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Bloco inicial de alfabetização (BIA) e queixa escolar : estudo de caso de uma escola pública do Distrito Federal

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Academic year: 2017

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Pró-Reitoria de Pós-Graduação em Pesquisa

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia

BLOCO INICIAL DE ALFABETIZAÇÃO (BIA) E QUEIXA

ESCOLAR: ESTUDO DE CASO DE UMA ESCOLA PÚBLICA DO

DISTRITO FEDERAL

Autor: Maria Augusta Alves Pimenta

Orientador: Prof.ª Dra. Erenice Natália Soares de Carvalho

Coorientador: Prof.ª Dra. Sandra Francesca Conte de Almeida

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MARIA AUGUSTA ALVES PIMENTA

BLOCO INICIAL DE ALFABETIZAÇÃO (BIA) E QUEIXA ESCOLAR:

ESTUDO DE CASO DE UMA ESCOLA PÚBLICA DO DISTRITO

FEDERAL

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Psicologia.

Orientador: Prof.ª Dra. Erenice Natália Soares de Carvalho Coorientador: Prof.ª Dra. Sandra Francesca Conte de Almeida

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Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

P644b Pimenta, Maria Augusta Alves.

Bloco inicial de alfabetização (BIA) e queixa escolar: estudo de caso de uma escola pública do Distrito Federal. / Maria Augusta Alves Pimenta – 2012.

248f. ; il.: 30 cm

Dissertação (mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2012. Orientação: Erenice Natália Soares de Carvalho

Coorientação: Sandra Francesca Conte de Almeida

1. Alfabetização. 2. Educação e Estado. 3. Prática de ensino. 4. Relações humanas. I. Carvalho, Erenice Natália Soares de, oriente. II. Almeida, Sandra Francesca Conte de, coorient. III. Título.

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Dissertação de Maria Augusta Alves Pimenta, intitulada Bloco Inicial de Alfabetização (BIA) e queixa escolar: estudo de caso de uma escola pública do Distrito Federal, apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, em 7 de março de 2012, defendida e aprovada pela Banca Examinadora abaixo assinada:

Prof.a Dra. Erenice Natália Soares de Carvalho Orientadora

Universidade Católica de Brasília – UCB

Prof.a Dra. Sandra Francesca Comte de Almeida Co-orientadora

Universidade Católica de Brasília – UCB

Prof.a Dra. Claisy Maria Marinho Araújo Membro externo

Universidade de Brasília – UnB

Prof.a Dra. Leda Gonçalves de Freitas Membro interno

Universidade Católica de Brasília – UCB

Prof.a Dra. Carmen Jansen de Cárdenas Membro interno

Universidade Católica de Brasília – UCB

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AGRADECIMENTOS

Ao amor incondicional e pleno que a tudo abarca, emoldurado na poesia do ritmo, numa infindável visibilidade e inviabilidade, harmonicamente sem tempo, como origem oculta de todas as coisas.

Aos filhos, Willian, Renata e Heloisa, e às netas, Ana Luíza, Sophia e Giulia, que muitas vezes se viram privados da mãe e da avó para deixar florescer a pesquisadora. À minha mãe, Vitória, notável modelo em expressão de resoluta fé, incansável guerreira a lutar pela vida dia a dia... fio a fio.

Ao sobrinho Rodrigo Sena pela preciosa paciência e atenção na formatação dos organogramas.

À colega Márcia Cabral, incansável amiga e companheira na trajetória do mestrado. À professora Erenice Natália Soares de Carvalho que, com carinho, partilhou tantas dúvidas, anseios e descobertas, parceira na tessitura desse novo desafio vencido.

À professora Sandra Francesca Conte de Almeida, que, como sempre, com muita sensibilidade e profissionalismo, mostrou-se parceira, educadora e pesquisadora, contribuindo com a orientação das ideias e das perspectivas, ancorando e direcionando minhas dúvidas a aportes teóricos-metodológicos, auxiliando-me a não perder de vista responsabilidades pessoais e sonhos de uma educação pública de qualidade, solidária, justa e cidadã.

À professora Leda Gonçalves de Freitas, por sua acolhida pessoal e profissional e pela primorosa ajuda na revisão do projeto de pesquisa.

À professora Claisy Maria Marinho Araújo, pela participação na banca examinadora e pelas ricas e primorosas contribuições dadas à análise do projeto de qualificação.

À diretora da Escola Desafios do Aprender e sua equipe gestora, mas, principalmente, à coordenadora e aos professores dos terceiros anos-BIA, pela disponibilidade de tempo e atenção para as entrevistas e o preenchimento do questionário. Foram, estes profissionais, especiais parceiros que muito contribuíram para o meu desenvolvimento pessoal, profissional e, fundamentalmente, humano.

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Há crianças que não aprendem! Há crianças que não aprendem... Há crianças que não aprendem?

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RESUMO

Esta pesquisa tem por objetivo analisar as concepções e as práticas pedagógicas de professores do Bloco Inicial de Alfabetização (BIA) em relação à queixa escolar em uma escola pública do Distrito Federal. Partiu-se do pressuposto de que a experiência do BIA, ao romper com a seriação nos três anos iniciais da alfabetização, trouxe novas formas de avaliar, planejar e executar estratégias pedagógicas aplicadas pelos professores aos estudantes mais susceptíveis de serem colocados em situação de queixa e de retenção escolar. Esse contexto conduziu à questão principal que orientou a pesquisa: o Bloco Inicial de Alfabetização (BIA), como proposta de escolaridade em ciclos, interfere nas concepções e nas práticas pedagógicas de professores acerca da queixa escolar? A pesquisa é de natureza qualitativa e apresenta estudo de caso de uma escola pública do Distrito Federal. As informações foram coletadas por meio de documentos oficiais, observação participante e entrevistas semiestruturadas. A investigação explicitou que, na escola investigada, os princípios metodológicos do BIA modificaram sua estrutura e organização pedagógica, determinando também alterações em suas práticas, estratégias e funcionamento pedagógico. Nessas alterações, sobressaem-se estratégias pedagógicas avaliativas e interventivas aplicadas pelos professores aos estudantes dos terceiros anos-BIA (com maiores incidências de defasagem de conteúdos, habilidades e competências exigidas para a alfabetização, reunindo características susceptíveis à condição de estudantes de queixa escolar). As práticas pedagógicas desenvolvidas pela escola apresentaram-se marcadas pelo Princípio da Avaliação Formativa, de caráter investigativo-reflexivo, que instaura e subsidia estruturações significativas na efetivação de estratégias pedagógicas dos princípios metodológicos orientadores do BIA e de todo o trabalho pedagógico desenvolvido. Essas mudanças implicaram modificações nas concepções de professores alfabetizadores quanto aos critérios de identificação, intervenção e encaminhamento das queixas escolares. Implicaram ainda, a redução do número de estudantes encaminhados às Equipes Especializadas de Apoio à Aprendizagem (EEAA), responsáveis pelo diagnóstico de estudantes da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal.

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ABSTRACT

This research aims at analyzing conceptions and pedagogical practices used by teachers of the BIA (Bloco Inicial de Alfabetização, i.e., Initial Block of Literacy) regarding school problems (queixa escolar) and learning difficulties in a public school in Distrito Federal (Federal District).One starts from the assumption that the BIA brought new ways to assess, plan and implement pedagogical strategies used by teachers in relation to students who were most likely to be placed in a situation of abuse and school retention. This was only possible because BIA broke with the structure of grades being applied to the first three years of literacy.This context led to the main question that guided this research: Does the BIA –

proposed as a cyclic model for schooling – interfere in the conceptions and pedagogical practices of teachers in matters related to school problems? The research is qualitative in nature and presents a case study of a public school in the Federal District. Information was collected through official documents, participant observation and semi-structured interviews. Research showed that at the investigated school the methodological principles of the BIA

changed the school’s structure and pedagogical organization, also determining changes in

their practices, strategies and educational functioning. Amongst these changes, one can highlight the evaluative and interventional teaching strategies applied by teachers to third-year BIA students (with higher incidences of content gap, besides lack of skills and competencies which are required to literacy, bringing together susceptible features to the condition of students with school problems). The pedagogical practices developed by the school are marked up by the Principle of Formative Evaluation, which is of investigative-reflective character, and also introduces and subsidizes significant structuring in the effective application of teaching strategies of the methodological principles which guide the BIA and all pedagogical work developed.These changes led to changes in conceptions of literacy teachers about the criteria for identification, intervention and referral of school problems. Another implication was the reduction of the number of students sent to the EEAA (Equipes Especializadas de Apoio à Aprendizagem, i.e., Specialized Teams for Support to Learning), responsible for the diagnosis of students in the State Education Department of Federal District (Secretaria do Estado Educação do Distrito Federal).

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1:Ciclos, seriação e avaliação: confronto de lógicas... 45

Quadro 2: Implementação do BIA no Ensino Fundamental no Distrito Federal ... 49

Quadro 3 :Critérios do Bloco Inicial de Alfabetização versão IV-2006 ... 59

Quadro 4: Ensino Fundamental, anos iniciais e enturmação no BIA... 61

Quadro 5: Princípios do BIA, versão V- 2010 ... 63

Quadro 6: Modalidades do Princípio do Reagrupamento do BIA ... 69

Quadro 7: Objetivos do Projeto Político-Pedagógico da escola ... 107

Quadro 8: Organização curricular da escola ... 109

Quadro 9: Cronograma de avaliações pedagógicas da escola ... 113

Quadro 10: Planejamento: reagrupamentos, plano de ensino e estratégias pedagógicas ... 116

Quadro 11: Cronograma de formação continuada dos professores... 119

Quadro 12: Cronograma semanal de atividades – professores e alunos ... 120

Quadro 13: Metas e objetivos da Educação Integral e Projeto Interventivo da escola ... 122

Quadro 14: Perfis profissionais dos professores participantes da pesquisa ... 130

Quadro 15: Documentos oficiais pesquisados: diretrizes educacionais nacionais e diretrizes educacionais – Distrito Federal ... 133

Quadro 16: Documentos produzidos/organizados pela escola ... 134

Quadro 17: Visitas realizadas pela pesquisadora à escola e suas observações ... 137

Quadro 18: Concepções dos professores sobre estratégias e princípios metodológicos do BIA145 Quadro 19: Reagrupamentos dos estudantes dos segundos e terceiros anos BIA ... 161

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LISTA DE TABELAS

Tabela1: Matrizes curriculares do Ensino Fundamental no Distrito Federal ... 46

Tabela 2:Implementação do Ensino Fundamental nove anos e do BIA. ... 110

Tabela 3: Resultados de avaliações nacionais da escola – MEC/Inep ... 123

Tabela 4: Ideb do Distrito Federal e da escola ... 124

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Planejamento: pertinência entre diagnóstico, rotina pedagógica e avaliação

formativa ... 54

Figura 2: Ensino-aprendizagem e organização do tempo no BIA ... 57

Figura 3: Organograma das diretrizes metodológicas e estratégias pedagógicas do BIA ... 64

Figura 4: Estrutura da formação continuada dos professores do BIA ... 66

Figura 5: Diagnóstico, avaliação, planejamento e estratégias interventivas do BIA ... 115

Figura 6: Avaliação, diagnóstico e intervenção pedagógica: interfaces do planejamento ... 117

Figura 7: Planejamentos e coordenações pedagógicas ... 117

Figura 8: Relação entre as questões e os objetivos da pesquisa ... 129

Figura 9: Organograma de efetivação do BIA na escola ... 139

Figura 10: Avaliação formativa: interfaces entre diagnóstico, registro, análise e intervenção ... 177

Figura 11: Interfaces entre identificação, intervenção e encaminhamento nas queixas escolares... 198

Figura 12: Critérios avaliativos de identificação da queixa escolar ... 199

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LISTA DE SIGLAS1

ANEE – Aluno com Necessidades Educacionais Especiais ATPp – Atendimento Psicopedagógico

ATPP – Equipe de Atendimento Psicopedagógico BIA – Bloco Inicial de Alfabetização

CBA – Ciclos Básicos de Alfabetização

CFORM – Centro de Formação Continuada de Professores em Alfabetização e Linguagem COMPP – Centro de Orientação Médica e Psicopedagógica

CRA – Centro de Referência de Alfabetização DEE – Direção do Ensino Especial

DF – Deficiência física DI – Deficiência intelectual

DRE – Diretoria Regional de Ensino

Dreso – Diretoria Regional de Ensino de Sobradinho

EAPE – Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação EEAA – Equipes Especializadas de Apoio à Aprendizagem

FMI – Fundo Monetário Internacional GDF – Governo do Distrito Federal GEF – Gerência Ensino Fundamental

Ideb – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

Inep – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MEC – Ministério da Educação

NJCLD – Naticional Joint Committee of Learning Disabilities NMP – Núcleo de Monitoramento Pedagógico

OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

1 O Decreto 33409, de 13 de dezembro de 2011, dispôs sobre a reestruturação organizacional e administrativa da SEDF, e implicou alterações nas seguintes siglas: DRESO foi alterada para Coordenação Regional de Ensino de Sobradinho; DEE foi alterada para Coordenação de Educação Inclusiva; GEF foi alterada para Gerência de Ensino Fundamental Programas e Projetos Especiais; SEB foi alterada para Coordenação do Ensino

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PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais

PDAF – Programa de Descentralização Administrativa e Financeira PDE – Plano de Desenvolvimento da Educação

PNE – Plano Nacional de Educação

PNLD – Programa Nacional do Livro Didático PPP – Projeto Político-Pedagógico

RA – Região Administrativa

SAE – Sistema de Avaliação do Ensino

Saeb – Sistema de Avaliação da Educação Básica Saiec – Sistema de Avaliação Interna da Escola Classe SEB – Secretaria de Educação Básica

SEDF – Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal

SePE-Ipusp – Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo

SES/DF – Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal TDAH – Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade TGD – Transtorno Global de Desenvolvimento

TLCE – Termo do Livre Consentimento Esclarecido UnB – Universidade de Brasília

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 18

1 ALFABETIZAÇÃO E ESCOLARIDADE EM CICLOS... 28

1.1 MÉTODOS E ABORDAGENS NA ALFABETIZAÇÃO ... 31

1.2 A ESCOLARIZAÇÃO EM CICLOS NO BRASIL ... 41

1.2.1 A experiência dos ciclos no Distrito Federal: a proposta do Bloco Inicial de Alfabetização ... 46

1.2.1.1 Concepção de ensino-aprendizagem e a organização do tempo escolar ... 50

1.2.1.2 Princípios metodológicos do BIA ... 58

1.2.1.2.1 Princípio da Formação Continuada ... 65

1.2.1.2.2 Princípio do Reagrupamento... 69

1.2.1.2.3 Princípio do Projeto Interventivo ... 70

1.2.1.2.4 Princípio do Ensino da Língua ... 74

1.2.1.2.5 Princípio da Avaliação Formativa ... 79

1.2.1.2.6 Princípio do Ensino da Matemática ... 82

2 QUEIXA ESCOLAR E ESCOLARIZAÇÃO EM CICLOS ... 85

2.1 QUEIXA ESCOLAR NO DISTRITO FEDERAL: CONTEXTUALIZANDO-A NA IMPLEMENTAÇÃO DO BLOCO INICIAL DE ALFABETIZAÇÃO ... 95

2.2 CENÁRIO DA INSTITUIÇÃO ESCOLAR INVESTIGADA ... 104

2.2.1 A proposta pedagógica da escola: detalhando seu Projeto Político-Pedagógico ... 106

2.2.1.1 Estrutura e o trabalho pedagógico da escola: caracterizando a organização escolar e a implementação do BIA ... 110

2.2.1.2 A organização do tempo no BIA: mapeando o planejamento, a avaliação e os projetos pedagógicos da escola pesquisada ... 111

(16)

3.1 PESQUISA DOCUMENTAL ... 127

3.2 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE ... 127

3.3 ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA ... 128

3.4 QUESTÃO DIRETRIZ E OBJETIVOS ... 128

3.5 PARTICIPANTES ... 130

3.6 PROCEDIMENTOS DE CONSTRUÇÃO DOS DADOS ... 131

3.6.1 Procedimentos de construção de dados: pesquisa documental ... 132

3.6.2 Procedimentos de construção de dados: observação participante ... 134

3.6.3 Procedimentos de construção de dados: entrevista semiestruturada ... 137

3.7 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DOS DADOS ... 138

3.7.1 Procedimentos de análise documental ... 140

3.7.2 Procedimentos de análise da observação participante ... 140

3.7.3 Procedimentos de análise das entrevistas semiestruturadas ... 142

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 146

4.1 PESQUISA DOCUMENTAL: RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 146

4.2 OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE: RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 153

4.3 ENTREVISTAS SEMIESTRUTURADAS: RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 164

4.3.1 Categoria 1: Características da operacionalização dos princípios e das estratégias metodológicos do BIA dificuldades e implicações profissionais para os professores ... 164

4.3.2 Categoria 02: Concepção dos professores sobre as queixas escolares no BIA ... 194

4.3.3 Categoria 3. Descrição, estratégias e processos pedagógicos em relação aos critérios de identificação, intervenção e encaminhamento das queixas escolares. ... 197

4.4 SÍNTESE DOS RESULTADOS ... 213

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 217

REFERÊNCIAS ... 225

APÊNDICES ... 232

APÊNDICE A Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ... 232

APÊNDICE B – Roteiro de entrevista semiestruturada para professores do BIA ... 234

(17)

ANEXOS ... 236

ANEXO A- Aprovação do Comitê de Ética. Parecer Consubstanciado de Projeto de Pesquisa ... 236 ANEXO B – Número de turmas e alunos matriculados na escola Desafios do Aprender, ... 238

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INTRODUÇÃO

Há muito a escola recebe críticas sobre seu distanciamento do mundo das crianças e dos jovens. Há muito se apela para a máxima de que a escola não acompanhou as mudanças do mundo atual. No entanto, a escola ainda continua sendo, por excelência, o espaço a quem a sociedade confia a educação de suas novas gerações. Portanto, não se trata aqui apenas de pensar mudanças na escola. Muitos têm tentado propor uma reflexão profunda acerca de sua função social, dos valores e das crenças perpetuados por ela, tanto de forma implícita como explícita.

Em minha experiência como pedagoga, orientadora educacional e psicopedagoga, venho acompanhando, com certa frustração, as diferentes mudanças pelas quais a escola vem passando (reformas, projetos, currículo, arquitetura, dentre outros) sem, contudo, deixar esmaecerem minhas esperanças, haja vista a percepção e o reconhecimento da escola como um espaço de circulação de culturas, além de espaço político que oferta bases conceituais e pressupostos (valores, crenças e ideologias) passíveis de modificação. Coaduno com o pensamento de Perrenoud (2001), de que as resistências se organizam tanto no campo dos professores quanto no das autoridades escolares, mas elas não conseguem imobilizar as mudanças. Acredito, como ele, que os ciclos de aprendizagem é uma maneira de redistribuir as cartas, de dar vida novamente a certas esperanças decepcionadas (PERRENOUD, 2001).

Nesse sentido, pensar na proposta da escolaridade em ciclos é pensar em um universo de variáveis visíveis e invisíveis que transformam a organização e a cultura escolar. Obriga-nos a pensar também no todo histórico em que as dificuldades de aprendizagem vêm sendo tratadas, remetendo a um universo muito grande de significações que inclui, entre outros, a queixa escolar.

Sem pretender esgotar esse universo de significações, é importante frisar que a alfabetização tem sido uma questão bastante discutida pelos que se preocupam com a educação, visto que há décadas se observam as mesmas dificuldades de aprendizagem, as inúmeras reprovações e a evasão escolar. Segundo Cagliari (1992, p.8) “[...] não se tratando

adequadamente a escrita e a fala na alfabetização, a escola encontrará dificuldades sérias para

lidar com a leitura”. O autor ressalta ainda que os problemas de aprendizagem na

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fracasso escolar ora ao aluno, visto como incapaz, carente, cheio de deficiências, ora ao

professor” (CAGLIARI, 1992, p. 9).

As inovações trazidas pelas diretrizes metodológicas do Bloco Inicial de Alfabetização (BIA) para os professores alfabetizadores instauram encontros, dificuldades, sucessos e impasses no contexto da alfabetização na escola pública, bem como um novo olhar para os estudantes em geral. Essas mudanças encontram-se marcadas por estratégias pedagógicas diferenciadas que, na prática, remetem a novas representações nas concepções de professores alfabetizadores.

Os olhares também se voltam ao sucesso e ao fracasso escolar desses estudantes, que não mais se deparam com as terríveis e ameaçadoras reprovações que impingiam a eles a culpabilização pelas dificuldades, pelos problemas ou pelos transtornos apresentados durante o processo de aquisição da alfabetização e letramentos. Minha compreensão é que esses estudantes estão mais susceptíveis de ser identificados pelos professores como estudantes com

problemas escolares ou com problemas de aprendizagem. As explicações e os estudos que se referem a esses problemas e sua estreita relação com o fracasso escolar se utilizam, com

maior frequência, do termo “queixa escolar” (DEL PRETE; DEL PRETE, 2003).

Mormente, professores e estudantes, na experiência do ciclo-BIA, veem-se diante da possibilidade de experimentar diversas situações e/ou estratégias didático-pedagógicas capazes de produzir aprendizagens significativas nos três primeiros anos iniciais de escolarização, experiência muito diferente daquela da alfabetização em série.

Essencialmente, infere-se que as novas diretrizes trazidas pelo BIA remexeram práticas incorporadas pelos professores alfabetizadores, acostumados a uma dinâmica organizacional de seriação. Sem pretender esboçar uma defesa apressada da alfabetização em ciclo, tenho percebido, em minha prática profissional, um novo clima na cultura organizacional escolar em relação aos alunos com problemas de aprendizagem na alfabetização.

Nesse contexto, os conceitos de desenvolvimento e aprendizagem para esses sujeitos foram ressignificados, e a padronização de práticas pedagógicas, procedimentos e estratégias didáticas também foi revista. Aspectos culturais, sociais e históricos passaram a ter relevância. O sujeito em processo de alfabetização passa a ser compreendido como um ser humano ativo, que age sobre o mundo e, por meio das relações sociais, transforma suas ações internamente.

Por esse novo olhar, a escola assume papel preponderante, uma vez que precisa responsabilizar-se por métodos, técnicas e estratégicas em que “[...] a atividade cognitiva

(20)

Vygotsky) dos saberes historicamente produzidos pelo homem em saberes do indivíduo”

(MORTIMER; SMOLKA, 2001, p, 40, grifo dos autores).

A escola, segundo a visão sociointeracionista, tem papel determinante para as transformações cognitivas do sujeito pela possibilidade de interferir na aprendizagem, de modo que sejam provocados avanços nos sujeitos que, de forma espontânea, não ocorreriam. Buscando desafiar as capacidades e as habilidades cognitivas dos alunos com o auxílio de um sujeito experiente, o professor deve desafiá-los, propondo atividades por meio da resolução de problemas. Partindo desse pressuposto, Vygotsky faz importantes críticas à visão presente tanto da psicologia como na pedagogia quando considera o aprendizado da escrita apenas uma

habilidade motora: “Ensina-se as crianças a desenhar letras e construir palavras com elas, mas

não se ensina a linguagem da escrita” (VYGOTSKY, 1984, p. 119 apud REGO, 1995, p. 69).

A consideração de Vygotsky permite-nos pensar contextos, concepções e práticas em que são produzidos não só os processos de alfabetização e letramentos, mas também as queixas escolares. Crianças em processo de alfabetização sofrem influências dessas concepções por meio das práticas desenvolvidas por seus professores cotidianamente em sala de aula, nos planejamentos e nos instrumentos de ensino, nas várias dimensões socioafetivas estabelecidas entre professores e estudantes.

A presença, a ausência e a qualidade da mediação pedagógica bem como divergências teórico-práticas dos métodos aplicados têm sido determinantes. A visão socio-histórica defende que as práticas pedagógicas precisam estar voltadas para resultados qualitativos, em que percursos de ensino e sua relação direta com diferentes perfis de aprendizagens apresentados pelos estudantes sejam priorizados.

Por meio dessa concepção, a ênfase que pairava sobre índices de aprovação e retenção de estudantes se alterou para metodologias e estratégias pedagógicas aplicadas ao ensino numa visão prospectiva de aprendizagens significativas e de atendimento às singularidades do sujeito alfabetizando. As estratégias pedagógicas aplicadas aos estudantes com dificuldades de aprendizagem, quando analisadas sob o ponto de vista qualitativo dos instrumentos e da mediação didático-pedagógica instituídos e empregadas nas práticas pedagógicas, confluem de forma inter-relacionada à constituição dos estudantes colocados em situação de queixa escolar.

(21)

este é portador de problemas, distúrbios ou transtornos, situação implicaria tratamento psicológico ou pedagógico. Nessa perspectiva, desconsideram-se assim os diversos aspectos de outros contextos que podem interferir no processo de ensino e de aprendizagem. Essa realidade corrobora com as pesquisas de Patto (1990) nas quais a autora designou de culpabilização da aluno com problemas escolares.

Os ciclos imprimem mudanças institucionais, preventivas e interventivas que favorecem uma cultura escolar na alfabetização voltada para o sucesso dos alunos vitimados, ou não, por problemas na aprendizagem. A proposta de ciclos vem sendo discutida em inúmeros sistemas educacionais do mundo – um desafio para a organização escolar, visto que altera profundamente a organização do trabalho escolar, fixa objetivos de aprendizagem e capacita professores visando a orientar e a facilitar os percursos de formação das crianças (PERRENOUD, 2004). Contudo, suas diretrizes metodológicas precisam ser contextualizadas à realidade brasileira. O BIA e a realidade do Distrito Federal circunscrevem novas trajetórias e novos desafios. Pesquisar a produção da queixa escolar sob a ótica dessa nova organização escolar é apenas um deles.

Venho atuando por 18 anos em escola pública no Distrito Federal, tendo participado de várias propostas pedagógicas orientadas para a retenção ou a progressão de alunos em situação de queixa escolar, vitimados, ou não, pelo fracasso escolar. Em várias situações, presenciei e corroborei para o encaminhamento desses alunos a serviços médicos especializados ou a equipes psicopedagógicas em diagnóstico, com as quais também atuei.

Experimentei frustrações diversas vezes. Pensava que os procedimentos realizados segundo a ótica médico-psicológica e psicoterápica no interior das escolas era na verdade um fatal deslocamento das demandas produzidas por carências pedagógicas e falhas metodológicas, não sendo motivadas apenas por síndromes ou incapacidades do estudante.

Dentre as carências pedagógicas e falhas metodológicas alguns equívocos, tais como: carências na capacitação de professores no que se refere à natureza da escrita, de suas funções e usos, indispensáveis ao processo de alfabetização; desconhecimento dos métodos e concepções teóricas eficazes para alfabetização. Dessa forma, reinava a prática do cartilhamento, pautada na pedagogia conteudista tradicional. E o número de queixas de alunos com dificuldades na alfabetização e no letramento aumentava nas listas de espera das equipes psicopedagógicos especializadas em diagnóstico2, bem como o de alunos reprovados, inadaptados e candidatos ao fracasso escolar.

(22)

Historicamente, a queixa escolar tem sido quase sempre centrada no estudante. Mesmo após avaliação e atendimento diagnóstico de serviços especializados, questões relativas a deficiências nos processos de alfabetização permanecem. Na escola pública são facilmente detectáveis estudantes reprovados, inadaptados e/ou candidatos ao fracasso escolar.

Sempre idealizei atuar na contramão da lógica de excessos de queixas escolares (encaminhamentos de alunos para atendimentos especializados), aspirando a pequenos projetos e executando-os com professores, famílias e os próprios estudantes, buscando, mesmo de forma não convergente ao coletivo da escola, reflexões que acercavam os professores, como o não reconhecimento das diferenças de classe social e de ritmos de aprendizagem, dificuldades específicas de aprendizagem e impactos gerados pela política de seriação sobre a criança pobre/oprimida matriculada em instituição pública de ensino.

Na experiência com alunos com dificuldades de aprendizagem, foi possível verificar seus avanços pedagógicos durante e após projetos interventivos, experiências pedagógicas e práticas diferenciadas, alternadas ou inovadoras. Porém, esses progressos parciais tornavam-se insuficientes às exigências de cumprimento do currículo escolar básico em um ano para cada série em curso, obedecendo ao regime de seriação, para as escolas públicas do Distrito Federal.

Na proposta curricular para as séries, o tempo é exíguo e não flexível para os conteúdos, para avaliações mensais, bimestrais, semestrais e para os conselhos de classe, com metas e padrões pedagógicos fechados e pouco acessíveis às particularidades e às condições de aprendizagem do alunado. Assim, o tempo apresenta-se como um grande obstáculo, e o currículo, uma obrigação com metas inexoráveis para professores e alunos, sem atendimento às diferenças e aos crescimentos verificados nas habilidades já trabalhadas e nas competências em andamento.

Por mais que se trabalhe com o aluno com dificuldades de aprendizagem, a reprovação estabelece-se como algo iminente. O sentimento que brota é o de estar atuando numa cultura pedagógica organizada de forma rígida, inflexível. Educadores são obrigados a dar conta de resultados e dos meios com tempo determinado para acabar, o que resulta numa acentuada

“descrença”, caracterizada pela expectativa do fracasso do aluno identificado com problemas

de aprendizagem.

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(5.5) e Minas Gerais (5.6), estados que historicamente atuam com o sistema de escolarização em ciclos há mais tempo que o Distrito Federal3.

Não se objetiva aqui referendar esses índices como únicos indicativos da supremacia da experiência de aprendizagem mediada pelo sistema de ciclos em detrimento da seriação. No entanto, pretende-se propor a relativização provocada pelo afrouxamento nas regras de sequenciamento, atrelado à eliminação da reprovação dentro do ciclo, permitindo que os alunos tenham mais tempo para aprender, criando-se maiores condições para a continuidade no processo de aprendizagem (MAINARDES, 2007).

A proposta da escolaridade em ciclos para a alfabetização no Distrito Federal indica um alargamento desse tempo anual, que pode ser pensado em três anos, levando-se em consideração as diferenças de ritmo de aprendizagem dos alunos. A escola ciclada traz uma nova lógica de estruturação do tempo e do espaço escolar e, consequentemente, uma nova lógica para a organização escolar e para sua cultura, bem como inovações para as práticas avaliativas e curriculares. A abertura para formação de professores e projetos interventivos gera maiores níveis de autonomia dos professores, que adquirem mais tempo para “gestar”

projetos, ideias e inovações pedagógicas.

A escola também dispõe de ampliação do tempo – tempo para se organizar, posicionar-se e orientar-se para novas estratégias que visem à promoção dos alunos e suas aprendizagens, situação muito diferente do clima “reprovador” e pessimista que acercava o

ideário educativo vivido na experiência da seriação, tratando-se assim de uma nova cultura no interior das escolas. Os atores escolares, cada qual em sua função, também têm seus papéis redimensionados. A hegemonia da seriação precisa ser quebrada, não bastando mais reprovar o aluno e repassar a responsabilidade de sua aprendizagem para a próxima professora.

Na proposta da aprendizagem em ciclos, a escola precisa responder ao final de três anos com resultados apreciáveis e detectáveis em seus alunos, ou seja, que estes atendam habilidades e competências de alfabetização e letramento objetivadas para o final do terceiro ano (Etapa III).

As iniciativas de organização do ensino em ciclos em oposição à seriação, ao mesmo tempo em que vêm sinalizando uma tendência, evidenciam uma diversidade muito grande tanto na concepção como em seus desdobramentos na reorganização efetiva do Ensino Fundamental. “A organização escolar em ciclo possibilita à instituição educacional olhar para todos os seus estudantes, porque estes não mais evadem por causa da repetência e, ao

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permanecerem na escola, exigem dessa instituição uma tomada de atitude” (DISTRITO FEDERAL, 2010a, p. 10).

O BIA propõe dimensão positiva ao promover a progressão continuada do processo de aprendizagem, além de possibilitar à criança a organização de um tempo flexível para o desenvolvimento das competências que precisa construir, bem como garantir a sistematização e a aprendizagem da leitura/escrita/letramento ao longo de todo o processo e o desenvolvimento integral do aluno, permitindo que este experimente uma aprendizagem dinâmica, prazerosa e eficaz (DISTRITO FEDERAL, 2010a).

Entretanto, a efetividade de sua implementação nas Coordenadorias Regionais de Ensino do DF não tem garantido a quebra da hegemonia da seriação nas práticas pedagógicas nem efetivado melhora nas estratégias mediacionais e interventivas nos problemas de aprendizagem, principalmente estratégias pedagógicas que intervenham nas dificuldades de aprendizagem de estudantes dos terceiros anos, período em que ocorre a retenção e maior número de estudantes encaminhados para diagnóstico.

O BIA sugere uma prática, e embora suas diretrizes metodológicas orientem estratégias a serem seguidas pelos professores não especifica o que se deve fazer a cada instante nas rotinas pedagógicas. Assim, na aplicação das diretrizes metodológicas e dos conceitos teóricos que os professores alfabetizadores precisam realizar no BIA, incide a ocorrência de alunos com problemas de aprendizagem, sobretudo na Etapa III – 8 anos, quando pode ocorrer a retenção dos estudantes. Daí surgir nesses terceiros anos um maior número de alunos com defasagens e dificuldades de aprendizagem oriundos da Etapa I – 6 anos e da Etapa II – 7 anos (visto não haver reprovações nessas primeiras etapas de escolarização no BIA).

Muito embora, se reconheça que problemas no processo de aquisição de habilidades em alfabetização e letramento possam ocorrer em qualquer uma das etapas percebe-se que na SEDF a questão da retenção de estudantes nos terceiros anos BIA reúne possibilidades maiores desses estudantes aparecerem em maior evidência nos encaminhamentos realizados pelos professores aos serviços de diagnóstico disponíveis na rede pública de ensino, as EEAAs.

Dessa forma, os professores estão convidados a trabalhar com os estudantes com problemas de aprendizagem segundo as novas diretrizes metodológicas e estratégias

pedagógicas do BIA. Os “modos” e as possibilidades de lidar com a criança que não avançou

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sobretudo nos mecanismos de gerenciamento de avaliações diagnósticas, planejamentos pedagógicos e intervenções grupais ou individualizadas (Projetos Interventivos) a cada perfil de estudante matriculado no BIA, principalmente no último ano – Etapa III. Essa particularidade se justifica porque a pesquisa em pauta deu foco preferencialmente às percepções dos professores alfabetizadores dos terceiros anos BIA.

Em minha experiência profissional em escolas públicas no Distrito Federal, tenho encontrado notáveis diferenças entre as instituições escolares nas quais atuei ao que concerne às práticas pedagógicas no processo de intercâmbio das mudanças políticas, teóricas e práticas da alfabetização em série para o Bloco Inicial de Alfabetização (BIA).

Essas diferenças mostraram-se marcadas por resistências às estratégias metodológicas trazidas pelo Bloco. De modo que as mudanças na estrutura organizacional não passaram da promoção automática da Etapa I para a Etapa II, resultando em grande número de estudantes retidos e defasados na Etapa III. Por outro lado, foi possível vivenciar, também, escolas que comprometidas com a proposta mostraram práticas pedagógicas eficazes ao atendimento das necessidades de aprendizagem dos estudantes. Contudo, dificuldades e dúvidas quanto à implementação da proposta ainda foram significativas, em relação ao comprometimento da equipe gestora; à desarticulação pedagógica entre coordenadores e professores quanto à aplicação das diretrizes metodológicas do BIA, sobretudo, no que concerne ao Princípio do Reagrupamento, Projeto Interventivo; dúvidas e dificuldades em relação à diversidade de métodos de alfabetização adotados pelos professores.

Tenho inferido que, mediante as diretrizes do BIA, algumas escolas assumem nuances político-organizacionais e de gestão muito diferenciadas, em que professores podem ou não concorrer para sua otimização ou resistir a essa nova cultura de organização escolar. Esses profissionais podem tentar manter o establishment4 de práticas equivocadas e/ou conservadoras. Entende-se que a proposta educacional em ciclos só logrará êxito se conseguir avançar em relação à proposta educacional seriada e suas limitações (MAINARDES, 2007).

A implantação dos ciclos no Brasil sempre esteve vinculada à necessidade de eliminar o fracasso escolar, estreitamente vinculado às práticas avaliativas (VILLAS BOAS, 2007). No BIA, esse contexto não se mostrou diferente, sendo o pressuposto avaliativo utilizado como ferramenta organizadora de estratégias pedagógicas para todo o bloco. O BIA pressupõe uma

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organização escolar com mudanças nas “concepções de ensino, aprendizagem, avaliação e, consequentemente, na organização do trabalho pedagógico e na formação de professores”

(DISTRITO FEDERAL, 2010a, p. 11).

As diretrizes metodológicas para o BIA estão organizadas em seis princípios: Formação Continuada, Reagrupamento, Projeto Interventivo, Avaliação Formativa, Ensino da Língua, Ensino da Matemática. Dentre elas, a Avaliação Formativa destaca-se como eixo central e integrador, pois acompanha todo o processo pedagógico e o organiza. Esse princípio, no andamento da pesquisa, passou a caracterizar-se como mecanismo proativo-retroativo (ir e vir de estratégias e pressupostos didáticos pedagógicos), em que todas as ações pedagógicas instituídas interagem de forma interdependente na promoção da aprendizagem dos estudantes. A pesquisa objetiva identificar os mecanismos pedagógicos utilizados pelos professores, por meio das diretrizes metodológicas trazidas pela experiência de ciclos-BIA, que estejam contribuindo para o redimensionamento da prática pedagógica dos professores em relação ao estudante com problemas de aprendizagem no contexto da alfabetização (sujeito sobre o qual se circunscreve a queixa escolar). Também busca a possibilidade de subsidiar alternativas e análises capazes de contribuir para a efetivação do BIA em que professores interajam e dialoguem para qualificar estratégias pedagógicas mediacionais que promovam a aprendizagem significativa em todo o processo de alfabetização.

Acredita-se que a efetivação dos princípios metodológicos do BIA pode fazer produzir aprendizagens significativas nos três anos de escolarização do ciclo, inferindo, de forma não memenos lógica, resultados sobre processos de redução da queixa e do fracasso escolar em toda a rede pública de ensino do Distrito Federal.

menos lógica, resultados sobre processos de redução da queixa e do fracasso escolar em toda a rede pública de ensino do Distrito Federal.

Mediante tais pressupostos situo esta pesquisa, utilizando a abordagem metodológica de um estudo de caso para caracterizar as “formas” pelas quais a escola, aqui denominada de

Classe Desafios do Aprender, vem reagindo à efetivação do BIA e como cotidianamente vem organizando seu trabalho pedagógico nesse sentido.

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mecanismos de atendimento aos estudantes com dificuldades de aprendizagem, portanto estudantes susceptíveis de serem colocados em situação de queixa escolar.

O texto dissertativo está organizado em quatro capítulos: no primeiro capítulo consta a discussão teórica da alfabetização, seus métodos e abordagens, visto que contextos, concepções e práticas que envolvam a alfabetização podem mostrar-se divergentes quanto à presença, à ausência e à qualidade da mediação e dos métodos aplicados, sendo determinantes para o sucesso ou o fracasso dos estudantes nos anos iniciais de escolarização. Há também a apresentação histórico-conceitual dos ciclos no Brasil e no Distrito Federal, contextualizando-os na experiência do Bloco Inicial de Alfabetização, caracterizado por meio de seus seis princípios metodológicos indicados pelas estratégias pedagógicas para o BIA (2006; 2010a).

A queixa escolar e a escolarização em ciclos são foco de discussão teórica no segundo capítulo, buscando dimensioná-las com base em uma perspectiva de construção do seu conceito até sua contextualização no Distrito Federal e na experiência do BIA. Explicita-se ainda o cenário da pesquisa, detalhando-se a estrutura e o trabalho pedagógico desenvolvido pela Escola Desafios do Aprender. Desse modo, buscou-se descrever e caracterizar a efetivação do BIA na interface do Projeto Político Pedagógico e outros projetos pedagógicos e demais estratégias pedagógicas interventivas instituídas e aplicadas às necessidades e às dificuldades de aprendizagem dos estudantes, sobretudo dos terceiros anos – Etapa III, na proposta do Bloco.

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1 ALFABETIZAÇÃO E ESCOLARIDADE EM CICLOS

A alfabetização, a escrita e o letramento encontram-se indissolúvel e inevitavelmente interligados. Contudo, nem sempre têm sido enfocados como um conjunto pelos estudiosos (TFOUNI, 2010). Enquanto os sistemas de escrita são um produto cultural, a alfabetização e o letramento podem ser vistos como processos de aquisição de um sistema escrito. Soares (2010, p. 15) define a alfabetização como “processo de aquisição do código escrito, das habilidades de leitura e escrita”. Para Carvalho (2005, p. 15), a alfabetização ocorre “[...] quando se aprende o código alfabético (as relações entre letras e sons)”.

A alfabetização é um processo no qual o indivíduo assimila o aprendizado do alfabeto e sua utilização como código de comunicação. Todavia, esse processo não se deve resumir apenas na aquisição dessas habilidades mecânicas (codificação e decodificação) do ato de ler, mas na capacidade de interpretar, compreender, criticar e produzir conhecimento. A alfabetização envolve também o desenvolvimento de novas formas de compreensão e uso da linguagem de maneira geral.

[...] um indivíduo alfabetizado não é necessariamente um indivíduo letrado. Alfabetizado é aquele indivíduo que sabe ler e escrever, já o indivíduo letrado é o indivíduo que vive em estado de letramento e não é só aquele que sabe ler e escrever, mas aquele que usa socialmente a leitura e a escrita, pratica a leitura e a escrita, responde adequadamente às demandas sociais de leitura e de escrita (SOARES, 2003, p. 39-40).

Nos dias de hoje, falar em alfabetização é referir-se àquele que usa socialmente a leitura e a escrita. Sem dúvida, a alfabetização é um processo de representação de fonemas e grafemas e vice-versa, mas é também um processo de compreensão/expressão de significados por meio de código escrito. Porém, o conceito de alfabetização depende ainda, dentre outros fatores, de características culturais, econômicas e tecnológicas e ainda de “determinantes sociais das funções e fins da aprendizagem da língua escrita (SOARES, 2010, p. 18).

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posterior ou até mesmo perdure, efetivamente, em todo o percurso do aluno ao passar pelas séries iniciais.

A alfabetização pode ser caracterizada como um processo complexo e multifacetado no qual se encontram implícitos condicionantes sociais, culturais e políticos com importantes repercussões no problema dos métodos de alfabetização, do material didático, da definição dos pré-requisitos, da preparação para a alfabetização e da formação de alfabetizadores para a alfabetização.

Alfabetização e letramento possuem cada qual a sua especificidade, sendo simultaneamente processos interdependentes por meio dos quais se dá a sistematização da leitura e da escrita e se aprende a fazer uso dessas práticas no cotidiano. Tfouni (2010) ressalta que a teoria do letramento não deve estar voltada apenas para a aquisição da leitura e

da escrita, mas “[...] que também tenha preocupações políticas e sociais de inclusão e justiça,

principalmente através dos mecanismos educacionais” (TFOUNI, 2010, p. 8). Assim, para a autora, a alfabetização pertence ao âmbito individual, e o letramento focaliza os aspectos socio-históricos da aquisição da escrita.

A escrita, por sua vez, está associada às principais causas do aparecimento das civilizações modernas e ao desenvolvimento científico, tecnológico e psicossocial da sociedade. Os tipos de códigos escritos criados pelo homem são pictográficos, ideográficos ou fonéticos (SOARES, 2010; TFOUNI, 2010). Como produto cultural, data de cerca de 5000 anos antes de Cristo, e seu processo de difusão e diversidade de sistemas escritos desde as sociedades antigas dependeu de fatores político-econômicos.

Vygotsky (1989) tem uma abordagem genética da escrita. Para o autor, o processo de sua aquisição inicia-se muito antes da entrada da criança na escola. Ele defende que para

compreender o desenvolvimento da escrita na criança é necessário estudar a “pré-história da

linguagem escrita”, considerando os aspectos histórico-sociais e as relações sociais como determinantes do desenvolvimento do sujeito, especialmente de sua linguagem (OLIVEIRA, 1997).

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língua ou de uma cultura, mas sobretudo do saber, o que lhes impossibilitaria de compreender e intervir na realidade (GOMES SENNA, 1995).

As definições que acercam a alfabetização, a escrita, o letramento e também a linguagem denotam existir convergências de fatores individuais sociais, políticos e históricos que concomitantemente interagem e integram os processos de alfabetizar-escrever, letrar. (CARVALHO, 2005; GOMES SENNA, 1995; SILVA, 2004; SOARES, 2003; 2010; TFOUNI, 2010). Em outro sentido, esses autores enunciam que as práticas de alfabetização, embora tenham avançado no desenvolvimento da expressão do código linguístico (escrita e letramento/linguagem) do alfabetizando-cidadão, ainda não garantiram melhores resultados nas dificuldades de aprendizagem surgidas e na produção do fracasso escolar. São inúmeras as pesquisas que indicam a existência de problemas no processo de ensino-aprendizagem da linguagem nas séries iniciais de escolarização, isto é, problemas relativos à alfabetização que corroboram, substancialmente, para o fracasso escolar (SCOZ, 1994; PATTO, 1990).

Carvalho (2005) ressalta que uma das causas do fracasso escolar de crianças na alfabetização é a polêmica dos métodos, desde os defensores dos métodos globais aos partidários dos métodos sintéticos. Carvalho (2005), Soares (2010) e Tfouri (2010) consideram que diferentes interpretações quanto aos métodos e aos processos de alfabetização corroboram sobremaneira para que ocorram problemas escolares no período de alfabetização.

Outras discussões pairam contra o construtivismo, que, segundo Carvalho (2005, p. 7), “é uma teoria, e não um método de alfabetização”. Até a década de 1980, nas concepções anteriores ao construtivismo, no Brasil, havia métodos nos quais os professores acreditavam e eram materializados nas cartilhas e nos manuais dos professores. As práticas pedagógicas para alfabetização sustentavam-se nessas cartilhas. Havia um método, mas não uma teoria. Hoje é possível perceber o contrário: todos versam sobre a teoria construtivista da alfabetização, mas não se tem método Soares (1992;2010).

Gomes Senna (1995, p. 222) adverte que as práticas de alfabetizar “refletem

concepções variadas acerca da natureza e da função do ato de alfabetizar e de ser alfabetizado”. Também tem sido comum a prática de desqualificar os professores, como se

estes fossem os únicos culpados pelo fracasso escolar na alfabetização. Evidencia-se ainda o ressurgimento de defensores de métodos do passado, que ignoram os avanços da pesquisa sobre a aprendizagem da criança, como as de Ferreiro, Piaget, Decroly, Freire, Vygotsky, dentre outros.

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(SOARES, 2010). A preparação do professor deve compreender as facetas psicológica, psicolinguística, sociolinguística e linguística e todos os condicionantes (sociais, culturais e políticos) do processo de alfabetização. Desse modo, o alfabetizador deve saber operacionalizar essas diversas facetas em métodos e procedimentos de alfabetização, elaboração e uso adequados de materiais didáticos. As diretrizes educacionais que vigoram no Brasil (currículo básico para Ensino Fundamental) se encontram atualizadas e subsidiadas pelas bases epistemológicas do conhecimento, em que se destacam a epistemologia genética piagetiana e o sociointeracionismo de Vygotsk. Essas linhas epistemológicas são destacadas, dentre outras, como as matrizes teóricas dos métodos de alfabetização para a proposta de alfabetização em ciclos (MAINARDES, 2007).

O fato de as diretrizes educacionais na atualidade estarem subsidiadas pelas atuais linhas epistemológicas do conhecimento não trouxe resultados evidentes quanto à redução de crianças com atrasos, defasagens e problemas no processo de alfabetização. Soares (2010) adverte que as tendências pedagógicas que vigoraram ao longo dos anos foram subsidiadas pelas correntes teóricas da psicologia, da sociologia e da linguística, e que as pesquisas conduzidas apresentam uma massa de dados não integrados e não conclusivos.

Em primeiro lugar, são dados que resultam de diferentes perspectivas do processo de alfabetização a partir de diferentes áreas de conhecimento (Psicologia, Linguística, Pedagogia), cada uma tratando a questão independentemente, e ignorando as demais; em segundo lugar, são dados que, excludentemente, buscam a explicação do problema ora no aluno (questões de saúde, ou psicológicas, ou de linguagem), ora no contexto cultural do aluno (ambiente familiar e vivências socioculturais), ora no professor (formação inadequada, incompetência profissional), ora no material didático (inadequação às experiências deste ou daquele método, sobretudo das crianças das camadas populares), ora, finalmente, no próprio meio, o código escrito (a questão das relações entre o sistema fonológico e o sistema ortográfico da língua portuguesa) (SOARES, 2010, p. 14, grifo do autor).

Nesse contexto, é perceptível que os paradigmas da alfabetização que orientam as práticas pedagógicas dos professores estiveram transversalizados por aspectos multifacetários envolvendo diversas áreas do conhecimento. Em face do exposto, propõe-se uma análise dos principais métodos, tendências pedagógicas determinantes e paradigmas da alfabetização.

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Nos últimos anos, desenvolveu-se consideravelmente a pesquisa sobre teorias e práticas de alfabetização, oriundas tanto do campo da psicologia e da pedagogia quanto dos estudos de linguística aplicados ao campo específico da alfabetização. Boa parte das propostas mais conhecidas constitui-se em respostas a diagnósticos pouco satisfatórios acerca da alfabetização: as crianças não estariam sendo alfabetizadas a contento, o que aprenderam de leitura e de escrita não foi suficiente para continuar o processo de escolarização, compreender e interpretar textos, resolver problemas do cotidiano, sair-se bem em situações em que são requeridas a leitura e a escrita. Esse diagnóstico está expresso, por exemplo, nos relatórios do Sistema de Avaliação do Ensino (Saeb),5 nas pesquisas de Klein (1996), Soares (2003; 2010), Gomes Senna (1995), Mendonça; Mendonça (2008), Tfouni (2010) e por outros autores.

Uma teoria coerente de alfabetização deverá basear-se em um conceito desse

processo suficientemente abrangente para incluir a abordagem “mecânica” do

ler/escrever, o enfoque da língua escrita como um meio de expressão/compreensão, com especificidade e autonomia em relação à língua oral, e, ainda, os determinantes sociais das funções e fins da aprendizagem da língua escrita (SOARES, 2010, p. 18).

Segundo Soares (2003), resultados do Saeb vêm mostrando que aproximadamente 33% dos alunos com quatro anos de escolaridade ainda são analfabetos. Cagliari (1992) denuncia que uma das causas do fracasso escolar de crianças na alfabetização se deve à

incompetência técnica dos alfabetizadores, visto que “sem o conhecimento competente da

realidade linguística compreendida no processo de alfabetização é impossível qualquer

didática, metodologia ou solução de outra ordem” (CAGLIARI, 1992, p. 9).

Cagliari defende a retórica da necessária e inadiável capacitação de professores. No entanto, Soares (2010) esclarece que o alfabetismo envolve uma multiplicidade de facetas, variedades e heterogeneidade de dimensões, tendo em vista que a diversidade de suas relações com a sociedade e a cultura leva a concluir não só que é impossível formular um conceito genérico desse fenômeno, como também são inúmeras as perspectivas teóricas e metodológicas de acordo com as quais se pode analisar o processo de alfabetização. Assim:

Resulta daí uma visão fragmentária do processo, e muitas vezes, uma aparente incoerência entre as análises e interpretações propostas. Uma teoria coerente de alfabetização exigiria uma articulação e integração dos estudos e pesquisas a respeito de suas diferentes facetas. Essas facetas referem-se, fundamentalmente, às

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perspectivas psicológica, psicolinguística, sociolinguística e propriamente linguística do processo (SOARES, 2010, p. 18, grifo do autor).

Embora os estudos e as teorias que acercam os métodos e as práticas de alfabetização tenham avançado em nível teórico e de pesquisas, autores como Cagliari (1992), Soares (2003; 2010) e Gomes Senna (1995) denunciam que o paradigma mecanicista priorizado na tendência Pedagógica Liberal Tradicional ainda é considerado por alguns professores o baluarte mais seguro para a alfabetização. Isso ocorre mesmo quando os professores percebem sua insuficiência para reverter o quadro de fracasso em relação ao domínio efetivo da leitura e da escrita e ao uso social desses instrumentos na qualidade de vida da população. Ressalte-se ainda que nesse modelo o cartilhamento6é prática usual e sedimentada.

Na literatura a respeito do conceito de método na área de ensino, observa-se um conceito genérico sob o qual podem ser abrigadas tantas alternativas quanto quadros conceituais diversos (CAGLIARI, 1992). Para Soares (2010, p. 93), método é:

A soma de ações baseadas em um conjunto coerente de princípios ou de hipóteses psicológicas, linguísticas, pedagógicas, que respondem a objetivos determinados. Um método de alfabetização será, pois, o resultado da determinação dos objetivos a atingir (que conceitos, habilidades, atitudes caracterizarão a pessoa alfabetizada?), da opção por certos paradigmas conceituais (psicológico, linguístico, pedagógico), da definição, enfim, de ações, procedimentos, técnicas compatíveis com os objetivos visados e as opções teóricas assumidas (grifo do autor).

Até a década de 1980, pesquisas e práticas pedagógicas na alfabetização orientavam-se pela abordagem tradicional. Nessa abordagem, ler e escrever são habilidades mecânicas adquiridas mediante o treino e a decifração de códigos. A sequência dos conteúdos deveria obedecer a uma hierarquização: de um ponto inferior a um superior e assim sucessivamente. O tempo das aquisições era identificado por níveis de aquisição dos conhecimentos. O saber era organizado e compactado. Para Soares (1985), na abordagem tradicional, alfabetizar-se significa codificar língua oral em língua escrita e decodificar língua escrita em língua oral (leitura). Essa abordagem encontra referência na Tendência Liberal Tradicional.7

Até o final da década de 1980, a preocupação com o método, com a melhor forma de ensinar é tão notória que, segundo Soares (1985), durante quase trinta anos as pesquisas

6 Nas décadas de 1960 a 1980, as cartilhas eram distribuídas pelo MEC às escolas públicas. Em 1996, o programa foi aperfeiçoado e as cartilhas foram trocadas por livros analisados e avaliados. O programa passou a ser conhecido como Programa Nacional do Livro Didático (PNLD- MEC).

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realizadas em alfabetização no Brasil reduziram-se, quase exclusivamente, ao enfoque do tema método. Os “modos de se alfabetizar” eram, portanto, a questão principal na produção científica no campo da alfabetização. Predominava a necessidade de avaliar por meio de processos psicométricos advindos da psicologia, que marcavam as diferenças entre os alunos quanto à capacidade de aprender. Esse marco teórico coincide com a visão da Pedagogia Liberal – movimento da escola nova.8

Essa fase no histórico da educação brasileira, aprofundando-se nas teorias da alfabetização, ocorre em paralelo ao paradigma mecanicista da alfabetização. Esse modelo tem respaldo nas teorias norte-americanas da linguística estruturalista e da psicologia comportamentalista. A prática de alfabetizar concentra-se, exclusivamente, no desenvolvimento das habilidades específicas de codificar e decodificar o código escrito e associar diretamente a fala à escrita (aprendizado da técnica da escrita). O método estava assentado na automação de regras e na equivalência entre a forma oral e a escrita, não chegando a intervir sobre a habilidade de criar ou interpretar sentenças no sentido textual (GOMES SENNA, 1995).

O processo avaliativo, segundo esse paradigma, estava centrado no tempo médio do aluno para dominar adequadamente a escrita/leitura. Os alunos não eram guiados a criar ou interpretar sentenças no sentido textual Dessa concepção os alfabetizadores evoluíram, partindo do pressuposto silábico em duas direções: os métodos fônicos – sistemas de descrição fonéticos fonológicos, advindos do estruturalismo linguístico, e métodos indutivos, influenciados pela psicologia gestaltista (década de 1950), que viria a propor resposta à psicologia comportamentalista. Contudo, segundo Gomes Senna (1995), esses métodos não demonstraram mudança significativa que justificasse a ruptura com o paradigma mecanicista porque também não contemplaram a textualidade discursiva, divergindo apenas do percurso traçado para iniciar e concluir o processo alfabetizador.

Segundo Araújo (1996, apud MENDONÇA; MENDONÇA, 2008), a história da alfabetização pode ser dividida em três grandes períodos: o primeiro inclui a Antiguidade e a Idade Média, quando predominou o método da soletração; o segundo, que se inicia pela reação contra o método da soletração, entre os séculos XVI e XVIII, estende-se até a década

8

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de 1960, e se caracteriza pela criação de novos métodos sintéticos e analíticos;9 o terceiro período, marcado pelo questionamento e pela refutação da necessidade de se associar os sinais gráficos da escrita aos sons da fala para aprender a ler, iniciou-se em 1986, com a divulgação da teoria da Psicogênese da Língua Escrita.

Mendes (1992) relata que a partir da década de 1970 surgiram críticas à educação escolar, encaminhadas inicialmente pelos teóricos da chamada Sociologia da Educação (Bourdieu, Passeron, Althusser, Baudelot, entre outros). Esse ideário pedagógico denominado Pedagogia Progressista denunciou a participação da escola na manutenção e no fortalecimento de uma sociedade injusta e discriminatória (BOURDIEU;PASSERON, 1975). A Pedagogia Progressista, termo utilizado pela primeira vez por Snyders em 1974, expressa o pensamento de toda a pedagogia preocupada em transformar a realidade e em não se acomodar com as desigualdades sociopolítico-econômicas da sociedade capitalista. Nessa tendência encontram-se as vertentes libertária, libertadora e crítico social dos conteúdos (LIBÂNEO, 1994).

Em se tratando das práticas e dos métodos da alfabetização fundamentados pela Pedagogia Mecanicista, as práticas passaram a ser duramente criticadas porque ratificavam o que as críticas sociológicas denunciavam: o concurso da própria educação para a produção de fenômenos maciços de fracasso escolar, particularmente evidenciados na alfabetização, na passagem da primeira para a segunda série do Ensino Fundamental.

A modalidade da língua escrita-código a serviço das classes sociais dominantes denunciadas pela proposta da Pedagogia Progressista também encontrou ruptura na automação do código, da hegemonia da forma da língua culta como língua do Estado,10 contribuindo para o surgimento e a instauração do paradigma linguístico. A teoria do Déficit Linguístico de Bernstein (1971) e a teoria Sociolinguística Quantitativa de Labov (1972) foram determinantes para seu surgimento.

O método linguístico é motivado pela linguística funcionalista vinculada ao estruturalismo. Seu objetivo é privilegiar o aprendizado das diferentes modalidades de

expressão da língua escrita, assim considerando diferentes níveis de inserção social. “Saber

9Os métodos de soletração, fônico e silábico são de origem sintética, pois partem da unidade menor rumo à

maior, isto é, apresentam a letra, depois unem letras e obtêm a sílaba, unem sílabas e compõem palavras, unem palavras e formam sentenças, juntam sentenças e formam textos. Há um percurso que caminha da menor unidade (letra) para o maior (texto). Os métodos da palavração, da sentenciação e os textuais são de origem analítica, pois partem de uma unidade que possui significado para então fazer sua análise (segmentação) em unidades menores (MENDONÇA; MENDONÇA, 2008).

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usar a língua escrita, nesse caso, é saber usá-la para socializar” (GOMES SENNA, 1995, p.

228, grifo do autor).

O método linguístico estabelece percurso compensatório por meio do qual o alfabetizando absorve o meio como expressão da cultura dominante. Dessa forma, não rompeu com os métodos tradicionais (fônicos e dedutivos) nem trouxe contribuições para a prática alfabetizadora quanto às habilidades para aprendizagem do código escrito. É um método visto ainda como uma prática compensatória com forte influência da linguística positivista.

As críticas ao paradigma mecanicista trazidas por Labov (teoria sociolinguística) serviram ao dimensionamento conceitual e prático da alfabetização. Para o autor, a língua transforma-se no tempo e no espaço como um processo evolutivo inadiável e incontrolável por leis externas: há estágios evolutivos na gramática explicados por manifestações empíricas e universais em que se legitimam estados diferenciados da língua igualmente corretos e eficazes. As considerações de Labov e outros11 atreladas às influências teóricas da Sociologia Crítica à educação são precursoras do paradigma sociolinguístico (SOARES, 2010).

As apreensões sociais e políticas do paradigma sociolinguístico serviram, ainda, para que o alfabetizando pudesse ser visto em sua totalidade epistêmica, uma vez que a educação precisou encarar as heterogeneidades do indivíduo, de sua linguagem, de sua história e de sua cultura. O indivíduo é então concebido como perpassado e constituído por sistemas simbólicos. O modelo de representação do código escrito passa a contemplar as teorias epistemológicas condizentes com o pensamento contemporâneo.

Surge assim o paradigma semioticista, que implica muito mais do que uma teoria sobre a alfabetização, como nos afirma Gomes Senna (1995, p. 227).

[...] pois se reúne ao conjunto de teorias epistemológicas que leem, neste fim de século, a natureza do pensamento contemporâneo. Para além do sistema de expressão, existe um homem dotado de linguagem, para além deste, existe uma sociedade semiótica.

A prática alfabetizadora semioticista é revolucionária, segundo Gomes Senna (1995), pois não se sustenta num método, tal como os paradigmas anteriores, mas sim em práticas mobilizadoras do alfabetizando. Este, por sua vez, deverá hipotetizar, descobrir o processo por meio do qual se constroem os códigos linguísticos exigidos pela civilização. Essa prática

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Tabela 1 – Matrizes Curriculares do Ensino Fundamental no Distrito Federal  Ensino Fundamental de nove anos
Figura 1 – Planejamento: pertinência entre diagnóstico, rotina pedagógica e avaliação formativa
Figura 2 – Ensino-aprendizagem e organização do tempo no BIA  Formação  Continuada  Reagrupamento  Projeto  Interventivo  Avaliação  Formativa  Ensino da Língua  Ensino da  Matemática
Figura 3 – Organograma das Diretrizes  Metodológicas e Estratégias  Pedagógicas do BIA
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