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ACESSO E REPRESENTAÇÃO LEXICAL DE PALAVRAS FLEXIONADAS EM GÊNERO NO PORTUGUÊS

Letícia M. Sicuro Corrêa

Diogo A. de A. e Almeida*

RESUMO:A representação e o acesso de palavras flexionadas em gênero no léxico mental são investigados por meio de tarefa de decisão lexical com falantes adultos de português. Visa-se a verificar se os resultados obtidos em espanhol (Dominguez, Cuetos & Segui, 1999) podem ser replicados em português e, em particular, se categoria gramatical, ou a natureza do processo flexional (lexical ou sintática), é um fator relevante na representação e no acesso a essas formas. Os resultados obtidos em espanhol sugerem que nomes (substantivos) e adjetivos flexionados em gênero têm representações independentes no léxico, sendo recuperados por uma via direta de acesso lexical. Oferecem, pois, suporte a um modelo de léxico mental em que formas plenas (de superfície) são representadas. Os presentes resultados não sustentam essa hipótese, ainda que possam indicar que formas femininas de alta freqüência relativa no par flexionado admitem acesso direto. Esses resultados indicam, ainda, que o acesso a nomes e adjetivos é diferenciado. Sugere-se que interpretabilidade de traços léxico-sintáticos, caracterizada no âmbito da teoria lingüística, seja uma propriedade incorporada em modelos de duplo-acesso do léxico mental.

PALAVRAS-CHAVE: léxico mental; acesso lexical; representação lexical; gênero gramatical;; flexão.

INTRODUÇÃO

Este estudo lida com o reconhecimento de palavras flexionadas em gênero por falantes adultos de português. Visa-se a verificar se palavras flexionadas em gênero são recuperadas do léxico mental como formas plenas, ou seja, tal como formas não flexionadas, e se esse tipo de representação pode ser atribuído indistintamente a nomes (substantivos) e adjetivos, tal como sugerido por dados do espanhol (Dominguez, Cuetos & Segui, 1999).

Léxico mental pode ser entendido como um tipo de memória para elementos do léxico e diz respeito ao conhecimento que o falante tem das palavras da língua. Esse conceito se inscreve em teorias psicolingüísticas que visam a explicar o modo como unidades lexicais são recuperadas na compreensão e na produção da linguagem, assim como dar conta de dificuldades no acesso lexical.

Um dos tópicos mais discutidos na caracterização de um modelo do léxico mental é o modo como palavras plurimorfêmicas estariam representadas. Ou seja, se o fato de estas formas serem derivadas ou flexionadas do ponto de vista da descrição lingüística necessariamente implica que o acesso a elas é dependente de regras de formação de palavras ou de procedimentos de natureza gerativa. Assumindo-se uma possível dissociação entre o modo como palavras são caracterizadas morfologicamente e o modo como são representadas para acesso lexical, palavras derivadas teriam, em princípio, mais chance de serem representadas como formas plenas do que palavras flexionadas, dado que o processo de derivação não é completamente regular e estas podem adquirir nuances semânticas imprevisíveis a partir do significado dos morfemas constituintes. De fato, formas derivadas de alta freqüência, tal como formas irregulares, tendem a ser representadas independentemente da palavra primitiva de sua “família” morfológica (Pinker, 1991). Formas regulares flexionadas, por sua vez, parecem ser decompostas no acesso lexical, como sugerem resultados experimentais obtidos em tarefas de reconhecimento com sonda (prime) semântica Sonnenstuhl, Eisenbeiss & Clahsen, (1999), dados neuropsicológicos obtidos por meio da técnica dos potenciais evocados (ERP –Event Related Potentials) (Penke et al., 1997) assim como erros de concordância obtidos com afásicos agramáticos (Janssen & Penke, 2002).

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Regularidade pode, no entanto, não ser o único fator determinante do modo como formas flexionadas são reconhecidas na compreensão ou recuperadas na produção. Baayen, Dijkstra & Schreuder (1997) argumentam que as propriedades específicas dos afixos na língua têm de ser levadas em conta num modelo de identificação lexical, e listam uma série de parâmetros que podem ser relevantes ao processamento em nível morfológico, dentre os quais a dominância de freqüência – fator considerado determinante do modo de representação de palavras flexionadas em gênero em espanhol (Dominguez, Cuetos & Segui, 1999).

Dominância de frequência diz respeito à freqüência relativa das chamadas formas de superfície (a forma da palavra tal como se apresenta fonologicamente, ou seja, não segmentada em morfemas constituintes) de um par flexionado. Por exemplo, no caso de uma língua em que haja formas distintas para singular e plural e que a diferença resida na presença ou ausência de um morfema de número adicionado a uma base, um par singular/plural tem dominância singular se a forma mais freqüente do par for a singular e tem dominância plural se a forma plural for a mais freqüente. Efeitos de freqüência da forma de superfície de um par flexionado no reconhecimento lexical são tomados como indicativos de que a forma flexionada encontra-se representada como forma plena, dispensando-se, com isso, o uso de regras ou de operações de natureza computacional quando de seu acesso na produção e/ou na compreensão.

Os estudos conduzidos em espanhol (Dominguez et al., 1999; 2000) fizeram uso de formas flexionadas em gênero e em número em tarefa de decisão lexical – o falante tem decidir o mais rapidamente possível se a palavra que lhe é apresentada é ou não uma palavra de sua língua. O tempo de decisão é tomado como medida do tempo de acesso lexical. Quanto menor o tempo, mais chances há de a forma ser reconhecida sem a necessidade de decomposição, ou seja, por via direta. Nesse estudo, a freqüência de superfície foi uma variável manipulada, caracterizando-se, dessa forma, a dominância da freqüência – masculina ou feminina; singular ou plural, nos pares flexionados. A freqüência cumulativa, ou seja, a soma da freqüência das formas masculina e feminina, no caso da flexão de gênero, e das formas singular e plural, no caso da flexão de número, foi uma variável controlada. Os resultados apresentaram um tempo de decisão menor para as formas dominantes, independente de gênero, sugerindo que formas flexionadas em gênero são representadas independentemente uma da outra e acessadas por uma via direta no léxico mental.

A representação de formas flexionadas como formas plenas seria compatível com a hipótese de que todas as palavras (formas livres) encontram-se “listadas” no léxico mental, não havendo necessidade de se postularem processos associativos ou gerativos no âmbito do léxico (Full Listing Model (Butterworth, 1983)). Entretanto, essa hipótese não tem encontrado suporte na maioria dos estudos sobre acesso lexical, cujos resultados podem ser explicados de forma mais adequada por meio de modelos de duplo-acesso – modelos que admitem o acesso lexical por uma via direta, em que a forma plena é recuperada, e por uma via analítica, que requer a decomposição da forma em seus morfemas constituintes (Caramazza, Laudanna & Romani, 1988; Taft, 1994; Schreuder & Baayen, 1995).

Os resultados relativos a formas flexionadas em gênero em espanhol levantam ainda uma série de questões interessantes para o tratamento do gênero gramatical em modelos de produção e de compreensão de enunciados verbais e no estudo da aquisição da linguagem. Palavras flexionadas em gênero seriam menos sujeitas a deslizes da fala (erros ou trocas involuntárias de unidades lingüísticas relevantes ao processamento, tal como afixos), por serem acessadas tal como raízes ou bases lexicais? Morfemas de gênero não seriam distintos, do ponto de vista da percepção e da aquisição, de vogais temáticas, a despeito de sua carga semântica? Formas flexionadas em gênero seriam adquiridas como formas com gênero intrínseco (tal como os nomes com traço [-animado] em português e espanhol)? A freqüência de uso tornaria intrínseco um traço opcional de elementos do léxico (como o de nomes flexionados)? Esses resultados também remetem a discussões de natureza descritiva, em que se considera a possibilidade de formas femininas serem decorrentes de derivação, dado que podem acarretar alteração do sentido da base, como em empregada, aventureira. Esse tipo de discussão seria relevante para um modelo do léxico mental?

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de as conclusões serem atribuídas indiscriminadamente a nomes (substantivos) e adjetivos. Nos primeiros, a flexão decorre de um processo essencialmente lexical – o morfema de gênero apresenta uma forma marcada que denota um subconjunto da classe denotada pela forma masculina não marcada – o subconjunto dos seres do sexo feminino. Nos segundos, o morfema de gênero pode ser visto como indicativo de concordância gramatical – condição que evidencia o compartilhamento de traços léxico-sintáticos de mesmo valor por elementos sintaticamente relacionados. A flexão é, nesse caso, decorrente de um processo de natureza sintática. Seria esta distinção irrelevante para um modelo do léxico mental?

Diante das questões acima levantadas, torna-se necessário verificar a generalidade das conclusões de Domingues et al.. O presente estudo teve como propósito replicar o experimento relativo a gênero do espanhol, explorando a grande semelhança entre a morfologia do gênero nas duas línguas. Diferentemente daquele estudo, contudo, a categoria gramatical a que a forma da palavra mais imediatamente remete (nome ou adjetivo) foi tomada como variável independente. Consideramos que, ainda freqüência de superfície possa ser um fator relevante para a representação/acesso de nomes femininos, o mesmo não seria esperado para a representação/acesso de adjetivos, tendo em vista a natureza sintática da flexão nesses últimos. Ainda diferentemente do estudo em espanhol, apenas nomes com traço [+ animado] foram utilizados. O estudo de Domingez et al. incluiu pares tais como fruto /fruta; jarro/jarra, cuja caracterização como pares flexionados em gênero, ainda que já tenha sido sugerida (Câmara, 1970), é polêmica. Não há evidência de que a forma feminina seja morfologicamente relacionada à masculina de um ponto de vista etimológico, nem de que os falantes da língua percebam a forma de gênero feminino como relacionada morfológica ou conceptualmente à forma masculina, dado que esta relação pode ser muito tênue, como em cano/cana (Português), caño/caña (Espanhol). É provável, pois, que tais formas sejam representadas de forma independente e é possível que a inclusão das mesmas no estudo do espanhol tenha afetado a direção dos resultados obtidos.

Apresentamos abaixo os resultados do primeiro experimento de uma série que visou a investigar o modo como nomes e adjetivos flexionados em gênero seriam representados ou recuperados no acesso lexical, a partir de dados do português (o estudo completo encontra-se em Corrêa, Almeida & Porto (a sair)).

1. EXPERIMENTO DE DECISÃO LEXICAL

Esse experimento teve como objetivo verificar se dominância de freqüência determina a velocidade do reconhecimento de nomes e adjetivos em português, como sugerido pelos dados do espanhol. Um efeito de dominância de freqüência independentemente de um efeito de gênero, com formas dominantes sendo reconhecidas mais rapidamente do que as não- dominantes, seria indicativo de que a chamada forma de superfície – a forma masculina (não marcada) e a forma feminina (marcada, pela adição do morfema de gênero –a) são representadas independentemente e que seu acesso não envolve decomposição.

As mesmas variáveis manipuladas em Dominguez et al. (1999) foram aqui manipuladas: Dominância de Freqüência em pares flexionados em gênero (Dominância Masculina (DM) e Dominância Feminina (DF)) e Gênero (Masculino e Feminino), à exceção de Categoria Gramatical (Nome (substantivo) e Adjetivo), introduzida neste estudo. Metade dos participantes foram submetidos à condição Nome e a outra metade à condição Adjetivo. O experimento teve, portanto, um design fatorial 2 (Dominância de freqüência) x 2 (Gênero) x 2 (Categoria Gramatical), sendo este último um fator grupal.

Com base nos resultados obtidos em espanhol, a previsão é de um efeito principal de Dominância de Freqüência, ou seja, as formas de superfície de freqüência dominante no par deverão ser reconhecidas mais rapidamente do que seus pares.

Com base no fato de a flexão de gênero em nomes ser de natureza estritamente lexical enquanto que a flexão de gênero em adjetivos é de natureza sintática, prevê-se interação entre

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Dominância de Freqüência e Categoria Gramatical com um possível efeito de Dominância de Freqüência restrito a nomes.

1.1.Método:

1.1.1.Participantes:

Setenta e quatro adultos (48 mulheres e 26 homens), falantes nativos de português, alunos da PUC-Rio, participaram como voluntários, constituindo dois grupos de 37 sujeitos.

1.1.2.Material:

Material lingüístico: quarenta e oito pares de palavras flexionadas em gênero: vinte e quatro nomes e vinte e quatro adjetivos distribuídos em quatro listas experimentais: duas para o grupo de nomes e duas para o grupo de adjetivos. Cada lista continha vinte e quatro palavras-alvo: doze masculinas – seis DM (palavras masculinas dominantes no par) e seis DF (palavras masculinas não dominantes no par); doze femininas – seis DF (palavras femininas dominantes no par) e seis DM (palavras femininas não dominantes no par). Apenas um membro cada par flexionado em gênero foi incluído em cada lista, de modo que cada participante foi exposto a apenas um elemento do par flexionado. As palavras foram extraídas de duas bases de dados: uma base de dados de 1.129.365 palavras identificadas em jornais no período de um mês e uma base de dados de língua oral, extraída do projeto NURC (Duarte, 1996), formando um total de cerca de 1 milhão e meio de palavras. Os nomes e adjetivos foram classificados inicialmente em função do contexto de ocorrência. Estes foram posteriormente submetidos, como palavras isoladas, à classificação, por cem falantes nativos de português escolarizados (alunos de graduação ou pós-graduação ou profissionais de nível superior). Apenas as palavras cuja classificação como nome ou adjetivo correspondeu à classificação inicial nas respostas de pelo menos 90% dos sujeitos foram incluídas no material de teste. 114 pares de nomes e 96 pares de adjetivos cuja diferença entre a freqüência das formas do par foi igual ou superior a três em um milhão foram pré-selecionados. Os pares pré-selecionados foram submetidos a quatro grupos de setenta e cinco falantes nativos para que estes julgassem qual das formas era a mais freqüente no uso da língua. No caso de nomes, o julgamento subjetivo correspondeu à dominância relativa identificada na base de dados em 83% dos casos. Apenas estes pares foram incluídos. No caso de adjetivos, esse julgamento coincidiu com a dominância real em apenas 5,21% dos pares, dado que a forma masculina foi considerada a mais freqüente na maioria dos casos. Por esta razão, as listas de adjetivos tiveram de ser baseadas predominantemente na freqüência real, independentemente do julgamento dos falantes. Tanto a freqüência de superfície quanto a freqüência cumulativa dos nomes e dos adjetivos foram controladas. O número médio de sílabas por condição também foi controlado e a o número de palavras morfologicamente complexas foi contrabalançado. 50 pseudo-palavras foram incluídas em cada lista, sendo estas morfologicamente compatíveis com a classificação como nomes ou como adjetivos. As pseudo-palavras foram distribuídas nas listas de nomes e de adjetivos. Uma lista de sete palavras e oito pseudo-palavras foi criada para treinamento. Equipamento: Um computador PC AMD Athlon 900Mhz com monitor super VGA de 15 polegadas e uma caixa de botões, com dois botões identificados com V ou F para indicação da decisão do falante quanto à palavra pertencer ou não à língua.

O quadro 1 apresenta as palavras-teste por listas e condições experimentais. Os números entre parênteses indicam a freqüência de superfície da forma em questão.

Quadro 1

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1.1.3.Procedimento:

Os participantes foram instruídos oralmente e por meio de informação apresentada no monitor situado numa cabine acústica do LAPAL (Laboratório de Psicolingüística e Aquisição da Linguagem da PUC-Rio), onde o experimento foi conduzido. Cada participante foi apresentado a uma lista escolhida aleatoriamente por meio de um programa em linguagem EXPE6 (Pallier, Dupoux & Jeannin, 1997), com a qual o experimento foi criado. Cada uma das palavras da lista era apresentada no centro da tela do monitor após a apresentação de 5 asteriscos durante 500 mseg.. A palavra permanecia na tela até o participante apertar um dos dois botões de uma caixa conectada ao computador para registro do tempo de resposta. Na ausência de resposta por 300 mseg, o estímulo desaparecia da tela, reiniciando-se uma seqüência de asteriscos seguida de um estímulo lingüístico. Após cada julgamento, um intervalo de 100 mseg precedia o próximo estímulo.

1.2. RESULTADOS E DISCUSSÃO:

Os tempos de julgamento formam submetidos a uma ANOVA por sujeitos e a outra por itens. Masculinos DM: aluno (253), curandeiro (4), fotógrafo (14), garoto (128), pato (53), urso (21).

Masculinos DF: bruxo (1), cozinheiro (9), dono (23), enfermeiro (4), moço (66), sogro (36).

Femininos DM: cenógrafa (0), funcionária (37), pomba (5), prima (12), proprietária (12), rata (0). Femininos DF: costureira (25), datilógrafa (5), empregada (127), esposa (30), noiva (76), viúva (16).

Lista 2: Nomes

Masculinos DM: cenógrafo (5), funcionário (193), pombo (19), primo (80), proprietário (27), rato (28). Masculinos DF: costureiro (16), datilógrafo (1), empregado (141), esposo (0), noivo (8), viúvo (11). Femininos DM: aluna (74), curandeira (0), fotógrafa (0), garota (96), pata (14), ursa (- 6).

Femininos DF: bruxa (3), cozinheira (18), dona (200), enfermeira (12), moça (217), sogra (37).

Lista 3: Adjetivos

Masculinos DM: bonito (38), esportivo (46), estranho (44), famoso (38), interno (71), positivo (56). Masculinos DF: absoluto (22), amplo (30), elétrico (30), falso (21), profundo (21), sagrado (23). Femininos DM: belo (82), cheio (55), curto (66), diverso (70), moderno (74), religioso (60). Femininos DF: aberto (91), antigo (98), básico (57), científico (45), externo (48), frio (35).

Lista 4: Adjetivos

Masculinos DM: bela (55), cheia (47), curta (44), diversa (66), moderna (69), religiosa (49). Masculinos DF: aberto (113), antigo (106), básico (63), científico (52), externo (64), frio (76). Femininos DM: bonita (33), esportiva (30), estranha (- 33), famosa (33), interna (30), positiva (34) Femininos DF: absoluta (30), ampla (43), elétrica (59), falsa (24), profunda (36), sagrada (34).

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Um efeito significativo de Categoria Gramatical foi obtido em ambas as análises F1(2,72) = 13.40 p<.001 (778.3 mseg para Nomes e 655.16 mseg para Adjetivos);F2(2,10) = 25.01 p<.001 (774.26 mseg para Nomes and 655.16 para Adjetivos). O efeito da interação entre Gênero e Categoria Gramatical aproximou-se do nível de significância na análise por sujeitos F1(2,72) = 3.09 p<.08), e foi significativo na análise por itens F2(2,10) = 6.29 p=.03 (757.61 mseg para Nomes masculinos; 790.92 mseg para Nomes femininos; 659.91 mseg para Adj. Masculinos e 651.41mseg para Adj. Femininos.). Um efeito significativo da interação Dominância de Freqüência e Categoria Gramatical também foi obtido em ambas as análises: F1(2,72) = 10.07 p<.01 (799.62 mseg para Nomes no par DM; 756.96mseg para Nomes no par FD; 646.6 mseg para Adjetivos no par DM e 663.6 mseg para Adjetivos no para DF); F2(2,10) = 7.96 p<.02. (794.08 mseg para Nomes no par DM; 754.62 mseg para Nomes no par DF; 646.55mseg para Adjetivos no par MD; 663.76 mseg para adjetivos no par FD). A Tabela 1 apresenta as médias da análise por sujeitos. O número de erros foi 1.94 (max escore=24), o que demonstra que as decisões lexicais foram precisas.

Os presentes resultados não sustentam a hipótese da dominância de freqüência sugerida pelos dados do espanhol. É possível que diferenças no material de teste, com inclusão de nomes com traço [-animado] em pares, cujos elementos não são morfologicamente relacionados, tenha favorecido o efeito de Dominância de freqüência obtido em Dominguez et al. (1999). Os efeitos gerados por Categoria Gramatical no presente estudo indicam que este fator, ou o tipo de processo flexional envolvido (lexical ou sintático), afeta o modo como palavras flexionadas em gênero são representadas e acessadas. O menor tempo de resposta para adjetivos em comparação a nomes pode indicar que a informação relativa a gênero não é computada nesses últimos. Observa-se na Tabela 1 que palavras dos pares DM levaram mais tempo para serem reconhecidas do que palavras dos pares DF, enquanto que uma tendência na direção oposta pode ser notada entre adjetivos, sendo que essas diferenças são particularmente manifestas nas palavras femininas. Esses resultados são compatíveis com a visão de que nomes femininos têm mais chance de adquirirem uma representação autônoma devido a nuances de sentido que possam assumir. No caso de adjetivos, a direção das médias parece indicar que a forma masculina não marcada guia o acesso lexical, o que é compatível com o julgamento subjetivo de dominância de freqüência na preparação do material do teste. Quanto ao efeito de Dominância Feminina no reconhecimento de nomes independentemente do gênero, não é claro como uma representação independente da forma flexionada (feminina) poderia afetar a rapidez de acesso à sua contraparte masculina. Os modelos correntes de acesso lexical teriam dificuldade de dar conta desse resultado. Tendo em vista que esse direcionamento envolveria uma interação (3-way)

Table 1

Médias do tempo de decisão (mseg) para palavras flexinadas em gênero em função de categoria gramatical, dominância de freqüência e gênero (n = 74)

Categoria Gramatical

Nome Adjetivo

Dominância de freqüência no par

DM DF DM DF Média Total

Gênero

Masc. 777.75 746.91 656.10 661.71 710.62

Fem. 821.50 767.04 637.00 665.81 722.84

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que não foi significativa, não é claro o quanto essa tendência é indicativa de um modo de representação lexical. Esse ponto foi explorado em experimentos subseqüentes (ver Corrêa, Almeida e Porto, a sair).

A principal evidência trazida pelos presentes resultados é de que o acesso a nomes e adjetivos flexionados em gênero não pode ser tomado como um mesmo processo. Os efeitos aqui obtidos apontam para a relevância do conceito de interpretabilidade, tal como caracterizado no programa minimalista (Chomsky, 1995), para modelos do léxico mental. O fato de, nessa perspectiva, o traço lexical de gênero ser interpretável no nome e não interpretável nos elementos que com ele concordam é compatível com a possibilidade de o falante/ouvinte representar e recuperar diferentemente nomes e adjetivos e de a informação relativa a gênero não ser relevante no reconhecimento desses últimos.

CONCLUSÃO:

O estudo do acesso a palavras flexionadas em gênero em Português não sustenta a idéia de estas sejam representadas como formas plenas e que seu acesso dispense decomposição. É possível, no entanto, que formas femininas de freqüência dominante em pares flexionados venham a admitir uma via direta de acesso. Modelos de duplo acesso (Caramazza, Laudanna & Romani, 1988; Taft, 1994; Schreuder & Baayen, 1995) fariam prever tais resultados. O que os modelos correntes não explicariam é o acesso diferenciado a nomes e adjetivos flexionados em gênero. É necessário, pois, que uma propriedade tal como interpretabilidade de traços do léxico (com suas implicações para a sintaxe e para a interpretação nas interfaces da língua com sistemas de desempenho) seja levada em conta em uma teoria do léxico mental.

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BIBLIOGRAFIA

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Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) / LAPAL (Laboratório de Psicolingüística e Aquisição da Linguagem - PUC-Rio)

Referências

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