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Umbanda de Nego Veio

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Academic year: 2021

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Umbanda de Nego Véio

Compêndio de Estudos (Volume 1)

Gregorio Lucio

São Paulo (SP)

2014

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UMBANDA DE

NEGO VÉIO

Compêndio de

Estudos

(Volume 1)

Gregorio Lucio

2014

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2 Lucio, Gregorio Fernandes

2014: Umbanda de Nego Véio. Compêndio de Estudos (livro eletrônico) / Gregorio Fernandes Lucio –

São Paulo (SP), 2014

Spinosa, Mario (foto de capa): As mãos, a cruz e o rosário TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

Il.; ePUB

Umbanda – Religião – Estudo Contato pelo email:

gregorbital@gmail.com Site:

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Apresentação

Caro Leitor,

A presente obra trata do primeiro volume de uma série de textos escritos como resultado de um trabalho de estudos que vêm sendo realizado por este que escreve. Particularmente, o presente volume compreende o período de estudos realizados entre julho de 2011 a janeiro de 2013.

Não pretende ser um códice para a religião de Umbanda. Jamais foi essa a intenção. Ao contrário, nosso sincero desejo é o de compartilhar com o público interessado, justamente, alguns traços e apontamentos das nossas reflexões em torno do fenômeno religioso umbandista, a partir do olhar de um simples adepto, livre pensador e dedicado estudioso deste universo tão plural e magnífico de significados, possibilidades de vivência e experimentação do Sagrado.

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Dedicatória

Dedico a presente obra, primeiramente, aos Mentores de Luz (cujos nomes não ousarei citar aqui, uma vez que sempre preferiram manterem-se em anonimato, como professores dedicados e humildes) que me assistem e inspiram no estudo desta intrigante religião, a Umbanda, a qual optei por abraçar como minha fé e de cujas experiências recolho novos sentidos para meu existir. Também cabe menção de gratidão e reconhecimento a Tenda de Umbanda Tamanaquaí, templo umbandista localizado na Zona Leste de São Paulo, onde desenvolvo meu trabalho como simples integrante de sua corrente mediúnica e colaborador de apagado destaque em suas atividades semanais.

Por fim, não posso deixar de mencionar minha esposa, Denise Beraldo, essa tão agradável e amorosíssima companheira de todos os momentos, a qual sempre apoiou-me neste projeto pessoal. Gratidão pela sua compreensão e carinho.

Gregorio Lucio

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Sumário

Introdução ... 09

Umbanda Religião Brasileira ... 11

Kardecismo e Umbanda são iguais? ... 14

Práticas Rito-Litúrgicas na Umbanda ... 21

Das Entidades Espirituais da Umbanda ... 26

As Ervas... 31

A Defumação ... 35

Os Banhos de Ervas ... 41

A Pemba, a Lei de Pemba e o Ponto Riscado ... 45

As Roupas Litúrgicas e as Fitas ... 52

As Guias ... 59

As Velas... 64

Música e Movimento na Umbanda ... 69

A Curimba e o Ponto Cantado ... 74

O Atabaque ... 83

A Dança Ritualística na Umbanda ... 91

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Simbolismo, Magia e Subjetividade na Umbanda (I) ... 108

Simbolismo, Magia e Subjetividade na Umbanda (II) ... 114

As Hierarquias na Umbanda ... 122

A Prática Oracular na Umbanda ... 128

As Votividades e Oferendas na Umbanda ... 135

O Psíquico e o Imaginário: Relação entre Mundo Espiritual e Materialidade ... 142

A Realidade Espiritual do Terreiro de Umbanda ... 151

A Obsessão Espiritual ... 157

As Egrégoras (A Utilização das Forças Naturais e Mentais no Rito da Umbandista) ... 163

A Demanda... 170

Saúde e Cura na Umbanda ... 188

Tratamento Espiritual ... 193

Vivência Religiosa e Bem-Estar ... 199

O Mediunismo de Umbanda ... 205

Sensações Mediúnicas – Parte I (Fenomenologia Orgânica e Psíquica do Transe)... 211

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7 Sensações Mediúnicas – Parte II (Fenomenologia Orgânica

e Psíquica do Transe) ... 218

O Médium de Umbanda ... 232

A Espiritualidade Umbandista Manifesta no Estado Superior de Consciência ... 240

Processos Mentais e o Transe Mediunista I ... 247

Processos Mentais e o Transe Mediunista II ... 255

Processos Mentais e o Transe Mediunista III ... 263

A Incorporação ... A Manifestação ... 274

A Interpretação Psíquica e Espiritual do Fenômeno ... 283

A Relação Médium-Guia na Umbanda ... 293

A Ascensão da Consciência ... 300

Visões do Transe de Possessão ... 307

Desenvolvimento Mediúnico na Umbanda ... 314

Função Anímica e Mecanismos Adaptativos ... 321

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O Comando da Função Mediúnica ... 337

A Identificação do Supra Consciente e a Expressão Criativa ... 343

Educação e Conciência Mediúnica... 353

A Visão de um Adepto ... O Processo de Ensino-Aprendizagem na Umbanda ... 362

A Sustentação do Trabalho Espiritual ... 367

O Templo Religioso como Ambiente Educativo ... 374

A Ética do Filho-de-Santo ... 387

Conclusão ... 394

Sobre o Autor ... 399

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Introdução

Umbanda. É uma cultura religiosa popular. É o resultado empírico da fé de um povo e não o produto do desenvolvimento intelectual hegemônico de um missionário, teólogo ou codificador. É a expressão mais próxima do Socialismo dentro da Religião.

Seus aspectos exteriores chamam a atenção, deslumbram mesmo. O transe é o seu maior elixir. As roupas, as liturgias, as votividades, os oráculos, as ofertas, as giras, os desmanches de demandas (que neste contexto não se referem a aspectos negativos, mas ao embate criativo e renovador que interpreta e ressignifica as situações de conflito na experiência humana), os cânticos, as curimbas, os atabaques, as velas, as ervas, as flores, os pontos...

Mas por trás de todo este universo polissêmico, repleto de símbolos com força atrativa e expressividade incomum, há um mundo de energias sutis que permeia a dimensão física, revelando-se devagar e amiúde, para aqueles que possuem “olhos de ver e ouvidos de ouvir”.

A Aruanda Infinita, por meio de seus representantes, os Guias e Orixás, mostra-se no suceder das experiências dentro das Leis de Umbanda. Nas realizações do cotidiano pertinentes a vida e a fé de seu adepto.

A função simbólica e psicológica deste viver religioso na Umbanda está, inequivocamente, muito mais no “sentir” (coração) do que no “pensar” (cérebro).

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10 Contudo, é preciso estabelecer pontes e diálogos entre o mundo subjetivo que contempla o sentido religioso, os discursos pertinentes ao universo interno dos terreiros e da Umbanda como um todo, com as outras formas de interpretação e entendimento da individualidade humana, para que esta bela cultura religiosa que emerge do âmbito social com sua rica produção simbólica seja também colocada como partícipe ativa na centralidade do campo religioso brasileiro, uma vez que sempre esteve posta à margem deste. E não é outra, senão esta mesma, a intenção deste trabalho. Contribuir para que a Umbanda tenha seu lugar de mérito dentro da cultura religiosa de nossa sociedade. Criar um campo de pesquisa e entendimento - assim como outros também já vêm de há tempos realizando - que demonstre ser a Umbanda também uma religião autêntica (e não uma “seita”, conforme ideologicamente alguns tentam classifica-la, com o objetivo de diminuir-lhe e manter o status quo social), capaz de dialogar com as mais diversas áreas do saber humano e, acima de tudo, fornecer propósitos e compreensão da Vida que estejam totalmente integrados ao tempo histórico, social, psicológico e espiritual do homem moderno.

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Umbanda - Religião Brasileira

Muito se tem discutido a respeito das origens da Umbanda.

Alguns acreditam ser esta uma religião revelada no dia 15 de novembro de 1908, pelo médium sr Zélio Fernandino de Moraes, logo, teria seu início a partir de um escolhido e revelador (obedecendo, assim, a mesma estrutura de "mito fundante" das demais religiões abraâmicas).

Outros, creem-na como uma religião cósmica, detentora dos mais altos níveis do conhecimento humano (em suas esferas científica, religiosa, artística e filosófica), o

Conhecimento Uno, provindo das mais antigas e míticas

raças humanas já existentes na Terra (Raça Vermelha e, posteriormente, os Atlantes e Lemurianos), cujas chaves de conhecimento teriam sido guardadas e veladas pelos Antigos Egípcios e no decorrer da história, haveria chegado ao Brasil por intermédio dos povos africanos e se conjugado aos conhecimentos já existentes dos indígenas brasileiros.

Seria essa a chamada Aumbandan; outrem credita às tradições originariamente africanas as chaves e fundamentos para o surgimento da Umbanda no Brasil.

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12 E, ainda, aqueles que reputam à Umbanda a pecha de uma simples seita, destituída de corpo doutrinário, senso racional e crítico, repleta de crenças e fetichismos, a qual surgiu como um processo de degradação das religiões predominantes ao longo do processo de desenvolvimento social, notadamente nos centros urbanos das grandes cidades brasileiras.

De nossa parte, cremos que a Umbanda surge como um processo natural de ressignificação de práticas religiosas pertinentes ao imaginário coletivo da cultura popular brasileira (catolicismo popular, pajelança, espiritismo "kardecista" e as práticas africanistas). Em conjunto a este processo, no plano espiritual, há um mecanismo de adaptação e direcionamento dos Espíritos afins à faixa vibratória brasileira, os quais colocam-se em contato com o "mundo terreno" para contribuir com as necessidades espirituais, psicológicas e sociais daqueles que, a pouco e pouco, tornaram-se adeptos da Umbanda e seu universo espiritual.

Cremos, particularmente, ser a Umbanda uma religião essencialmente brasileira, contando com o amparo e assistência de Grandes Numes, os quais orientam e direcionam a coletividade umbandista no processo de sua jornada espiritual, através da prática da caridade, do amor ao próximo, da ética e da cada vez maior consciência crítica e reflexiva de seu corpo de adeptos, fazendo com que saiamos de uma zona de marginalidade e sub-cultura, e passemos a ocupar e partilhar de um plano mais central na produção cultural e religiosa no cenário brasileiro.

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13 Ademais, em seu aspecto espiritual, também particularmente, não cremos que a Umbanda disponha de uma "missão" específica, como as religiões cristãs predominantes (por exemplo, o Catolicismo, por meio de sua Igreja procura arrebanhar fiéis e balizar sua conduta religiosa para uma salvação; o protestantismo por sua vez, busca a conversão do indivíduo à fé cristã para também desta forma conseguir sua salvação; o espiritismo "kardecista" pretende ser a Terceira Revelação das religiões Abraâmicas, o Consolador Prometido por Jesus Cristo). Sinceramente, não cremos que a Umbanda disponha desta premissa na constituição de sua práxis religiosa, bem como em seus ensinamentos.

Cremos que a singeleza , a doçura e força da Umbanda estão justamente na naturalidade em que ela se propõe a oferecer abrigo àqueles que buscam uma vivência religiosa em contato direto com o Sagrado através do Transe (não necessariamente mediunista), na qual o indivíduo pode ser partícipe da comunidade religiosa, exercitar a solidariedade, a tão falada caridade, e experienciar em si mesmo os efeitos salutares da conduta direcionada para a ética e a responsabilidade, para o contato com a natureza e a ligação direta com a Divindade (Zambi, Olorum, Deus, etc) nas mais diversas formas em que se apresente.

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Kardecismo e Umbanda são

iguais?

É certo que existem semelhanças entre a prática do espiritismo dito "kardecista" com determinadas práticas da Umbanda. No entanto, impera entre adeptos dessas duas correntes religiosas uma certa confusão no que se refere à distinção entre ambas, e em idéias errôneas que implicam numa visão "kardequisada" da umbanda, como seja o entendimento de que esta seria uma corrente paralela ao Espiritismo (popularmente conhecido como Kardecismo), ou mesmo a de que a Umbanda seria uma espécie de sub-cultura religiosa produzida a partir de um processo de degeneração e miscigenação das práticas espíritas (daí o termo pejorativo "Baixo Espiritismo"). Bem, a questão fundamental para podermos distinguir a Umbanda do Kardecismo (permita-me o leitor a utilização do termo popular quando referir-me ao Espiritismo), é primeiro a de encontrarmos quais são os aspectos que poderíamos relacionar como sendo semelhantes entre ambos e após isso chegarmos a sua distinção.

Sendo assim, podemos a priori relacionar como semelhanças:

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15 2º Crença na Imortalidade do Indivíduo;

3º Crença na Reencarnação;

4º Crença na existência de Espíritos;

5º Crença na possibilidade da Comunicação dos Espíritos por meio do fenômeno mediúnico.

Acreditamos serem estes 5 aspectos que encontram-se, em termos de similaridade, entre a visão "kardecista" e umbandista. Obviamente, não elencaremos aqui os princípios éticos e morais (amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, a caridade, o respeito pelo próximo, a consciência do dever e da responsabilidade, a conduta de vida que busca a abstenção de vícios e práticas mundanas, etc), pois estes constituem o corolário de todas as religiões do mundo, mesmo que ensinados e transmitidos de maneira culturalmente diversa.

Partindo agora para as diferenças entre Kardecismo e Umbanda, iremos direto a uma questão central e para isso nos utilizaremos de três questões da obra intitulada O

Livro dos Espíritos, do respeitável e eminente prof.

Hippolyte Léon Denizard Rivail, mais conhecido como Allan Kardec, codificador da Doutrina dos Espíritos, vinda de França para o Brasil. Lembramos que esta obra constitui a pedra angular do pensamento espírita. Vamos as questões:

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16 Questão 553: Qual pode ser o efeito de fórmulas e práticas com ajuda das quais certas pessoas pretendem dispor da vontade dos Espíritos?

Resp: O efeito de torná-las ridículas se são de boa-fé; caso contrário, são patifes que merecem um castigo. Todas as fórmulas são enganosas; não há nenhuma palavra sacramental, nenhum sinal cabalístico, nenhum talismã que tenha uma ação sobre os Espíritos, porque estes são atraídos pelo pensamento e não pelas coisas materiais.

- Certos Espíritos não têm, eles mesmos, algumas vezes, ditado fórmulas cabalísticas?

Resp: Sim, tendes Espíritos que vos indicam sinais, palavras bizarras ou que vos prescrevem certos atos com a ajuda dos quais fazeis o que chamais de conjuração. Mas estejais bem seguros que são Espíritos que zombam de vós e abusam da vossa credulidade.

Questão 554: Aquele que, errado ou certo, tem confiança no que chama virtude de um talismã, não pode por essa confiança mesma atrair um Espírito, porque, então, é o pensamento que age? O talismã não é senão um sinal que ajuda a dirigir o pensamento?

Resp: É verdade, mas a natureza do Espírito atraído depende da pureza da intenção e da elevação dos sentimentos. Ora, é raro que aquele que é tão simples para crer na virtude de um talismã não tenha objetivo mais material que moral. Em todos os casos isso

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17 denuncia uma baixeza e uma fraqueza de idéias, que o expõe aos Espíritos imperfeitos e zombeteiros.

Questão 555: Que sentido se deve dar à qualificação de feiticeiro?

Resp: Aqueles a quem chamais feiticeiros são pessoas, quando de boa-fé, dotadas de certas faculdades, como a força magnética ou a segunda vista. Então, como eles fazem coisas que não compreendeis, os acreditais dotadas de uma força sobrenatural. Vossos sábios, frequentemente, não passam por feiticeiros aos olhos das pessoas ignorantes?

(Capítulo IX do Livro Segundo - Intervenção dos Espíritos no Mundo Corporal)

Diante das questões expostas acima, vemos claramente o posicionamento do Espiritismo no que se refere a sua maneira de entender a relação com o mundo espiritual, a qual confronta diretamente as práticas ritualísticas e magísticas da Umbanda (obviamente a intenção de Kardec e dos Espíritos não era criticar a Umbanda, até porque nem creio que eles soubessem da existência de práticas espirituais que viriam a se constituir na Umbanda..sim, eles...não creio que os "Espíritos do Espiritismo" sabem e conhecem tudo e a todos).

Começando pelo fato de que na Umbanda nos utilizamos de rituais (as giras estão fundamentadas em rito-liturgias), de signos cabalísticos (pontos riscados, cruzes, triângulos, estrelas, etc), de talismãs (patuás, guias, etc),

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18 assim como utilizamo-nos da palavra e do som para congregarmos forças espirituais (a curimba, constituída de pontos cantados, toque de atabaques, etc), vemos que ai já estão as características fundamentais da prática umbandista, as quais a distinguem drasticamente do "Kardecismo".

Há aqueles, mesmo adeptos da Umbanda, que admitem a utilização das práticas ritualísticas, bem como os recursos simbólicos e mágicos utilizados nas giras, como sendo meros pontos de apoio e direcionamento da intenção...corroborando, dessa forma, com a concepção de que estes seriam somente "muletas psicológicas" para a produção de determinado efeito.

No entanto, segundo nosso parecer, não consideramos como simples recursos de apoio, as simbologias e ritualísticas umbandistas, embora uma análise superficial a respeito destes aspectos possa levar a crer nisso. Ao contrário, as práticas umbandistas preconizam sempre uma inter-relação direta e não bipartida da realidade espiritual.

O mundo dito material ou corpóreo é manifestação da realidade espiritual, e, por conseguinte, pela simbologia mágica e ritualística podemos influenciar e movimentar forças (as quais não são enquadradas dentro daquelas conhecidas pela ciência) que desencadeiam reações na realidade "material", como é o caso da cura de determinadas doenças que ocorrem num trabalho de terreiro, quebrando o paradigma da ciência, o qual ainda não encontra explicações conclusivas a respeito (de como

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19 forças ou aspectos não-fisicos interferem em processos físicos).

Ademais, é sempre importante lembrar que as práticas ritualísticas da Umbanda, as firmezas que existem numa tenda de umbanda, as práticas recomendadas para o corpo de médiuns, suas proteções, benzimentos, banhos, defumações, cruzamentos, pontos cantados, riscados, etc...são essencialmente trazidos e transmitidos pelas Entidades Espirituais responsáveis pela coletividade de cada templo em particular, e pela faixa espiritual da Umbanda como um todo. Admitir que esses recursos são meros apoios de menor importância, é também admitir que nossos Guias e Mentores são Espíritos Ignorantes ou Zombeteiros, bem como seus adeptos também o seriam. E isso também é um outro aspecto errôneo, o qual podemos verificar na vivência da prática religiosa, no "dia-a-dia de terreiro", em cujo meio, no contato com as entidades espirituais, reconhecemo-las como Espíritos de grande sabedoria, conhecimento e simplicidade.

Não estamos aqui dizendo que devamos aceitar tudo o que os Espíritos nos trazem, de maneira indiscriminada e tola. Isso porque é inegável que existem em determinados núcleos dito "umbandistas" práticas exageradas e esdrúxulas, as quais suscitam estranheza até mesmo entre o próprio meio umbandista. No entanto, devemos avaliar a atitude e a mensagem daqueles que buscam trazer seus conselhos, suas mirongas, suas firmezas...Somente assim podemos avaliar a natureza e a intenção de determinados Espíritos. Da mesma maneira como faríamos com qualquer pessoa que chegasse até

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20 nós a fim de nos trazer uma mensagem ou um conselho. Usar sempre o bom senso.

Importa ainda considerar que não devemos nos pautar na visão "kardecista" para lastrear ou basear nossa prática religiosa como umbandistas. Isso porque o "kardecismo" não dispõe de uma visão adequada (não dispõe de uma visão êmica) para entender o universo espiritual pertinente a Umbanda. Por uma razão óbvia: o Espiritismo foi concebido na França, em uma cultura extremamente diversa, num meio intelectual e "cientificista", sendo toda a sua proposta filosófica e metodológica assentada sobre os discursos e a visão de mundo pertinente àquela época, naquele país.

Para finalizar, gostaríamos de ressaltar aqui que as opiniões grassadas no texto são particulares, não representam a idéia de nenhuma coletividade ou instituição em específico, tão pouco tem a intenção de outorgar-se a Verdade. Da mesma forma, nosso respeito é incondicional a todas as correntes religiosas, e em específico ao próprio Espiritismo (do qual fomos, somos e seremos sempre admiradores e estudiosos, apesar de nossa crença estar situada nas lides da Umbanda).

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Práticas

Rito-Litúrgicas

na

Umbanda

Iremos agora explanar, de maneira simples e resumida, a respeito das práticas rito-litúrgicas no templo de Umbanda.

Adiantamos que não iremos tratar aqui de modelos de rituais, estabelecer cronogramas e procedimentos, pois isso é dado e cabe a cada templo umbandista e aos seus dirigentes, os quais certamente dispõem de amplos conhecimentos e vivência para estabelecê-los.

Nosso objetivo será o de tratar reflexivamente a questão ritualística e da liturgia na prática Umbandista, ressaltando seus objetivos, suas consequências espirituais e social-coletiva. Para isso, iremos pautar-nos nos "ditos e escritos" de proeminentes umbandistas e pesquisadores, cujas obras estão citadas ao fim deste post.

Primeiramente gostaríamos de considerar o ritual como sendo a práxis fundamental para agregar, em torno de um objetivo específico, as idéias, pensamentos e o comportamento da coletividade presente no rito. Por sua vez, a liturgia (fechando assim o binômio rito-liturgia) implica em todo o proceder por parte dos adeptos, o qual viabiliza o cumprimento e a eficácia do rito. A liturgia seria constituída por determinados gestos, palavras,

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22 rezas, roupas, aparatos e posturas corporais, e até mesmo o comportamento subjetivo (indicando concentração, mentalização, silêncio, respeito, reciprocidade, etc) realizados dentro do ritual.

Pois bem, toda a prática rito-litúrgica na Umbanda possui 3 aspectos sobre os quais esta se fundamenta, quais sejam:

1º Preparatória; 2º Atração de Forças;

3º Movimentação destas Forças segundo o objetivo visado.

Para que possamos cumprir um dado objetivo faz-se necessário cumprir uma série de práticas e um cronograma pré-estabelecido, a fim de sairmos de uma condição inicial e realizemos o que nos propomos a fazer. Em cima desta premissa é que se assentam os vários ritos presentes e verificáveis no universo Umbandista.

Dito isso, focamos a necessidade da prática rito-liturgica como fundamental para o estabelecimento e a propagação da tradição umbandista. As tradições umbandistas, dentro de sua respeitável diversidade, estão ligadas diretamente ao processo rito-liturgico. A tradição é a consequencia imediata da vivência e da prática do rito ao longo do tempo, por meio do qual são ressignificados e transmitidos os princípios velados pelas Leis de

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23 Umbanda, de geração a geração, de sacerdote/sacerdotisa ao iniciado, do mestre ao aluno.

Como afirmaria Émile Durkheim, um dos baluartes da sociologia moderna: "O culto não é simplesmente um sistema de símbolos pelos quais a fé se traduz exteriormente; é o meio pelo qual ela se cria e se recria periodicamente. Consistindo em operações materiais ou mentais, ele é sempre eficaz".

Ainda considerando a vivência do rito, no seu aspecto social/coletivo devemos considerar o indivíduo como portador de uma identidade divina, a qual não se caracterizaria por um individualismo exclusivista; mas uma identidade vivida e integrada ao contexto coletivo religioso. No rito religioso, o indivíduo assume o "divino" interior, estabelecendo um contato próximo com

a Divindade. Na Umbanda, essa

experiência "mística" dar-se-á pelo transe mediunista, no qual o sujeito-médium comunga com seu orixá (aspecto manifesto da Divindade) por intermédio de seu Guia, sua "entidade de frente", seu "pai-de-cabeça", o qual funciona como um mediador, manifestador e regulador dos aspectos mais profundos e pulsantes da inter-relação homem/Orixá e médium/Espírito Guia. Chegamos agora no aspecto espiritual da vivência rito-litúrgica. A importância da consciência religiosa por parte do adepto umbandista deve comportar esse ângulo de visão e compreensão da realidade espiritual, pois somente assim este poderá ampliar e aprofundar sua vivência e sabedoria dentro das Leis de Umbanda, e

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24 obviamente colherá melhores e mais frutos abençoados ao longo de sua jornada espiritual.

Considerando que nos dias de rito, notadamente, as irradiações do Orixá começam a se estreitar e entrelaçar com as do médium de maneira mais profunda pelo menos 7 horas antes dos trabalhos, as práticas de preparação do médium antes das giras, como sejam os "banhos de defesa", a introspecção, o cultivo da oração, a abstenção de determinados hábitos e vícios, são fundamentais para que o adepto possa romper as barreiras interiores, inconscientes, de maneira a emergir a força arquetípica e espiritual de seu Orixá regente, e essa confluência de forças possa resultar em processos de saúde, de prosperidade, de maturidade emocional e vitalidade perante a vida. É assim também que o médium pode, de maneira prática e patente, aprofundar seus estados de transe e assim aos poucos eliminar a dúvida do "eu ou não-eu" durante a prática mediunista.

Adicionalmente, todos os templos umbandistas sérios e com compromissos fundamentados na relação com os Mentores e Guias Luminares da Umbanda, possui toda uma estrutura espiritual, localizada obviamente na dimensão extrafísica, a qual comporta e atinge uma esfera exterior muito maior do que os limites físicos do templo. Dentro desta dimensão estão inseridas uma série de energias polivalentes e poderosas, as quais serão movimentadas no momento do rito a benefício de todos os presentes e de tantos outros distantes, seja espacial ou dimensionalmente. A quantidade de Espíritos associados ao rito, seja na condição de orientadores e amparadores,

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25 seja na condição de doentes em tratamento supera em muito a quantidade de encarnados presentes no dia de trabalho.

Sendo assim, toda a dedicação e carinho, além do respeito e da seriedade, com os quais os médiuns possam revestir-se, serão sempre fatores fundamentais para o bom andamento e para a eficácia dos trabalhos espirituais, em benefícios de todos!

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26

Das Entidades Espirituais da

Umbanda

Muito se tem dito e escrito a respeito das entidades espirituais vinculadas ao universo espiritual da Umbanda. É de conhecimento de todos, inclusive popularmente, as representações simbólicas sob as quais estas entidades se apresentam nos ritos dos templos umbandistas. São os nossos caboclos, pretos-velhos, crianças, baianos, boiadeiros, marinheiros...

Não entraremos aqui no estabelecimento de linhas de trabalho, ou na característica particular de cada tipo de entidade, as quais cabem para cada templo, de acordo com sua tradição.

Faremos sim, uma incursão direcionada ao conhecimento de quem são os Espíritos que se manifestam como Guias e Protetores na Corrente Astral da Umbanda, bem como qual a sua relação com o universo "material", com a consciência mediúnica e “como estes Numes transitam entre a dimensão humana e a dimensão divina (expressa pelo Orixá)”.

Para iniciarmos, precisamos compreender em essência a atuação do(s) Orixá(s) como sendo a de um ser estruturador da Realidade. Tudo o que existe no

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27 Universo, seja de natureza concreta ou abstrata, física ou não-física, realiza-se e sustenta-se por meio do(s) Orixá(s). O(s) Orixá(s) é quem manifesta a "vontade Divina" no tempo e no espaço, estruturando as várias dimensões da Vida e abarcando em si as esferas pertencentes a estas dimensões (Natureza, Humanidade, Espiritualidade e Divindade).

Por ser o agente manifestador da Divindade Maior (Olorum, Deus, Zambi, etc.), o Orixá manifesta-se no universo como um todo, tornando-se regente de uma determinada faixa vibratória, a qual alberga em si todos os seres portadores de consciência (independente de seus níveis) e, por consequência, todas as coisas existentes. Lembremos que o "mundo material" (Natureza/Humanidade), segundo nossa conceituação, é

manifestação do "mundo espiritual" (Espiritualidade/Divindade), por isso o universo material existe na medida em que é manifestado pela Consciência, a qual está situada na dimensão Espiritualidade/Divindade.

Obviamente, existe um contínuo "fluxo e refluxo" neste trânsito entre a Realidade Divina/Espiritual e a realidade Natural/Humana.

Sendo assim, Orixá torna-se então manifestação da Divindade (sendo Seu preposto na Hierarquia Divina), na Espiritualidade (manifestando-se como força viva através dos Numes Espirituais), na Natureza (por meio dos 4 elementos: ar, fogo, agua e terra) e, por fim, na

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28 arquetípica pertinente ao inconsciente pessoal e coletivo do indivíduo).

Dito isso, entendemos agora que dentro de cada faixa vibratória, a qual denominamos Linha dentro das Leis de Umbanda, estão contidos aspectos divinos, entidades espirituais, elementos da natureza e seres humanos cujas consciências "vibram originalmente" em sintonia com esta ou aquela faixa, representante deste ou daquele Orixá. É por isso que temos então pessoas filhas de tal Orixá, espíritos representantes de Orixá tal, elementos da natureza relacionados com Orixá tal, assim como atributos divinos ligados a determinado Orixá.

Diante dessa questão, entenderemos que as entidades tidas como Guias e Protetores em nossa Lei de Umbanda, são aquelas que passando pelo ciclo nascimento morte reencarnação (ciclo reencarnatório), a pouco e pouco, vivenciam e vivenciaram a experiência do contato homem/Orixá, seja na vida do mundo espiritual, seja na vida "humana" (encarnação), seja na sua passagem evolutiva pelos reinos da natureza, adquirindo

consciência do Orixá, daquilo chamado de "Deus

interno", passando a ser manifestadores da força e irradiação do Orixá.

Assim é que podemos ter, dentro de uma mesma Linha, entidades diversas. Ex: Preto-Velho, Caboclo, e Boiadeiro manifestando a irradiação de Ogum; Marinheiro, Criança, Caboclo e Preto-Velho, manifestando a irradiação de Yemanjá, e assim por diante.

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29 Importante considerarmos também que os termos "Caboclo", "Preto-Velho", "Criança", "Baiano", etc., mais do que a forma de apresentação destes Espíritos, remetem ao grau espiritual concernente a cada um. Esse grau espiritual não traduz uma relação vertical entre as Entidades (por exemplo, Preto-Velho seria "mais evoluído" que o Caboclo, e vice-versa). Ao contrário, as relações do plano espiritual revelam-se horizontalmente entre os Guias e Protetores, sendo dada a ascendência de determinado Espírito sobre o médium pelo fato deste guardar maior afinidade vibratória e kármica sobre o seu tutelado. Embora seja verdade que muitos espíritos tiveram pelo menos sua última encarnação como índios, negros, nordestinos e sertanejos, isso não se torna uma regra na qual possamos enquadrar todos as Entidades que "baixam" nos templos de Umbanda.

Tratando agora a respeito da relação médium/Guia, podemos também citar um aspecto interessante, segundo o qual sendo o médium filho de determinado Orixá, esse receberá um Guia manifestador deste mesmo Orixá, conhecido como "pai de cabeça" ou "guia de frente". Será sempre sob a cobertura dessa entidade "principal" que irão ocorrer as manifestações mediunistas das demais entidades que compõem a "coroa mediúnica" do médium. A abertura da sintonia mediúnica será sempre realizada pelo guia de frente (não necessariamente incorporando-se no médium antes das demais, mas sim efetivando uma influenciação mais subjetiva e sutil), resguardando o médium e sua identidade.

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30 Finalmente, e ainda sobre a atuação do Guia de frente, na experiência do transe, ao longo da vivência tempo/rito, poderão emergir os conteúdos numinosos presentes no inconsciente do médium proporcionando experiências místicas profundas e alterações marcantes no seu comportamento e percepção da vida, compreendo-se como Ser existente tanto na realidade material (natureza/humanidade) quanto espiritual (espiritualidade/divindade), como sujeito eterno e constituído pelo Divino/Orixá.

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As Ervas

Na Umbanda tudo tem um fundamento e uma razão de ser.

Não importa se essa "razão de ser" seja diretamente concordante com a ciência moderna, pois nem sempre a visão metafísica preconizada pela compreensão Espiritualista da realidade comporta métodos de mensuração quantitativa e qualitativa, exigências básicas para a comprovação do método científico acadêmico. Importa sim, que a metafísica característica de um segmento religioso comporte em seus princípios e fundamentos um discurso e uma prática coerentes entre si, e esteja embuída de crítica da realidade de si mesma e da sociedade na qual está inserida. Assim, ambas as formas de compreender a realidade, no seu aspecto religioso e científico, podem se interfacear, não fundindo-se, mas convivendo num mesmo ambiente cultural, sendo comportadas pela fé e pela razão humana, cada uma respeitando a esfera de ação a que lhe pertence. Dizemos isso para podermos abrir nosso estudo reflexivo a respeito das Ervas na Umbanda.

Deixaremos claro mais uma vez que não iremos aqui passar receitas de banhos ritualísticos, defumações, simpatias, amacis, etc. não que tenhamos nada contra,

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32 muito pelo contrário, uma vez que somos umbandista, mas como sempre nossa intenção será a de refletirmos a respeito do porquê do uso e da importância das ervas no universo religioso umbandista e como essas estão ligadas aos aspectos físicos e espirituais, segundo o sistema de crença da Umbanda. Como sabemos que em nosso meio existem várias tradições, procuraremos tratar o assunto da maneira mais ampla possível para que tenhamos uma visão satisfatória e adaptável ao máximo número de adeptos.

A Umbanda, por ser essencialmente um credo Espiritualista, compreende a Realidade como sendo portadora de uma porção material e outra porção espiritual. No entanto, como já tratado em textos anteriores, não entendemos estas duas "polaridades" do Universo como estando separadas uma da outra.

Entendemos inclusive que o "mundo material" é manifestação do "mundo espiritual", seus aspectos essenciais coexistem dentro de um sistema maior em que forças sutis transitam entre ambos, carreando os influxos de origem divina/espiritual para o universo material, bem como a experiência dos efeitos materiais em essência repercutem vibratoriamente em determinados níveis mais próximo-imediatos do plano espiritual.

Uma vez compreendida essa questão, passamos a entender como, segundo nosso sistema de crença e experiência religiosa, tudo no planeta é dotado de uma dimensão corpóreo-física e outra mais essencial/espiritual. As ervas, utilizadas em nossa prática

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33 religiosa com as mais diversas finalidades, possuem então uma dimensão corpórea e vital (são seres vivos) assim como uma dimensão espiritual/divina (estão associadas às consciências espirituais ainda em estágio de evolução neste reino anterior ao hominal, assim como está contida nelas a manifestação direta dos Orixás). Diante de tudo isso, entendemos agora que as ervas podem influenciar o mundo material, quando utilizadas como medicamentos, alimentos, etc...assim como podem influenciar a dimensão espiritual, quando empregadas na rito-liturgia umbandista, em forma de banhos de defesa, defumações, amacis, etc.

Para concluir, abordaremos mais um aspecto de fundamental importância para nossa compreensão. Como dissemos anteriormente, entendemos que tudo que há em nosso planeta, e neste caso, especificamente na natureza, é dotado de uma constituição sutil e espiritual. Dessa forma, é necessário que haja, quando da utilização da erva nas práticas do rito umbandista, uma ligação entre o(s) indivíduo(s)/médium(ns) operador(es) do rito com a erva ou as ervas que serão utilizadas.

É a mente do sensitivo que "dispara" o comando para que sejam movimentadas as forças sutis que estão contidas na erva e no ambiente que será atingido por tal ação magística. Devemos lembrar que para um trabalho espiritual, no qual as ervas serão utilizadas como poderoso recurso, a vontade e o pensamento do operador é que irão subordinar e comandar o processo.

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34 Evidentemente existem práticas de fundamento específicas dentro de cada terreiro que destinam-se justamente a promover esse "despertar" das propriedades espirituais das ervas. Para citar um exemplo, quando o corpo de médiuns canta e dança para os Orixás junto ou próximo às folhas que posteriormente serão utilizadas nos trabalhos ritualísticos da casa, mesmo que muitos dos presentes não o saibam, podemos estar certos de que neste instante está ocorrendo uma verdadeira "agitação" nos planos etéricos/espirituais em cujas dimensões movimentam-se os aspectos curativos/espirituais de nossas folhas sagradas, com as quais sempre poderemos contar como abençoados remédios para o corpo e para as questões espirituais, levando toda a negatividade, os acúmulos nocivos de energias densas, afastando seres espirituais de baixa frequência e nos colocando vibratoriamente em contato com os Guias e Orixás de nossa amada Umbanda!

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A Defumação

Em continuidade ao assunto iniciado e tratado no post anterior, trataremos agora de outra questão extremamente presente no dia-a-dia da prática umbandista: a

defumação. A defumação como verdadeira magia para a

correção e harmonia das estruturas espirituais do templo e principalmente do indivíduo.

É sabido por parte de todos os adeptos da nossa Umbanda como se preparar uma boa defumação. Os templos umbandistas fornecem essa orientação, além de contarmos com uma considerável bibliografia no meio umbandista que trata, pelo menos de maneira básica, a respeito deste fundamento.

Entretanto, gostaríamos neste momento de aprofundar o olhar a respeito e reflexionar sobre como uma prática, vista como um mero "exotismo" ou prática primitiva ao olhar do leigo, está revestida de tanta sabedoria e conhecimento a respeito das dimensões do ser humano e da vida.

A difusão cada vez maior de idéias a respeito da realidade quântica do universo em nossa cultura ocidental - a qual é caracterizada pelo cientificismo e pelo racionalismo filosófico -, tem suscitado muitas discussões em nosso meio social e também nos meios acadêmicos.

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36 A compreensão quântica do universo (preconizada pelo eminente professor de Física da Universidade de Oregon, Amit Goswami) postula que a Realidade é criada pela Consciência, a qual escolhe, entre várias possibilidades prováveis, quais os contextos que irão surgir como realidades. Isso implica em dizer, sumariamente, que nossa consciência objetiva ou de corpo (as sensações corporais como calor, frio, dor, leveza, pressão sobre a pele) e nossa consciência subjetiva ou psíquica (percepção de individualidade, assim como sentimentos, emoções, ideias, pensamentos), seriam causadas pela ação da Consciência. A este princípio foi dado o nome de

causação descendente (a Consciência cria a realidade, o

cérebro e o corpo), implicando numa posição contrária ao paradigma científico materialista, tido como causação

ascendente, o qual define o cérebro como criador da

consciência e do sentido de individualidade. A Consciência seria, portanto, Causal.

Obviamente, essa Consciência, a qual É essencialmente nós mesmos, opera essas "escolhas" num nível inconsciente, por isso não temos a percepção objetiva e consciente de que estamos produzindo a realidade em que vivemos, sentimos, pensamos e nos movimentamos. Talvez ai more a chave central para a compreensão da Lei Kármica. Em outra oportunidade, voltaremos a este aspecto para refletirmos a respeito da Lei do Karma e do Livre-Arbítrio.

É importante fixarmos, deste conceito acima explicitado, que é a partir do momento em que a Consciência cria a

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Individualidade, a qual está localizada em vários níveis

dimensionais (natural - espiritual - divino, por exemplo), Ela (a Consciência) manifesta estruturas paralelas que interagem dinamicamente e regulam-se umas as outras, num movimento de equilíbrio. Essas estruturas, fazendo uma ponte com os conhecimentos espiritualistas, podemos chamá-las, didaticamente, de: corpo físico

(material), corpo vital ("semi-material" ou etéreo), corpo psíquico (sutil) e corpo mental (sutilíssimo).

Uma vez que o movimento harmônico entre essas estruturas dinâmicas implica na saúde, consequentemente a desarmonia entre esses movimentos equivaleria à doença (seja ela física, psíquica ou espiritual).

Cremos que o princípio espiritual (conhecido nos cultos de nação, nos Candomblés, como Axé) está manifesto em cada ser humano, cada Espírito, e em cada elemento da Natureza (por conta da própria ação dos Orixás), e este pode ser transmitido, assimilado, compartilhado e renovado dentro deste Sistema abarcado pela Consciência.

As ervas, na dimensão natural (Natureza), pelos processos de seu desenvolvimento, recolhem do solo os nutrientes necessários para sua subsistência e perpetuação da espécie, além da influência da luz solar e da lua, as quais também contribuem nos fenômenos da fotossíntese e no seu crescimento.

Já na sua dimensão espiritual, as ervas estão carreadas de grande acúmulo etérico, por conta da absorção das

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38 energias sutis provindas dos 4 elementos (ar, fogo, água e terra).

Adicionalmente, na sua dimensão divina, as ervas carregam o princípio espiritual do(s) Orixá(s).

As ervas também são, portanto, manifestação da Consciência Causal.

Por carregarem em si substâncias químicas (seu princípio ativo), no momento de sua queima essas são liberadas no ambiente. Como muitas das ervas utilizadas na defumação possuem propriedades antissépticas e curativas (por exemplo, alecrim, eucalipto, arruda e guiné), sua fumaça age primariamente sobre o corpo e o ambiente contribuindo para o saneamento destes.

Em relação às estruturas etérica/espiritual, quando utilizamo-nos da defumação em nossas giras, os princípios espirituais liberados pelas ervas no momento de sua queima e potencializados na fumaça, influenciam estas estruturas de cada indivíduo (encarnado ou desencarnado), estabilizando-as e contribuindo para que a Individualidade possa recuperar-se ou fortalecer-se. No entanto, na prática litúrgica, este processo manifestar-se-á sempre pelo comando do médium/operador, cuja consciência e o poder da vontade "dispara" o gatilho que irá promover sua movimentação no plano espiritual. Não podemos nos furtar a dizer da importância de nossos Guias e Mentores neste processo, os quais dinamizam, no

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39 momento da defumação, seus próprios "princípios espirituais", verdadeiros "mananciais de luz", direcionando-os para todos, formando uma verdadeira "aura coletiva" da qual cada um retirará o que lhe seja necessário.

Finalizemos colocando um ponto de destaque. Não cremos, particularmente, que essa influência nas estruturas sutis da Individualidade, efetivada no ato da defumação, processe-se obedecendo às Leis Físicas conhecidas e aceitas atualmente. Nossa proposta aqui, ao citarmos conceitos da Física Quântica, é a de contemporizar nossa visão do universo espiritual, estabelecendo uma relação com assuntos atuais, provindos de um meio oposto ao religioso, qual seja o meio científico acadêmico.

Pretendemos assim situar o conhecimento humano como sendo o contemplador de ângulos de entendimento da realidade diversos mas ao mesmo tempo complementares, dos quais podemos dispor para darmos significados à nossa existência e realidade.

Lembremos que somos a Consciência e escolhemos a nossa realidade!

Deixamos isso claro para não parecer que estamos tentando dar explicações científicas para um processo essencialmente mágico e subjetivo, segundo nosso entendimento, embora totalmente eficaz e real.

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40 O amigo leitor deve estar se perguntando agora: Ué... A que tipos de Leis então essa prática de "transmissão de forças" obedecerá?

Respondemos: Temos uma linha de estudo que versa a respeito dos fundamentos de transmissão de forças espirituais dentro da prática umbandista.

Isso por que a explicação do processo implica no tratamento de alguns conceitos que tornariam o presente texto muito extenso. Então, no capítulo

"Simbolismo , Magia e Subjetividade na Prática Umbandista", trataremos do assunto.

Saravá!

Defuma com as Ervas da Jurema, Defuma com Arruda e Guiné, Benjoim, Alecrim e Alfazema Vamos defumar Filhos de Fé!

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O Banho de Ervas

O corpo é instrumento da alma. Estamos manifestos no plano material e instrumentalizados por um complexo orgânico responsável por arquivar nossas experiências sensoriais e extra-sensoriais, mediante cujo mecanismo acrescemos ao nosso patrimônio interior, por via do inconsciente, os registros dos quais nos valeremos ao longo de nossa caminhada espiritual, obedecendo ao imperativo da reencarnação.

Como já salientamos em nossos textos anteriores, segundo nossa concepção, a Umbanda não vê o mundo espiritual e o mundo material como expressões dissociadas e independentes. Cremos numa Unidade que se manifesta em dimensões diversas.

Voltamos a essa premissa para que possamos entender o porque das práticas espirituais da Umbanda estarem intimamente ligadas a utilização de elementos da natureza, símbolos e até mesmo com expressões corporais características.

Ao contrário do que alguns seguidores de outras correntes espiritualistas vêem na Umbanda, não nos utilizamos de recursos "materiais" como apoio para conseguir "efeitos espirituais" que poderiam ser atingidos somente com faculdades subjetivas, supostamente de "níveis superiores". Para nós, a noção de corporeidade

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42 está diretamente associada à significação do mundo, no qual, como Espíritos encarnados, nos manifestamos. Por exemplo, diferentemente do Espiritismo (vide: "Kardecismo" e Umbanda são iguais?), no qual a relação com o mundo espiritual é expressa, notadamente, pela

fala do médium (por isso a utilização do termo psicofonia, para designar o fenômeno pelo qual o espírito

se comunica, nas sessões mediúnicas espiritistas), na Umbanda possuímos duas formas de expressão do fenômeno espiritual: a linguagem corporal e a fala, sendo a primeira mais significativa e rica dentro da simbologia e fenomenologia do transe (por conta de suas gestualidades, danças, expressões faciais, atos litúrgicos, etc.).

"A linguagem da umbanda não é referencial, não etiqueta objetos, metafísicos ou não, o que lhe permite uma grande liberdade de composição. Pode conceber-se como processos de enunciação que envolvem a integralidade dos sentidos"(Bairrão, 2004).

Como manifestação do Espírito, na Umbanda o corpo expressa memórias coletivas e pessoais, sendo essas para nós, o conjunto das vivências da humanidade ao longo do tempo (em suas dimensões natural, social, espiritual e divina).

Assim, os banhos de ervas compõem dentro das práticas religiosas na Umbanda, mais um significativo procedimento para estabelecer-se a relação do seu adepto com o mundo espiritual.

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43 O banho de erva, assim como a magia das fumaças (vide: A Defumação), compõe a preparação fundamental de seu adepto para o contato com o Sagrado, com os Numes da Umbanda, os quais não somente valem-se do psiquismo como também utilizam-se do corpo do médium, num autêntico processo de incorporação.

Dessa forma, é importante que não só o subjetivo (os pensamentos e as emoções) esteja em harmonia, refletindo um estado de serenidade. É também sumamente imprescindível que o corpo também esteja em estado propício para a prática espiritual.

A prática de banhar-se com as ervas ritualísticas serve como instrumento de fixação das irradiações espirituais em torno do Aura do indivíduo, restabelecendo o equilíbrio de suas estruturas dimensionais mais sutis. O banho de ervas também pode ser utilizado como descarregador de "energias negativas" e como elo sintonizador com a vibração de seu Orixá.

O "filho de fé" umbandista precisa estar com seu corpo "vibratoriamente" adequado para que suas energias espirituais possam fluir de si, influenciando a realidade e produzindo estados de bem-estar, de equilíbrio emocional e prosperidade.

O médium umbandista precisa estar com seu corpo "purificado" e sintonizado com as faixas espirituais de onde provêm os Guias e Protetores da Corrente Astral de Umbanda, para que seu trabalho possa ser feito a contento.

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44 No caso de uma influência espiritual negativa, as emanações etéricas propiciadas pelo banho impactam sobre o corpo astral da entidade obsessora, alijando-a da ligação com seu "hospedeiro", favorecendo que este se reestabeleça.

Como vemos, nossas práticas estão repletas de significado e sabedoria, das quais nos dispomos dentro de nossa cultura religiosa, buscando sempre a saúde, a felicidade e a relação com o Divino.

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A Pemba, a Lei de Pemba e o

Ponto Riscado

A Pemba é um elemento ritual muito característico e presente nos terreiros de Umbanda.

Como mostra a figura ao lado, trata-se de um giz rústico, constituído de calcário.

Esse elemento é amplamente utilizado nos rituais africanos, e obviamente, herdamos desta cultura religiosa tal prática.

A Pemba geralmente é utilizada de duas formas específicas nos ritos: em pó ou em forma de pedra.

A origem do nome, Pemba, vem da lenda africana referente ao monte Kabanda e as águas do rio Usil (tidos como sagrados pelas tribos Bacongo e Congo). A lenda conta a história da donzela M.Pemba, virgem filha do poderoso líder de sua tribo, Soba Li-u-Thab. M.Pemba seria conservada virgem para que fosse oferecida às divindades cultuadas por aquela tribo, no entanto, a jovem conhece um estrangeiro, e ambos entregam-se a uma aventura amorosa, tomados pela paixão.

O pai de M.Pemba, quando toma conhecimento de tal aventura amorosa, manda degolar o rapaz para que em

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46 seguida fosse lançado ao rio USIL, de maneira que fosse devorado pelos crocodilos. M.Pemba, consternada com tal tragédia e desilusão amorosa, para atestar sua dor e pesar, cobria todo o seu corpo com o pó branco retirado do monte Kabanda e à noite, para que seu pai não soubesse desse ato de dor perante a morte de seu amor, lavava-se nas margens do rio.

Um dia, pessoas da tribo que observavam M.Pemba banhar-se, viram que a jovem elevava-se aos céus, deixando em seu lugar um monte de massa branca às margens do rio. Ao informarem o pai, Soba, enfurecido, mandou que também degolassem aos membros da tribo. No entanto, como estes haviam passado em seu corpo aquela massa branca deixada pela jovem "divinizada", perceberam que o tirano líder acalmava-se e tornava-se bom, desculpando os seus servos.

A partir daí, a Pemba vem sendo utilizada dentro dos ritos africanos.

A Lei de Pemba.

O termo refere-se ao domínio da mística simbólica, realizada e transmitida pelos guias de Umbanda, cujos seus maiores conhecedores e guardiões de seu segredo são os nossos Pretos-Velhos.

A Lei de Pemba é expressa pela utilização de símbolos cabalísticos de origem universal, presentes em todas as culturas ao longo da história da Humanidade, os quais

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47 ganham re-significação própria dentro da rito-liturgia umbandista.

A Lei de Pemba contém em si aspectos fundamentais do conhecimento transcendente a respeito das Leis Espirituais que regem os movimentos das consciências viventes no planeta Terra, bem como as vinculações de ordem kármica entre estas e os mecanismos pelos quais a vontade humana pode subordinar forças sutis e naturais, movimentando-as, com a intenção de produzir efeitos que impactem nas dimensões material e espiritual.

Sendo assim, a Lei de Pemba manifesta as chaves para o conhecimento dos atributos e vinculações das Entidades Espirituais dentro das Leis de Umbanda, assim como guarda para si aspectos mais profundos que não podem ser acessados diretamente por pessoas (encarnadas) e mesmo entidades espirituais que ainda não possuam níveis de conhecimento e de consciência próprios para tal.

Como dissemos, as Entidades Espirituais ligadas à Corrente Umbandista, trazem os conhecimentos, em maior ou menor grau, referentes à Lei de Pemba e para que possam grafá-los, "abrindo-os" para a dimensão material, utilizam-se de símbolos próprios da cultura humana, os quais encontram-se gravados no inconsciente do médium e em si próprios. Para isso, dentro da cultura umbandista, damos significados próprios a tais simbologias, contextualizando-os de acordo com nosso universo simbólico-espiritual.

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48 De acordo com Evans-Pritchard (2004), conforme consta em Etiene Sales (2005), o símbolo religioso é uma

representação analógica do mundo invisível, sendo a cultura a matriz geradora das formas simbólicas que trazem à existência (mundo imanente) forças do mundo espiritual.

Pelo exposto acima, vemos que a Espiritualidade irá utilizar-se daqueles símbolos subjacentes no inconsciente do indivíduo, portanto dotados de grande força emocional e transcendente, para imprimir as "ordens" e "movimentos" que facultarão a obtenção de determinados efeitos sobre o ambiente, sobre a coletividade presente ao rito, sobre o médium ou o consulente, sobre um espírito desencarnado ou um doente necessitado de ajuda, etc... Depreendemos então que a Lei de Pemba, num nível mais fundamental, é utilizada para a criação de concentrações de forças que serão postas em movimento para beneficiar os presentes ao rito.

Assim, a Lei de Pemba consubstancia-se, dentro da prática rito-litúrgica umbandista, por meio do Ponto

Riscado.

Ponto Riscado

Segundo as Hierarquias Espirituais regentes das Leis de Umbanda, os espíritos ligados à Corrente Astral afim à nossa faixa espiritual religiosa, estão agrupados em 3

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Orixás, Guias e Protetores (trataremos em artigos

futuros de maneira mais detalhada a respeito das Hierarquias Espirituais da Umbanda).

Essa categorização evidencia uma qualificação em termos de evolução espiritual para os espíritos trabalhadores da Umbanda.

Pela Lei de Afinidade, estes espíritos irão utilizar-se de médiuns compatíveis com seus propósitos e alcances de trabalho. De maneira geral, os espíritos identificados com o trabalho mediúnico estão entre aqueles na condição de Guias e Protetores.

Conforme havíamos dito, a Lei de Pemba contém em si uma série de aspectos profundos da realidade espiritual, e por conta disso, seu acesso não é dado de maneira integral a todos os Espíritos e médiuns. O patamar de conhecimento e possibilidades de compreensão a respeito da utilização da grafia cabalística umbandista, está diretamente relacionado ao grau de consciência manifestados pelo Espírito atuante e o seu respectivo médium.

Dessa forma é que veremos Pontos Riscados que meramente trazem informações a respeito da Entidade manifestada naquele momento, qual a sua pertença espiritual e ordens de trabalho. Ou seja, pelos símbolos contidos no Ponto Riscado, podemos identificar qual a Linha, Falange e Cruzamento (se for o caso) do Guia ou Protetor. Aliás, justamente, o que irá categorizar um

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50 espírito na condição de Guia ou Protetor é exatamente a simbologia e interpretação expressa no Ponto Riscado. Resumindo, pelo Ponto Riscado a entidade poderá dizer quem é, qual a sua linha e, qual seu grau dentro da hierarquia espiritual. O Ponto Riscado é a assinatura da Entidade Espiritual.

Adicionalmente, o Ponto Riscado é utilizado não somente para identificação dos Espíritos como também para beneficiar determinadas pessoas (física ou espiritualmente) e para a consagração de guias, patuás, elementos rituais (pembas, instrumentos da curimba, fitas, velas, imagens, etc).

Não podemos deixar de considerar, quanto à interpretação e significado dos símbolos usados nos Pontos Riscados, ser imprescindível levar em conta o contexto cultural e tradicional do templo umbandista onde serão expressos e manifestos. Isso por que, segundo Sales (2005): "O significado de um símbolo não é

intrínseco, mas depende do discurso em que encontra inserido em sua própria estrutura. Fora do contexto onde foram gerados, os significados dos símbolos se alteram [...]. É preciso perceber a dinâmica própria da cultura religiosa do local e sua influência nas simbologias e representações".

Compreendemos então que os Pontos Riscados não são símbolos universais (embora os elementos contidos neles sejam) e sua linguagem expressa um padrão dinâmico

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51 que carece ser interpretado dentro do contexto religioso de cada casa de Umbanda.

Sendo assim, esperamos ter contribuído um pouco com o esclarecimento a respeito destes aspectos tão presentes na nossa vivência umbandista.

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As Roupas Litúrgicas e as Fitas

A questão dos aparatos litúrgicos na Umbanda é sempre notada por parte daqueles que frequentam ou tomam o primeiro contato com nossa religião. Em meio a essa rica estrutura semiótica presente nos ritos umbandistas, encontramos os elementos que servirão como pontos de atribuição de significados de nossa cosmovisão, quais sejam os elementos rituais.

Neste post, traremos considerações a respeito de dois elementos rituais específicos: As Roupas Litúrgicas

e as Fitas.

Antes disso, devemos lembrar que em posts anteriores, havíamos já situado a interação Espírito-corpo, sob cujos mecanismos a corporeidade é fundamental para o entendimento de sua ação sobre a espiritualidade. O corpo, por caracterizar-se como manifestação do Espírito, é também espírito, situado na dimensão material. Os elementos corpóreos (ditos materiais) também possuem estruturas sutis e irradiações espirituais que os compõem. O trabalho com o corpo e o corpóreo torna-se o vínculo principal para influenciarmos a realidade espiritual, pois é pela experiência do contato com a realidade física (material) que o Espírito agrega os valores imprescindíveis para o seu aprimoramento e evolução.

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53 Assim, a composição de sentidos estéticos para as práticas espirituais não são fetichismos, mas são atos de reconhecimento do espiritual naquilo que em sua essência já o é. A matéria-prima utilizada na confecção de todo o aparato litúrgico, contém essencialmente a força espiritual por provir da Natureza, na qual estão impressas, de forma latente, as irradiações dos Orixás. No "corpo físico" estão situados os elos de várias dimensões do Ser e da Vida. No corpo, encontramos a ligação entre o indivíduo e o coletivo, a cultura e a natureza, o sagrado e o humano (Silva, 2008).

O corpo do adepto deve ser preparado para receber os Guias, manifestadores dos Orixás, e para isso deve estar interiormente e exteriormente adequado para tal ato, havendo um entrelaçamento dos planos sagrado e humano, permeados por um sentido estético.

Cultura e natureza, assim como sagrado e humano, são aspectos interpretados dentro da cultura Umbandista, assim como nas demais religiões afro-brasileiras, como sendo não-opostos. Antes, são aspectos que fluem para um mesmo princípio e fim.

As roupas litúrgicas - roupas de santo, como são conhecidas -, obedecem a uma composição básica e homogênea, de maneira que todos os integrantes do cazuá estejam apresentando-se uniformemente. Nessa prática, entendemos que no momento do rito, quando o médium veste sua roupa de santo, ele deixa de lado a sua individualidade - seus atributos sociais,

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54 seu status econômico, seu grau de intelecto, etc. -, para inserir-se em um contexto religioso que o conduzirá a uma vivência na qual a persona individual deve ser deixada de lado para que haja a passagem para a persona

social, o sujeito integrante de um sistema maior, no qual

ele compõe um elo. Um dos vários elos da corrente mediúnica.

Assim, nossas circunstâncias particulares devem ser deixadas, momentaneamente, de lado para que possamos integrar-nos aos trabalhos espirituais, porquanto neste trânsito entre persona individual - persona social anularemos os aspectos centrais de nossa consciência para abrirmos campo a persona-espiritual que irá acessar a persona-divina, a depender de cada um, habitante do interior de cada ser humano.

A roupa litúrgica, por caracterizar um aparato específico e importante para o médium, deve ser tratada como tal. Recomenda-se, portanto, que esta seja lavada em separado das demais roupas de uso do médium, assim como seja guardada em local específico e, de preferência, em separado das demais roupas.

Nunca é demais lembrar que a utilização das roupas de santo deve limitar-se aos dias de rito, bem como só devem ser vestidas dentro do templo religioso, salvo exceções preditas pelo dirigente da casa.

Outra característica das roupas de santo refere-se à sua aparência. É bem sabido de todos os umbandistas que as vestimentas têm a cor branca como fundamental. Os

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55 modelos das roupas litúrgicas são estabelecidos pela casa e devem ser utilizados por todos os seus médiuns, não permitindo-se variações. Isso por que é óbvio que, no aspecto coletivo, a roupa de santo visa dar uniformidade ao grupo frequentador do templo.

A utilização de roupas brancas, como símbolo religioso, é milenar e podemos encontrá-las ao longo da história dentro das culturas egípcia, tibetana, hindú, chinesa e árabe. No Brasil, o costume da utilização da cor branca dentro dos ritos nas religiões afro-brasileiras, deu-se por influência dos negros malês. O termo malê originou-se

da palavra em iorubá imalê, sob a qual identifica-se os negros mulçumanos.

Estes, trazidos também como escravos ao Brasil, eram islamizados e trouxeram o hábito da utilização da roupa branca, bem como do turbante (também conhecido como torço), entre outros elementos próprios de sua cultura já sincretizada entre a cultura iorubá e o islamismo.

Com isso dizemos que, ao contrário do que muitos pensam, o uso da roupa branca na Umbanda não advém de uma influência kardecista, pois como já deixamos claro em um texto anterior (ver: Kardecismo e Umbanda são iguais?), o Kardecismo não prevê nenhuma espécie de roupa característica, tão pouco a utilização de qualquer objeto ritual ou simbólico.

Continuaremos agora dando enfoque para a utilização das

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