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Direito Do Trabalho II - Romano Martinez

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Academic year: 2021

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Índice

Contrato de Trabalho ... 4

VIII – Não Cumprimento ... 4

Incumprimento das prestações contratuais ... 4

Prescrição ... 17

IX – Acidentes de Trabalho ... 19

Aspetos gerais ... 19

Responsabilidade civil objetiva e subjetiva ... 22

X – Cessação ... 50 Aspetos gerais ... 50 Caducidade... 57 Revogação ... 72 Denúncia ... 77 Resolução ... 80 Direito Coletivo ... 120

I – Instrumentos negociais de regulamentação coletiva de trabalho... 120

Convenção coletiva de trabalho ... 120

Acordo de adesão ... 134

II – Instrumentos não negociais de regulamentação coletiva de trabalho ... 135

Aspetos gerais ... 135

Portaria de extensão ... 136

Portaria de condições de trabalho ... 138

Natureza jurídica das portarias de extensão e de condições de trabalho ... 139

III - Conflitos coletivos de trabalho ... 141

Aspetos gerais ... 141

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Não dispensa a consulta dos

manuais

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Contrato de Trabalho

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VIII – Não Cumprimento

Incumprimento das prestações contratuais:

1. Noções comuns: como em qualquer contrato, uma das partes pode não realizar a

prestação a que se encontra adstrita, nos termos devidos, havendo, então, incumprimento numa das suas modalidades. O incumprimento definitivo, a mora e o cumprimento defeituoso das prestações laborais seguem o regime regra dos artigos 798.º e seguintes CC, solução reiterada no artigo 323.º, n.º1 CT. Não obstante valer no regime regra, há toda a conveniência em fazer a transposição do mesmo para o domínio do contrato de trabalho, até porque, por vezes, há certas especificidades e surgem dúvidas de qualificação. O contrato de trabalho, tendo em conta a sua estrutura complexa, com facilidade se apresenta como exemplo paradigmático em que a tripartição das formas de incumprimento se concretiza. Encontram-se, assim, situações de incumprimento definitivo, de mora na execução e de cumprimento defeituoso da prestação. Importa salientar que, em qualquer destes casos, vale o princípio geral da presunção de culpa, vigente no domínio da responsabilidade contratual (artigo 799.º CC). Qualquer incumprimento de deveres emergentes do contrato de trabalho, por parte do trabalhador ou do empregador, presume-se culposo. O artigo 323.º, n.º1 CT, como princípio geral do incumprimento do contrato de trabalho, dispõe que a parte que faltar culposamente ao cumprimento dos seus deveres é responsável pelo prejuízo causado à contraparte. Este artigo estabelece a matriz base relativa ao incumprimento do contrato de trabalho. Este artigo corresponde, portanto, a um mero esclarecimento no sentido que valem as regras gerais do Direito das Obrigações (artigos 798.º e seguintes CC). Reitera-se, assim, um princípio geral, esclarecendo dúvidas que se poderiam suscitar. Por outro lado, do artigo 323.º, n.º1 CT sobressai a natureza sinalagmática do contrato de trabalho. Cabe ainda acrescentar que da receção explícita do texto do artigo 798.º CC – parcialmente transcrito no artigo 323.º, n.º1 CT – resulta a aplicação do regime comum de incumprimento dos contratos em geral, constante dos artigos 798.º e seguintes CC, designadamente da presunção de culpa (artigo 799.º, n.º1 CC). 2. Incumprimento definitivo e mora imputáveis ao empregador:

a. Indemnização: sempre que o empregador não cumpra atempadamente as

suas prestações, podendo estas realizar-se mais tarde, haverá mora. A situação mais comum verificar-se-á com respeito ao pagamento da retribuição. Não sendo esta paga na data do vencimento, o empregador constitui-se em mora; em tal caso, a mora pressupõe o pagamento de juros compensatórios (artigos 806.º e 559.º CC). Além do regime geral, em que o empregador, por faltar culposamente ao cumprimento dos seus deveres, será responsável pelo prejuízo causado ao trabalhador (artigos 323.º, n.º1 e 2 CT), importa atender em especial à falta culposa de cumprimento das prestações pecuniárias, concretamente da prestação retributiva. Se o empregador não

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realiza a prestação no seu vencimento, há uma situação de incumprimento e presume-se que a omissão do comportamento devido é culposa. Apesar de a falta de pagamento da retribuição corresponder à situação mais usual de mora, esta não se circunscreve a tal hipótese, pois abrange todas as prestações pecuniárias, nomeadamente o pagamento de indemnizações. Como resulta do artigo 323.º, n.º2 CT, a mora no pagamento da retribuição determina o vencimento de juros de mora. Também o disposto neste preceito não constitui uma novidade mas a solução que antes resultaria do artigo 806.º CC (por vezes esquecida em tribunal). Do n.º1 do artigo decorre que, estando o empregador em mora quanto ao pagamento de prestações pecuniárias, por via de regra, sobre o valor da retribuição, a partir da data do vencimento da prestação, passam a vencer-se juros de mora. Os juros de mora, não havendo acordo em contrário, são fixados à taxa supletiva legal, ascendendo, presentemente, à taxa de 4% ao ano (Portaria n.º 291/2003, 8 abril). O ajuste de juros de mora convencionais está condicionado aos limites decorrentes do artigo 1146.º ex vi artigo 559.º-A CC. Sem descurar os juros de mora, que correspondem a uma indemnização previamente fixada pela lei, o empregador inadimplente deverá indemnizar o trabalhador pelos prejuízos causados pelo incumprimento de deveres contratuais (artigo 323.º, n.º1 CT). A indemnização será determinada pelas regras gerais de Direito Civil, em particular atendendo ao regime constante dos artigos 562.º e seguintes CC. A indemnização devida ao trabalhador em caso de incumprimento definitivo de deveres do empregador sofre de uma limitação relativamente às regras gerais. A determinação do montante indemnizatório pode não seguir exatamente os parâmetros dos artigos 562.º e seguintes CC sempre que encontra aplicação o disposto no artigo 391.º CT. Neste preceito, por um motivo de certeza, fixa-se a indemnização a atribuir ao trabalhador atendendo a um cálculo assente na retribuição de base, sem ter, portanto, em vista a reconstituição da situação que existiria (artigo 562.º CC), na qual se poderiam incluir outros valores.

b. Exceção de não cumprimento: a mora do empregador no pagamento da

retribuição não facultaria ao trabalhador o recurso à exceptio non adimpleti

contractus, podendo este suspender a execução da prestação de trabalho (artigo

428.º CC). O facto de o trabalhador ter de cumprir em primeiro lugar, antes de receber a retribuição, não constitui obstáculo a que se invoque a exceção de não cumprimento para o período seguinte àquele em que não foi remunerado; esta solução não resulta diretamente do artigo 429.º CC, mas decorre do regime geral da exceção, quando aplicado a contratos de execução continuada. Assim, se o trabalhador, depois de desenvolver a sua atividade durante um mês, não auferiu a respetiva retribuição, os princípios gerais levariam a admitir que ele poderia licitamente recusar-se a trabalhar no mês seguinte. O caráter sinalagmático das prestações laborais não opera só em cada mês ou semana, consoante o tipo de remuneração. Esta é uma visão parcelar que não parece correta. A relação laboral corresponde a um todo e não a um mero somatório de dias, semanas ou meses de trabalho. Resta referir que, em qualquer outro contrato de prestação de serviços, estando ou não em causa a prossecução de um resultado, mesmo quando a retribuição seja paga mensalmente depois de realizada a atividade, sendo o contrato de

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execução continuada, o prestador de serviços pode, ainda assim, recorrer à exceção de não cumprimento. Em caso de mora, no n.º3 do artigo 323.º CT (assim como no artigo 209.º, n.º3 CT) prescreve-se um regime especial de exceção de não cumprimento. Havendo mora do empregador – e atendendo ao caráter sinalagmático do contrato –, o trabalhador pode suspender a execução da atividade, recorrendo ao instituto da exceção de não cumprimento, previsto nos artigos 428.º e seguintes CC. Mas a suspensão da atividade, tendo em conta a dinâmica empresarial, não poderia operar imediatamente, motivo pelo qual o trabalhador deve aguardar quinze dias para suspender o contrato de trabalho (artigo 325.º, n.º1 CT). Trata-se de um prazo razoável para permitir à empresa com retribuições em atraso regularizar – purgando a mora – antes de os trabalhadores suspenderem a atividade, paralisando a empresa. É necessário reiterar que a mora, nos termos gerais, pressupõe um comportamento culposo para que o empregador se constitua na obrigação de pagar juros de mora (artigo 323.º, n.º2 CT), mas, de modo diverso, não é necessário um comportamento culposo do empregador para que o trabalhador possa recorrer à exceção de não cumprimento. Esta solução – constante do artigo 323.º, n.º3 CT – resulta da aplicação das regras gerais de Direito das Obrigações, pois o exercício da exceção de não cumprimento não pressupõe culpa do devedor faltoso (artigo 428.º CC). Não obstante, o direito pode ser exercido pelo trabalhador sem ter havido um comportamento culposo do empregador, não parece lícito que a exceção seja invocada perante qualquer incumprimento, principalmente quando a falta de pagamento respeita a uma parte reduzida da retribuição. O regime da exceção de não cumprimento no âmbito laboral – designada por suspensão do contrato de trabalho – consta dos artigos 325.º, 326.º e 327.º CT. O trabalhador pode suspender a atividade, cumprindo as formalidades impostas no artigo 325.º CT. Do artigo 295.º, n.º1 CT, resulta que o contrato suspenso subsiste, mantendo-se direitos e deveres das partes que não pressuponham a efetiva prestação de trabalho. Na medida em que, durante a suspensão o trabalhador não desempenha a atividade nem recebe a correspondente retribuição, no artigo 325.º CT e no artigo 25.º Lei n.º 105/2009, 25 setembro, atribui-se ao credor (trabalhador) direito à prestação de desemprego. Refira-se ainda que, durante a suspensão, o trabalhador pode desempenhar outra atividade retribuída (artigo 326.º CT). A suspensão do contrato será necessariamente transitória e cessa pelo retorno à atividade (artigo 327.º CT) ou com a cessação do vínculo contratual. Recapitulando, o trabalhador que não recebeu a retribuição na data do vencimento pode suspender a execução da sua atividade, recorrendo à exceção de não cumprimento do contrato. A referida suspensão não pode operar imediatamente após a falta de pagamento, pelos motivos já indicados, devendo o trabalhador aguardar quinze dias. Trata-se de um prazo razoável, atentos os interesses em confronto, para que a empresa regularize a sua situação financeira, pagando a retribuição ao trabalhador. Refira-se, ainda, que a remissão para legislação especial se justifica, em particular, pela necessidade de garantir, ao trabalhador que invoca a exceção, o pagamento de subsídio idêntico ao de desemprego; o direito à prestação de desemprego

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a mora depender de culpa para o empregador se constituir no dever de pagar juros de mora (n.º1), mas não se requer um comportamento culposo para o trabalhador suspender a prestação de trabalho ou resolver o contrato (n.º2). De facto, nem a resolução do contrato depende sempre de culpa do empregador (artigo 394.º, n.º3 CT) nem a exceção de não cumprimento pressupõe falta de cumprimento culposo da parte que, por não afetar a sua prestação, permite que a contraparte recorra à exceptio (artigo 428.º CT). No n.º3 do artigo 323.º CT cabe distinguir a exceção de não cumprimento da resolução do contrato. O trabalhador que não recebeu a retribuição na data do vencimento pode suspender a execução da sua atividade, recorrendo à exceção de não cumprimento do contrato. A referida suspensão não pode operar imediatamente após a falta de pagamento, pelos motivos indicados no ponto anterior, devendo o trabalhador aguardar 15 dias. Mas para invocar a resolução do contrato, que não depende de culpa do empregador (artigo 394.º, n.º3 CT), o prazo é de sessenta dias nos termos do n.º5 do artigo 394.º CT.

c. Garantias: relativamente à falta de pagamento de prestações pecuniárias –

tanto a retribuição como outras prestações –, haverá mora com a consequente obrigação de pagar juros moratórios nos termos já indicados, mas como garantia importa atender ao regime constante dos artigos 333.º e seguintes CT. Na sequência do regime anterior, subsistem como garantias do trabalhador:

i. Os privilégios creditórios (artigo 333.º CT);

ii. Fundo de Garantia Social (artigo 336.º CT).

Como novidade introduzida em 2003, cabe atender a duas soluções:

iii. A responsabilidade solidária das sociedades em relação de domínio ou de grupo (artigo 334.º CT);

iv. A responsabilidade dos sócios (artigo 335.º CT).

Quanto aos meios de autotutela de créditos, estando admitida a exceção de não cumprimento (artigos 294.º, n.º3 CT e 323.º, n.º3 CT), estabelece-se solução oposta com respeito ao direito de retenção. O trabalhador a quem tenham sido fornecidos instrumentos de trabalho e quaisquer outros objetos que sejam pertença do empregador não goza, nos termos do artigo 754.º CC, do direito de retenção dessas coisas por conta de crédito contra a entidade patronal. Do disposto no artigo 342.º CT deduz-se que a falta do empregador (discutível ou mesmo por ele reconhecida) de pagamento de quaisquer quantias pagas ao trabalhador – mesmo tratando-se da retribuição –, em princípio, não confere a este direito de retenção sobre os instrumentos de trabalho ou outros objetos que sejam pertença daquele. A inexistência do direito de retenção resulta de três razões:

i. Esta garantia real, conferindo uma situação de privilégio a certos credores, constitui uma limitação que deve ser entendida de modo restritivo;

ii. Tendo em conta a previsão geral do artigo 754.º CC, para haver direito de retenção será necessário que o crédito do trabalhador resulte de despesas feitas por causa desses objetos do empregador ou de danos por ele causados.

Por via de regra, os montantes que o empregador tem a pagar ao trabalhador aquando da cessação do contrato não se relacionam com essas duas hipóteses;

iii. Entre as situações especiais de direito de retenção (artigo 755.º CC) não se inclui o trabalhador no elenco de credores privilegiados. Acresce que o artigo 342.º

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CT determina a devolução de instrumentos de trabalho, obrigação não condicionada ao pagamento da retribuição ou de outras prestações a cargo do empregador.

Outros mecanismos de autotutela do crédito do trabalhador – como a compensação – seguem o regime geral.

d. Benefícios conferidos ao trabalhador: como pode ser problemática a

situação económica do trabalhador a quem não é paga a retribuição, além dos mecanismos jurídicos, são-lhe conferidos certos benefícios:

i. Suspendem-se os processos de execução fiscal (artigo 26.º Lei n.º 105/2009);

ii. Suspendem-se igualmente a venda de determinados bens penhorados ao trabalhador (artigo 27.º da mesma Lei);

iii. Suspende-se a ação de despejo que lhe tenha sido movida (artigo 28.º da mesma

Lei).

Em qualquer caso, não se “transfere” o risco do incumprimento da retribuição para terceiros – credores do trabalhador –, mas estes veem limitados os meios judiciais para efetivarem os seus direitos. Para a aplicação deste regime basta que exista mora no pagamento de retribuições por período superior a quinze dias, não sendo necessária a declaração de insolvência do trabalhador, a que alude o artigo 113.º CIRE. Tal como foi referido, este regime só se aplicará caso o empregador esteja em mora quanto ao pagamento da retribuição – não de outras prestações patrimoniais sem caráter retributivo –, e desde que o valor em causa seja relevante. De facto, com base nas regras da boa fé, será desproporcionado o exercício de um destes direitos se estiver em causa a falta de pagamento de uma parte irrisória da retribuição. Tal desproporção contraria a boa fé e o fim social e económico do direito, podendo integrar a figura do abuso do direito (artigo 334.º CC).

e. Consequências para o empregador: o empregador que não paga a

retribuição aos seus trabalhadores sujeita-se à inibição da prática dos atos indicados no artigo 313.º CT, por remissão do artigo 324.º, n.º1 CT, podendo incorrer em pena de prisão (artigo 324.º, n.º3 CT). Havendo mora no pagamento da retribuição, independentemente do prazo por que esta tenha durado, o empregador não pode realizar certas despesas nem contrair dívidas, porque podem agravar a situação patrimonial da empresa. Por outro lado, atendendo à mora no pagamento de retribuições, podem ser invalidados os atos praticados pelo empregador que se encontram no elenco do artigo 313.º CT, segundo o disposto nos artigos 324.º, n.º1 e 2 CT. Do artigo 324.º, n.º2 CT depreende-se que o legislador não atendeu à figura da impugnação pauliana (artigos 610.º e seguintes CC). Contrariamente ao disposto no artigo 612.º CC, na hipótese de retribuições em atraso, a anulabilidade pode ser pedida mesmo que o adquirente a título oneroso esteja de boa fé, o que parece um exagero. A anulabilidade estabelecida no preceito em análise implica a destruição do negócio, com a consequente reversão doo bem; ora, no caso de impugnação pauliana, o bem alienado pode ser executado no património do terceiro adquirente (artigo 615.º CC), que é mais vantajoso para todos os intervenientes. Esta garantia concedida aos trabalhadores pode ser contraproducente. Compreender-se-ia que os atos de disposição a título gratuito fossem anuláveis (artigo 314.º, n.º1 CT), ou melhor impugnáveis nos

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de disposição a título oneroso realizados com terceiro de boa fé (artigo 314.º, n.º2 CT). Tal solução leva a que ninguém esteja disposto a adquirir bens a uma empresa com retribuições em atraso, tendo em vista viabilizá-la economicamente, pois corre o risco de ver o negócio jurídico anulado. Em suma, o excesso de proteção do trabalhador facilita a insolvência do empregador, como o consequente despedimento daquele. Estes mecanismos – descurando as críticas apontadas – constituem meios dissuasores de uma eventual dissipação de bens e, principalmente, de uma gestão empresarial prejudicial para a cobrança dos créditos dos trabalhadores. Não obstante a efetividade que alguns destes mecanismos possuem, que podem contribuir, ainda que indiretamente, para proporcionar a rápida perceção da retribuição por parte dos trabalhadores, não constituem uma verdadeira garantia, apesar de se poderem enquadrar entre os meios conservatórios da garantia patrimonial (artigos 605.º e seguintes CC).

f. Resolução do contrato: como já se indicou antes a propósito da exceção de

não cumprimento, no n.º3 do artigo 323.º CT importa distinguir a exceção de não cumprimento da resolução de contratos. Em alternativa à exceção de não cumprimento – independentemente de ter requerido a suspensão doo contrato –, o trabalhador pode resolver o contrato com base na falta de cumprimento de prestações contratuais, mormente em caso de não pagamento da retribuição. Contudo, a mora, desde que não se transforme em incumprimento definitivo, por impossibilidade de realização da prestação, por perda de interesse do credor (no caso o trabalhador) ou após o decurso do prazo admonitório (artigo 808.º CC), não dá azo à resolução do contrato. Todavia, no artigo 394.º, n.º2, alínea a) CT estabelece-se que o não cumprimento da retribuição constitui justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador, mesmo que a falta de cumprimento não seja culposa (artigo 394.º, n.º3, alínea c) CT). Como não se exige o estabelecimento de um prazo admonitório, poder-se-ia entender, numa leitura pouco atenta do preceito, que, se o empregador se atrasar um dia que seja no pagamento da retribuição, por exemplo, imputável ao banco do empregador ou mesmo ao banco do trabalhador, este poderia resolver o contrato e pedir uma indemnização. Essa solução seria aberrante e não corresponde ao espírito da lei, pois o artigo 394.º, n.º4 CT remete para a justa causa como critério aferidor do poder de resolução do contrato de trabalho. Por outro lado, tendo em conta o disposto no artigo 394.º, n.º5 CT, independentemente de culpa do empregador, a resolução só pode ser requerida depois de uma situação de mora que se prolongue por sessenta dias; o preceito tem igualmente em vista a tutela da empresa, que não se verá, de imediato, privada dos trabalhadores. No caso de a mora quanto ao pagamento da retribuição se transformar em incumprimento definitivo por decurso do prazo admonitório ou se houver incumprimento definitivo relativamente a outra prestação do empregador, por exemplo, artigos 127.º, n.º1, alínea a), 394.º, n.º2, alínea f) e 394.º, n.º2, alínea d) CT, o trabalhador pode, em alternativa, pedir a resolução do contrato com indemnização ou tão-só uma indemnização sendo, porém, esta determinada em moldes diferentes daquela. A transformação da mora em incumprimento definitivo suscita uma dificuldade na relação laboral, pois, nos termos do artigo 395.º,

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n.º1 CT, o trabalhador só pode resolver o contrato nos trinta dias subsequentes ao conhecimento do incumprimento de deveres por parte do empregador. Por isso, a mora só se transforma em incumprimento definitivo para efeitos de permitir a resolução do contrato depois de decorrido esse prazo. O incumprimento definitivo de prestações devidas pelo empregador só permite a resolução do contrato se essas faltas forem consideradas graves. São considerados comportamentos graves para efeito de resolução do contrato de trabalho, exemplificativamente aqueles que vêm indicados no artigo 394.º, n.º2 CT, os mesmos, porém, ainda têm de ser apreciados pelo crivo da justa causa (artigo 394.º, n.º4 CT). É necessário, porém, conjugar o disposto no artigo 323.º, n.º3 CT, com o regime constante do artigo 394.º, n.º1 e 2 CT, de onde poderia retirar-se a existência de uma incompatibilidade, que não se verifica. No artigo 394.º, n.º5 CT exige-se que a mora seja prolongada: sessenta dias (60 dias); enquanto no artigo 394.º, n.º1 CT fala-se em cessar imediatamente o contrato. Todavia, neste preceito, a resolução imediata depende da prova da ocorrência de factos determinantes de justa causa: será pressuposto que a falta de pagamento, por si, consubstancie justa causa de resolução. Com base no disposto no artigo 394.º, n.º5 CT, ficciona-se que existe justa causa de resolução ficciona-se tiverem decorrido ficciona-sesficciona-senta dias (60 dias) de mora; sendo o prazo inferior, o trabalhador terá de provar que a mora constitui justa causa de resolução atendendo à gravidade da situação. No mencionado preceito estabeleceu-se uma presunção iuris et iure de que o trabalhador tem justa causa de resolução do contrato sempre que a retribuição (na sua totalidade) não tiver sido paga depois de decorrer um período de sessenta dias (60 dias) após o respetivo vencimento. Esta presunção, além de não se aplicar no caso de mora quanto a prestações não retributivas – por força da letra da lei –, não pode valer no caso de incumprimento parcial da retribuição – atendendo ao espírito da lei. Com base nos princípios gerais, nomeadamente da boa fé e da proporcionalidade, não parece admissível que o trabalhador possa resolver o contrato pelo facto de o empregador se encontrar em mora, por mais de sessenta dias (60 dias), quanto ao pagamento de um subsídio que corresponde a 5% da retribuição base, tendo esta e os demais complementos sido pontualmente cumpridos. Cabe ainda esclarecer a relação entre o prazo de sessenta dias do artigo 394.º, n.º5 CT e o prazo de trinta dias (30 dias) do artigo 395.º, n.º1 CT. O primeiro é um prazo que permite concluir pela existência de justa causa; o segundo é o período dentro do qual se deve resolver o contrato, que se inicia a partir do momento em que exista justa causa. O prazo de trinta dias (30 dias) do n.º1 do artigo 395.º CT é de caducidade, fixando o período em que se pode exercer o direito de resolução. Existindo justa causa – eventualmente antes do decurso do prazo de sessenta dias (60 dias) do artigo 394.º, n.º5 CT –, o trabalhador tem trinta dias (30 dias) para resolver o contrato. Importa concretizar a mencionada necessidade de conjugação do artigo 323.º, n.º3 CT com o disposto nos artigos 394.º, n.º1 e 2, alínea a), e 351.º, n.º2 CT. No n.º3 do artigo 323.º CT lê-se que a falta de pagamento pontual da retribuição confere ao trabalhador a faculdade de fazer cessar o contrato, nos termos previstos no Código de Trabalho, e no n.º1 do artigo 394.º CT, dispõe-se que

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não são incompatíveis, pelo contrário, justificam-se numa leitura conjugada, a que se aludiu, importando, contudo, precisar esta interpretação. A cessação imediata do contrato advém do facto de ocorrer justa causa (n.º1 do artigo 394.º CT), nomeadamente em caso de falta culposa de pagamento da retribuição (alínea d) do n.º2 do artigo 394.º CT); mas a justa causa deve ser apreciada nos termos prescritos no n.º2 do artigo 351.º CT (ex vi artigo 394.º, n.º4 CT). Ora, a lesão de interesses do trabalhador, no quadro geral da empresa, e a perturbação no relacionamento entre as partes de modo a tornar praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho, normalmente não ocorre no momento seguinte ao da falta de pagamento da retribuição. Concluindo, dir-se-á que a justa causa presume-se se decorreram sessenta dias após a falta de pagamento da retribuição; antes do decurso deste período, o trabalhador terá de demonstrar que a falta de pagamento constitui justa causa de resolução do contrato, isto é, tem de provar os pressupostos da justa causa indicados. Os sessenta dias (60 dias) têm uma função de prazo admonitório (legal), que permite transformar a mora no pagamento da retribuição em incumprimento definitivo, viabilizando o pedido de resolução do contrato. Importa ainda contrapor os prazos de sessenta dias (60 dias) do n.º2 e de trinta dias (30 dias) do n.º1, ambos do artigo 395.º CT.:

i. 60 dias: é um prazo mínimo para se presumir a existência de justa

causa;

ii. 30 dias: é um prazo de caducidade para se exercer um direito.

Atendendo ao prazo do artigo 395.º, n.º1 CT o trabalhador pode, após o conhecimento da situação e nos trinta dias imediatos, fazer valer os seus direitos; ou seja, provando a justa causa pode resolver o contrato no dia seguinte ao da violação contratual por parte do empregador. O prazo de sessenta dias (60 dias) do n.º5 do artigo 394.º CT tem em conta uma situação continuada de incumprimento, e pressupõe o exercício do direito de resolução depois do seu decurso; decorridos os sessenta dias presume-se que há justa causa e o trabalhador pode, então, resolver o contrato bastando a prova do incumprimento continuado. Importa reiterar, como se afirmou, que a falta de pagamento da retribuição, ainda que culposa, por via de regra não determina a imediata impossibilidade de subsistência da relação de trabalho, razão pela qual o trabalhador não pode, desde logo, resolver o contrato nos termos do artigo 394.º CT; terá de aguardar pelo decurso do prazo de sessenta dias ou pela verificação de outro facto que, associado à falta de pagamento, consubstancie a justa causa de resolução. Para a resolução do contrato em caso de mora prolongada cabe atender ao disposto no artigo 394.º, n.º5 CT. A resolução não pressupõe a prévia suspensão do contrato, requerida pelo trabalhador em consequência da falta de pagamento da retribuição (artigos 294.º, n.º4 e 323.º, n.º1 CT). O trabalhador que resolva o contrato em caso de não cumprimento da prestação retributiva tem direito:

i. À indemnização prevista no artigo 396.º CT;

ii. À proteção social de desemprego e a facilidades no âmbito de formação profissional.

A resolução do contrato por parte do trabalhador pode ser requerida em caso de outras situações de incumprimento de deveres obrigacionais do

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empregador, pois não está circunscrita à falta de pagamento de prestações pecuniárias.

3. Cumprimento defeituoso imputável ao empregador: o cumprimento defeituoso

ocorrerá sempre que o empregador não cumprir corretamente alguns dos seus deveres. Mesmo a retribuição, na parcela em que esta não seja pecuniária, pode ser defeituosamente cumprida. Para além disso, há outros deveres do empregador suscetíveis de serem defeituosamente cumpridos, designadamente o respeito de regras de higiene e segurança no trabalho. O cumprimento defeituoso dos deveres do empregador concede ao trabalhador o direito a exigir uma indemnização e inclusive a resolução do contrato, se estiverem preenchidos os pressupostos de justa causa. Na enumeração constante do n.º2 do artigo 351.º CT, de fazem parte seis situações que constituem justa causa, quatro delas integram hipóteses de cumprimento defeituoso (alíneas b), c), d) e e)). Nomeadamente, na violação das garantias legais e convencionais do trabalhador (artigo 351.º, n.º2, alínea b) CT) enquadram-se múltiplas hipóteses de deficiente cumprimento de deveres contratuais por parte do empregador, como a atribuição de taregas não incluídas na categoria, a alteração do local de trabalho fora do âmbito dos artigos 194.º e seguintes CT, o recurso ao ius variandi em violação do artigo 120.º CT ou a exigência ilegal de trabalho suplementar. De entre as situações de cumprimento defeituoso de deveres do empregador, importa fazer especial alusão, pela relevância prática que implica, o mau cumprimento das regras de segurança, causa de acidentes de trabalho e, consequentemente, fonte de responsabilidade civil. Esta hipótese de responsabilidade civil, afora a particularidade de poder existir independentemente de culpa do empregador, segue o regime regra do Direito Civil.

4. Incumprimento imputável ao trabalhador:

a. Regras gerais: atendendo à sua natureza sinalagmática, o incumprimento de

prestações emergentes do contrato de trabalho pode ser imputável a qualquer das partes, mas neste número far-se-á referência ao incumprimento de prestações contratuais imputáveis ao trabalhador. O incumprimento de deveres obrigacionais por parte do trabalhador segue o regime geral, em termos idênticos aos anteriormente referidos em relação ao empregador.

b. Mora e incumprimento definitivo imputáveis ao trabalhador:

i. Mora do devedor: se o trabalhador faltar culposamente ao cumprimento

dos seus deveres poderá haver mora ou incumprimento definitivo. Assim, uma falta injustificada implica a violação do dever de comparecer ao serviço com assiduidade e poderá integrar uma situação de mora ou de incumprimento definitivo parcial. Tendo o trabalhador chegado atrasado, pode compensar o atraso trabalhando mais tempo depois do horário; haverá teoricamente uma situação de mora, tendo-se procedido à respetiva purgação (artigo 804.º CC). O mesmo se passa na hipótese de falta injustificada, que pode ser compensada, inclusive com dias de férias (artigo 257.º, n.º1 CT). Não parece correto entender-se que, faltando o trabalhador, não possa realizar a atividade devida mais tarde, porque se estaria perante uma situação de impossibilidade de cumprimento. Por via de regra, não há qualquer perda de interesse para o empregador e o trabalhador

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trabalho; esta compensação não será considerada trabalho suplementar se verificados os pressupostos do artigo 226.º, n.º2, alínea b) CT. Por outro lado, admitir-se-ia que há impossibilidade de realizar a prestação em outro dia ou outro horário corresponde a uma visão parcelar da relação laboral; esta não deve ser entendida como o somatório das várias horas e dias de trabalho, pois estes integram-se num conjunto, como elementos indissociáveis. Além disso, não parece que a tendencial imperatividade do regime das férias e faltas impeça esta solução. Importa reiterar que a situação de mora depende de um pressuposto relacionado com a vontade de ambas as partes: só há purgação da mora se o credor (empregador) tiver interesse em aceitar a prestação posteriormente e se o devedor (trabalhador) estiver disposto a realizá-la; dito de outro modo, a mora na prestação principal do trabalhador e a respetiva purgação assenta numa situação de consenso. Esta necessidade de consenso, não exigida no Direito das Obrigações, advém da particularidade do vínculo laboral. Se, pelo contrário, perante a falta injustificada do trabalhador for feito o respetivo desconto na retribuição mensal, a situação integrar-se-á num incumprimento definitivo parcial. Para se determinar se a situação concreta corresponde a um caso de mora ou de incumprimento definitivo, ainda que parcial, importa determinar se, do ponto de vista objetivo, a prestação incumprida pode ou não ser realizada mais tarde. No caso de o trabalhador faltar ou se atrasar injustificadamente, caberia determinar se a prestação pode ser realizada mais tarde e se o empregador tem interesse, objetivamente determinado, em que a atividade seja efetuada posteriormente, por um lado, e se o trabalhador está interessado em realizá-la em momento ulterior. Na eventualidade de uma situação de incumprimento que, objetivamente, poderia enquadrar-se numa hipótese de mora, mas que será qualificada como incumprimento definitivo, porque o trabalhador se recusa a realizar a prestação mais tarde, dever-se-á ponderar esta gravidade da conduta do trabalhador na apreciação da sua culpa. Havendo mora por parte do trabalhador este deverá cumprir a prestação mais tarde e, além disso, terá de reparar os danos causados ao empregador. A determinação desses prejuízos far-se-á nos termos gerais dos artigos 562.º e seguintes CC. O empregador, com base na exceptio, poderá recusar a parte da retribuição correspondente à atividade em mora.

ii. Mora do credor: o trabalhador, na qualidade de credor de uma prestação,

em particular da retribuição, pode entrar em mora. Haverá mora do credor, nos termos dos artigos 813.º e seguintes CC, se o trabalhador, sem motivo justificado, não aceitar a retribuição que lhe for oferecida. Nesse caso, o trabalhador entra em mora, não se considerando que o empregador esteja em incumprimento pelo facto de a retribuição não ter sido paga na data do vencimento, podendo este recorrer à consignação em depósito (artigo 841.º e seguintes CC). Havendo mora do trabalhador, na qualidade de credor, deverá infrutífero da prestação (artigo 816.º CC). O regime da mora do credor aplicável ao

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trabalhador não se circunscreve à recusa de aceitação do salário, valendo em caso de qualquer crédito devido pelo empregador (ainda que oferecido por terceiro, sendo a prestação fungível) que o credor da atividade (trabalhador) recuse injustificadamente.

iii. Incumprimento definitivo: estar-se-á perante uma situação de

incumprimento definitivo se o trabalhador não puder realizar a prestação mais tarde, porque isto é objetivamente impossível ou porque o empregador não tem interesse, também determinado objetivamente, em que a atividade seja realizada em momento posterior (artigo 808.º CC). Acresce ainda que se o empregador estabelecer um prazo admonitório para o trabalhador realizar a prestação, não a tendo este feito, pode aquele considerar definitivamente incumprida a prestação (artigo 808.º C). Por último, como particularidade com especial relevância a nível laboral, importa acrescentar que o incumprimento definitivo pode advir do facto de o trabalhador se recusar a realizar a prestação em falta após o incumprimento. Deste modo, se o trabalhador faltou injustificadamente e a atividade não pode ser realizada mais tarde mas o trabalhador não a efetua depois do decurso do prazo admonitório, há incumprimento definitivo. O incumprimento definitivo, sendo parcial, permite que o empregador reduza a retribuição na proporção respetiva (artigo 802.º, n.º1 CC) e, sendo grave o incumprimento definitivo parcial, o empregador pode resolver o contrato de trabalho (artigo 802.º, n.º1 e 2 CC), que corresponde a uma justa causa de despedimento (artigo 351.º CT). Em qualquer caso, o empregador pode exigir uma indemnização. Em princípio, na primeira situação, a indemnização só cobre o interesse contratual positivo, enquanto na segunda, abrangeria o dano negativo ou de confiança; todavia, é preciso ter em conta que o contrato de trabalho pressupõe a existência de uma relação duradoura, cujos efeitos passados não são postos em causa (artigo 434.º, n.º2 CC), pelo que esta repartição do tipo de indemnizações pode não se ajustar completamente. De facto, em particular nestes contratos, a resolução não faz desaparecer a relação contratual, constituindo, antes, uma relação de liquidação. Sendo o incumprimento definitivo total, ao empregador cabe optar entre a resolução do contrato (artigo 801.º, n.º2 CC), ou seja proceder ao despedimento nos termos do artigo 351.º CT, ou manter a relação laboral, exigindo uma indemnização correspondente ao dano positivo (artigo 801.º, n.º2 CC). É evidente que a opção só existe na medida em que haja justa causa de despedimento (artigo 351.º, n.º1 CT). Em termos indemnizatórios, o incumprimento definitivo do contrato de trabalho não apresenta diferenças fundamentais em relação ao regime comum, determinando-se os prejuízos nos termos dos artigos 562.º e seguintes CC. Por isso, é lícito estabelecer-se uma cláusula penal determinando o montante da indemnização devida pelo trabalhador na hipótese de falta de cumprimento de uma prestação do contrato de trabalho. Há, porém, casos em que o valor

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exemplo, no artigo 137.º, n.º2, in fine, 399.º e 401.º CT. Todavia, por motivos vários, não é frequente que os empregadores os demandem, exigindo o pagamento de uma indemnização por incumprimento do contrato de trabalho. Se o trabalhador não cumpre alguma das obrigações a que se encontra adstrito no contrato de trabalho, responde pelo prejuízo causado ao empregador, nos termos gerais (artigo 323.º, n.º1 CT). Como regime particular importa atender ao poder disciplinar (artigos 328.º e seguintes CT), que confere ao empregador a possibilidade de aplicar sanções disciplinares ao trabalhador. O recurso ao poder disciplinar relaciona-se com o incumprimento de deveres por parte do trabalhador; tendo o trabalhador faltado ao cumprimento de obrigações resultantes do vínculo laboral, pode o empregador, com base no poder disciplinar, aplicar uma das sanções constantes do elenco do artigo 328.º CT. De entre essas sanções cabe indicar a resolução do contrato por facto imputável ao trabalhador, prevista no artigo 328.º, n.º1, alínea f) CT, cujo regime terá de ser analisado com base no artigo 351.º CT.

c. Cumprimento defeituoso da atividade: sempre que o trabalhador realiza

a atividade em desconformidade com o que era devido, estar-se-á perante um cumprimento defeituoso. Haverá, nesse caso, um desvio entre a atividade devida e a que foi realizada. Além da imperfeição referida, para haver incumprimento defeituoso torna-se ainda necessário que o empregador não tenha mostrado a sua concordância com aquela atuação, que o defeito seja relevante e que daí derivem danos típicos. Estar-se-á perante uma desconformidade se o trabalhador realiza a atividade em lugar diferente ou de modo distinto do acordado, bem como quando, ao desempenhar a atividade, viola deveres acessórios. Para além da desconformidade é necessário que o empregador não tenha mostrado a sua concordância com a atividade defeituosa. Relacionado com este aspeto importa igualmente que a falta de conformidade não seja imputável ao próprio empregador, em razão, nomeadamente, de ordens contraditórias ou desconexas. Em terceiro lugar, só será de admitir um cumprimento defeituoso se o defeito for grave. Vale o princípio de minimus non curat praetor. Não se justificaria que o empregador demandasse o trabalhador por um defeito insignificante em relação à atividade por este desenvolvida; esta é uma conclusão que deriva do bom senso e que tem particular relevância no domínio laboral atento o facto de a continuidade no exercício da atividade e a repetição de tarefas justificar uma atenuação do cuidado que pode tornar irrelevantes pequenas falhas. A importância do defeito deverá ser apreciada com base no princípio da boa fé, perante cada situação concreta e à luz do interesse do empregador. Por último, os danos têm de ser típicos, a atuação do trabalhador deverá acarretar consequências que não estariam tuteladas pela mora nem pelo incumprimento definitivo. O fundamento legal do cumprimento defeituoso da atividade laboral encontra-se no artigo 128.º, alíneas b) e c) CT, onde se impõe ao trabalhador o dever de comparecer ao serviço com assiduidade e pontualidade e realizar o trabalho com zelo e diligência. A assiduidade e o zelo relacionam-se ambos com a diligência na execução da atividade. Se o trabalhador efetua a atividade com falta de diligência há um cumprimento

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imperfeito do seu dever principal. A falta de assiduidade implica que o trabalhador não comparece diariamente ao serviço ou chega atrasado com habitualidade. Não se está perante a situação de uma única falta injustificada; só se pode falar em falta de assiduidade se houver alguma continuidade, o que não implica que tenham de ser faltas ou atrasos seguidos; basta que num determinado período (normalmente num ano civil), o trabalhador, por diversas vezes, tenha faltado ou chegado atrasado. Se se estiver perante uma falta injustificada poder-se-á qualifica-la como mora ou incumprimento definitivo parcial, nos termos referidos anteriormente. Porém, a falta de assiduidade, pela sua repetição, leva à perda de confiança e, nesse caso, vista a relação laboral no seu todo, há que encarar a atuação do trabalhador como um cumprimento defeituoso. Mais uma vez, importa reiterar que a não realização da atividade em certo dia não implica, por via de regra, uma impossibilidade de cumprimento, entendimento que corresponderia a uma visão parcelar da relação laboral, como um somatório de dias de trabalho, quando, na realidade, ela deve ser vista numa perspetiva de conjunto. Na realização da atividade com falta de zelo há igualmente uma situação de perda de confiança, conformando esta atuação um cumprimento defeituoso por parte do trabalhador. A falta de diligência é uma fórmula ampla onde se incluem diversas falhas na realização da atividade laboral, em especial relacionadas com o modo de prestar o trabalho. A propósito, resta relembrar que o cumprimento defeituoso, como qualquer outra forma de não cumprimento, funda-se na presunção de culpa do artigo 799.º CC. Porém, o defeito terá de ser provado por quem o invoca, nos termos gerais do artigo 342.º, n.º1 CC; ou seja, cabe ao empregador provar que o trabalhador desempenhou defeituosamente a atividade. Perante o cumprimento defeituoso por parte de trabalhador cabe, em primeiro lugar, ao empregador o direito de licitamente recusar a prestação desconforme. Relativamente a atrasos injustificados do trabalhador, determina-se no artigo 256.º, n.º3 CT que o empregador pode recusar-se a aceitar a presunção laboral, daí decorrendo uma falta injustificada. Depois de realizada a prestação defeituosa, o empregador poderá exigir, sendo isso possível, que o trabalhador, a expensas suas, corrija o defeito ou realize nova prestação. Se o trabalhador, fora do horário de trabalho, que não corresponde necessariamente a trabalho suplementar (artigo 226.º, n.º3, alínea c) CT), vier a corrigir o defeito ou a realizar outra prestação, a falta ficou sanada. Em caso de cumprimento defeituoso, ao empregador é-lhe também facultado o recurso à exceção de não cumprimento, que corresponderia a uma redução da retribuição; todavia, não havendo recusa da prestação, como as situações geradoras de cumprimento defeituoso não permitem a aplicação do regime das faltas, que determina perda da retribuição, só seria admissível a exceção nos limites do artigo 279.º CT. A exceção de não cumprimento por parte do empregador está condicionada pelo princípio da irredutibilidade salarial. O legislador rodeou de especiais cautelas a efetividade da remuneração, limitando, designadamente, a possibilidade de se proceder à cessão, compensação e penhora do salário (artigos 279.º e 280.º CT). Deste modo, o deficiente cumprimento da prestação laboral não permite que o empregador proceda a

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n.º2, alínea b) CT. Se o trabalhador, pela sua atuação, causar um prejuízo ao empregador, só depois da indemnização se encontrar liquidada por decisão judicial é que o seu valor pode ser descontado no salário, com os limites constantes do artigo 279.º, n.º3 CT. O cumprimento defeituoso da atividade laboral por parte do trabalhador é fonte de responsabilidade civil contratual, podendo dar azo a um dever de indemnizar, bem como à resolução do contrato, quando se integre numa justa causa de despedimento, situação que ocorre, nomeadamente, nas hipóteses previstas nas alíneas d), e), h) e m) do n.º2 do artigo 351.º CT; nestes casos, estar-se-á perante um cumprimento defeituoso por parte do trabalhador. Ou seja, dos doze exemplos de situações de justa causa de despedimento, quatro derivam de cumprimento defeituoso da prestação laboral.

Prescrição: a prescrição de créditos laborais associa-se normalmente com a retribuição – razão pela qual a matéria já foi referida no semestre anterior –, mas o regime especial de prescrição estabelecido em sede laboral não se circunscreve ao crédito retributivo. A prescrição foi estabelecida no artigo 337.º CT com caráter bilateral, valendo para ambas as partes; tanto o trabalhador como o empregador estão sujeitos a um prazo de prescrição de um ano para fazerem valer os respetivos direitos emergentes do contrato de trabalho. Esta ideia, já defensável no âmbito da legislação anterior, tem maior justificação atendendo ao elemento sistemático: a prescrição surgiu no Código do Trabalho autonomizada da retribuição, em secção própria. A aplicação do regime prescricional, constante do artigo 337.º CT, aos direitos do trabalhador e do empregador, decorre do texto da lei, mas não encontra a mesma justificação quando está em causa um crédito do empregador, sobre o qual não incide a mesma pressão psicológica; todavia, seria inadequado estabelecer prazos distintos, que obstariam à aplicação do regime da compensação. Como já se mencionou, em sede laboral foi consagrado um regime excecional de prescrição, diferente do regime comum, estabelecido no Código Civil, que só vale no estrito âmbito de aplicação previsto na norma. Por isso, nem todos os créditos do trabalhador ou do empregador estão sujeitos a este regime excecional de prescrição. Quanto à prescrição do créditos resultantes do contrato de trabalho, em que se inclui a retribuição e outros direitos emergentes do vínculo laboral, o artigo 337.º CT afasta-se do regime instituído no Código Civil (artigos 300.º e seguintes CC), sob dois aspetos, subdividindo-se o segundo em duas vertentes:

1. No artigo 337.º, n.º1 CT estabeleceu-se um prazo de prescrição de um ano. Tal

prazo não é conhecido no Código Civil.

2. Determinou-se que o prazo de prescrição começa a correr a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho, independentemente da causa de cessação (caducidade, revogação ou resolução). A extinção do vínculo

deve entender-se em sentido factual, abrangendo a hipótese de despedimento ilícito. Esta regra – justificada pelo facto de, na pendência da relação laboral, o trabalhador poder encontrar-se constrangido a intentar uma ação judicial contra o empregador – implica duas alterações em relação ao regime do Direito Civil:

a. Nos termos do artigo 306.º CC, por via de regra, a prescrição tem início com o vencimento da obrigação, enquanto nos créditos resultantes da retribuição ou de outra prestação devida pela execução do contrato de trabalho, o início da prescrição relaciona-se com o termo do contrato.

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b. Nesta sequência, a prescrição não corre durante a vigência do contrato de trabalho. Trata-se, no fundo, de uma suspensão da prescrição, tal como

vem previsto no artigo 318.º, alínea e) CC, apresentada com outras vestes jurídicas.

Apesar de o regime da prescrição ser idêntico, independentemente do tipo de crédito, determinados direitos do trabalhador, desde que vencidos há mais de cinco anos (5 anos) têm de ser provados por documento idóneo (artigo 337.º, n.º2 CT).

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IX – Acidentes de Trabalho

Aspetos gerais:

1. Ideia geral e evolução: a matéria dos acidentes de trabalho, na prática, ocupa talvez

50% das questões juslaborais suscitadas. A disciplina jurídica dos acidentes de trabalho apresenta alguma especificidade com respeito às regras gerais da responsabilidade civil aquiliana, constantes dos artigos 483.º e seguintes CC. Trata-se, tão-só, de especificidades, porque a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho assenta nos pressupostos básicos da responsabilidade civil extracontratual. Porém, atentas as particularidades, justifica-se o estudo desta matéria. Com efeito, sendo o Direito do Trabalho Direito Privado especial, cabe aludir às especificidades de regime, em particular, com respeito ao Direito comum que é, em grande parte, o Direito das Obrigações. Do ponto de vista legislativo, a responsabilidade civil objetiva emergente de acidentes de trabalho terá surgido na Alemanha, com a lei de 6 de julho 1884. Em Portugal, a primeira regulamentação aparece com a Lei n.º 83, 24 julho 1913, em que se estabelecia uma responsabilidade sem culpa, em particular, quando os acidentes eram causados por máquinas, mas não abrangia as doenças profissionais. Atualmente, desde 1 janeiro 2010, vigora a Lei n.º 98/2009, 4 setembro (Lei dos Acidentes de Trabalho, LAT), que, com pequenas adaptações e resolução de dúvidas, manteve quase inalterado o regime até então vigente. Nos termos da legislação referida, vigora, com respeito aos acidentes de trabalho, um regime de responsabilidade civil objetiva, pelo risco. Só que, contrariamente ao estabelecido no Código Civil em termos de responsabilidade civil objetiva (artigos 499.º e seguintes CC), em que, por via de regra, se determinam limites máximos do montante indemnizatório, em sede de acidentes de trabalho os limites são determinados pela tipificação dos danos – na Tabela Nacional de Incapacidades – e pelo estabelecimento de regras para o apuramento da indemnização. Á proteção derivada de acidente de trabalho ou doença profissional, após a revisão de 1997, foi conferida dignidade constitucional. De facto, no artigo 59.º, n.º1 CRP acrescentou-se a alínea f), nos termos da qual todos os trabalhadores têm direito a assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional. Para além dos diplomas referidos, importa tem em conta regras jurídicas provenientes de fontes externas, em especial, convenções da OIR. Quanto às fontes externas em geral há a referir a Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigo 25.º), o Pacto Internacional sobre Direitos Económicos, Sociais e Culturais (artigo 7.º) e a Carta Social Europeia (artigo 3.º). Relativamente às Convenções da OIT é de indicar a Convenção n.º12, 1921, a Convenção n.º 17, de 1925 e a Convenção n.º 155, de 1981, todas ratificadas por Portugal. Sobre este ponto é igualmente de aludir à Convenção OIT n.º 121, de 1964, modificada em 1980, mas que não foi ratificada por Portugal. Ainda com respeito às fontes externas cabe mencionar o Direito Comunitário, com várias diretivas sobre segurança e saúde no trabalho.

2. Acidente de trabalho e doença profissional: no ordenamento jurídico português,

os acidentes de trabalho não se encontram integrados no sistema de proteção da segurança social; solução que parece inteiramente correta. Há uma diferença entre a proteção concedida ao trabalhador em caso de acidente de trabalho e a Segurança Social. Como é sabido, a Segurança Social sofre de dois problemas graves:

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a. Excessiva burocratização, que não existe nos mesmos moldes num esquema de seguro privado;

b. A sua falência económica.

A estes motivos acresce que o setor segurador passaria por graves dificuldades caso se procedesse à mencionada transferência, derivado do peso significativo do ramo

acidentes de trabalho. Razões pelas quais, hoje, a tendência aponta no sentido de se

aliviar a segurança social de algumas das suas tarefas, transferindo-as para entidades privadas, em princípio seguradoras. Tendo isto em conta, o legislador acabou por não concretizar a substituição prometida, mantendo-se, quanto aos acidentes de trabalho, o regime indemnizatório de Direito Privado, previsto na Lei dos Acidentes de Trabalho. Mas esta conclusão vale somente para os acidentes de trabalho e não quanto às doenças profissionais. Progressivamente, a partir de 1962, a responsabilidade pelas doenças profissionais foi sendo transferida das entidades patronais para a, então previdência social. Em 1981 as doenças profissionais foram integradas num sistema de proteção público (Segurança Social), concretamente a Caixa Nacional de Seguros de Doenças Profissionais (substituída pelo Centro Nacional de Proteção contra os Riscos Profissionais). Estando o regime fora do domínio privado, não cabe neste estudo aludir às questões que lhe são inerentes. Assim sendo, vai proceder-se unicamente ao estudo dos acidentes de trabalho, pois só estes se encontram no âmbito do Direito Privado, sabendo-se que, contudo, algumas das regras válidas neste regime continuam a encontrar aplicação em sede de doenças profissionais. O acidente de trabalho pressupõe que seja súbito o seu aparecimento, assenta numa ideia de imprevisibilidade quanto à sua verificação e deriva de fatores exteriores. O acidente de trabalho é, normalmente, causa de uma lesão corporal, física ou psíquica; mas, em determinados casos, pode estar na origem de uma doença. Por seu turno, as doenças profissionais, que se encontram reguladas nos artigos 93.º e seguintes LAT, resultam do exercício de uma atividade profissional. Daí que, por via de regra, a doença profissional é de produção lenta e progressiva surgindo de modo impercetível. Como afirma Emygdio da Silva,

«a doença profissional infiltra-se com insídia, mas não é facilmente reconhecida desde

logo».

Nos termos da Lei dos Acidentes de Trabalho, para efeitos indemnizatórios, só se consideram doenças profissionais as que constam de uma lista periodicamente atualizada (artigo 94.º, n.º2 LAT e artigo 283.º, n.º2 e 3 CT). Posto isto, importa estabelecer a seguinte distinção:

a. Doenças profissionais em sentido amplo: abrangem

i. Doenças profissionais em sentido restrito: as que constam da lista de doenças

profissionais (artigos 283.º, n.º2 CT e 94.º, n.º1 CT);

ii. Doenças de trabalho: são igualmente doenças profissionais, por

resultarem do exercício de uma atividade profissional, mas apesar de não constarem da lista referida, são ainda assim ressarcíveis (artigos 283.º, n.º3 CT e 94.º, n.º2 LAT).

A responsabilidade derivada de doenças profissionais tem vindo, progressivamente, a ser transferida de instituições privadas para instituições públicas; ou seja, foi deixando de estar na órbita de imputabilidade dos empregadores e respetivas seguradoras, passando para o setor público. Não obstante a figura das doenças profissionais andar associada com a dos acidentes de trabalho, a sua forma de

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3. Prevenção do acidente; regras de segurança no trabalho: a Lei dos Acidentes de

Trabalho, bem como os diplomas que a regulamentam, preocupam-se em disciplinar dois aspetos:

a. A prevenção do acidente de trabalho: constitui um dever humanitário e

apresenta vantagens económicas para a empresa e respetiva seguradora – com base na máxima mais vale prevenir do que remediar –, bem como para a comunidade em geral. Para a prevenção do acidente de trabalho podem intervir várias entidades com funções diversificadas.

i. A profilaxia do acidente de trabalho é uma incumbência do Estado: sobre o

Governo impende o dever de decretar medidas de segurança que, postas em prática, evitem a ocorrência de acidentes. No que respeita ao estabelecimento de regras de segurança no trabalho é de referir o regime constante dos artigos 281.º e seguintes CT e o disposto na Lei n.º 102/2009, 10 novembro;

ii. Ao Estado incumbe fiscalizar o cumprimento de tais regras: importa salientar

que as regras de segurança não têm só como destinatários os empregadores, pois elas destinam-se também a ser cumpridas pelos trabalhadores (artigo 17.º Lei n.º102/2009). O Estado tem organismos competentes, em particular a Autoridade para as Condições de Trabalho, para fiscalizar o cumprimento das regras de Direito do Trabalho, entre as quais as que respeitam à prevenção de acidentes.

1. Relacionado com a fiscalização, cabe aludir à punição de infrações às regras de prevenção: além das contraordenações laborais

desenvolvidas e concretizadas na Lei n.º 107/2009, 14 setembro, com respeito a vários diplomas sobre proteção da segurança e saúde dos trabalhadores, no artigo 152.º, n.º3 CP foi estabelecido um crime de perigo comum por infração a regras de segurança no trabalho;

iii. À fiscalização estadual, acresce que o cumprimento das regras de segurança e saúde no trabalho pode igualmente ser verificado por parte das comissões de trabalhadores e dos delegados singdicais, nos termos gerais, por representantes dos trabalhadores (artigo 223.º Lei n.º102/2009), bem como dos serviços de segurança e saúde no trabalho organizados pelo empregador (artigos 73.º e

seguintes Lei n.º 102/2009).

iv. A lei ainda admite que os empregadores possam estabelecer outras regras de segurança para além daquelas que constam de diplomas legais: dentro da sua

empresa, tendo em conta o dever e proteger o trabalhador, cabe ao empregador fixar regras mais pormenorizadas e concretas em função da atividade desenvolvida. Essas normas internas não podem dispor contra o que vem determinado em diplomas legais, mas servem para desenvolver e concretizar as regras de segurança legais, atentas as especificidades da atividade desenvolvida na empresa. As normas internas de prevenção do acidente podem constar de regulamento de empresa, de ordens de serviço ou de simples avisos afixados na empresa e são vinculativas para os trabalhadores.

Na prevenção do acidente de trabalho deve igualmente ter-se em conta a minimização dos seus efeitos. Pretende-se, não só evitar a verificação do

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acidente, como minimizar os respetivos efeitos. Daí a obrigação imposta aos empregadores de manterem serviços de segurança e saúde no trabalho; serviços internos, interempresas ou externos, que se relacionam com a dimensão da empresa, nos termos prescritos nos artigos 73.º e seguintes Lei n.º102/2009.

b. A reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho.

Responsabilidade civil objetiva e subjetiva: 1. Generalidades:

a. Responsabilidade aquiliana comum: inicialmente, a figura dos acidentes

de trabalho não apresentava qualquer autonomia, pois estava integrada no regime comum da responsabilidade civil extracontratual; era o que ocorria no domínio do Código Civil de 1867 e legislação subsequente. Caberia ao trabalhador lesado a prova dos factos constitutivos da responsabilidade aquiliana, sendo, em muitos casos, particularmente difícil demonstrar a existência de culpa por parte do empregador. Na realidade, o trabalhador, sendo por via de regra a parte fraca na relação jurídica, teria dificuldade em carrear elementos para provar a culpa do empregador, em especial em relação à prova testemunhal a efetuar por colegas de trabalho. Na segunda metade do século XX, a introdução da máquina no processo de laboração levou a um aumento significativo dos acidentes de trabalho e um consequente agravamento do risco na realização da atividade. A isto acrescia ainda o facto de ser mais difícil a prova da culpa do empregador no caso de o acidente ter sido causado por uma máquina; por um lado em que o mau funcionamento do maquinismo não era facilmente provado, em particular por quem carecia de conhecimentos técnicos e, por outro, porque seria difícil imputar a culpa do mau funcionamento da máquina ao empregador que a tinha adquirido de um terceiro. Em conclusão, proliferam os acidentes de trabalho e os lesados não conseguiam obter qualquer indemnização.

b. Responsabilidade com culpa presumida: pensou-se em alterar esta

situação através da inserção do ónus da prova da culpa, por duas vias:

i. Conduzir os acidentes de trabalho ao regime da responsabilidade contratual;

ii. Admitir uma exceção no regime da responsabilidade aquiliana, estabelecendo uma presunção de culpa.

Mas esta conceção assenta num vício: de que o acidente de trabalho resulta do incumprimento de uma obrigação emergente do contrato de trabalho. E, por outro lado, mesmo que se pudesse relacionar o acidente de trabalho com o não cumprimento de deveres contratuais, o dano corporal causado ao trabalhador, em princípio, estaria fora do domínio de proteção do contrato. A responsabilidade contratual visa tão-só ressarcir os danos típicos que se incluem no domínio de proteção do negócio jurídico em causa. Por isso, sendo causados danos corporais à contraparte, não estando a proteção da pessoa do contraente incluída no objeto do contrato, tais danos estarão fora do domínio típico de proteção desse contrato. Não estando os danos abrangidos no domínio da proteção contratual, só poderão ser ressarcidos pela via da responsabilidade extracontratual. Esta é a conclusão a que se pode chegar em sede de acidentes de trabalho. Assim sendo, admitir a presunção

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de culpa do empregador com base na aplicação do regime da responsabilidade contratual não parece, do ponto de vista concetual, o melhor caminho. A solução seria, pois, considerando a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho como extracontratual, admitir, nesta sede, exceções à regra geral de a prova da culpa incumbir ao lesado (artigo 487.º, n.º2 CC). Este seria um caminho ao qual não haveria objeções concetuais a opor e resolveria alguns dos problemas que poderiam surgir derivados da dificuldade da prova da culpa do empregador por parte do trabalhador lesado. Acontece, porém, que, mesmo com recurso à culpa presumida do empregador, ficavam em alguns casos os danos emergentes de acidentes de trabalho por ressarcir, na medida em que a presunção era ilidível.

c. Responsabilidade objetiva: para, de algum modo, pôr cobro a estas

situações, em especial quando implicavam uma clamorosa injustiça para os trabalhadores lesados que, por via da responsabilidade civil delitual, não podiam ser ressarcidos, veio a admitir-se uma terceira via: a da responsabilidade civil objetiva. A responsabilidade civil objetiva, sem culpa, tem o seu aparecimento relacionado com o ressarcimento dos danos causados por acidentes de trabalho. A responsabilidade objetiva surge como exceção à responsabilidade civil extracontratual tendo em vista resolver o problema pontual dos acidentes de trabalho. Mais tarde, esta exceção foi alargada a outras figuras, como os acidentes de viação e, mais recentemente, a responsabilidade do produtor. Mas, de facto, foi para os acidentes de trabalho que se pensou na criação de uma figura de responsabilidade civil extracontratual sem culpa. Principalmente a partir da introdução da máquina no processo produtivo, na medida em que esta aumentou o perigo de sinistros e, na realidade, levou a um incremento de acidentes de trabalho. De certo modo, esta ideia ainda hoje se encontra patente na Lei, quando o artigo 16.º, n.º2 Lei dos Acidentes de Trabalho (LAT) não se permite a exclusão da reparação derivada de acidente de trabalho se este se tiver ficado a dever a utilização de máquinas e de outros equipamentos de especial perigosidade. A responsabilidade objetiva surge, assim, associada à periculosidade. O fundamento da responsabilidade civil objetiva pode estar associado à teoria do risco, em particular, no que respeita aos acidentes de trabalho, ao risco profissional. Nestes termos, se a atividade profissional desenvolvida tinha, em potência, um risco, bastava demonstrar que o acidente de trabalho ocorrido se encontrava na órbita desse risco para que fosse devida a respetiva indemnização. Seria, todavia, necessário demonstrar que o acidente era causa normal do risco próprio daquela atividade. O empregador seria responsável pelos danos causados aos trabalhadores pelo risco próprio da atividade por estes desenvolvida, porque poderia retirar as vantagens dessa mesma atividade; ou seja, ubi commoda ibi incommoda: atribui-se o risco a quem tem os benefícios. A responsabilidade objetiva, para além da periculosidade, anda associada à existência de benefícios, daí que, por exemplo, no artigo 16.º, n.º1 LAT se estabeleça que não é possível excluir do âmbito da lei as situações em que haja exploração lucrativa. Depois de uma primeira justificação assente tão-só no risco profissional, em alterações legislativas, denota-se que a responsabilidade objetiva por acidentes de trabalho também encontra justificação no risco de integração empresarial, em que a inclusão de

Referências

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