• Nenhum resultado encontrado

Proposta de cuidado de enfermagem à criança autista : contribuições da psicanálise

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Proposta de cuidado de enfermagem à criança autista : contribuições da psicanálise"

Copied!
95
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE

CAMPINAS

Faculdade de Enfermagem

REBECCA BRONZATTO DE PAIVA E SILVA

PROPOSTA DE CUIDADO DE ENFERMAGEM À

CRIANÇA AUTISTA: CONTRIBUIÇÕES DA

PSICANÁLISE

CAMPINAS 2015

(2)
(3)
(4)
(5)

Aos meus pais Angélica e Roberto, que sempre me apoiaram em todos os momentos da minha vida com muita compreensão e amor, fazendo com que eu me torne a pessoa que sou hoje.

Ao Julio, namorado e melhor amigo, que me apoia em cada novo desafio da vida com muita compreensão e carinho.

(6)

AGRADECIMENTOS

Ao finalizar mais esta etapa da minha vida profissional, gostaria de agradecer as pessoas que de alguma forma contribuíram para a realização deste trabalho.

À Profª Drª Vanessa Pellegrino Toledo, orientadora, que me guiou durante todo o percurso deste trabalho.

Á Profª Ana Paula Rigon Francischetti Garcia, por todo auxilio no processo de conhecimento e estudo da psicanálise, sugerindo meios para a construção deste trabalho.

Ao Saulo Saad N. Benevides, secretário da Pós-Graduação da Faculdade de Enfermagem, pela atenção dispensada ao longo deste percurso.

À Murielle Badin, amiga, que mesmo longe fisicamente me apoia com suas palavras de compreensão e animo durante esta etapa.

À Renata Bonilha Esteves, amiga de longa data, pela amizade e apoio ao longo destes anos.

Aos meus pais, Angélica e Roberto, por todo apoio, compreensão, paciência, pelas palavras encorajadoras ao longo da vida e deste percurso.

Ao Julio, namorado, por toda sua paciência, apoio, compreensão, pelas palavras de animo.

(7)

RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivo propor que o enfermeiro, ao assumir sua posição de agente terapêutico, utilize o acompanhamento terapêutico como instrumento para prestar assistência de enfermagem acrianças autistas à luz da psicanálise. Justifica-se pela constatação, na literatura, da dificuldade do preparo teórico dos enfermeiros na área da saúde mental e enfermagem psiquiátrica, principalmente dos que atuam com crianças autistas. Muitos têm buscado o preparo em cursos extracurriculares, entre eles o de formação em psicanálise. A orientação psicanalítica pode contribuir no tratamento da criança autista, tentando explicar os sintomas expressos por meio da falha da função materna, foraclusão da metáfora do Nome do pai entre outros conceitos. Consiste em um estudo teórico que foi realizado a partir de artigos indexados nas bases de dados, livros que abordam a constituição da psique infantil e dos seminários III e IV de Lacan e se subdividiu em duas fases. A primeira constituiu em conhecer os pressupostos teóricos do acompanhamento terapêutico e estabelecer sua relação com a prática clínica do enfermeiro no campo da saúde mental, por meio da elaboração de uma metassíntese. A segunda fase foi apreender a estrutura da formação psíquica da criança para abordar o funcionamento psíquico do autista a partir do complexo de Édipo. A partir dos significantes que constituem a organização do complexo de Édipo, foi reconhecido o estádio no qual, possivelmente, ocorre a falha que ocasiona o autismo na criança. Sendo assim, o enfermeiro, exercendo sua função de agente terapêutico, pode utilizar o acompanhamento terapêutico como instrumento de trabalho na assistência de crianças autistas por meio das três propostas de intervenções: A – implementação do acompanhamento terapêutico como possibilidade de intervenção para inserção do terceiro elemento, repertório simbólico, construção do laço social e aumento dos significantes para a criança; B - reconhecimento da relação pais e filhos e C - leitura dos acontecimentos do dia a dia: banho como lugar para leitura e cuidados corporais.

Descritores: Complexo de Édipo, Criança, Transtorno Autístico, Psicanálise,

Enfermagem.

(8)

ABSTRACT

This research aims to propose that the nurse to assume his therapeutic agent position use the therapeutic accompaniment as a instrument to provide nursing care to autistic children in the illumination of psychoanalysis. Justified by the evidence in the literature of the difficulty of theoretical preparation of nurses in mental health and psychiatric nursing, especially those who work with autistic children. Many have sought to prepare in extracurricular courses, including training in psychoanalysis. The psychoanalytic orientation can contribute to the treatment of autistic children, trying to explain the symptoms expressed by the failure of the maternal function, foreclosure father's name metaphor and other concepts. It consists of a theoretical study that was conducted from articles indexed in databases, books that address the establishment of child psyche and seminars III and IV of Lacan and was divided into two stages. The first consisted to connection the theoretical assumptions of the therapeutic accompaniment and establish its relationship with the clinical practice of nurses in the mental health field, through the development of a meta-synthesis. The second stage was to grasp the psychic formation of children structure to address the psychological functioning autism from the Oedipus complex. From the signifiers that constitute the Oedipus complex the organization, the stadium in which possibly the failure occurs that causes autism in children was recognized. Thus, the nurse exercising their therapeutic function can use the therapeutic accompaniment as a working instrument for the care of autistic children through the three proposed interventions: A - implement the therapeutic accompaniment as a possible intervention for the third element insertion, symbolic repertoire, construction of social ties and increasing significant for the child; B - To recognize the relationship parents and children and C - Read the events of everyday life: bath as a place for reading and body care.

(9)

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Esquema grafado em Z de Lacan

(10)

LISTA DE TABELAS

Quadro 1 – Temas e metáforas emergentes dos artigos selecionados.

57

Quadro 2 – Continuação dos Temas e metáforas emergentes dos artigos selecionados

(11)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AT – Acompanhamento terapêutico CAPS – Centro de atenção psicossocial DeCs – Descritores em Ciência da Saúde MeSH – Medical Subject Headings

UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas USP – Universidade de São Paulo

(12)

SUMÁRIO 1 – INTRODUÇÃO 13 2 – OBJETIVOS 24 3 – MÉTODO 26 4 - RESULTADOS E DISCUSSÃO 29 4.1 Apresentação 30 4.2 - Metassíntese: acompanhamento terapêutico e as implicações para prática clínica de enfermeiros na saúde mental

31

4.3 - Proposta de intervenções de enfermagem para crianças autistas e a organização do complexo de Édipo.

62

5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS 86

6 - REFERENCIAS 89

(13)

1

(14)

A motivação para elaboração desta pesquisa sobre o cuidado de enfermagem à criança autista originou-se em experiências vividas desde a minha infância.

O ato de cuidar de crianças esteve presente desde muito cedo em minha vida. Sempre ajudei a cuidar dos meus primos mais novos, o que me despertou um grande interesse de, no futuro, trabalhar com crianças.

Em 2006, iniciei a graduação na faculdade de enfermagem e, desde o início, tive o desejo de exercer um cuidado voltado às crianças.

No terceiro ano da graduação, fui convidada por uma professora a atender uma criança com compulsão alimentar e obesa na clínica de enfermagem da faculdade. Durante alguns meses, prestei assistência a ela. A partir desse momento, comecei a perceber o quanto a saúde mental influencia a vida das pessoas e como a assistência de enfermagem qualificada pode contribuir para o cuidado aos portadores de sofrimento psíquico.

No ano de 2011, tive a oportunidade de realizar um treinamento em serviço na equipe multiprofissional em terapia nutricional do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Nesse treinamento, eu passava visitas na pediatria e nas alas de internação de adultos. As visitas na pediatria me chamavam mais atenção, pois o cuidado às crianças sempre me despertou maior interesse.

Ainda no final de 2011, o desejo de aprimorar meus conhecimentos e pesquisar meios de prestar um cuidado efetivo às crianças com algum tipo de necessidade especial aumentou. Diante desse desejo, em 2012, iniciei os estudos como aluna especial no programa de pós-graduação da Faculdade de Enfermagem da Unicamp.

Após cursar disciplinas como aluna especial, prestei o processo seletivo para o mestrado, tornando-me assim uma aluna regular. Comecei a pensar em toda minha vivência pessoal e profissional e o que eu realmente gostaria de estudar, pesquisar para, de alguma forma, contribuir para a formação do corpo de conhecimentos da enfermagem.

(15)

Durante minhas leituras, o autismo infantil chamou minha atenção, por ser uma patologia complexa, sem uma etiologia definida, que provoca transtornos no comportamento da criança e, por consequência, na dinâmica familiar(1-4).

O diagnóstico de autismo infantil data do início do século 20. Até então, as crianças autistas ainda faziam parte do grupo dos deficientes mentais, que apresentavam comportamentos bizarros, inadequados e de autoagressão(5). Atualmente, a prevalência de crianças autistas está para um a cada 88 nascimentos, afetando mais crianças do sexo masculino(6). Evidenciando, assim, a importância do tema para o cuidado da saúde mental dessas crianças.

O autismo na criança se caracteriza por apresentar problemas na linguagem, na comunicação, na interação social e no repertorio de comportamentos, sendo estes muitas vezes repetitivos e estereotipados(6-7). Sendo assim, os profissionais que prestam cuidados à estas crianças precisam ter conhecimentos destas particularidades para prestar uma assistência mais adequada.

Na busca bibliográfica sobre autismo infantil, foram realizadas pesquisas em cinco bases de dados (Bireme, Scopus, Cinahl, Pubmed e Web of Science) e percebeu-se que ainda existem poucos estudos realizados por enfermeiros sobre o cuidado de enfermagem prestado a estas crianças, e os existentes demonstram as dificuldades que os enfermeiros têm em desenvolvê-los. Para realizar essa busca prévia por artigos, foram utilizados os descritores, previamente consultados no DeCs e MeSH, transtorno autístico, criança e cuidados de enfermagem, e seus correspondentes na língua inglesa (autistic disorder, child, nursing care). No total, com o uso dos devidos filtros em cada uma das bases, foram levantados 104 artigos, sendo que alguns se repetem em mais de uma base de dados, totalizando assim 97 artigos. A maioria aborda questões de relacionamento entre criança autista e sua família, ou aspectos clínicos do autismo.

Diante desse cenário, algumas indagações começaram a surgir. Será que os enfermeiros têm preparo teórico e prático para realizar esta assistência às crianças autistas? Será que eles estão buscando informações nas fontes corretas? Dentro da equipe multiprofissional que presta assistência, o enfermeiro assume a posição de agente terapêutico?

(16)

Iniciadas as pesquisas na literatura, foi constatado que, realmente, existe uma dificuldade em relação ao preparo teórico, pois os enfermeiros relatam que têm uma formação generalista e, quando se veem diante de uma criança autista, necessitam buscar conhecimentos em cursos extracurriculares, os quais algumas vezes não são suficientes, pois, além do conhecimento teórico, o enfermeiro precisa “aceitar” a criança autista e suas singularidades para prestar assistência de enfermagem(2).

A formação dos profissionais de enfermagem, assim como a de outros profissionais da saúde, não é voltada para o trabalho na área da saúde mental. Os currículos dos cursos superiores ainda não têm como objetivo a preparação de um profissional polivalente, mas sim de generalistas(8). Ainda são pouco abordadas pelas instituições de ensino as discussões trazidas a partir da Reforma Psiquiátrica em seus currículos(9). Fica a critério de cada um procurar se especializar em uma determinada área de trabalho, já que a grade curricular não consegue contemplar todos os assuntos referentes à saúde mental. Sendo assim, os enfermeiros que trabalham em equipamentos de saúde mental,como por exemplo os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), principalmente os que desenvolvem trabalhos com crianças autistas, têm buscado qualificação em cursos de formação como os de psicanálise(8).

Os artigos encontrados na literatura que abordam a posição do enfermeiro diante da criança autista, de forma geral, baseiam-se na atenção às suas reações ao se relacionar com outras pessoas e na transmissão de conhecimentos sobre o autismo aos pais e avaliar o grau de compreensão e o enfrentamento diante da patologia(2).

Ainda em relação aos estudos presentes na literatura, em um, pode-se observar uma proposta de plano de assistência para crianças autistas baseado nos diagnósticos de enfermagem, intervenções e prescrições de enfermagem(3).

A partir desses achados na literatura, comecei a refletir sobre a posição do enfermeiro, como agente terapêutico, prestando assistência a uma criança autista pautado em diagnósticos de enfermagem preestabelecidos. Seria essa a forma mais adequada de cuidar dela? Será que tal forma de assistência garante uma atenção pautada na singularidade da criança?

(17)

É importante ter em mente que os autistas têm dificuldade em estabelecer interação social, muitas vezes se sentindo perseguidos pela presença, olhar e voz das pessoas. Um exemplo destes fatos são quando as crianças tapam os ouvidos para não escutar a voz ou se fazem de surdas, não respondendo quando são chamadas. Outro exemplo é quando evitam o contato visual com as pessoas. Os autistas, de forma geral, não conseguem se separar da mãe, tendo uma relação simbiótica, como se estivessem fundidos ao corpo materno(10). Sendo assim, uma assistência padrão, na qual o contato entre enfermeiro e criança é estabelecido simplesmente pela fala tem grandes chances de não ser efetiva para os autistas, pois com estas crianças é necessário uma interação maior, tentando assim estabelecer um vínculo antes de se prestar assistência.

Cada criança é uma, mesmo que elas compartilhem do mesmo diagnóstico. Mas, infelizmente, com a padronização dos diagnósticos de enfermagem baseados em manuais de enfermagem psiquiátrica, essa singularidade pode não ser considerada no momento de estabelecer a relação terapêutica com o paciente(8).

É oportuno, então, contextualizar as práticas de enfermagem a partir do movimento da Reforma Psiquiátrica para localizar o novo lugar que o enfermeiro ocupa na assistência à saúde mental no país. As práticas de enfermagem eram pautadas no modelo asilar de cuidado, no qual as funções dos enfermeiros eram de vigilante e repressor. No contexto pós-reforma, houve um deslocamento do lugar ocupado por eles. Passaram a assumir a posição de agente terapêutico preocupados com a promoção da qualidade de vida e com a constituição de sujeitos responsáveis por suas escolhas(8,11).

Com a reforma psiquiátrica, houve uma substituição da institucionalização das pessoas em sofrimento psíquico grave, criando novos equipamentos para prestar assistência a elas(8,12). Os novos locais criados para substituir os hospitais psiquiátricos são os CAPS, as residências terapêuticas e os centros de convivência(11).

Esses novos equipamentos passam a dispor de equipe multiprofissionais para realizar o acompanhamento terapêutico (AT) das pessoas em sofrimento psíquico grave(13).

(18)

O AT é uma importante ferramenta no tratamento dessas pessoas em sofrimento psíquico grave que, por alguma razão, não conseguem lidar com seus afazeres do dia a dia(14). No Brasil, o AT surgiu no final da década de 1970, na mesma época em que se iniciavam as ideias da reforma psiquiátrica e surgiam as comunidades terapêuticas(15). Tem como principais características o setting ampliado, não ficando fixo a um local ou a hora pré - determinados, trabalho em equipe e diálogo com a família da pessoa em sofrimento psíquico grave(16-19).

A prática do AT foi disseminada no Brasil na mesma época da Reforma Psiquiátrica, favorecendo assim a inclusão dos enfermeiros como agentes terapêuticos, que podem fazer o uso do AT como um instrumento de trabalho, visando assim um cuidado menos uniforme as pessoas em sofrimento psíquico grave(15).

Existe uma preferência dos profissionais que realizam o AT pelo uso da teoria psicanalítica como alicerce para a sua realização(17-22).

Com a modificação da posição dos enfermeiros, após a reforma psiquiátrica, ocorreu necessidade de organizar um cuidado mais singular ao paciente, com a preocupação de estabelecer significados e novos laços para sua vida, e o referencial teórico da psicanálise tornou-se alternativa para sustentar essa proposta terapêutica(8).

Com isso, comecei a pensar na criança autista não só como portadora de uma patologia biológica e neurológica(3), despertando meu interesse em apreender a subjetividade da criança autista e, como o enfermeiro, poder prestar um cuidado de enfermagem pautado nessa singularidade.

Na procura de bibliografia sobre este assunto, constatou-se que a orientação psicanalítica traz contribuições para o tratamento da criança autista, pois, a partir da explicação da falha da função materna, foraclusão da metáfora do Nome do pai entre outros conceitos, tenta explicar os sintomas, como por exemplo a recusa de ouvir a fala do Outro e resistência a se despir causada pela ausência de bordas corporais(5,23-24).

A psicanálise surgiu com o propósito de elaboração do recalque que provém pela fala. Para que isso ocorra, é necessário o exercício do mecanismo que rege a linguagem, a condensação (metáfora que associa a semelhança ao sentido) e o deslocamento (metonímia que toma a parte como o todo do objeto). Na psicanálise, são

(19)

estudados os mecanismos de condensação e deslocamento, que se relacionam com a linguagem e os processos primários (inconsciente) e secundários (pré-consciente e consciente) do aparelho psíquico. A linguagem é condição do inconsciente, a existência de ambos está ligada um ao outro; não se consegue determinar qual surgiu primeiro

(25-26)

.

Lacan (1901-1981), na década de 1960, retoma os ensinamentos de Freud e afirma que “o inconsciente é estruturado como uma linguagem”(25)

. Ao realizar essa afirmação, Lacan está dizendo que o inconsciente funciona sob as mesmas regras da linguagem, porém, sua proposição inverte a ordem do algorítimo proposto por Saussure em seu curso de linguística geral. Assim, surge a proposição do algorítimo lacaniano

(25-26)

.

No algoritmo saussuriano, significado e significante formam um conjunto inseparável, um não existe sem o outro. Da relação entre significado e significante, nasce a significação, cujo valor será determinado pelo sistema de signos. Já no algoritmo lacaniano, da unidade do signo, o que torna a significação resistente é a existência de uma barra que separa significante do significado com a supremacia do significante sobre o significado. Assim, o significante permanece acima da barra, representado pela letra “S”, e o significado, abaixo da barra, representado pela letra “s”. Para Lacan (1901-1981), o significante no âmbito da psicanálise “é aquele que representa um sujeito para outro significante”(25). Essa conceituação pode ser abordada de três formas: pela relação entre sujeito e saber inconsciente; entre sujeito e castração e entre sujeito e lógica(25-26).

O sujeito do inconsciente é um efeito do significante e está ligado aos significantes que se dirigem ao Outro (que é o inconsciente)(25-26). Logo, ao considerar o nascimento de uma criança, também se deve considerar sua inscrição no nível significante, o que marcará sua existência. Essa marca denomina-se S1 e vem do

campo do Outro, que constitui a alienação fundamental. Após ser marcado pelo S1, a

criança será marcada pelo S2, que traz um sentido denominado saber, ou seja, a

fundação da criança, como sujeito, ocorre a partir de um significante sem qualquer sentido, representado pelo S1, e um significante que pretende ter sentido, S2. O sujeito

(20)

do inconsciente (S barrado) surge, pois nem S1 e S2 conseguem representá-lo de forma

integral(25).

Lacan (1901-1981) elaborou o “esquema” que é topológico para demonstrar a relação do sujeito do inconsciente (S) com o Outro (A), que é de fala virtual, na qual o sujeito do inconsciente (S) recebe do Outro(A) sua mensagem, sob a forma de palavra do inconsciente. Essa mensagem é interceptada pela relação imaginária, demonstrada pelo eixo a-a`, que é a relação entre o eu(a) e o outro(a`). O outro(a`), a princípio, está ligado ao Outro (A), sendo assim o Outro primordial que é a função materna. O eu(a) representa o bebê. Tanto outro(a`) e Outro(A) fornecem significantes para o eu(a). Do fornecimento de significantes de outro(a`) e Outro(A) para o eu(a), nasce o S1, assim

determina significados para eu(a). Há um rompimento entre outro(a`) e Outro(A) que levavam os significantes para eu(a), com isso Outro(A) vai para baixo no esquema, tornando-se o inconsciente, e surge o sujeito do inconsciente (S). Para que ocorra o rompimento entre outro(a`) e Outro(A), é necessário que ocorra a entrada do terceiro elemento, a função paterna(26-27).

Figura 1: Esquema grafado em Z de Lacan

Vale ressaltar que todos os distúrbios psiquiátricos que a criança possa vir a desenvolver tem sua origem na infância, que é o momento no qual ela irá se constituir como sujeito falante, por meio da inserção de significantes(28-29).

Diante disso, é de extrema importância, ao deparar-se com crianças com transtornos mentais, interrogar o sujeito e as condições nas quais ele se estruturou, levando em consideração a singularidade de cada um e sua relação com aqueles que ocuparam a função materna e paterna(5,23,30).

(21)

O inconsciente só se sabe como efeito, só é possível olhar sua formação após a mesma ter se completado. Cada sujeito irá se formar por meio dos significantes que lhe forem fornecidos, e a direção do tratamento deve levar em conta a criança e seus pais. Dessa forma, não basta apenas “tratar” a criança, é necessário também trabalhar com os pais, pois são eles que, ao ocupar a função materna e paterna, inserem os primeiros significantes na formação do sujeito que a criança se tornará(26).

Assim, a abordagem terapêutica inclui, além da criança, sua família, pois há uma ligação muito forte e indiferenciada entre a mãe e sua criança, no caso das crianças autistas(31).

A mãe é para a criança como o Outro primordial, deixa marcas no sujeito, pois ela interpreta as manifestações da criança desde o primeiro momento de vida, faz com que a mesma seja introduzida no circuito de demanda e no mundo. Para a criança autista, a função da mãe como estruturante não ocorre. Dessa maneira, existe uma falha na interpretação da criança(23).

Até o século XX, o autismo era incluído no quadro geral das psicoses infantis, mas já se estabelecia uma distinção entre a psicose autística e a psicose simbiótica. Na autística, a mãe não é percebida como um elemento externo à criança, assim não sendo investida libidinalmente. Já na simbiótica, a representação da mãe existe, mas está em fusão com o self, o que a aproxima da psicose infantil clássica(5).

A mãe, durante o exercício de sua função, ocupa para o bebê o lugar de Outro primordial, antecipa a existência subjetiva do mesmo. Essa tarefa é construída por um cotidiano de reconhecimento de pequenos gestos recíprocos. Como, por exemplo, escutar o choro do bebê sem que ninguém mais o tenha ouvido. Por parte do bebê, desde cedo, é possível observar o mesmo virar a cabeça em busca do rosto da mãe quando essa sai do seu campo de visão. Esse processo foi descrito por Lacan pelo estádio do espelho, que é o primeiro tempo na constituição do sujeito(5,32).

O estádio do espelho é a fase na qual a criança começará a se constituir enquanto sujeito. Essa fase pode ser dividida em três tempos. Primeiramente, ela reage como se a imagem que vê no espelho seja de outro. Após perceber que a imagem não é um objeto real, desiste de pegar o “outro” que está atrás do espelho e, por fim, a

(22)

criança reconhece sua própria imagem atrás do espelho. Todo o processo de identificação, conquista de identidade do sujeito será a base para as outras identificações ao longo de sua vida(25-26).

Quando a criança se identifica com seu duplo, a imagem perfeita e completa que não é ela, surge a alegria ao juntar a imagem ao seu corpo. A relação com o outro é alienante, pois a criança vê o seu próprio corpo como seu duplo(25).

Até o segundo tempo do estádio do espelho, a criança localiza seu próprio corpo, mas liga sua imagem ao desejo da mãe. Nesse momento, a criança ainda não entrou no mundo da linguagem; está ainda no campo do imaginário. No terceiro tempo do estádio do espelho, quando ocorre a integração da imagem ao próprio corpo, a criança parte para sua constituição como sujeito falante, da ordem simbólica(25).

Quando o estádio do espelho falha, surgem os primeiros sinais do autismo por volta dos seis meses de idade do bebê(5).

Todos os sujeitos começam a vida subjetiva no campo do Outro primordial. Para a criança autista, no início, há um significante (S1) que a representa no campo do Outro, mas o problema é que a partir desse primeiro significante, não surgirão outros. O Outro está fixo a um só significado, ficará sempre no mesmo local, no Outro absoluto, tornando-se não recortado e não simbolizado(33).

A criança, seja ela autista ou não, pode ocupar dois lugares distintos para o Outro. Uma posição sintomática ou de objeto, na qual a metáfora paterna não opera(23).

A metáfora paterna tem ligação com o Édipo descrito por Freud (1856-1939). Para ele, a relação edipiana é divida em três tempos. No primeiro, há ênfase na função materna, a criança pensa ser o objeto de desejo da mãe, o falo. No segundo, o pai (função paterna, não necessariamente o pai biológico da criança) intervém e priva a mãe e a criança do falo. Nesse momento, o pai tem o falo, a mãe não o tem mais, e a criança não é mais o falo. Esse tempo também é denominado metáfora paterna, que substitui o desejo da mãe pela criança pelo Nome-do-pai que produz significação fálica. Em um terceiro tempo, há a identificação com o pai e, nesse momento, opera-se a entrada, na ordem simbólica, da linguagem, onde existem necessariamente três

(23)

elementos, entre os quais o pai é o terceiro, que está entrando na relação mãe/ criança(23,25-26,30).

Em relação ao terceiro tempo de Édipo, a função paterna é a da palavra que significa a lei. A mãe deve reconhecer o rompimento dual com a criança, de forma que possa perceber o Nome-do-pai, o que permite assim a simbolização da falta. Com isso, há um corte no Outro primordial, a criança se distingue do falo e separa-se da mãe, aceitando assim a castração e adquirindo subjetividade(25-26).

Na relação mãe/criança autista, ocorre uma falha na inclusão da metáfora paterna e a criança passa a ser objeto da mãe e exposta a todas as capturas de sua fantasia. Com isso, a criança fica presa na estrutura fantasmática da mãe, como um objeto de gozo que não entrou na equação simbólica por falha de simbolização(23).

Dessa forma, a pesquisa a que me proponho realizar toma a psicanálise como referencial teórico que é uma abordagem que poderá dar respostas à minha indagação: como estabelecer a atuação do enfermeiro, como agente terapêutico, na assistência à criança autista?

(24)

2

(25)

2.1 Objetivo geral:

Discutir como o enfermeiro, ao assumir a posição de agente terapêutico, utilize o AT como instrumento para prestar assistência de enfermagem às crianças autistas à luz da psicanálise.

2.2 Objetivos específicos:

2.2.1 Mapear e sintetizar os temas emergentes da literatura sobre os conceitos de AT e suas implicações para prática clínica do enfermeiro na saúde mental.

2.2.2 Desenvolver uma proposta de cuidado de enfermagem por meio do AT considerando a apreensão da criança autista à luz da psicanálise.

(26)

3

(27)

Trata-se de um estudo teórico orientado pela abordagem qualitativa.

A pesquisa qualitativa tem aumentado significativamente no campo da saúde(34). Pode-se definir o método qualitativo como aquele que é indutivo, subjetivo, holístico, orientado por processos, usado para compreender, interpretar, descrever, desenvolver teorias relativas a um fenômeno(35).

Teoria, nessa definição, implica que o método qualitativo não é apenas um modo de pesquisa, ele tem como finalidade criar um modelo de ligações entre elementos, de abordar uma ordem invisível ao olhar comum(34).

O campo de estudo teórico tem origem nas práticas, não de forma espontânea, mas sim pela integração, reflexão e pesquisa(36). O estudo teórico é dedicado a estudar teorias, formular quadros de referências e a criar conceitos(37).

Sendo assim, este estudo teórico discutiu, a partir do seminário III e IV de Lacan, os conceitos do complexo de Édipo e seus efeitos para estruturação do sujeito, além de artigos que abordem o autismo pela psicanálise, para propor uma possibilidade de cuidado de enfermagem a uma criança autista(27,38).

Este estudo teórico se dividiu em duas fases.

A primeira etapa constituiu em conhecer os pressupostos teóricos do AT e estabelecer sua relação com a prática clínica do enfermeiro no campo da saúde mental, por meio da elaboração de uma metassíntese, que teve como objetivo mapear e sintetizar os temas emergentes da literatura sobre os conceitos de AT e suas implicações para prática clínica do enfermeiro na saúde mental.

Metassíntese qualitativa é um método de pesquisa rigoroso que permite decompor, comparar, integrar e transformar, por meio de síntese, os resultados dos estudos qualitativos primários(39).

Foi usada a metassíntese com fundamentação na metaetnografia proposta por Noblit e Hare(40), na qual são preconizados sete passos: 1.Começando; 2. Descrevendo o que é relevante para o interesse inicial; 3.Leitura dos estudos; 4.Determinar como os estudos estão relacionados; 5. Traduzindo os estudos em um outro; 6. Sintetizar as traduções; 7. Expressando a síntese(40-41).

(28)

Esta etapa originou o artigo “Metassíntese: acompanhamento terapêutico e as implicações para prática clínica de enfermeiros na saúde mental” que foi submetido à Revista Brasileira de Enfermagem.

A segunda etapa teve como objetivo desenvolver uma proposta de cuidado de enfermagem por meio do AT considerando a apreensão da criança autista à luz da psicanálise. Para isso, foi necessário apreender a estrutura de formação psíquica da criança para, depois, abordar o funcionamento psíquico da criança autista a partir do complexo de Édipo, que foi apreendido nas obras de Lacan(27,38), nos livros que abordam a constituição da psique infantil e nos artigos complementares, pesquisados em bases indexadas nacionais e internacionais. Nessa etapa, foi utilizado o método de leitura denominado atenção uniformemente flutuante(42-43), técnica utilizada, a princípio, para escuta clínica, porém, nesse caso, foi usada como forma de realizar a leitura clínica dos textos, não havendo um foco pré - determinado em nenhuma citação ou palavra, mas acolhendo todas as associações que o discurso escrito revelava.

De posse dos significantes que constituem a organização do complexo de Édipo na formação da psique da criança, foi reconhecida a etapa onde ocorre a falha no processo do complexo de Édipo que pode ter ocasionado o autismo na criança.

Com base nesse conhecimento, foram desenvolvidas três propostas de intervenções para clínica da enfermagem que estão descritas no artigo “Proposta de intervenções de enfermagem para crianças autistas e a organização do complexo de Édipo”, que está em fase de edição para posterior submissão.

(29)

4

(30)

4.1 – Apresentação

Os resultados e discussões foram separados em dois subitens que correspondem as duas etapas propostas no método.

Primeiramente foi realizada a metassíntese para abordar o que é o AT e suas implicações para a prática clínica de enfermeiros na saúde mental, gerando assim o artigo “Metassíntese: acompanhamento terapêutico e as implicações para prática clínica de enfermeiros na saúde mental”, contido no subitem 4.2

Após ter conhecimento das implicações que o AT pode ter para a prática clínica dos enfermeiros, foi realizado um estudo teórico para traçar uma forma de cuidado de enfermagem às crianças autistas, na qual o enfermeiro tendo conhecimento de como ocorre a organização do complexo de Édipo, possa usar o AT como instrumento de trabalho. Esta etapa gerou o artigo “ Proposta de intervenções de enfermagem para a criança autista e a organização do complexo de Édipo”, contido no subitem 4.3.

(31)

4.2-Metassíntese: acompanhamento terapêutico e as implicações para prática clínica de enfermeiros na saúde mental1

Resumo: Este estudo consiste em uma metassíntese que tem como objetivo mapear e sintetizar os temas emergentes da literatura sobre os conceitos de acompanhamento terapêutico e suas implicações para prática clínica do enfermeiro na saúde mental. Metassíntese é um método de pesquisa rigoroso, que permite decompor, comparar, integrar e transformar, através de síntese, os resultados dos estudos qualitativos primários. A amostra final foi composta por sete artigos. Foram extraídos seis metáforas/temas destes estudos primários. Constataram-se semelhanças entre a função desempenhada pelo acompanhamento terapêutico e a posição de agente terapêutico que o enfermeiro assume após a reforma psiquiátrica. Sendo assim, o acompanhamento terapêutico pode trazer implicações benéficas para a prática clínica do enfermeiro na saúde mental.

Palavras-chave: Acompanhamento Terapêutico; Enfermagem; Psicanálise, Saúde Mental; Enfermeiros.

Meta-synthesis: therapeutic accompaniment and its implications for clinical practice of nurses in mental health

Abstract: This study consists of a meta-synthesis that aims on mapping and synthesizing emerging themes of the literature on concepts of therapeutic accompaniment and their implications for clinical practice of nurses in mental health. Meta-synthesis is a method of rigorous study, which allows decomposing, comparing, integrating and transforming, by synthesizing, the results of primary qualitative studies. The final sample was composed of seven articles. Six metaphors/themes studies were extracted from these primary studies. It was discovered then similarities in function performed by therapeutic accompaniment and the therapeutic position that the nurse takes after psychiatric reform. Therefore, therapeutic accompaniment can bring beneficial implications for clinical practice of nurses in mental health.

Keywords: Therapeutic Accompaniment; Nursing; Psychoanalysis; Mental Health; Nurses.

(32)

Metasíntesis: acompañamiento terapéutico y sus implicaciones para la práctica clínica de las enfermeras en salud mental

Resumen: Este estudio consiste en un meta- síntesis que pretende trazar un mapa y sintetizar los temas emergentes de la literatura sobre los conceptos de acompañamiento terapéutico y las implicaciones de la práctica clínica de las enfermeras en la salud mental. Metasíntesis es un método de estudio riguroso, que permite romper, comparar, integrar y transformar, mediante la síntesis, los resultados de estudios cualitativos primarios. La muestra final estuvo compuesta por siete artículos. Se extrajeron seis metáforas/themes de estos estudios primarios. Se descubrió similitudes entre la función desempeñada por el acompañamiento terapéutico y el papel de agente terapéutico que la enfermera realiza después de la reforma psiquiátrica. Por lo tanto, el acompañamiento terapéutico puede traer consecuencias beneficiosas para la práctica clínica de las enfermeras en la salud mental.

Palablas-clave: Acompañamiento Terapéutico; Enfermería; Psicoanálisis; Salud Mental; Enfermeras.

Introdução

A reforma psiquiátrica provocou transformação no modelo de assistência em saúde mental e início da construção de um novo estatuto, cuja pessoa em sofrimento psíquico grave passou a ser considerada cidadã, sendo consentida como sujeito no próprio tratamento, e não mais objeto de intervenção exclusivo do médico (Dias & Aranha e Silva, 2010).

No Brasil, até a década de 1970, a Psiquiatria desempenhava o papel de controle dos sujeitos que apresentavam comportamentos vistos como não aceitáveis pela sociedade. Com isso, as pessoas em sofrimento psíquico grave eram marginalizadas e excluídas do convívio social, permanecendo reclusas em hospitais denominados manicômios. Deste modo, a Psiquiatria não considerava o paciente como sujeito ativo no tratamento, não envolvia as famílias e não valorizava a história e cultura deste (Andrade & Pedrão, 2005).

No início da década de 1980, emergiu o movimento da Reforma Psiquiátrica no Brasil, cujo objetivo foi modificar o sistema de tratamento das pessoas em sofrimento

(33)

psíquico grave, substituindo parcialmente o modelo hospitalar, no qual a internação, muitas vezes, era vista como forma de exclusão social, por equipamentos de atenção psicossocial, cujo objetivo era a integração da pessoa em sofrimento psíquico grave ao convívio social e o resgate da cidadania (Andrade & Pedrão, 2005; Kirschbaum, 2000; Calgaro & Souza, 2009; Queiroz & Delamuta, 2011).

Esses equipamentos, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), passaram a dispor de equipes multiprofissionais em uma perspectiva interdisciplinar para o acompanhamento terapêutico (AT) (Dias & Aranha e Silva, 2010).

Os CAPS são serviços da Rede de Atenção Psicossocial abertos destinados a oferecer acolhimento à pessoas com transtornos mentais, realizam o seguimento clínico e a reabilitação social dos usuários pela promoção ao trabalho, ao lazer, o exercício dos direitos civis e o fortalecimento dos laços familiares e comunitários. A equipe de profissionais do CAPS se propõe a fortalecer os usuários e familiares na busca da independência e responsabilização para com seu tratamento (Ministério da Saúde, 2004).

As ações desenvolvidas pelas equipes multiprofissionais podem transcender os espaços destes centros, permitindo criar uma rede de suporte social, ampliando sua abrangência, valorizando a história, a cultura e a vida diária do indivíduo.

Neste contexto, o enfermeiro deixa de exercer a assistência de enfermagem como antes da reforma psiquiátrica que se assemelhava ao auxiliar psiquiátrico dentro das comunidades terapêuticas na década de 1970, isto é, de proteção, contenção e vigilância, e passa a se preocupar com fatores psicossociais, perpassando os aspectos orgânicos da doença e voltando-se ao relacionamento com a pessoa em sofrimento psíquico grave (Damásio, Melo, & Esteves, 2008; Paravidini & Alvarenga, 2008).

Desse modo, as atividades desenvolvidas por enfermeiros que estimulavam a independência no dia a dia não eram mais vistas como banais e passaram a ser valorizadas como de extrema importância no tratamento da pessoa em sofrimento psíquico grave, bem como para prática assistencial voltada à valorização da subjetividade, da autoestima, da autonomia e da cidadania. Esta prática permite estabelecer um relacionamento terapêutico com o paciente, baseando-se na escuta e

(34)

no diálogo para construção do tratamento. Esse posicionamento auxilia na formação do vínculo com o paciente, contribuindo, assim, para reinserção social dos acometidos por algum sofrimento mental (Damásio et al., 2008).

Importante ferramenta na atenção a pacientes psicóticos ou em sofrimento psíquico grave é a modalidade denominada AT, recurso de atendimento que permite o tratamento destes pacientes ou de pessoas que por algum motivo não conseguem lidar com condições básicas da vida, como organizar pertences, programar passeios, estudar, trabalhar, ou seja, que apresentam dificuldades de inserção social (Barreto, 1997).

O AT surgiu no Brasil no final dos anos de 1970, na mesma época que se dava início à Reforma Psiquiátrica e às comunidades terapêuticas brasileiras (Kirschbaum & Rosa, 2003). Neste período, percebeu-se que o sistema de segregação não era o mais adequado e, diante disso, iniciaram-se pesquisas sobre novas alternativas para o acompanhamento efetivo dos pacientes (Araújo, 2005).

Ao final dos anos de 1970 e início dos anos de 1980, o auxiliar psiquiátrico passou a acompanhar a pessoa em sofrimento psíquico agudo, tal função foi se modificando, na medida em que começou a sair da instituição. A construção do vínculo entre acompanhante e acompanhado tornou-se valorizada, e a função deste profissional denominou-se de amigo qualificado (Kirschbaum & Rosa, 2003).

A denominação amigo qualificado foi pouco utilizada, pois acentuava o caráter amistoso do vínculo com o paciente, não marcando a função terapêutica ou clínica da prática (Araújo,2005; Paravidini & Alvarenga, 2008). Com a necessidade de se agregar à prática uma dimensão teórica, o amigo qualificado converteu-se em acompanhante terapêutico (Kirschbaum & Rosa, 2003).

O AT é desenvolvido por profissionais com diferentes perfis ao longo de sua história (Simões & Kirschubaum, 2005). De leigos a profissionais com formação universitária, como psicólogos, assistentes sociais e terapeutas em geral, perpassando inclusive pelos auxiliares de enfermagem (Guerra & Milagres, 2005) e enfermeiros (Vilela, Silva & Oliveira, 2010).

(35)

A atuação do acompanhante terapêutico ocorre além da palavra, pelo ato, pela intervenção no plano concreto, em que as experiências de vida de pessoas em sofrimento psíquico grave podem ser revividas de forma diferente (Kirschbaum & Rosa, 2003).

Portanto, vivencia com o acompanhado a tentativa de descobrir o mundo nas suas particularidades (Maia & Pirim, 1997). Pode ser descrito como um tratamento realizado em movimento (Carniel & Pedrão, 2010; Reis Neto, Pinto, & Oliveira, 2011; Simões & Kirschbaum, 2005). Caracteriza-se por ter um setting ampliado, não se restringindo a consultórios, com um horário fixo, pode ocorrer na rua, na casa do paciente e nos horários que forem solicitados para proporcionar a interação entre a pessoa em sofrimento psíquico grave e a sociedade, pode assim levá-los a experimentar situações novas ou a ressignificação de experiências já vividas (Kirschbaum & Rosa, 2003).

A visão e atuação do enfermeiro mesmo após a reforma psiquiátrica não se modificou completamente. Ainda persiste a ideia de cuidado ligada à transmissão de informações e conhecimento, visando à mudança de atitude dos sujeitos. Sob esta ótica o enfermeiro assume o papel de emissor de informações e a pessoa em sofrimento psíquico grave de receptor (Almeida, Feitosa, Boesmans, & Silveira, 2014).

A enfermagem psiquiátrica atuou por muito tempo com a preocupação em acolher a pessoa em sofrimento psíquico grave com garantias, ou seja, prover um leito para o paciente repousar, alimentos, vestimentas e medicamentos. Essas garantias são importantes, pois asseguram o bem-estar da pessoa em sofrimento psíquico grave, contudo o enfermeiro não deve se restringir apenas a esses cuidados, pois a enfermagem pode ir além e oferecer de fato um tratamento psiquiátrico (Loyola & Rocha, 2000).

Atualmente, pode-se falar em transcender o acolhimento com garantias, por meio de novos efeitos terapêuticos que se denomina de clínica de enfermagem. A clínica fundamenta-se nas informações sobre a pessoa em sofrimento psíquico grave coletadas durante a atuação do enfermeiro (Marques, Toledo, & Garcia, 2012). Segundo Lima et al.(2014), para que se consiga transcender a prática clínica que

(36)

responde às necessidades humanas básicas, é preciso que se articule o reconhecimento da singularidade da história de vida de cada indivíduo. Assim, é de extrema importância qualificar a escuta que os enfermeiros fazem do paciente, ouvir o que se dizem relação a si e como se sente. Logo, a escuta passa a ser uma estratégia para que o cuidado clínico em enfermagem se desenvolva (Almeida et al., 2014).

Neste novo contexto, o enfermeiro na saúde mental passa a atuar como agente terapêutico, deslocando-se da antiga posição que ocupava no modelo manicomial, de repressores e vigias, possibilitando, assim, cuidado mais humanizado às pessoas em sofrimento psíquico grave (Kirschbaum & Rosa, 2003).

Outra estratégia de cuidado é envolver a família e a comunidade no tratamento do paciente, ampliando o espectro de ações, com atividades extramuros (Loyola & Rocha, 2000; Vieira, Silveira, Silva, Rodrigues, & Martins, 2014). Tal estratégia relaciona-se com as principais características do AT, que são o setting ampliado, o trabalho em equipe e o diálogo com a família do paciente que o recebe (Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010).

Segundo Damásio et al.(2008), o enfermeiro após a reforma psiquiátrica começa a se preocupar com os fatores psicossociais, além dos orgânicos, da pessoa em sofrimento psíquico grave e também com o relacionamento desta com família. Assim, encontra-se uma confluência da prática do AT e do enfermeiro, que oferecem oportunidades de estruturar uma prática clínica, ao se relacionar com a pessoa em sofrimento psíquico grave e a família desta, tendo uma proposta de reinserção social da mesma (Marco & Calais, 2012).

Diante do exposto, este estudo objetivou mapear e sintetizar os temas emergentes da literatura sobre os conceitos de AT e suas implicações para prática clínica do enfermeiro na saúde mental.

Método

Este estudo consistiu em uma metassíntese qualitativa, método de pesquisa rigoroso, o qual permite decompor, comparar, integrar e transformar, por meio de síntese os resultados de estudos qualitativos primários (Zoboli & Schveitzer, 2013).

(37)

Foi usada a metassíntese com fundamentação na meta-etnografia, que consiste na síntese dos dados de pesquisas interpretativas. Para preservar as características do estudo qualitativo, a meta-etnografia envolve a tradução dos estudos primários em outro estudo, chamado secundário (Noblit & Hare, 1988).

Segundo Atkins et al.(2008), a metassíntese com base na meta-etonografia tem sido muito usada na área da saúde para sintetizar estudos qualitativos e desenvolver modelos que interpretam os resultados de múltiplos estudos.

A metassíntese com base na meta-etnografia foi proposta por Noblit e Hare como alternativa à meta-análise (Barnett-Page & Thomas, 2009). A metassíntese difere-se da meta-análidifere-se, pois tem como objetivo interpretar os dados obtidos nos estudos primários, enquanto a meta-análise objetiva a agregação dos dados em forma de índices numéricos (Espíndola & Blay, 2006).

A meta-etnografia, proposta originalmente em 1988, sofreu algumas adaptações nas suas sete fases, sendo assim, neste estudo, foram utilizadas as seguintes fases (Atkins et al., 2008; Noblit & Hare, 1988):

1.Começar com: a elaboração de uma pergunta para dar início à pesquisa e

que possa ser respondida por estudos qualitativos, sendo esta: qual o conceito de AT e suas implicações para prática clínica do enfermeiro na área de saúde mental apontados pela literatura?

2.Descrever o que é relevante para o interesse inicial: pode ser divida em

quatro fases. Em 1ª lugar, deve-se definir o foco da síntese, que, neste caso, foi levantar os principais conceitos de AT e a sua prática clínica junto aos pacientes com transtornos mentais. A 2ª fase foi localizar os estudos relevantes, que nesta metassíntese foram obtidos a partir da busca na base de dados Bireme e Cinhal, utilizando duas combinações de palavras-chave, acompanhamento terapêutico e saúde mental ou acompanhamento terapêutico e psicanálise. Também foram inseridos outros dois estudos relevantes que não constaram na busca realizada com as palavras-chave nas duas bases de dados. A definição dos critérios de inclusão pertence a 3ª fase, que neste estudo foram: ser um artigo científico, os estudos apresentarem um conceito sobre AT, caracterização, como é a prática clínica e não ser estudo de caso. E,

(38)

finalmente, a última fase, a avaliação dos estudos, realizada com base no comprimento dos objetivos propostos.

3.Leitura dos estudos: realizou-se a leitura dos estudos, com a finalidade

de familiarizar-se com os temas e começar a extrair as metáforas/temas emergentes; os estudos foram lidos e relidos cuidadosamente para extração das principais metáforas/temas emergentes em cada um deles.

4.Determinar como os estudos estão relacionados: criação de um quadro

com as metáforas/temas emergentes dos estudos e determinação de como eles se relacionam.

5.Traduzindo os estudos em outro: comparar as metáforas/temas e

conceitos de um estudo com metáforas/temas e conceitos de outro estudo.

6.Sintetizar as traduções: sumarizar os dados achados, buscando a

integração.

7.Expressando a síntese: documentar as interpretações provenientes da

síntese dos dados obtidos por meio dos estudos primários, gerando, assim, os resultados da pesquisa secundária (metassíntese) (Atkins et al.,2008; Noblit & Hare, 1988).

Resultados

Após leitura criteriosa de artigos publicados entre os anos de 2005 e 2011, respeitando os critérios de inclusão foram selecionados sete trabalhos.

As seis metáforas/temas estão organizadas nos Quadros 1 e 2. As metáforas/temas emergentes são de importância para o trabalho da enfermagem, pois relatam história, evolução, pessoas que realizam o AT, quem pode se beneficiar com este trabalho, os conceitos e a fundamentação teórica.

Ressalta-se que a enfermagem em saúde mental, assim como o AT, sofreu mudanças ao longo dos anos, uma vez que o enfermeiro ao se desfazer das tradições protocolares permite aquisições necessárias aos profissionais de saúde mental no contexto da Reforma Psiquiátrica e na atenção psicossocial.

Assim, o enfermeiro ao apoderar-se desse conhecimento, é capaz de perceber semelhanças entre a sua função como agente terapêutico e o trabalho

(39)

desenvolvido pelo AT.

Diante disso, justifica-se a escolha pelas metáforas/temas “História do surgimento do AT” e “Nomenclaturas utilizadas” como importantes para os enfermeiros, pois o conhecimento dos marcos teóricos e históricos do desenvolvimento da enfermagem e do AT demonstram algumas confluências, como ambos serem agentes terapêuticos (Calgaro & Souza, 2009; Damásio et al., 2008; Estellita-Lins, Oliveira, & Coutinho, 2009; Kirschbaum & Rosa, 2003; Oliveira & Alessi, 2003; Pitiá & Furegato, 2009).Notou-se também que tanto a função de enfermeiro como a de acompanhante terapêutico eram desempenhadas por pessoas leigas no passado (Nogueira, 2009; Oliveira & Alessi, 2003; Paravidini & Alvarenga, 2008; Reis Neto et al., 2011; Simões e Kirschubaum, 2005).

A escolha por definir as diferentes nomenclaturas pode indicar a mudança de posição que a prática do AT foi adquirindo articuladas ao contexto histórico de sua época.

1. História do surgimento do AT

Observou-se concordância entre os artigos analisados quanto ao início da prática do AT como um recurso no atendimento a pacientes com sofrimento mental. Segundo Araújo (2005), o AT nasceu no contexto dos movimentos da psiquiatria democrática e da antipsiquiatria.

Entre 1950 e 1970 ocorreram os movimentos reformistas em algumas partes do mundo, como Itália, França, Inglaterra (Paravidini & Alvarenga, 2008). A partir destes movimentos, surgiram as comunidades terapêuticas, que no Brasil iniciaram-se no Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre (Vilela et al., 2010). Nelas, o trabalho do acompanhante terapêutico já estava presente (Araújo, 2005; Guerra & Milagres, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Vilela et al., 2010).

A atividade de AT no Brasil ocorreu a partir dos anos de 1960, após as manifestações da Reforma Psiquiátrica na Europa Ocidental e nos Estados Unidos da América (Simões e Kirschbaum, 2005).

(40)

Pode-se afirmar que o contexto no qual o AT se iniciou foi basicamente o mesmo em todos os artigos, ou seja, após os movimentos reformistas, se consolidando no Brasil com esta nomenclatura após a Reforma Psiquiátrica e como alternativa para internação das pessoas em sofrimento psíquico grave nos antigos manicômios (Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005).

O AT era praticado nas comunidades terapêuticas que sofreram influência estrutural do modelo americano. Com o passar do tempo, começou a ser realizado também fora destas (Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Vilela et al., 2010).

Nos artigos pesquisados, pode-se levantar a hipótese interpretativa que o AT surgiu concomitantemente na Europa Ocidental, nos Estados Unidos (Simões & Kirschbaum, 2005) e na América Latina (Araújo, 2005; Guerra & Milagres, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Vilela et al., 2010).

O surgimento nesses diferentes locais pode ter ocorrido por necessidades peculiares, com características específicas. Contudo, apresentam a mesma essência, ou seja, a contestação ao enclausuramento da loucura e a tentativa de desistitucionalizar o louco e a loucura (Araújo, 2005).

2. Nomenclaturas utilizadas

Notou-se que a nomenclatura utilizada para prática do cuidado à pessoa em sofrimento psíquico grave foi sendo alterada no decorrer do tempo.

Uma das primeiras nomenclaturas foi de “atendente psiquiátrico” utilizada na Clínica Pinel, Porto Alegre (Brasil) na década de 1960. Sua função era prestar cuidados à pessoa em sofrimento psíquico grave dentro do hospital e quando necessário, em atividades externas ao hospital (Nogueira, 2009; Simões & Kirschbaum, 2005).

Substituída posteriormente por “auxiliar psiquiátrico” na Clínica Vila Pinheiros, Rio de Janeiro (Brasil), esta denominação era utilizada também nos hospitais sob a orientação médica na década de 1960 e eram exercidas pelos auxiliares de enfermagem. Porém, não existia embasamento teórico que orientasse o trabalho do auxiliar psiquiátrico dentro dos hospitais (Guerra e Milagre, 2005; Paravidini &

(41)

Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010).

O termo “amigo qualificado” apareceu pela primeira vez em uma comunidade terapêutica na Argentina e foi utilizado por um curto período (Araújo, 2005). Sua função consistia em acompanhar nas atividades sociais como ir ao cinema, parques, colocando-se junto da pessoa em sofrimento psíquico grave para que se sentissem menos sozinhas (Vilela et al., 2010). Esta denominação acentuava o caráter amistoso da relação, o que tornou o termo questionável por não indicar sua função clínica e terapêutica (Araújo, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Reis Neto et al.,2011; Simões & Kirschbaum, 2005).

Com o movimento da Reforma Psiquiátrica já estabelecido nos anos 1990, a denominação AT se consolidou e é utilizada até hoje (Araújo, 2005; Guerra & Milagres, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010). Tal mudança de denominação propõe facilitar a inclusão social da pessoa em sofrimento psíquico grave, viabilizar novas formas dela estar no mundo (Simões & Kirschbaum, 2005). A ação terapêutica é de não limitar o atendimento aos horários do hospital-dia e valorizar a participação familiar no tratamento (Nogueira, 2009).

Com o auxílio do AT, a pessoa pode gradualmente retomar os laços sociais que havia perdido, ou até mesmo, criá-los com as pessoas a sua volta, construindo mecanismos de convivência produtiva e integrada da pessoa em sofrimento psíquico grave na sociedade (Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010).

As quatro metáforas/temas a seguir são justificadas para que o enfermeiro possa desenvolver o AT, pois este conhecimento foi estabelecido em um contexto histórico e pode sustentar a clínica de enfermagem.

No contexto histórico da Reforma Psiquiátrica, o enfermeiro foi assumindo a posição de agente terapêutico, no qual começa a se preocupar com um cuidado mais singular, além dos aspectos orgânicos do paciente (Kirschbaum & Rosa, 2003), desta forma, amplia o horizonte de trabalho (Almeida et al., 2014; Damásio et al., 2008). Para

(42)

que o enfermeiro seja um agente terapêutico, a clínica deve estar presente (Vieira, Silveira, & Franco, 2011). A perspectiva da clínica no campo da enfermagem refere-se ao atendimento prestado pelos acompanhantes terapêuticos. Em ambos são realizadas atividades que priorizam alcançar os objetivos terapêuticos propostos, como a inclusão da pessoa em sofrimento psíquico grave na sociedade (Pitiá & Furegato, 2009), ocorrendo, assim, confluência entre a prática do enfermeiro como agente terapêutico e o AT.

3. Profissionais que realizam o AT

O perfil das pessoas que realizam o AT sofreu reestruturação ao longo dos anos, de acordo com a mudança da nomenclatura. Quando se usava a denominação de atendente psiquiátrico, era realizado por estudantes de medicina e leigos (Nogueira, 2009; Simões e Kirschubaum, 2005).

Os auxiliares psiquiátricos eram estudantes de psicologia, medicina, auxiliares de enfermagem ou enfermeiros (Guerra & Milagres, 2005; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschubaum, 2005; Vilela et al., 2010). Ressalta-se ainda que nas comunidades terapêuticas, o AT era realizado por estudantes (Araújo, 2005).

Atualmente, a maioria dos profissionais que exerce o AT está ligada à área da saúde mental, sendo grande parte psicólogos vinculados à psicanálise e estudantes de psicologia (Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschubaum, 2005).

Cabe destacar a necessidade de formação especifica do profissional para exercer o papel de at, sendo necessário que ocorra a supervisão analítica e pessoal do profissional que realiza este tipo de trabalho (Simões & Kirschubaum, 2005). O AT não causa efeitos somente no acompanhado, mas também no acompanhante terapêutico, que muitas vezes demonstra desejo de proporcionar à pessoa em sofrimento psíquico grave o direito de circular livremente por diversos espaços, o que nem sempre é possível. Desta forma, o acompanhante terapêutico se depara com a especificidade de cada caso e, concomitantemente, com as suas limitações como sujeito e profissional (Nogueira, 2009).

(43)

4. A quem se destina o AT

O AT pode ser benéfico para diversos pacientes, mas, de forma geral, é recomendado às pessoas em sofrimento psíquico grave que apresentam dificuldade de estabelecer laços e não conseguem manter vínculos sociais (Nogueira, 2009). Pode ser usado no tratamento de pacientes psicóticos, delirantes, deprimidos, esquizofrênicos e autistas (Araújo, 2005; Guerra & Milagres, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010). Até a década de 1960, o AT era uma ferramenta de tratamento somente para adultos psicóticos. A partir de 1980, passou também a ocorrer com crianças, adolescentes e outras pessoas com condições de saúde incapacitantes (Simões & Kirschbaum, 2005).

5. Características e definições do AT

Na prática do AT, qualquer ideal de neutralidade é colocada fora de cena, o que afeta a dinâmica das relações (Araújo, 2005). Sabe-se que o AT deriva da saúde mental e esta, por sua vez, da “loucura” (Paravidini & Alvarenga, 2008). Assim, é função do AT levar a pessoa em sofrimento psíquico grave a ter contato direto com a sociedade (Araújo, 2005).

O AT é uma clínica nômade que ocorre no cotidiano em diferentes espaços. São desenvolvidas atividades com a pessoa em sofrimento psíquico grave, com a família e equipe responsável pelo cuidado (Paravidini & Alvarenga, 2008).

O AT sendo uma clínica nômade possui um setting ampliado, o que envolve saídas para as ruas, não ter um local específico, com hora marcada para ocorrer. O tratamento é realizado em movimento e por uma equipe de profissionais, na qual participam mais de um acompanhante terapêutico e outros profissionais da área da saúde. Uma característica deste atendimento é a ligação do profissional com a família do paciente, pois é necessário que ocorra diálogo para que a terapêutica funcione da melhor forma possível (Guerra & Milagres, 2005; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011;Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010).

O fato do AT ser realizado em um setting ampliado favorece a fala espontânea do acompanhado, pois ela não é diretamente evocada, portanto, o

(44)

profissional assume grande responsabilidade, pois muitas vezes, é necessário tomar atitudes diante da demanda do paciente, cuja finalidade é construir uma elaboração simbólica. É importante que a pessoa em sofrimento psíquico grave possa verbalizar ideias, sentimentos, que talvez não relatasse em um atendimento dentro de um consultório. Com isso, o AT não faz uso de contenção física, mas simbólica, que é o uso da palavra “não” para impor limites em determinadas situações vivenciadas entre ele e o acompanhado (Reis Neto et al., 2011).

O acompanhante terapêutico nunca trabalha sozinho, sempre em equipe e com auxílio da rede terapêutica, que é constituída por todos os conhecidos do acompanhado (Nogueira, 2009).

Destaca-se que ele não trabalha somente com a pessoa em sofrimento psíquico grave, mas também com a família e círculo social mais próximo (Guerra & Milagres, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005). Tal relação contribui positivamente para evolução do tratamento do acompanhado (Nogueira, 2009).

6. Fundamentação teórica

Existe consenso entre os artigos sobre pouca ou inexistente de fundamentação teórica, havendo inclinação para o uso da teoria psicanalítica (Araújo, 2005; Guerra & Milagres, 2005; Paravidini & Alvarenga, 2008; Nogueira, 2009; Reis Neto et al., 2011; Simões & Kirschbaum, 2005; Vilela et al., 2010).

Reis Neto et al. (2011) demonstraram a preocupação do AT se basear no modelo psicanalítico, com ênfase na escuta, nos diálogos e menos importância ao deslocamento pelo espaço público. A prática do AT pode estar pautada no campo da psicanálise, porém o profissional deve sempre lembrar que esta clínica se atém à singularidade de cada paciente (Nogueira, 2009).

Em conformidade com Paravidini e Alvarenga (2008), a clínica do AT utiliza as teorias nascidas dos saberes “psis” (psicanálise, psiquiatria e psicologia). O AT pode ter fundamentação teórica na psicanálise, na fenomenologia, na teoria sistêmica, no psicodrama, na análise institucional, na esquizoanálise e na gestalt.

(45)

Outro estudo refere que o AT realiza atividades práticas baseadas no campo da psicanálise, com referenciais lacanianos, winnicottiano e bioniano (Simões & Kirschbaum, 2005).

Discussão

Diante das metáforas/temas obtidas e sintetizadas nos resultados, alcançou-se a síntealcançou-se interpretativa sobre os conceitos do AT e as implicações para a prática clínica do enfermeiro na saúde mental, baseados na literatura.

Assim como a nomenclatura e as funções do AT se modificaram ao longo dos anos, a posição ocupada pelo enfermeiro também se alterou após a Reforma Psiquiátrica.

A enfermagem obteve sua prática estruturada ao longo de sua história, sendo construída por diferentes formas de cuidar, que foram determinadas pelas relações sociais presentes em cada momento histórico. A enfermagem psiquiátrica nasceu nos hospícios e os enfermeiros tinham sua formação orientada pelos médicos. O modelo de trabalho utilizado pela Enfermagem em vários países nos séculos 19 e 20, inspirado nas premissas de Florence Nightingale, não era usado para formação destes enfermeiros psiquiátricos no Brasil (Oliveira & Alessi, 2003).

Com a Reforma Psiquiátrica, a posição do enfermeiro evoluiu gradativamente de uma postura vigilante e repressiva, centrada somente nas necessidades físicas dos pacientes, para uma postura que aos poucos foi incorporando a abordagem social e psicológica, e passou a valorizar o relacionamento terapêutico com o paciente (Damásio et al., 2008).Desta forma, a prática do AT, que foi disseminada nessa mesma época, pode contribuir para inclusão dos trabalhadores de enfermagem como agentes terapêuticos, trazendo a possibilidade de oferecer atenção mais singular aos pacientes e cuidado menos uniforme (Kirschbaum & Rosa, 2003).Assim, o enfermeiro ao assumir a função de agente terapêutico, pode ampliar o horizonte de trabalho para além dos cuidados tradicionais de enfermagem e ações burocráticas, como o preenchimento de fichas com informações clínicas da doença do paciente. O cuidado de enfermagem pode ser visto como um campo pautado além das intervenções que se baseiam somente no caráter instrumental (Almeida et al., 2014; Damásio et al., 2008).

Referências

Documentos relacionados

In this work, TiO2 nanoparticles were dispersed and stabilized in water using a novel type of dispersant based on tailor-made amphiphilic block copolymers of

Em março de 2009, a subsidiária Quilmes Industrial (Quinsa) Société Anonyme adquiriu, junto à SAB Miller plc, 100% do capital social da Bebidas y Aguas Gaseosas Occidente

Os testes de desequilíbrio de resistência DC dentro de um par e de desequilíbrio de resistência DC entre pares se tornarão uma preocupação ainda maior à medida que mais

Isso será feito sob o ponto de vista dos conceitos apresentados pelo físico Serge Nahon, em “ Contribuição ao Estudo das Ondas de Formas a Partir da Mumificação

Nessa situação temos claramente a relação de tecnovívio apresentado por Dubatti (2012) operando, visto que nessa experiência ambos os atores tra- çam um diálogo que não se dá

Um dos FH permanece na sala de trabalho, onde realiza várias tarefas: a validação das prescrições médicas informatizadas e manuais; a impressão dos mapas de

A partir deste momento é dada indicação para a seleção da população em estudo e é ativado o envio da medicação pelo promotor, ficando o FH da Unidade de

Especificamente: trazer um resgate acerca de como surgiram e os existentes na atualidade; fazer uma breve análise histórica dos consórcios no Estado e um levantamento das