Intensificação sustentável da
agricultura portuguesa
José Lima Santos
Instituto Superior de Agronomia Universidade de Lisboa
Escassez de terra, segurança alimentar e o
dilema da intensificação
Se o problema for:
“Como obter alimentação suficiente
para 9-10 mil milhões em 2050 …
… sem a perda de biodiversidade e as emissões de CO2 resultantes da simples
expansão de terra cultivada?”
A solução apontará para algum tipo de
intensificação, quer dizer: aumento da produção por hectare.
Wheat Yields in France, Germany, and the United Kingdom, 1961-2011 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: FAO, USDA
T o n s P e r H e ct a r e France Germany United Kingdom E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
Escassez de terra, segurança alimentar e o
dilema da intensificação
• A intensificação, baseada em inputs, do passado realmente poupou terra para a natureza e os processos
ecológicos,
• … mas à custa de um uso cada vez mais ineficiente dos inputs e de perdas excessivas de inputs, que ampliaram …
• … as emissões poluentes (nitratos, GEE, pesticidas …), e
• a perda de recursos (água, solo,
biodiversidade, energia e múltiplos serviços de ecossistemas).
World Fertilizer Consumption, 1950-2011
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: Worldwatch, IFA
M il li o n T o n s E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
World Grain Production Per Ton of Fertilizer, 1961-2011
0 5 10 15 20 25 30 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: IFA, USDA
T o n s E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
Modelo químico-mecânico: inovação
endógena e papel do mercado
Produto/ hora trabalho = Produto / hectare x hectares / hora trabalho
«The Japanese agricultural system, with intensive applications of labor and
fertilizers on mini-sized paddy fields, is not necessarily inefficient, but represents a rational economic response to the unfavorable endowment of land relative to
labor.
… there are multiple paths of technological development in agriculture. » (Hayami) Modelo de inovação endógena e induzida pelo preço relativo (escassez relativa)
dos fatores de produção
Hayami Y & Ruttan V W. Agricultural development: an international perspective. Baltimore, MD: Johns Hopkins Press, 1971. 367 p.
Modelo químico-mecânico: impasses
• Passivo ambiental, que é necessário corrigir • Limites ao melhoramento genético das plantas
• limites na resposta das plantas aos fertilizantes e pesticidas
• Esgotamento de recursos hídricos e redução nas disponibilidades de
água para rega
• Impacte das alterações climáticas na produtividade das culturas
agrícolas e nos recursos hídricos
• Dependência de energia fóssil e vulnerabilidade face aos preços da
Current status of the control variables for seven of the planetary boundaries. The green zone is the safe operating space, the yellow represents the zone of uncertainty (increasing risk), and the
red is a high-risk zone.
Will Steffen et al. Science 2015;347:1259855
8
Wheat Yields in France, Germany, and the United Kingdom, 1961-2011 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: FAO, USDA
T o n s P e r H e ct a r e France Germany United Kingdom E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
9
Rice Yields in China and Japan, 1960-2011
0 1 2 3 4 5 6 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020 Source: USDA T o n s p e r H e ct a r e E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g Japan China
10
World Fertilizer Consumption, 1950-2011
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 200 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: Worldwatch, IFA
M il li o n T o n s E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
11
Fertilizer Consumption in Top Five Countries, 1961-2011
0 10 20 30 40 50 60 1961 1971 1981 1991 2001 2011 2021 Source: IFA M il li o n T o n s E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g China India United States Brazil Indonesia
12
World Grain Production Per Ton of Fertilizer, 1961-2011
0 5 10 15 20 25 30 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: IFA, USDA
T o n s E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
13
Grain Production Per Ton of Fertilizer in the United States, China, and India, 1961-2011
0 20 40 60 80 100 120 140 160 180 1960 1970 1980 1990 2000 2010 2020
Source: IFA, USDA
T o n s United States China India E a r t h P o li c y I n s t it u t e -w w w . e a r t h -p o li c y . o r g
Stocks globais de cereais pré-colheita: impasse
na capacidade produtiva?
Intensificação sustentável
Daí a necessidade de mudança de
modelo tecnológico que nos afaste da intensificação baseada em inputs, mas mantendo o lado bom da
intensificação: mais produção por hectare.
• Por duas vias:
• Uso de inputs mais dirigido, preciso e eficiente – intensificação baseada nas
tecnologias da informação, deteção
remota, SIGs, etc.;
• Redesenho dos agroecossistemas para substituir inputs industriais por
processos ecológicos – intensificação baseada em conhecimento ecológico.
Intensificação sustentável – segurança alimentar a
partir de agroecossistemas eficientes e resilientes
A terra está a ficar mais escassa.
A energia e outros inputs estão também a ficar mais escassos logo mais caros.
Os agricultores estão, por isso, a reduzir o uso de inputs. Será já isto um indicador de intensificação sustentável?
… ou apenas o recuo da intensificação com base em inputs?
A intensificação de base ecológica depende de uma provisão reforçada e
resiliente de serviços de polinização, controlo biótico de pragas e doenças, fertilidade do solo e outros serviços de ecossistemas,
… todos estes requerem ecossistemas saudáveis, investimento em capital
natural (ex: matéria orgânica do solo)
… para reduzir a nossa atual dependência de inputs industriais, ricos em
A intensificação de base ecológica requer portanto:
• Proteger serviços dos ecossistemas com valor para a agricultura (e.g. polinização; controlo biótico de pragas, fertilidade do solo)
• Inovação tecnológica baseada em conhecimento agro-ecológico.
Como a luz de um farol (e ao contrário de tecnologia de precisão patenteável, tal como equipamento de rega gota-a-gota, OGM ou
agricultura de precisão) o conhecimento ecológico é, em grande medida,
um bem público (não excluível, nem facilmente patenteável).
Por isso, não é atrativo para investimento privado na investigação.
Uma forte prioridade das políticas de investigação nesta área é portanto essencial para desenvolver o conhecimento eco-agrícola relevante.
Necessidade de mudar as prioridades de
investigação para adquirir o tipo de conhecimento
requerido pela intensificação de base ecológica
Transição para uma agricultura mais sustentável
requer:
• Controlo da desertificação e adaptação às alterações climáticas; • Diminuição da impermeabilização de solos por expansão urbana; • Proteger serviços de ecossistemas relevantes para a agricultura; • Reduzir a dependência dos agro-ecossistemas relativamente a
combustíveis fósseis substituindo inputs industriais por serviços de ecossistemas;
• Reduzir as emissões de GEE pela agricultura e alimentação; • Aumentar a eficiência no uso da água;
3 falhas de mercado na transição para um modelo
sustentável de produção e consumo de alimentos:
necessidade de políticas públicas
• Caráter de bem público de grande parte do conhecimento agro-ecológico -> requer políticas públicas de investigação direcionadas para o apoio ao
avanço da ciência agro-ecológica
• Não remuneração pelo mercado da maior parte dos serviços dos
ecossistemas -> requer políticas públicas de proteção dos ecossistemas ou de incentivo económico a esses mesmos serviços (subsídios, taxas, preço da água, etc.)
• Preços de mercado dos alimentos cegos à pegada ecológica dos mesmos -> a utilização de incentivos económicos em matéria de serviços de
A nível nacional (Portugal):
O uso da terra pela agricultura desempenha múltiplas funções no desenvolvimento sustentável:
• produção de alimentos e equilíbrio da balança
comercial,
• conservação da biodiversidade e serviços de
ecossistemas,
• emprego e desenvolvimento rural.
O cabaz de funções depende muito dos sistemas de produção agrícola e da sua localização.
Função de produção de alimentos
• Concentração espacial da produção agrícola em Portugal
• Concentração da produção em alguns sistemas de produção: os mais intensivos
• A resultante: diferentes graus de
auto-aprovisionamento alimentar nos diversos sectores • Pontos fortes: usa menos solo, deixando mais
para os sistemas naturais; é presentemente mais competitiva; produz mais alimentos
• Pontos fracos da agricultura intensiva:
dependência da disponibilidade de energia
Concentração espacial da
produção agrícola em Portugal
Laranja:
VP/SAU > 2 000 Euro/ha (mto intensivo) VP = 20% SAU = 5%
Laranja + amarelo:
VP/SAU > 1 000 Euro/ha (intensivo)
VP = 45% SAU = 20%
Verde:
VP/SAU < 1 000 Euro/ha (extensivo)
Concentração da produção por sistemas de produção
Sistemas mais intensivos (VP/SAU > 2000 Euro/ha)
• Bovinos de Leite + Horticultura + Vinha + bovinos/intensivo; • 37% da produção agrícola nacional
• 10% da SAU.
Sist. intensivos + média intensidade (VP/SAU > 1000 Euro/ha)
• Sist acima + Batata + Fruticultura + Arroz + cereais reg. (milho); • 44% da produção agrícola nacional
• 15% da SAU
Sistemas extensivos (VP/SAU < 1000 Euro/ha)
• Bovinos/extensivo + ovinos + olival + cereais seq. + Policultura; • 56% da produção agrícola nacional
Grau de auto-aprovisionamento em diversos produtos agrícolas
Produto
% do consumo coberto por produção nacional
(2006-2008) Trigo 11,5 Arroz 53,0 Milho 29,2 Batata 59,0 Tomate 612,8 Outros hortícolas 81,5 Frutos 74,6 Azeite 57,6 Vinho e derivados 114,8 Carne de bovino 52,2
Carne de ovino e caprino 79,8
Carne de suíno 51,3
Carne de aves 93,0
Leite 106,8
Ovos 100,1
Pontos fracos da produção intensiva
-
Dependência do regadio / alterações climáticas- Dependência de inputs energéticos / preço da energia e suas consequência na utilização de inputs
Evolução dos preços (IPI) dos Consumos Intermédios, Energia e Fertilizantes (agricultura portuguesa)
Fonte:INE, Contas Económicas Nacionais,
http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid= cn_quadros&boui=95392496
Evolução em Volume dos CI, Energia e fertilizantes na agricultura portuguesa
Fonte:INE, Contas Económicas Nacionais,
http://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid= cn_quadros&boui=95392496
Função de gestão das terras, serviços dos
ecossistemas e conservação da biodiversidade
• Localização da agricultura extensiva
– Fracção do território ocupada por explorações agrícolas • Benefícios ambientais da agricultura extensiva:
– Biodiversidade e paisagem – redução do risco de incêndio
Localização da agricultura extensiva em
Portugal
Localização da agricultura extensiva em Portugal
Verde: (extensivo)
VP/SAU < 1 000 Euro/ha VP = 55% SAU = 80%
Benefícios ambientais da agricultura
extensiva:
• Rotações e usos mais diversificados do solo; • Agricultura biológica;
• Agricultura e conservação da natureza e da
biodiversidade (o exemplo da Rede Natura 2000; • Agricultura e prevenção do risco de incêndios florestais
• Menor consumo de água, fertilizantes e energia
• Menores impactos ambientais (nitratos, pesticidas, gases com efeitos de estufa (?))
45
Agricultura extensiva e conservação da biodiversidade High Nature Value farmland
Intensity of agriculture Biodiv er sity HNV farmland Intensive farmland Fonte: EEA (2004: 5)
Sítios da Rede Natura 2000 em Portugal
Verde:
Biodiversidade associada a sistemas agrícolas e agro-florestais
Vermelho:
Biodiversidade essencialmente não associada a sistemas agrícolas e agro-florestais
O abandono de superfície agrícola, suas
causas e consequências
Carta de risco de
incêndios florestais
Dinâmicas no uso extensivo de terras
agrícolas
(dependência de mudanças nos apoios da PAC; ex. reforma da PAC de 2003)