORIGINALIDADE (configuração distintiva de objetos anteriores – não configura cópia),
b)NOVIDADE (não está compreendido no estado da técnica) e
c) PRODUÇÃO EM ESCALA INDUSTRIAL;
Prazo de vigência de 10 (dez) anos, prorrogável por 3 (três) períodos sucessivos de 5 (cinco) anos cada, totalizando, assim, 25 (vinte e cinco) anos de proteção.
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A importância do Desenho
Industrial
Proteção do Design - diferencial competitivo almejado
pelas montadoras, incrementa desejo do consumidor por seus veículos
Recompensa por P&D.
Incentivo à inovação.
53 13
LOGOT YPE
53 14 LOGOT YPE
Mera
Coincidência?
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O que motiva a
efetiva ida das
montadoras para o
pós-vendas?
LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE LOGO HERE Garantia estendidaDesign mais atraente Maior conforto e economia Melhores condições de venda ___________________________________
O contexto do caso
///
Pós 200016
2007
Contexto do mercado
FORD x
Coga e Coga (FIAP)
200
2
VW XMercado Car (FIAP)
2005
FIAT X
Centauro Latarias (FIAP)
2007
///
• Ações
judiciais
(busca e
apreensão
)
• Notificaçõ
es
extrajudici
ais
• Representaç
ão junto ao
CADE
Sham litigation?17 REPRESENTADAS
O objeto da representação
///
X
REPRESENTANTEQuestão controvertida:
• Exercício abusivo do direito de propriedade industrial (desenho industrial) no mercado secundário.
Fundamentos:
• Domínio de mercado relevante e exercício abusivo de posição dominante
art. 20, II e IV da Lei 8884/94 / art. 36, II e IV da nova Lei
• Criação de dificuldade para desenvolvimento de concorrente
art. 21, V da Lei 8884/94/ art. 36, §3°, IV da nova Lei
18 FIAPs
Mercado “Liberalizado”
Fabricante independe nte Distribuid ora Peça Paralela Peça original Peça Genuína Varejo Concessioná ria Linha de produçã o Montado ra Oferta elevada Substituibilidad e Preços competitivos Qualidade dos produtos19 NATURE
Mercado “Protegido”
Baixa oferta Competição ? = ausência de substituibilidade Preços elevadosQualidade das peças –
questionável. Obsolescência planejada? Linha de produçã o Montado ra Fabricante Concessioná ria Varejo Peça genuína
20
Reflexo da baixa
oferta de peças
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Demais consequências
Ausência de peças
Sustenta o mercado de desmanches clandestinos
Estimula o crime organizado: encomenda de peças através do roubo/furto de automóveis.
Elevação dos valores dos seguros
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O “superotimismo” do
consumidor
•
Economia Comportamental e
viés (erro sistemático de
julgamento) otimista do
consumidor.
•
Prova: menos de ¼ da frota
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O efeito “lock
in”
• A aquisição do produto novo exige
investimentos tão altos que o proprietário é impelido à manutenção corretiva.
• Ausência de substituibilidade (salvo exceções).
• Exemplo de mercado sem efeito lock-in:
aparelho de barbear
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Breve histórico do caso
• Em 04/04/2007, SDE instaurou uma averiguação preliminar, em decorrência de representação oposta pela Anfape (que foi constituída neste ano), em face das 3 montadoras instaladas no Brasil: (1) Volkswagen, (2) Fiat e (3) Ford.
• Em 03/2008, a SDE sugeriu o arquivamento da averiguação preliminar: uso regular do direito de PI.
• Em 06/2009, a ProCade também sugeriu o arquivamento da averiguação preliminar: idem.
• Em 03/2010, o MPF emitiu parecer, no âmbito da averiguação preliminar, sugerindo a instauração de um PA.
• Em 12/2010, o Tribunal do CADE acompanhou voto do C. Carlos Raggazo, que determinou a instauração do PA à SG.
• Em 27/04/2011, o PA em questão foi instaurado pela então SDE, enquadrado em abuso de posição dominante com o fim de impedir ou dificultar a atuação de concorrentes (art. 20, incisos 1, II e IV, e art. 21, incisos IV e V, da Lei n° 8.884/94).
• Em 2016, a SG entendeu pela condenação das 3 montadoras, sugerindo multa e o fim do RDI no aftermarket.
• Em 2017, a ProCade, o MPF e o voto-relator sugerem a condenação das 3 montadoras.
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Argumentos das montadoras
envolvidas
1. Necessidade de recuperação dos custos em P&D.
2. Desestímulo à inovação.
3. Qualidade e segurança da peças produzidas pelos
FIAPs.
4. Contrafação:
peças
independentes
falsamente
comercializadas como originais .
5. Cream skimming: exploração seletiva pelas FIAPs
6. As montadoras fazem uso regular do direito
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Respostas do C. Ragazzo e C. Paulo Burnier
1. Remunerar P&D custo baixo, recuperado no mercado primário
2. Desincentivo a inovação Não existe inovação nesse mercado de reposição, uma vez que as peças objetivam restaurar a aparência original do bem (impertinência do tunning)
3. Qualidade e segurança Desenho Industrial não garante qualidade e segurança – ademais, a maioria das empresas independentes investem em certificação ISO e já estão no mercado desde antes da década de 80.
4. Contrafação Diferente: peça paralela X peça pirata.. Contrafação é ilícito independente de haver registro de desenho industrial.
5. Cream skimming inexiste prova de custo maior das montadoras
6. As montadoras fazem uso regular do direito abusividade
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Outras questões debatidas
6. Ilegitimidade da ANFAPE (a) registro regularizado em 14/6/07, antes da instauração da averiguação preliminar (15/6/7); (b) Lei 9.784/99 não exige 1 ano de constituição; (c) princípio da oficialidade
7. Terceiros interessados Lei 9.784/99 , art. 9°. Impacto ainda que indireto configura interesse.
8. Incompetência do CADE Debate não sobre regularidade do procedimento do registro, mas exercício abusivo do direito em detrimento da concorrência.
9. Sham litigation Inexistente: há algum fundamento + ação não fundamentada em base enganosa.
10.Preços abusivos Como consequência, e não como conduta autônoma
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Posição da C. Cristiane Alkimin J. Schmidt
• As montadoras pediram ao INPI o direito de terem o RDI sobre algumas peças/carro, que ocorreu de forma legitima e não fraudulenta. O INPI concedeu. Logo, afastou-se a possibilidade de fraudes no pedido de RDI;
• A ANFAPE copia peças com RDI há mais de 13 anos. Montadoras reclamaram (ações infrativas). ANFAPE reclamou (ações de nulidade). Uso correto da Justiça. Afastou-se a possibilidade do sham litigation;
• As FIAPs não podiam ter a “expectativa” de que podiam copiar peças com RDI, estando à margem da lei;
• Não houve má-fé das montadoras, mas das FIAPs. Afinal, há “expectativa” de que as Leis sejam respeitadas; LPI: não limita o uso do RDI ao foremarket e nem até a montadora recuperar seus investimentos;
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Posição da C. Cristiane Alkimin J. Schmidt
• A ANFAPE comete crime: produz peças com RDI sem licença há mais de 13 anos, que é crime (LPI, art 187/188). Mesmo que a regra mude no futuro; o passado as condena;
• Cade não deve chancelar prática criminosa: a partir de 2007, ANFAPE passou a querer produzir peças com RDI sem licença no aftermarket. Não há extensão indevida do foremarket para o aftermarket pelas montadoras;
• Jurisprudência é clara. Todas as ações infrativas deram ganho de causa para as montadoras (que inclui uma que entendeu ser crime o que faz a FIAP). Apenas uma ação (de nulidade) deu ganho a FIAP (contra a Ford);
• Não há provas para condenação: os ”efeitos anticompetitivos” são consequências da Lei, não da conduta das montadoras. Portanto, não há infração à ordem econômica;
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INOVAÇÃO
OU
EXCLUSÃO?
“O fato de uma patente ser obtida não torna o titular da patente imune às leis antitruste. Ao titular da patente que usa seus direitos de patente não só como um escudo para proteger sua inovação, mas também como uma espada para estripar competição injustamente, este agente deverá ser responsabilizado por violações antitruste”. (EUA – Nintendo x Atari)
H
A obtenção regular de direito de PI torna lícita qualquer forma de seu exercício?
Abuso no procedimento de registro ≠
abuso no exercício do direito
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Newton Silveira:
“Partes isoladas do desenho industrial de
um produto seguem sendo um desenho
industrial?”
Desvio de função? Por que montadoras
registram desenho industrial de partes
do automóvel?
• Proteger design do veículo, ou
• Impedir atuação FIAPs?
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O que nos diz a experiência
internacional?
Discussão sobre o uso do desenho industrial a partir da décade de 1990. Denúncias a paritr de 2004 (FORD)
EUA
Denuncias desde a década de 1980 (Itália)
EUROPA
Solução do caso em 2003
33
34
Europa
Legenda:
• Azul: Estados-membro com uma Cláusula de reparos e,
assim, com livre concorrência no mercado secundário.
• Vermelho escuro: França - nenhuma regra de reparação e
implementação rígida do projeto de proteção.
• Vermelho claro: Estados-Membro sem uma Cláusula de
reparação onde os órgãos ainda não se posicionaram acerca das diretrizes no que tange às peças de reposição • Vermelho/azul tracejado: Alemanha - Garantia das
montadoras ao Governo alemão para não usar (possível) projeto proteção para dificultar a concorrência nas peças de reposição no mercado até que a questão de peças de reposição é resolvida em nível da UE.
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Austrália
• Solução legislativa – Design Act (2003)
• Proposta de alteração legislativa da Lei de PI (Denis
Borges Barbosa):
Art. 109 – A – O dispositivo no caput do artigo anterior não se aplica:
(...)III – aos fabricantes de acessórios, implementos e peças de reposição de bens de consumo
durável, que utilizem o objeto do desenho protegido exclusivamente para suprir a reposição, no
interesse do consumidor, de parte integrante de produto já vendido, desde que obedecidas às práticas leais de concorrência e mantidas as especificações de qualidade do elemento original. (BARBOSA, 2013)
No Brasil, sem alteração legislativa conduta das montadoras poderia ser punida?
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Movimento
“Right to repair”
Como o direito da
concorrência pode lidar com abusos?
ANTITRUSTE
Qual o futuro do setor?
REPARAÇÃO O uso da PI no aftermaket: inovação ou exclusão de concorrentes? INOVAÇÃO?
/////////
/////////
!
G
?
37
Sistemas Analógicos
Outra evidência: caso dos rastreadores
automotivos (Processo administrativo n.
08012.005818/2004-23)
Contexto: início da década de 1990 –
injeção eletrônica embarcada nos veículos
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CENTRAL
SENSOR
40
Restrição de
acesso
às informações
TENTATIVA E ERRO Assimetria de informações Venda casadaTratamento diferenciado entre concessionárias e independentes
Regulamento da Comissão Europeia nº
2400/2002: acesso à informação técnica deve ser franqueado a qualquer operador
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