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Repositório Institucional UFC: O papel da jurisprudência na admissibilidade recursal

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PROCESSUAL

ROSELANE DE AQUINO LUZ

O PAPEL DA JURISPRUDÊNCIA NA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

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ROSELANE DE AQUINO LUZ

O PAPEL DA JURISPRUDÊNCIA NA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

Monografia apresentada ao curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Juvêncio Vasconcelos Viana

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ROSELANE DE AQUINO LUZ

O PAPEL DA JURISPRUDÊNCIA NA ADMISSIBILIDADE RECURSAL

Monografia submetida ao curso de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Aprovada em:____/____/_______

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________ Prof. Dr. Juvêncio Vasconcelos Viana (Orientador)

Universidade Federal do Ceará

_________________________________________ Prof. Ms. Dimas Macedo

Universidade Federal do Ceará

_________________________________________ Prof. Daniel Gomes de Miranda

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AGRADECIMENTOS

À minha mãe, Roseli de Aquino Luz, meu modelo de bondade, generosidade e paciência, pelos conselhos e apoio incondicional em todas as minhas decisões.

Ao meu pai, Francisco Antônio da Luz, exemplo na graduação seguida, pelo abraço não dado, mas mesmo assim sentido!

Ao meu irmão, Rodrigo de Aquino Luz, pela vibração com minhas vitórias e pelas conversas sobre o Direito.

Ao Gustavo Alencar Oliveira, cúmplice de todas as horas, pelas dicas durante a faculdade e pelas horas de desespero sempre acalmadas com muito carinho.

Ao professor e eterno chefe-amigo, Juvêncio Vasconcelos Viana, por todo o conhecimento compartilhado com paciência.

Ao professor e amigo Daniel Gomes de Miranda, pelos conselhos sempre pertinentes.

Ao professor Dimas Macedo, por ter aceitado o convite de participar da banca examinadora desta monografia.

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"Eu não sei o caminho para sucesso; mas, sem dúvida, o caminho para

o fracasso é agradar a todos."

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RESUMO

A crescente utilização da jurisprudência como instrumento de celeridade processual resultou na criação da súmula impeditiva de apelação. A falta de uniformização jurisprudencial, contudo, torna precária o emprego das súmulas e dos entendimentos majoritários como atalhos processuais. Serão aqui pontuados os principais aspectos da isonomia dos julgados e da súmula impeditiva sob o enfoque da atual conjuntura de um processo célere. Destarte, através de vasta pesquisa na doutrina, na legislação e na jurisprudência procurou-se analisar por uma visão crítica as reformas processuais, em especial a Lei 11.267/2006, que inseriu a súmula impeditiva no ordenamento processual, sob o enfoque das constantes alterações dos entendimentos jurisprudenciais e da prática de julgados diversos para situações exatamente iguais. Os argumentos utilizados buscam conferir maior celeridade processual, sem, contudo, desprestigiar a segurança jurídica e o duplo grau de jurisdição.

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ABSTRACT

The increasing use of law as an instrument of speedy trial resulted in the creation of precluding appellate docket. The lack of uniformity of case law, however, makes the use of precedents and understandings as major procedural shortcuts a risk. Here will be demonstrated the main aspects os equality of the summary trial and precedent attached under the lack of speedy trial. Thus, through extensive research in doctrine, legislation and case law we analyzed, in a critical view, the procedural reforms, especially 11.267/2006 law, which entered the precedent impediment in procedural law, under the approach of the constant changes in jurisprudential understandings. The arguments seek to provide more speedy process, but without discrediting the legal security and the two levels of jurisdiction.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 A JURISPRUDÊNCIA COMO FONTE PRIMÁRIA DO DIREITO ... 11

2.1 Jurisprudência: origem e conceito ... 11

2.2 Precedentes, jurisprudências, súmulas: uma evolução desenfreada ... 12

2.3 A jurisprudência (des)uniforme ... 14

2.3.1 Incidente de uniformização jurisprudencial ... 16

2.3.2 As súmulas ... 18

2.4 Súmula vinculante ... 19

2.5 A supervalorização jurisprudencial ... 23

3 A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO ... 26

3.1 A descomunal demora na prestação jurisdicional ... 26

3.2 A celeridade processual como pretexto para a potencialização da jurisprudência e as inúmeras reformas processuais ... 30

3.3 Recursos: os vilões processuais ... 32

4 SÚMULA IMPEDITIVA DE APELAÇÃO ... 35

4.1 Instrumento de redução da quantidade de recursos... 35

4.2 Aplicação... 37

4.3 Dever ou faculdade do juiz? ... 39

4.4 Recorribilidade ... 39

4.4.1 Provimento do agravo e subida da apelação ... 42

4.5 Súmula impeditiva para todos os recursos? ... 42

4.6 Juízo de admissibilidade ou juízo de mérito? ... 44

4.7 Súmula impeditiva e os poderes do relator ... 46

4.8 Súmulas impeditiva e vinculante ... 47

4.9 Constitucionalidade ... 48

4.9.1 O duplo grau de Jurisdição ... 49

4.9.2 A constitucionalidade da súmula impeditiva ... 51

5 CONCLUSÃO ... 55

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1 INTRODUÇÃO

É do conhecimento de todos que a justiça anda a passos lentos. Até mesmo os leigos, que nunca dela necessitaram, têm consciência da crônica morosidade do sistema processual.

É nessa conjuntura que nasceram inúmeras leis mini-reformadoras do ordenamento processual. Dentre elas nos releva a Lei 12.276/2006 que, entre outras alterações pontuais, introduziu no Código de Processo Civil a chamada “súmula impeditiva de recursos”, pela qual se modificou a regência do recebimento do recurso de apelação.

Em síntese, a súmula impeditiva consiste na inadmissão e não conhecimento do recurso de apelação pelo juízo a quo quando existir súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal fundamentando a sentença recorrida.

A intenção do presente estudo é, pois, refletir sobre o crescente aproveitamento da jurisprudência como meio de celeridade processual e efetivação da prestação jurisdicional, em uma conjuntura cada vez mais grave de morosidade do sistema.

De fato, o legislador processual optou por prestigiar a jurisprudência dominante e sumulada dos Tribunais pátrios inserindo e modificando diversos dispositivos do Código de Processo Civil para contemplar os entendimentos consolidados.

A jurisprudência merece sim ser utilizada em todo o seu potencial unificador de decisões. Todavia, é preciso tecer algumas considerações antes de aceitá-la como instrumento de celeridade processual.

Em verdade, os precedentes jurisdicionais nem sempre representam juízos efetivamente consolidados. As mudanças nos entendimentos jurisprudenciais são cada vez mais freqüentes. Se em um ano o Supremo Tribunal Federal decide que sim, no ano seguinte ele decide que não. Essa prática provoca insegurança jurídica e desprestigia a isonomia dos julgados.

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Dessa forma, não há como existir segurança jurídica em um dispositivo que contenha em seu cerne a jurisprudência, se o próprio entendimento paradigmático não é seguro ou se existem vários entendimentos para o mesmo caso. Antes de qualquer coisa, é necessário haver uma uniformização jurisprudencial que permita a estabilidade dos entendimentos e a isonomia nos julgados para então o legislador poder contemplar de forma segura a jurisprudência nos procedimentos processuais.

Não obstante, o legislador, nada precavido, optou por inserir a súmula impeditiva no ordenamento, utilizando - apesar das críticas - a jurisprudência como um atalho para diminuir a quantidade de recursos remetidos aos tribunais.

Os recursos, por serem verdadeiros vilões da celeridade processual, são os alvos mais evidentes na busca incessante por uma tutela jurisdicional ágil, de forma que o legislador cria a contento inúmeros instrumentos que facilitam a decisão dos magistrados e obstam o recebimento dos recursos. Todavia, o princípio do duplo grau de jurisdição acaba sofrendo exacerbada mitigação sob o pálio da necessidade de processo célere.

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2 A JURISPRUDÊNCIA COMO FONTE PRIMÁRIA DO DIREITO

Apesar de não ser assim consagrada pelo ordenamento processual1, é crescente a concepção de fonte do direito que a jurisprudência toma para si.

Tanto os operadores do direito como o legislador costumam recorrer à jurisprudência para solucionar os julgados e os entraves processuais. Até mesmo onde há lei que regule, a jurisprudência é utilizada a contento.

A busca pela motivação da atual ascensão valorativa da jurisprudência no sistema processual constitucional, portanto, nos leva a pesquisar sua origem, significado e natureza em uma tentativa de encontrar em suas bases a razão da elevação de seu status.

2.1 Jurisprudência: origem e conceito

Apesar de alguns textos da antiguidade mais remota aparentemente evidenciarem a existência de uma atividade similar ao que, atualmente, conhecemos como entendimento jurisprudencial, é no período romano que se encontra a raiz desse instituto. 2

No período romano a expressão jurisprudência estava ligada ao trabalho de interpretação e esclarecimento dos textos jurídicos realizados pelos jurisconsultos, que ora utilizavam o conhecimento das coisas divinas e humanas, ora a ciência do justo e do injusto para construir suas teses.3

A etimologia da palavra jurisprudência - juris e prudentia – inclusive nos remonta à sua origem romana evocando os pareceres dados pelos jurisconsultos, também chamados prudentes4.

1 Confirmando a ausência de previsão da jurisprudência como fonte formal, José de Albuquerque Rocha assim

justifica: “Esta exclusão, deve-se, provavelmente, a uma concepção estreita do legislador sobre a jurisdição, qual seja, a de que um juiz é mero “aplicador” da lei.” (2006, p. 58.)

2 Nesse sentido, apontamos de Paulo Dourado Gusmão: “[...] antes de Roma, não se pode falar em

jurisprudência, pois na Grécia, onde as idéias filosóficas e políticas se desenvolveram, a jurisprudência se confundia com a ética, com investigações sobre a República perfeita, a lei justa, a justiça considerada como

virtude” (1925 apud MANCUSO, 2007, p. 11.) 3 MANCUSO, 2007, p. 12.

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Atualmente, a jurisprudência é resultante de situações diversas das utilizadas no período romano. Ganhou outros ares e evoluiu de forma exponencial até se transformar em fonte do direito.

Em sentido comum, ou menos técnico, como o apresentado por alguns dicionaristas, jurisprudência indica a “Ciência da legislação e do Direito” 5. Nessa acepção Rodolfo de Camargo Mancuso apresenta a seguinte definição: a jurisprudência “representa a somatória indiscriminada do produto judiciário, isto é, a grande massa de decisões, de mérito ou não, consonantes ou discrepantes, terminativas ou finais, prolatadas por órgão similares ou colegiados, em todo o país e em todas as Justiças” 6.

Por uma visão mais técnica do instituto, podemos afirmar tratar-se de um conjunto ordenado de decisões congruentes sobre uma mesma matéria, proferidas em determinado Tribunal. Essa acepção, contudo, não transparece o espírito paradigmático da jurisprudência que nos sobressalta.

Não obstante, é pela acepção prática que podemos visualizar todo o poder conferido às jurisprudências. Quando uma decisão se destaca de forma reiterada, projetando efeitos em face de outras demandas, sua inteligência passa a ser considerada jurisprudencial e, logo, paradigmática.

Jurisprudência é, portanto, o conjunto uniforme e constante das decisões judiciais sobre casos semelhantes, que revela a interpretação correta da norma para ser aplicada ao caso in concreto.

2.2 Precedentes, jurisprudência, súmula: uma evolução desenfreada

O direito português, que muito influenciou a constituição das leis brasileiras, apresentava, em seu antigo sistema normativo, a previsão do instituto dos ‘assentos’, segundo o qual um colegiado de julgadores fixava o entendimento que deveria ser dado à determinada ordenação. Caso um magistrado deixasse de aplicar o entendimento assentado sujeitava-se até a ser suspenso.7

5 MANCUSO, 1989, p. 1

6

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O ‘assento’, portanto, era ato do Poder Judiciário que objetivava conferir à lei interpretação exata. Por ele, não se julgava um caso in concreto, apenas determinava-se o entendimento que deveria ser conferido à lei, quando a seu respeito sobrevinham divergências nas sentenças.8

Os assentos foram, em verdade, a semente dos atuais entendimentos jurisprudenciais. Já no Brasil imperial o Supremo Tribunal tinha competência para tomar assentos sobre as leis civil, comercias, e criminais, quando houvesse julgamentos divergentes9. Desde então, a utilização de mecanismos uniformizadores dos julgados só cresceu.

Quando a República foi constituída, seu sistema normativo não adotou a previsão dos assentos, mas continuou buscando formas de uniformização da jurisprudência. O atual recurso extraordinário é resultante dessa conjuntura.

A Constituição de 1891 instituiu o recurso, sem nomeá-lo, permitindo sua interposição quando houvesse divergência doutrinária. Entretanto, somente com a Constituição de 1926 foi expressamente conferida ao Supremo Tribunal Federal a função unificadora de julgar recurso extraordinário nos casos em que dois ou mais tribunais estaduais interpretassem de forma divergente a mesma lei federal.

Ainda no espírito unificador, em 1963, por orientação do Supremo Tribunal Federal, foi criada a ‘Súmula da Jurisprudência Predominante’, que tinha por objetivo atenuar o problema, que ainda hoje persegue os tribunais pátrios, da sobrecarga dos órgão jurisdicionais10.

Embora não houvesse disposição legal no sentido de conferir efeito vinculante aos entendimentos fixados pela Súmula, ela exerceu enorme influência nos julgamentos dos tribunais e dos juízes de primeiro grau. Poucas sentenças e acórdãos tentavam inovar, adotando tese destoante dos entendimentos constantes da Súmula. Comumente, os julgados não faziam qualquer referencia à legislação, aplicando a Súmula da Jurisprudência Dominante como seu único fundamento11 - ainda hoje, há juízes que utilizam essa prática indiscriminadamente.

O anteprojeto do Código de Processo Civil, de autoria de Alfredo Buzaid, até tentou, sem sucesso, ressuscitar o mecanismo dos antigos assentos. A intenção do anteprojeto era de que a tese jurídica tomada pela maioria absoluta dos membros de cada Corte Suprema

8 STRECK, 1995, p. 100.

9Ibid., p. 85. 10

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seria obrigatória enquanto não modificado por outro acórdão proferido em sentido diverso. Caberia, então, ao Presidente do respectivo Tribunal baixar assento, que passaria a ter força de lei. O projeto, contudo, abandonou a idéia dos assentos, atribuindo à matéria novo aspecto inspirado nas súmulas do Supremo Tribunal Federal12.

Os assentos portugueses, portanto, foram responsáveis pela introdução da idéia de uniformização dos julgados no direito brasileiro, que passou a ser uma obsessão buscada pelo legislador e pelo intérprete.

Atualmente a jurisprudência encontra-se em ascensão exponencial. Não bastasse a sua utilização para a uniformização dos julgados, sua eficácia gradativamente potencializada pelas inúmeras reformas processuais e constitucionais resultou na criação de institutos como a súmula vinculante e a súmula impeditiva que, por vezes, impedem a criação de novos julgados, cerceando o livre convencimento do magistrado, conforme veremos adiante.

2.3 A jurisprudência (des)uniforme

Conquanto haja uma forte tendência do legislador e dos órgãos jurisdicionais em dotar as súmulas e a jurisprudência de força cada vez mais expressiva, não se percebe, na jurisprudência e nos julgamentos, intenção equivalente, no sentido de buscar uma uniformidade jurisprudencial.13

Os entendimentos jurisprudenciais são, em verdade, volúveis; e as súmulas, instrumentos que deveriam transcender os entendimentos dos tribunais, nem sempre são pautadas em juízos consolidados. Ao contrário, já é prática comum o abandono de súmulas e, até mesmo, a edição de novo enunciado, tratando a matéria de forma completamente diversa.14

Dada a relevante função Constitucional dos órgãos jurisdicionais superiores, espera-se que quando um de seus tribunais enuncia uma decisão, desta se possa extrair um adequado modelo de julgamento a ser utilizado como padrão para as decisões futuras proferidas pelos demais órgãos judiciais. Mais relevante, espera-se que os julgamentos dos

12 MOREIRA, 2005, p. 23.

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próprios Tribunais Superiores sigam a mesma orientação anteriormente adotada, de forma a consolidá-la.15

As constantes divergências jurisprudências internas, tanto do Supremo Tribunal Federal, como do Superior Tribunal de justiça, comprometem sua função constitucional de uniformização e acarretam insegurança na interpretação correta de normas constitucionais e federais.

Caso, perfeitamente pontuado por Medina, Wambier e Wambier, que demonstra o impacto negativo das divergências nos entendimentos jurisprudências dos Tribunais Superiores ocorreu quando o Supremo Tribunal Federal manifestou-se sobre a constitucionalidade da penhora do bem de família de fiador em contrato de locação. 16

Em 2005, a Corte máxima considerou inconstitucional a penhora daqueles bens.17 Diante disso, como não poderia deixar de ser, diversos tribunais do País passaram a adotar o mesmo entendimento. Inúmeras penhoras foram canceladas e decisões reformadas com fundamento no arranjo proferido pelo Supremo Tribunal Federal.

O posicionamento da Corte Suprema, todavia, não se manteve por muito tempo. Em 2006, apenas um ano depois, o Supremo Tribunal Federal, novamente, emitiu juízo sobre o mesmo tema, dessa vez apontando a constitucionalidade da penhora do bem de família de fiador em contrato de locação.18

Mais uma vez decisões foram reformadas com base no novo entendimento propagando a insegurança jurídica e a insatisfação das partes.

Situações como essa, apesar de ordinariamente serem toleradas pelo sistema, devem sempre ser evitadas, principalmente pelos Tribunais Superiores, responsáveis, implícita e explicitamente, pela uniformização das decisões do Poder Judiciário.

A uniformização dos entendimentos jurisprudenciais é atitude que se faz imperiosa, principalmente no que diz respeito às questões constitucionais e federais.

Embora a uniformidade jurisprudencial seja desejável, fato é: o processo civil brasileiro convive com a prestação jurisdicional desigual para casos idênticos. Justamente por essa oposição não ser desejada é que o sistema busca criar mecanismos de prevenção da contradição de julgados, como a súmula vinculante.

Quando essas situações de julgamento desiguais para casos iguais acontecem, princípios constitucionais, como o da legalidade e da isonomia, são ofendidos. Se a lei

15 MEDINA; WAMBIER; WAMBIER, 2006, p. 231. 16 Ibid., p. 232/235.

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comporta diversas interpretações, e não há meios legítimos e eficazes para uniformizá-las, fatalmente o jurisdicionado terá tantas decisões quantas interpretações houver.

O princípio da isonomia, insculpido no caput do artigo 5º da Constituição Federal19, afirma que todos são iguais perante a lei, logo, a lei deve tratar a todos de modo uniforme. E é na aplicação dessa uniformidade que entra o trabalho dos tribunais de tentar respeitar o entendimento tido por correto e decidir de forma idêntica em casos iguais.

O trabalho de uniformização jurisprudencial, portanto, deve ter como base o princípio da isonomia, pelo qual todos devem ser tratados de forma congruente, inclusive, e principalmente, aqueles que procuram a guarida jurisdicional.

A lei é uma só para todos e sua interpretação também deve ser. Todavia, na prática, é comum haver duas ou mais decisões completamente diferentes a respeito do mesmo dispositivo aplicado a casos similares.

Visando evitar essas situações é que foram criados institutos como o incidente de uniformização da jurisprudência, a súmula vinculante e até mesmo os recursos extraordinários, que se prestam, em certa medida e exercer função uniformizadora.

2.3.1 Incidente de uniformização da jurisprudência

Dentro da vastidão de julgados desiguais para casos iguais surge o incidente de uniformização de jurisprudência, com sentido corretivo, para os casos em andamento, e preventivo, para os casos futuros.

A função do incidente de uniformização é, portanto, tentar manter a unidade da jurisprudência interna de determinado tribunal, buscando em cada caso concreto a inteligência correta a ser aplicada.

Conforme delineado, é comum existir em uma corte julgamentos conflitantes para uma mesma tese jurídica. Essa prática, embora tolerada pelo sistema, deve ser abolida e uma das possibilidades para sua extinção encontra-se regulada exatamente no incidente de uniformização jurisprudencial.

Com efeito, ao constatar-se a utilização de diversos entendimentos para uma única situação, é cabível suscitar o incidente a fim que o pleno do tribunal se manifeste sobre o

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tema. Fixada a premissa, o tribunal deverá aplicá-la ao caso concreto que gerou o incidente de uniformização.

Enquanto o pleno não resolver o incidente, o julgamento do caso, seja originário do tribunal ou decorrente de recurso, deverá permanecer sobrestado. Depois de fixada a tese jurídica a ser adotada, o resultado da deliberação será obrigatoriamente aplicado e o processo poderá prosseguir.

A natureza do instituto – como o próprio nome indica – é incidental. Os legitimados suscitam a divergência e o pleno, de forma incidente, apresenta manifestação. Não se trata, portanto, de recurso, ação autônoma e nem outro meio de impugnação qualquer.20

Com efeito, a manifestação do pleno não é decisão, é apenas uma afirmação da tese jurídica a ser aplicada ao caso que deu origem ao incidente de uniformização. Quem julga, em verdade, é a câmara, que irá utilizar a inteligência do pleno para decidir.

Assim sendo, a parte que se sentir prejudicada deverá interpor recurso contra a decisão da turma ou câmara que julgou o feito. Não cabe recurso contra a manifestação do plenário exatamente por não se tratar de uma decisão in concreto.

O incidente pode ser suscitado por qualquer juiz que vote no julgamento ou pela parte.

Tanto o recorrido como o recorrente, cientes da existência de controvérsia no Tribunal, poderão provocar o incidente em suas razões recursais ou por meio de petição avulsa enquanto pendente o recurso. Ao juiz compete, mesmo que as parte não o provoquem, de ofício, suscitar o pronunciamento prévio do plenário do Tribunal acerca da tese aplicável ao caso sub judici, que apresente questão controvertida e relevante.

Há quem defenda a possibilidade de o Ministério Público também suscitar o incidente de uniformização jurisprudencial.21 Em verdade, se o parquet atuar na qualidade de parte ou, na condição de custus legis, recorrer da sentença será legitimado a invocar o incidente de uniformização, exatamente pela qualidade de sujeito processual que lhe é conferida nesses casos.

O incidente de uniformização processual é, portanto, medida legítima de uniformização dos julgados, que infelizmente não possui o destaque e o prestígio que merece dos tribunais e do legislador.

20 GRECO FILHO, 2009, p. 394.

21 Nesse sentido apontamos Nelson Nery Junior: “Como a matéria envolvida é de interesse público (unidade da

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2.3.2 As súmulas

A súmula é um enunciado editado pelos Tribunais que contém um resumo de entendimento jurisprudencial majoritário destinado à orientação dos demais julgamentos que lhe sucedem. Elas encerram um posicionamento sobre determinada matéria recorrente do Tribunal a que pertence. 22

Destarte, a finalidade das súmulas é conferir estabilidade à jurisprudência, prestigiando a segurança jurídica na identidade de julgamentos para casos iguais, bem como facilitar o trabalho dos operadores e intérpretes do Direito.

Conforme disposição do artigo 479 do CPC, no julgamento do incidente de uniformização da jurisprudência, o tribunal, ao fixar a tese jurídica vencedora, poderá editar enunciado que será inserido na súmula de sua jurisprudência dominante.

Dessa forma, as súmulas expressam a refinada interpretação da jurisprudência dominante de um Tribunal, produzindo, enquanto vigentes, efeitos processuais em relação a casos idênticos levados à apreciação dos respectivos tribunais.23

A súmula funciona como meio de dinamização dos julgamentos e instrumento de uniformização jurisprudencial, de forma que seu deve apenas refletir a exegese da lei, sem criar nova regra jurídica, ou seja, a súmula não faz papel de lei, mas sim de orientação da interpretação da lei.24

Com efeito, a norma jurídica, por ser geral e abstrata, pode apresentar interpretações diversas em um mesmo contexto. A interpretação de lei que seja comumente aplicada por um Tribunal a reiterados casos pode resultar na criação de súmulas, que encerram a dubiedade da norma jurídica a que se referem.25

A súmula desempenha, desse modo, papel relevante, registrando qual interpretação da norma se faz correta, devendo prevalecer nos julgamentos futuros sobre o mesmo objeto. 26

22 Nelson Nery Júnior resume, com propriedade o conceito de súmula assim dispondo: “A Súmula é o conjunto

das teses jurídicas reveladoras da jurisprudência reiterada e predominante no tribunal e vem trazida em forma de verbetes sintéticos e editados.” (2007, p 667).

23 STRECK, 1995, p. 125.

24 Nesse sentido colacionamos o entendimento de Medina, Wambier e Wambier “[...]a lei e a súmula não se

encontram num mesmo plano. Na verdade, a súmula deve se subordinar à lei, já é interpretação desta.” (2006, p. 229).

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O crescente prestígio processual que o legislador vem atribuindo às súmulas demanda um maior cuidado na edição de seus enunciados. Não é admissível que um instituto gerado de um incidente de uniformização jurisprudencial apresente entendimento dúbio e inconsistente.

O descrédito que súmulas mal elaboradoras incutem no sistema, pode ser facilmente atalhado pelo Tribunal que toma cautelas em sua edição.

Segundo Medina, Wambier e Wambier, uma das maneiras de evitar que a súmula gere problemas de interpretação é que esta não contenha, em seu enunciado, conceitos vagos e indeterminados. 27 Ademais, por seu caráter paradigmático conclui-se que a matéria por elas versada deve ser atemporal, capaz de se repetir ao longo do tempo de modo efetivo.

Esses cuidados na edição das súmulas evitam a tão comum prática de abandono de entendimento sumulado ou de modificação de seu enunciado. Todo cuidado é pouco quando um Tribunal for editar súmula, principalmente quando tratar-se de súmulas dos tribunais superiores.

2.4 Súmula vinculante

A sucessivas reformas processuais decorrentes da insatisfação com o desempenho do sistema judiciário não se limitaram às reformas infraconstitucionais anteriormente apontadas, foi além alterando a própria Constituição.

Com efeito, o artigo 103-A da Constituição Federal28 introduziu a súmula vinculante no ordenamento jurídico tornando-a a concepção processual mais expressiva e ambiciosa da Emenda Constitucional nº 45 que hoje se apresenta como um instrumento legítimo, embora não ideal, de uniformização dos entendimentos do Supremo Tribunal Federal.

O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, após reiteradas decisões sobre a Matéria constitucional, editar enunciado de súmula, que a partir de sua

27 MEDINA; WAMBIER; WAMBIER, 2009, p. 34.

28 “Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois

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publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação ao demais órgão do Poder Judiciário e à Administração Pública em geral.

A competência para edição da súmula vinculante é atribuída exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal. Outros Tribunais - incluindo o Superior Tribunal de Justiça – somente poderão editar súmulas comuns, sem caráter vinculante, utilizadas para impedir o julgamento de ação ou definir o sentido de determinada norma 29.

Para evitar o engessamento da interpretação constitucional sumulada, o constituinte optou, ainda, por conferir ao Supremo Tribunal Federal a possibilidade de revisão ou cancelamento do enunciado sumulado.

A proposta para a edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante pode ser realizada pelos próprios integrantes do Supremo Tribunal Federal ou pelos legitimados para a ação direta de inconstitucionalidade30. Esse rol, todavia, conforme redação do §2º do artigo 103–A da Constituição31, não é exaustivo, pois é possível que lei ordinária apresente outros legitimados. É o caso da Lei 11.417/2006 que, em seu artigo 3º, estende a legitimidade para edição revisão ou cancelamento de súmula vinculante ao Defensor Público-Geral da União e aos Tribunais. Também o Município poderá propor a edição, revisão ou cancelamento de enunciado de súmula de forma incidental ao curso de processo em que seja parte, conforme redação do §1º do mesmo artigo.

A súmula vinculante, assim como a súmula comum, tem como objeto a validade, a interpretação e a eficácia de normas constitucionais. Embora o artigo 103-A da Carta Magna faça referência expressa à “matéria constitucional”, é possível que a súmula vinculante regule matéria infraconstitucional ao dispor, por exemplo, sobre a compatibilidade de lei com o texto constitucional32.

Embora, em regra, a súmula vinculante produza efeitos de forma imediata, o Supremo Tribunal Federal pode, por maioria de dois terços de seus membros, “restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista

29 MEDINA; WAMBIER; WAMBIER, 2009, p. 32.

30 “Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade: I -

o Presidente da República; II - a Mesa do Senado Federal; III - a Mesa da Câmara dos Deputados; IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal; V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal; VI - o Procurador-Geral da República; VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil; VIII - partido político com representação no Congresso Nacional; IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.” Constituição Federal.

31 “103-A, § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de

súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.” Constituição Federal.

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razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público” 33. Trata-se aqui de uma brecha que o legislador abriu no sentido de ser possível a modulação dos efeitos da súmula.

É possível, ainda, que, além da modulação temporal, haja restrição no alcance dos efeitos vinculantes da súmula nas situações de excepcional interesse público. É o que acontece nos casos de reserva de eficácia vinculativa da súmula a pessoas ou regiões. Pode o Supremo Tribunal Federal, por exemplo, editar súmula vinculante que só produza efeitos no âmbito da União, excluindo os Estados e os Municípios.

Esses permissivos buscam adaptar a súmula vinculante ao meio a que se destina, evitando o seu impacto abrupto de forma a resguardar a segurança jurídica e o interesse público.

O efeito vinculante da súmula é resultante do quorum de dois terços dos membros do Tribunal Federal que votam a favor de sua edição. Esse quorum também é necessário para o caso de cancelamento ou revisão da súmula.

Não só os órgãos do Poder Judiciário, mas também a Administração Pública está vinculada ao enunciado da súmula editada pelo STF. Todos os juízes, tribunais, bem como os agentes da Administração, ao se depararem com situações concretas, devem adotar o entendimento sumulado nos exatos limites de sua edição. O desrespeito ao entendimento sumulado de forma vinculante pode resultar em reclamação dirigida ao STF.

Desse modo, nos casos em que a súmula não for aplicada quando obrigatoriamente deveria ser consagrada, quando for aplicada em situação que não condiz com o enunciado sumulado ou quando sua redação for distorcida caberá reclamação ao STF,

“sem prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação”34.

Em verdade, como o recurso e a reclamação possuem finalidades e pressupostos distintos, não poderia haver óbice algum na interposição concomitante dos dois meios. A parte lesionada pela má aplicação da súmula pode, inclusive, interpor reclamação e Recurso Extraordinário, quando cabível, ambos para o Supremo Tribunal Federal.

Na seara administrativa, contudo, para que a parte possa utilizar-se da reclamação ao STF faz-se imperioso o esgotamento das vias administrativas35. Dessa forma, o administrado que sentir-se prejudicado pela aplicação de súmula vinculante deverá, inicialmente, recorrer da decisão através do processo administrativo requerendo a reconsideração da decisão da autoridade, para, então, poder socorrer-se da reclamação.

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O objetivo desse óbice é evitar a necessidade de ajuizamento da reclamação, de forma que o problema seja solucionado na seara local e administrativa. Sem a interposição do recurso administrativo cabível não será caracterizado o interesse processual e a reclamação poderá ser indeferida pela ausência desta condição da ação.

Ressalta-se que o Poder Legislativo, no exercício de sua função normativa, não fica vinculado à súmula, podendo, inclusive, editar Leis em sentido contrário à sua redação. 36 Nesses casos, cabe ao Supremo Tribunal Federal rever a súmula vinculante, optando pelo reajuste de seu entendimento à nova Lei ou pelo cancelamento do enunciado.

Com efeito, “revogada ou modificada a lei em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante, o Supremo Tribunal Federal, de ofício ou por provocação, procederá à sua revisão ou cancelamento, conforme o caso.” 37.

As considerações que fizemos sobre a atemporalidade das súmulas se aplicam de forma potencializada à edição das súmulas vinculantes. O caráter obrigatório e vinculante das súmulas vinculantes obsta o livre convencimento do juiz e da Administração tolhendo a capacidade de análise do caso concreto, o que impõe uma cautela na edição de seu enunciado.

As súmulas vinculantes, por sua natureza, devem ser elaboradas criteriosamente de forma a não gerar problemas de interpretação maiores do que os gerados pela própria norma de que derivam.38

A Corte Suprema, ao editar uma súmula vinculante, deve, portanto, privilegiar a segurança jurídica e optar por regular, exclusivamente, casos que não sofram modificações constantes. Para as situações passíveis de sofrer alterações com freqüência mostra-se salutar permitir a diversidade de decisões e a modificação dos entendimentos dos tribunais até mesmo como forma de acompanhar os costumes e os anseios da sociedade.39

Por mais que a edição da súmula vinculante seja cautelosa e revestida especificidades e limitações, a imposição de seu enunciado não é salutar. Em verdade, o efeito vinculante da súmula é um resultado exacerbado da busca desesperada pela uniformização da jurisprudência.

Para José Afonso da Silva nem mesmo as súmulas vinculantes, revestidas de inúmeras formalidades, são suficientes para diminuir a quantidade de recursos e o trabalho

36 MEDINA; WAMBIER; WAMBIER, 2009, p. 45. 37 Art. 5º da Lei 11.417/2006.

38 Nesse sentido colacionamos lição de Juvêncio Vasconcelos Viana: “Dever haver certo cuidado com a redação

da súmula. Impõe-se objetividade e clareza em seu texto, tudo para que essa não venha criar mais dúvidas ou questões interpretativas do que a própria lei (afinal, tais súmulas já vem ao mundo exatamente com o fim de por termo a essas).” (2006b, p. 87).

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dos tribunais. Segundo o articulista se o ato administrativo ou a decisão judicial contrariar a súmula aplicável, ainda restará à parte se socorrer de reclamação para o Supremo Tribunal Federal, que, julgando-o procedente, anulará o ato impugnado e determinará que outro seja efetuado em seu lugar. Haverá, portanto, uma mera troca de meios de impugnação.40

Não obstante, talvez a súmula vinculante seja um passo necessário para a conscientização da sociedade e dos operadores do direito pela necessidade de decisões mais uniformes. Seu caráter vinculante e paradigmático proporciona o sentimento de segurança jurídica e ameniza a situação de descrédito em que se encontra o Poder Judiciário, situação favorável à harmonização dos julgados.

Se os potenciais litigantes estiverem convencidos de que não é possível contornar o enunciado sumulado que lhe é contrário muitas ações deixarão de ser propostas e outros tantos recursos não serão interpostos. O trabalho do tribunal por conseqüência iria diminuir e o sistema poderia fluir de forma mais célere.41

2.5 A supervalorização jurisprudencial

O rumo que o legislador e os órgãos julgadores vêm tomando de tentar atribuir à jurisprudência e às súmulas efeito vinculante se mostra temeroso. Como pode o julgador analisar o caso concreto e todas suas peculiaridades, quando existe entendimento sumulado que, em tese, deveria ser aplicado? A vinculação das decisões à jurisprudência dominante retira do magistrado a possibilidade de julgar in concreto, bem como restringe o seu livre convencimento.

Destarte, a crítica maior à supervalorização da jurisprudência sedimentada é dirigida aos inúmeros meios desordenados de imobilismo jurisprudencial a exemplo da ‘súmula impeditiva de recursos’, pelo qual o magistrado deve negar seguimento a recurso contrário a um entendimento sumulado das cortes superiores.

Conforme leciona Dinamarco, Grinover e Cintra, o Brasil adota o princípio da persuasão racional, pelo qual o juiz, apesar de estar vinculado às provas e aos elementos in concreto, não depende de critérios legais formados a priori.42 A vinculação da decisão do

40 SILVA, 2007, p. 566.

41 MOREIRA, 2006a, p. 189.

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magistrado a um prévio entendimento dominante das Cortes Superiores, portanto, representa uma mitigação do princípio da persuasão racional e do convencimento livre do juiz.

A utilização consciente da jurisprudência é salutar. Todavia, é indispensável reservar aos julgamentos dos juízes e tribunais certa flexibilidade para que não se perca de vista a realidade dos costumes.

De certo modo, as incessantes mudanças da sociedade são captadas com mais agilidade pelos órgãos jurisdicionais locais, que lidam diariamente com os conflitos de interesse que as novas condições sociais, políticas, econômicas e culturais vão projetando Ousamos concordar inclusive com José Carlos Barbosa Moreira, segundo o qual as maiores mudanças dos entendimentos jurisprudenciais começaram por decisões dos juízos de primeiro grau e só mais tarde receberam a chancela dos tribunais.43

Bloquear o livre convencimento do juiz de primeiro grau, imputando-lhe a utilização das teses firmadas nas instâncias superiores significa, de certo modo, inibir a chancela de renovação da jurisprudência44.

É evidente que certas normas devem ser interpretadas de modo uníssono por todos os órgãos jurisdicionais, como é o caso das normas constitucionais. Há outras, contudo, que imputam certa flexibilidade hermenêutica para adequarem-se às peculiaridades regionais.

A busca incessante pela celeridade processual, todavia, parece sempre justificar os meios utilizados para alcançá-la, mesmo que isso represente a estagnação dos entendimentos.

A supervalorização da jurisprudência como conseqüência do processo célere foi ao extremo de permitir que o magistrado de primeiro grau profira sentença de improcedência, sem a citação do réu, na hipótese de se tratar de matéria exclusivamente de direito e de já existir, no juízo, julgamento de casos idênticos no mesmo sentido45. Aqui não foi nem prestigiada a jurisprudência de uma instância superior - à similaridade do que ocorre com a súmula impeditiva - bastando a existência de um único precedente do mesmo juiz. José Carlos Barbosa Moreira, comentando o dispositivo, afirma que “dificilmente se concebe incentivo maior à preguiça, ou em termos menos severos ao comodismo do julgador [...]” 46.

O princípio da celeridade processual é garantia constitucional que deve sim ser prestigiada em toda sua extensão, mas não pode servir de alicerce para a instituição de dispositivos que cortam o caminho processual, criando atalhos que não coadunam com a segurança jurídica e se mostram, por vezes, inconstitucionais.

43 MOREIRA, 2005, p. 31.

44Ibid., p. 31.

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A jurisprudência deve ser valorizada e aplicada quando o magistrado assim considerar apropriado e não por determinação do legislador. Somente o magistrado, pela análise do caso concreto, pode decidir se a jurisprudência dominante ou o entendimento sumulado são aplicáveis ao processo.

Efetivamente, a repetição dos julgados idênticos com base em entendimento sedimentado confere segurança jurídica aos destinatários da prestação jurisdicional e é prática que se mostra salutar à evolução processual. A valorização da jurisprudência, portanto, pode ser benéfica quando aplicada de forma consciente com o objetivo de uniformizar os julgados e não como meio da celeridade.

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3 A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO

A Emenda Constitucional nº 45, reflexo constitucional da insatisfação com o desempenho da máquina judiciária e sua morosidade, elevou a celeridade processual à categoria de princípio e garantia, inserindo o inciso LXXVIII ao artigo 5º da Carta Maior com os seguintes termos: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Não obstante, a celeridade processual não era novidade no ordenamento brasileiro. A Convenção Interamericana de Direitos Humanos, aprovada pelo Pacto de San José de Costa Rica do qual o Brasil é signatário, emana que “toda pessoa tem direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente [...]”. A EC nº 45, portanto, apenas contemplou constitucionalmente garantia que já deveria ser respeitada em todos os seus termos.

Não obstante a previsão constitucional da necessária duração razoável do processo, a declaração formal de sua existência não é suficiente para desconstituir a crônica morosidade do aparelho judiciário. A garantia geral não possui efetividade no caso concreto sem os instrumentos indispensáveis à sua implementação.

Destarte, a celeridade só é contemplada no caso concreto quando os procedimentos processuais também se mostrarem ágeis, afinal são eles que marcam o passo da tutela jurisdicional.

Partindo dessa premissa, o legislador, preocupado em conferir celeridade ao processo, desempenhou diversas reformas no Código de Processo Civil, em uma tentativa de minimizar os entraves processuais.

De todo modo, apesar de as inúmeras leis reformadoras não terem solucionado todos os percalços processuais, elas merecem destaque pelas tentativas de instrumentalizar os pontos mais obstruídos dos ritos processuais.

3.1 A descomunal demora na prestação jurisdicional

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às partes não há alternativa senão esperar. Espera interminável quando se busca o reconhecimento de um direito certo. 47

A lentidão da máquina judiciária inegavelmente constitui um problema grave do sistema brasileiro, um problema longe de ser resolvido ou aliviado.

Em uma tentativa desesperada de dar satisfação à sociedade e à mídia, o legislador, para aliviar o sistema judicial, optou pela reforma processual do Código de Processo Civil.

Não obstante, as constantes mudanças dos paradigmas procedimentais sem maiores justificações e que não mostram resultados práticos de sua efetividade ocasionam insegurança jurídica tanto para o aplicador do direito que se depara com novas especulações interpretativas, como para as partes que se ficam a mercê da hermenêutica que será utilizada pelo magistrado.48

Por vezes, as reformas acabam provocando dúvidas onde não havia controvérsias. Em decorrência da necessidade cega de buscar a celeridade, as inúmeras reformas processuais foram sendo realizadas de forma abrupta, sem avaliação histórica dos fatos e contextualização dos problemas. O legislador, tentando mostra-se ágil, não se preocupou em pesquisar a efetividade real das reformas, apenas reformou e muito!

Todavia, é fato: a justiça continua morosa.

Segundo José Carlos Barbosa Moreira o primeiro passo para solucionar a morosidade do sistema é buscar e entender os fatores que retardam a prestação jurisdicional para então traçar uma estratégia e combatê-los de forma efetiva, evitando as inúmeras reformas legislativas em vão. O articulista, inclusive, aponta cinco falsas proposições que são utilizadas de forma ordinária para justificar a morosidade.49

O primeiro equívoco apontado encontra-se na idéia de que o problema da excessiva duração do processo é peculiar ao nosso tempo. Em verdade, conforme aponta o autor, a lentidão já era um problema verificável no processo canônico da Igreja Católica no século XIV. O Papa Clemente V chegou até mesmo a instituir um rito simplificado, sem muitas formalidades na tentativa de contornar a situação lenta do procedimento. Destarte,

47 Em brilhante lição, Humberto Theodoro Junior discorre sobre a exagerada demora da prestação jurisdicional:

“De instrumento de justiça, o processo torna-se instrumento de injutiça, gerando o atual descrédito que inunda

a sociedade quando se põe a avaliar a qualidade da tutela que pode esperar dos órgão jurisdicionais, entre nós.” (2009, p. 352).

48 “Não poucas vozes, todavia, se opõe, a esse programa reformador, suscitando sempre objeções de raízes

constitucionais, cujos principais argumentos giram em torno da quebra da segurança jurídica que as constantes modificações legislativas fatalmente acarretam, e do desrespeito às garantias que a Constituição institui para o processo, mormente no que se relaciona com a do contraditório e ampla defesa.” (Ibid., p. 351.)

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Não há como considerar o embaraço da duração do processo tema atual: a morosidade judicial se arrasta no sistema brasileiro desde a época colonial, quando ainda eram utilizados os procedimentos de Portugal.

Todavia, com o atual progresso tecnológico e aceleração dos meios de comunicação, a pressa em obter resultados agravou situação que já era crítica.

Ademais, a crescente expansão da demanda jurisdicional elevou o problema a patamares insustentáveis. A proliferação de conflitos de interesses na sociedade somada à idéia de simplificação do acesso à justiça resultou na sobrecarga do Judiciário, que, não possui estrutura para comportar a enorme quantidade de processos e recursos diariamente protocolados.50

Acreditar que a excessiva duração do processo é mazela tipicamente brasileira é outro equívoco apontado por José Carlos Barbosa Moreira. Não há como negar a existência de países com sistemas jurisdicionais modelos com efetiva tutela ágil e duração breve dos processos. Não obstante, a Itália é exemplo expressivo de um país de primeiro mundo que enfrenta enormes entraves processuais.

A questão da morosidade do processo não é de forma alguma local e não atinge apenas os vulgarmente chamados países subdesenvolvidos.

Embora não seja um problema unicamente nacional, a solução para a demora processual não perde sua relevância e urgência. O fato de outros países enfrentarem o mesmo problema não justifica e nem ameniza a insustentável morosidade brasileira.

O terceiro equívoco apontado pelo autor lida com a ingenuidade de acreditar que ambas as partes do processo aspiram a um desfecho rápido e que a demora lhes causa frustração.

Na prática, por vezes, a parte desamparada pelo direito, que já tenha conhecimento de que será sucumbente, não possui interesse no desfecho rápido do processo. O empenho em prolongar o feito, faz com que se utilize de todos os meios processuais disponíveis para dilatar os procedimentos e o trânsito em julgado das decisões. Uma das medidas mais comuns, e por assim dizer mais eficazes, é a interposição de recursos sabidamente infundados ou inadmissíveis com o único propósito protelatório.

50 Apontando a sobrecarga dos Tribunais, temos José Carlos Barbosa Moreira: “Tudo indica ter razão quem

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É deprimente constatar, mas as partes, maiores interessadas na prestação jurisdicional, por vezes, atrapalham de forma significativa o andamento regular do feito. Infelizmente, para esse entrave não há reforma processual ou legislativa que apresente solução.

E é exatamente na idéia de reforma da legislação processual como saída para o entrave da morosidade que encontramos o quarto equívoco apontado por José Carlos Barbosa Moreira.

Não é apenas por meio das inúmeras reformas que o problema da duração do processo será solucionado.A morosidade é resultante de questões mais culturais do que realmente procedimentais. As partes, o juiz, a secretária das varas, os gabinetes de desembargadores, enfim, todos os partícipes do processo devem ter em mente a necessidade de desburocratizar os atos e conferir celeridade ao sistema.

Não adianta modificar a legislação e criar atalhos nos procedimentos sem que ocorra a conscientização dos aplicadores do direito e dos funcionários da justiça.51

A última crítica apontada por José Carlos Barbosa Moreira é dirigida à utilização dos meios alternativos de solução de conflitos como meio de acelerar a máquina judiciária.

A arbitragem, conciliação e mediação podem até aliviar a situação, entretanto não solucionam efetivamente o problema da duração processual, por isso, embora sejam medidas válidas e prósperas, não devem ser utilizadas como solução para o problema da morosidade do sistema.

O fato é: para enfrentar a crise, o legislador optou por realizar reformas, que se estendem por quase duas décadas, tanto no Código de Processo Civil, como na Constituição. Inúmeras leis foram sucessivamente editadas remodelando procedimentos, tudo pela busca da efetivação da tutela jurisdicional e do combate aos entraves supostamente causadores da morosidade.52

Não obstante, boa parte das reformas, mesmo sem a devida contextualização e estudo de caso, acabaram aperfeiçoando os procedimentos processuais sem gerar impactos

51 José Carlos Barbosa Moreira, com propriedade, subtende a morosidade como resultado da lassidão dos

funcionários da justiça: “Peço licença para inserir neste ponto o registro de experiência pessoal. Exerci a judicatura por cerca de quinze anos no Tribunal de Justiça do Rio de janeiro. As diversas Câmaras recebiam igual número de processos e trabalhavam sob a mesma lei processual e o mesmo regimento interno. Apesar disso, resultados consideravelmente diferiam. Enquanto uma Câmara julgava recurso de apelação em um ou dois meses, outras gastavam muito mais, às vezes mais de um ano, para executar trabalho equivalente.” (2006b, p. 71).

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sobre a coesão do sistema processual. Contribuem efetivamente para o propósito de diminuir a demora processual, respeitando os princípios e garantias processuais e constitucionais.

As críticas, contudo, devem permanecer enquanto o legislador insistir em atropelar o sistema inserindo institutos de efetividade duvidosa como a súmula impeditiva de apelação, que será observada adiante.

3.2 A celeridade processual como pretexto para a potencialização da jurisprudência e as inúmeras reformas processuais

Um dos caminhos escolhidos pelo legislador para conferir celeridade ao processo foi a inserção de inúmeras previsões no Código de Processo Civil de utilização da jurisprudência como uma atalho para os procedimentos e atos processuais.

A potencialização da jurisprudência, portanto, tem como plano de fundo a atual supervalorização do princípio da celeridade processual.

Com efeito, as súmulas e a jurisprudência dominante proporcionam uma resposta judicial mais rápida, em razão da preexistência de entendimentos solidificados que possam vir a ser utilizados como parâmetro pelo magistrado.

Os julgamentos passaram a ser menos complicados, pois, atualmente, basta que o juiz encontre uma súmula ou entendimento jurisprudencial para a decisão ser considerada fundamentada53. Em contrapartida, a qualidade e devida motivação das decisões são gradativamente abandonadas.

Efetivamente, o objetivo do processo célere levou o sistema a privilegiar a quantidade e não a qualidade das decisões. Os fins do processo célere passaram a justificar os meios de utilização de atalhos jurisprudenciais.

Nesse diapasão, inúmeras foram as reformas, levadas a cabo por diversas leis, que, objetivando atribuir celeridade ao processo, acabaram aumentando progressivamente o valor da jurisprudência e ampliando sua aplicação.

A Lei 8.038/1990, ao instituir normas procedimentais para os processos que correm perante o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal, tornou

53 Corroborando temos José Carlos Barbosa Moreira: “[...] os tribunais brasileiros inclusive os superiores

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competente o relator de ambas para negar seguimento a pedido ou recurso que contrariasse, “nas questões predominantemente de direito, súmula do respectivo tribunal”. 54

Modificando o artigo 557, a Lei 9.756/1998 estendeu a competência do relator, que, além de poder negar seguimento a recurso quando “em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior”, poderá também dar provimento a recurso do recorrente, “se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior”.55

A Lei 9.756/1998 alterou, ainda, a redação do artigo 554, §3º do Código de Processo Civil para autorizar o relator, quando do exame do agravo de instrumento contra a decisão denegatória de Recurso Extraordinário ou de Recurso Especial, a julgar o próprio mérito dos Recursos extraordinários, quando o acórdão recorrido estiver em desacordo com a súmula do Superior Tribunal de Justiça.56

Outra modificação da lei 9.756/1998 foi o parágrafo único do art. 120 do Código de Processo Civil. A norma autoriza o relator a decidir de plano, monocraticamente, o conflito de competência pelo mérito, quando a tese já estiver pacificada no tribunal, constituindo jurisprudência dominante. 57

A Lei 10.352/ 2010 alterou a redação do artigo 475 do Código de Processo Civil, para restringir a remessa necessária. Com efeito, não está sujeito ao reexame obrigatório a sentença com fundamento na jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula dos tribunais superiores genericamente considerados.58

54 “Art. 38 - O Relator, no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça, decidirá o pedido ou o

recurso que haja perdido seu objeto, bem como negará seguimento a pedido ou recurso manifestamente intempestivo, incabível ou, improcedente ou ainda, que contrariar, nas questões predominantemente de direito, Súmula do respectivo Tribunal.” Lei 8.038/1990

55 “Art. 557. O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou

em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. § 1o-A Se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.” Código de Processo Civil

56 “Art. 544, §3º Poderá o relator, se o acórdão recorrido estiver em confronto com a súmula ou jurisprudência

dominante do Superior Tribunal de Justiça, conhecer do agravo para dar provimento ao próprio recurso especial; poderá ainda, se o instrumento contiver os elementos necessários ao julgamento do mérito, determinar sua conversão, observando-se, daí em diante, o procedimento relativo ao recurso especial.” Código de Processo Civil.

57 “Art. 120, Parágrafo único. Havendo jurisprudência dominante do tribunal sobre a questão suscitada, o relator

poderá decidir de plano o conflito de competência, cabendo agravo, no prazo de cinco dias, contado da intimação da decisão às partes, para o órgão recursal competente.” Código de Processo Civil

58 “Art. 475, §3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em

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A Lei 11.276/2006 modificou a redação do §1º no artigo 518, estendendo ao magistrado de primeiro grau a competência antes atribuída apenas ao relator do recurso, de negar seguimento a apelação, quando “a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”.59

Por fim, a Lei 11.418 de 2006 incluiu o artigo 543-A no Código de Processo Civil, que em seu §3º prevê o reconhecimento da repercussão geral - requisito indispensável ao Recurso Extraordinário - quando o recurso impugnar decisão contrária à súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal. 60

Perceptível, portanto, que as reformas da legislação processual tentaram, de forma paliativa, mudar a situação de carência dinâmica do judiciário inserindo a jurisprudência como um instrumento desse fim.

A obsessão por uma solução, por vezes, geram reformas simplistas, que pouco contribuem para uma efetiva mudança de paradigmas e acabam suscitando insegurança nos procedimentos processuais 61. Atiram-se diversos dardos no escuro para que um possa acertar o alvo, e ao final seja possível vangloriar-se do resultado obtido sem, contudo, saber qual solução prosperou.62

Em verdade, não são as leis as maiores culpadas pela morosidade do sistema, mas sim quem as aplica. A má gestão administrativa dos tribunais e os entraves dos magistrados influem de forma negativa no andamento processual. Problema sócio-cultural, contudo, não há reforma legislativa que solucione!

3.3 Recursos: os vilões processuais

59 “Art. 518, §1º O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com

súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal” Artigo 518, §1º do Código de Processo Civil

60 “Art. 543-A, §3º. Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária a súmula ou

jurisprudência dominante do Tribunal.” Código de Processo Civil.

61 MOREIRA, 2006a, p. 183.

62 Apontando a ausência de dados e estudos aprofundados sobre o efeito prático das reformas, citamos José

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Conforme leciona Juvêncio Vasconcelos Viana, “recurso é o meio de provocar o reexame de uma decisão, pela mesma autoridade judiciária ou por outra hierarquicamente superior, visando a obter sua reforma ou modificação.”

Trata-se, portanto, de um remédio processual conferido às partes para impugnar decisões insatisfatórias através do exercício do direito de recorrer e do duplo grau de jurisdição.

Em verdade, os recursos são meios de segurança jurídica, pois uma mesma decisão é examinada duas vezes ou mais, retirando-lhe maiores dúvidas na interpretação de suas disposições. Se o magistrado de primeiro grau comete um equívoco, a parte poderá saná-lo ao devolver a decisão em uma nova apreciação do Poder Judiciário.

A utilização inconsciente dos recursos, contudo, ocasionou um inflação e sobrecarga no trabalho dos Tribunais. Os inúmeros requisitos de admissibilidade, que passam pelo crivo dos juízos a quo e ad quem não foram/são suficientes para impedir a enorme de quantidade de recursos utilizados com o único propósito protelatório.

E é exatamente em decorrência da má-fé da parte, que tenta a todo custo dilatar a prestação jurisdicional, que os recursos passaram a ser considerados os maiores entraves processuais. Não é a toa que grande parte das reformas tiveram como alvo o recebimento e processamento recursal.

Ademais, a despeito da má-fé de uma minoria, à parte sucumbente é garantida uma gama de meios para se insurgir contra a decisão proferida em seu desfavor, o que contribui mais ainda para a coleção de recursos atravancados nos Tribunais.

Não estamos aqui defendendo a diminuição dos meios de impugnação. Longe disso! Estamos apenas evidenciando que os Tribunais, atualmente, não têm capacidade para receber a enorme quantidade de recursos que lhes são enviados e que, por isso, o recebimento dos recursos e sua admissibilidade tornaram-se alvo do pacote de reformas do CPC.

Os dados disponibilizados pelos tribunais confirmam essa realidade. Só no ano de 2009, de acordo com os gráficos de movimentação processual do Superior Tribunal Federal 63, foram distribuídos em torno de 80.000 processos, tendo sido proferidos aproximadamente

95.000 julgamentos.

63 Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=estatistica&pagina=movimento

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Indubitavelmente, a enorme quantidade de recursos diariamente protocolados é uma das causas mais significativas da morosidade processual. A natural irresignação da parte sucumbente, somada às inúmeras decisões sobre um mesmo assunto proferidas em sentidos diversos, além da má-fé daqueles que desejam protelar a prestação jurisdicional resulta no congestionamento do Poder Judiciário, motivo pelo qual o legislador optou por criar atalhos para o processamento recursal.

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4 SÚMULA IMPEDITIVA DE RECURSO

Enfim, chegamos ao núcleo de nossas argumentações: a súmula impeditiva de apelação.

Esse instituto mescla todas as considerações supra delineadas: é um instrumento, criado pelo legislador nas reformas processuais recentes, que utiliza a jurisprudência sumulada para justificar o não recebimento de apelação, com o fim de diminuir a quantidade de recursos remetidos ao tribunal e conseguintemente conferir celeridade ao processo.

Decorrente do Projeto de Lei 4.724/2204 apresentado pela Associação de Magistrados Brasileiros, ente deflagrador da “Campanha pela Efetividade da Justiça”, a Lei 11.276/2006 instituiu o que se convencionou chamar de súmula impeditiva de recurso.

De fato, a Lei 11.276/2006 é resultado da conjuntura de inovação e reforma do sistema processual como meio de busca da efetividade e celeridade da justiça. O pacote de reformas processuais, composto por essa e por outras inúmeras leis, contudo, trouxe apenas modificações pontuais ao Código de Processo Civil, servindo como paliativos ao problema da morosidade do sistema.

4.1 Instrumento de redução da quantidade de recursos

Linhas atrás, ponderamos acerca da sobrecarga dos tribunais em decorrência da descomunal quantidade de recursos.

E foi com a intenção de diminuir a abundância dos recursos remetidos aos Tribunais, que a Lei 11.276/2006 modificou a redação do §1º, artigo 518 do CPC, determinando que “O juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal.”

Em seu parecer na exposição de motivos do projeto de lei 4.724/2204, o então Ministro da Justiça, Márcio Thomas Bastos, manifestou-se positivamente pela inserção do §1º no artigo 518 do Código de Processo Civil afirmando tratar-se de uma adequação salutar que iria contribuir para a redução da quantidade de recursos manifestamente improcedentes 64. Foi

64 “2. Sob a perspectiva das diretrizes estabelecidas para a reforma da Justiça, faz-se necessária a alteração do

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esse – e continua sendo - o maior argumento utilizado por aqueles que defendem a aplicação do dispositivo.

Resta clara a intenção do legislador em restringir a interposição de recursos, o que importa na relativização de determinados princípios, valendo-se dentre outras medidas, da jurisprudência.

De acordo com a atual redação do §1º do art. 518 do CPC, é lícito ao magistrado de primeiro grau, ao proferir juízo de admissibilidade provisório, não receber o recurso de apelação se a sentença vergastada tiver sido pronunciada em consonância com súmula do STF ou do STJ. É um caso visível de utilização da jurisprudência - no caso as súmulas - como meio de busca da celeridade processual, como já ocorre em diversos outros dispositivos do Código de Processo Civil 65.

A súmula impeditiva ressalta a atual e evolutiva conjuntura de utilização da jurisprudência como fonte do direito. Seu enunciado é suficiente para mitigar o princípio do duplo grau de jurisdição e barrar o recebimento de um recurso. Força essa que não é positivada no caso de a sentença encontrar-se em consonância com norma, seja infra ou constitucional.

Percebe-se, por conseguinte, que a jurisprudência, antes renegada do rol de fontes do direito, vai, gradativamente, assumindo função hermenêutica da norma e a ela, indevidamente, se iguala ou até mesmo supera.

A idéia de tradução da norma incumbida à súmula arraigou-se de tal forma que as decisões judiciais, comumente, não se pautam em dispositivos de lei, mas citam apenas súmulas do tribunal relativas ao tema. Todavia, corroboramos com Medina, Wambier e Wambier, para os quais “[...] no nosso sistema, as decisões judiciais têm de ser pautadas na lei, embora não só na lei” 66.

A utilização de súmulas como única fonte de decisões judiciais é precária, pois, a qualquer momento, embora sumulado, o entendimento jurisprudencial pode vir a ser alterado por nova interpretação de lei, e superar a interpretação anterior.

igualmente altera o art. 518 do CPC, e de maneira a inserir em seu § 1o a previsão do não recebimento, pelo juiz, do recurso de apelação, quando a sentença estiver em conformidade com Súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. 6. Trata-se, portanto, de uma adequação salutar que contribuirá para a redução do número excessivo de impugnações sem possibilidades de êxito.” BASTOS, Márcio Thomaz

(Ministro da Justiça). Parecer do projeto de lei 4.724. Disponível em:

<http://www.camara.gov.br/sileg/integras/260583.pdf> Acesso em: 20 de novembro de 2010.

Referências

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