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Influência política da Economia Ecológica na União Europeia com aplicação ao mercado de carbono

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INFLUÊNCIA POLÍTICA DA ECONOMIA ECOLÓGICA NA UNIÃO

EUROPEIA COM APLICAÇÃO AO MERCADO DE CARBONO

Jorge Pedro Lourenço Gonçalves

Dissertação

Mestrado em Economia e Gestão do Ambiente

Orientado por Manuel Luís Costa

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Agradecimentos

Ao Professor Manuel Luís Costa, por ter aceite este desafio e por ter sido absolutamente inexcedível na sua dedicação ao estudo destes assuntos e no apoio que me deu ao longo de todo o trabalho. Ensinou-me muito sobre economia, e a sua sabedoria deu-me uma perspetiva mais alargada de questões muito complexas. Agradeço também à Professora Cristina Chaves, por me ter colocado em contacto com o Professor.

Aos meus pais, por serem um apoio incondicional e me darem mais uma oportunidade para continuar a aprender, agora noutro campo. À minha avó e ao meu irmão, que de longe continuam a torcer pelo meu sucesso.

Aos meus amigos de longa data, engenheiros, voluntários e comediantes por me ajudarem neste caminho de economicismo ambiental.

Ao Eduardo, ao Carlos e ao Daniel, por me terem aturado tantas vezes à saída de aulas terminadas a horas em que já se pensa em pousar a cabeça na almofada.

Ao Guilherme, por ter sido pioneiro em percorrer um caminho audaz, que me fez ver que é possível expandir horizontes se arriscarmos.

À Maria, que segundo ouvi de fontes confiáveis, é uma rapariga impecável com que se pode contar todos os dias, e que me transmite uma inteligência, curiosidade e empatia que dão ainda mais vontade de viver.

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Resumo

O objetivo desta dissertação é analisar a influência política das ideias da economia ecológica (EE) na União Europeia (UE) enquanto comunidade. A influência da EE tem-se cingido largamente à área académica, existindo poucos trabalhos que analisam o impacto político das suas ideias. Assim, esta investigação pretende preencher uma pequena parte desta lacuna.

A metodologia do trabalho é inspirada no modelo conceptual sustentado por abordagens da ciência política que Boezeman et al. (2010) aplicaram para avaliar a influência política da EE nos Países Baixos, sendo devidamente adaptada e aplicada ao caso da UE. Definiram-se as ideias da EE e da economia neoclássica (EN) em oposição, analisando-se a forma como estas se traduzem na agenda política da UE. Como principal elemento representativo da agenda, consultaram-se os programas de ação da UE em matéria de ambiente (PAAs) desenvolvidos pela Comissão Europeia (CE), sendo complementados por literatura académica e documentos adicionais da UE. Começou por se realizar uma reconstrução temporal da agenda política desde o 1º PAA (adotado em 1973) até ao 7º PAA (em vigor atualmente). De seguida, analisaram-se os fatores que influenciaram a presença do cap-and-trade (instrumento de política representativo da EE) na agenda política.

A primeira conclusão é a constatação duma influência parcial e intermitente das ideias da EE na agenda política da UE. O 1º, 2º e 5º PAAs refletem mais a EE, enquanto os restantes se enquadram melhor na EN. Alguns pressupostos da EE são transversais aos PAAs, tais como a capacidade de carga do planeta e o princípio da precaução. Por outro lado, desde os anos 80, verificam-se “pressuposições de compatibilização” entre o crescimento económico e a proteção ambiental. A agenda política foi muito influenciada pela conjuntura internacional e pela situação económica. Os períodos em que as questões ambientais são prioritárias na agenda política correspondem a uma maior presença das ideias da EE. O cap-and-trade (CaT) foi operacionalizado na UE pelo comércio europeu de licenças (CELE). A segunda conclusão principal da dissertação é que o CELE não chegou à agenda política por influência da EE, mas sim devido ao contexto internacional. A agência também influenciou os moldes de implementação do CELE e a sua evolução desde então. Conjeturalmente, a principal lição do CELE para a EE prende-se com os obstáculos políticos que prejudicaram o funcionamento desta política, aspeto cuja integração na construção teórica e princípios operacionais da EE seria benéfica.

Palavras-chave: economia ecológica, crescimento económico, agenda política, União Europeia,

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Abstract

The goal of this dissertation is to analyse the political influence of the ideas of the ecological economics approach (EE) at the European Union (EU) level. The influence of EE has been largely restricted to academia, with few works analysing the political impact of its ideas. Therefore, this investigation intends to fulfil a small part of this gap.

The methodology follows the conceptual model supported by approaches in political science that Boezeman et al. (2010) used to evaluate the political influence of EE in the Netherlands, properly adapted and applied to the EU case. The EE and neoclassical economics (NE) ideas were defined in opposition in an analytical framework, in order to analyse the way they translate into the EU policy agenda. The environment action programs (EAP) of the EU developed by the European Commission (EC) were taken as the representative elements of the agenda, also complemented by academic literature and additional EU documents. A temporal reconstruction of the political agenda was carried out from the 1º EAP (adopted in 1973) to the 7º EAP (currently in force), which was then analysed in the light of the constructed analytical framework. Afterwards, the factors that influence the presence of cap-and-trade (policy instrument representative of EE) in the political agenda were assessed.

The first conclusion is that there was a partial and intermittent influence of the EE ideas in the political agenda of the EU. The 1º, 2º, 5º EAP are reflective of EE, while the remaining ones are better framed in terms of NE. Some presuppositions from EE are transversal to the PAAs, such as the carrying capacity and the precautionary principle. On the other hand, since the 80s, there are “compatibility presuppositions” between economic growth and environmental protection. The political agenda has been very influenced by the international juncture and the economic situation. Periods where the environmental issues are prioritized show a larger presence of EE ideas in the political agenda. Cap-and-trade was operationalized in the EU by carbon markets (ETS). The second main conclusion of the dissertation is that the creation of this market didn’t get to the political agenda due to EE influence, but due to the international context. Agency factors have also influenced the way in which ETS was initially designed and it has evolved. Conjecturally, the main lesson for EE concern the political obstacles that hindered the workings of this policy, a subject which the EE would benefit to integrate in its theoretical construction and operational principles.

Keywords: ecological economics, economic growth, political agenda, European Union, cap-and-trade, carbon market.

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“I was born not knowing and have had only a little time to change that here and there” Richard Feynman

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Índice de Conteúdos

Agradecimentos ... iii Resumo... v Abstract ... vii Índice de Conteúdos ... ix

Lista de Acrónimos ... xiii

1. Introdução ... 1

1.1. Enquadramento e objetivos ... 1

1.2. Metodologia... 3

1.3. Estrutura do trabalho... 3

2. Fundamentos da economia ecológica ... 5

2.1. Contexto histórico ... 5

2.2. Princípios e conceitos ... 9

2.3. Contendas da economia ecológica com a economia neoclássica ... 13

2.3.1. Definição de sustentabilidade ... 14

2.3.2. Controlo da escala (internalização vs pré-determinação) ... 16

2.3.3. Taxa de desconto ... 16

2.3.4. Substituibilidade vs Complementaridade ... 18

2.3.5. (Des)acoplamento entre o PIB e o throughput ... 18

2.3.6. (Des)acoplamento entre o PIB e o bem-estar ... 19

2.3.7. Importância daquilo a que é adicionado valor e o valor adicionado em si .... 20

2.3.8. Categorias mal concebidas no PIB ... 20

2.3.9. Internacionalização vs Globalização ... 21

2.4. Princípios operacionais ... 23

2.4.1. Escala, distribuição e alocação ... 24

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x 2.4.1.2. Distribuição justa ... 27 2.4.1.3. Alocação eficiente ... 28 2.5. Políticas ... 29 2.5.1. Políticas de escala... 29 2.5.1.1. Regulação direta... 29

2.5.1.2. Impostos e subsídios pigouvianos ... 29

2.5.1.3. Mercado de licenças ... 30

2.5.2. Opções políticas da EE para uma economia steady-state ... 31

2.5.2.1. Escala ... 31

2.5.2.2. Distribuição e redistribuição... 33

2.5.2.3. Alocação ... 34

3. Pontos de debate da EE ... 39

3.1. Conceito de desenvolvimento sustentável ... 39

3.2. Descontar o futuro ... 41

3.3. Substituibilidade vs Complementaridade e o papel do progresso tecnológico .... 42

3.4. Relação entre escala, distribuição e alocação ... 46

3.5. Outros pontos... 48

3.5.1. Fundamentos da economia ecológica... 48

3.5.2. Economia de mercado sem crescimento ... 49

4. Análise da documentação ... 51

4.1. Enquadramento teórico da metodologia ... 51

4.2. Metodologia ... 56

4.3. Enquadramento da EE e da EN ... 59

4.4. Caso de estudo – União Europeia ... 62

4.4.1. Discurso da política ambiental europeia ... 62

4.4.1.1. 1º PAA: 1973-1976 ... 63

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xi 4.4.1.3. 3º PAA: 1982-1986 ... 65 4.4.1.4. 4º PAA: 1987-1992 ... 67 4.4.1.5. 5º PAA: 1993-2000 ... 69 4.4.1.6. 6º PAA: 2002-2012 ... 73 4.4.1.7. 7º PAA: 2014-2020 ... 75 4.4.1.8. A caminho do 8º PAA ... 76

4.4.2. Discussão e análise de resultados ... 77

4.5. Mercados de licenças na agenda política ... 82

4.5.1. Enquadramento discursivo do cap-and-trade ... 82

4.5.2. Dinâmica política do cap-and-trade ... 83

4.5.2.1. Contexto ... 84

4.5.2.2. Agentes Intervenientes ... 88

4.5.2.3. Caraterísticas específicas do cap-and-trade ... 89

4.5.2.4. Conclusões sobre o cap-and-trade ... 91

4.5.3. As lições do CELE para a EE ... 92

5. Conclusões finais e trabalhos futuros ... 99

Apêndice 1 ... 103

Glossário ... 111

Referências bibliográficas ... 117

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Lista de Acrónimos

CaT – Cap-and-trade CE – Comissão Europeia

CELE – Comércio europeu de licenças de emissão

CREs – Créditos de redução de emissões (CERs - Certified Emission Reductions) CM – Capital manmade

CN – Capital natural

CQNUMC - Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC em inglês)

CUE – Conselho da União Europeia DS – Desenvolvimento Sustentável EA – Economia do ambiente EAM – Espaço ambiental EE – Economia ecológica EM – Estados-membros EN – Economia Neoclássica

ERN – Economia dos recursos naturais ESS – Economia steady-state

EUA – Estados Unidos da América

EUAs – European Union Allowances (Licenças de emissão do CELE) IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) MSR – Market stability reserve

ONU – Organização das Nações Unidas

PAA - Programa de ação da União Europeia em matéria de ambiente PAAs - Programas de ação da União Europeia em matéria de ambiente PE – Pegada ecológica

PIB – Produto interno bruto PNB – Produto nacional bruto

POPs - Poluentes orgânicos persistentes UE – União Europeia

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1. Introdução

1.1. Enquadramento e objetivos

O debate sobre os limites biofísicos para a expansão da atividade económica remonta à época da pré-revolução industrial. Ao longo dos últimos séculos, tem-se questionado se o crescimento da economia global vai ultrapassar a capacidade do planeta em fornecer recursos naturais e absorver os níveis de poluição resultantes da atividade humana. Nas diferentes épocas, dependendo do contexto histórico, esta questão teve maior ou menor relevância. As últimas décadas trouxeram-nos de volta a uma conjuntura em que os limites do crescimento são mais considerados. As alterações climáticas e a destruição ecológica generalizada provocadas pela atividade humana são hoje um tema constante na agenda política e na opinião pública, sendo vistos por muitos como uma ameaça existencial à Humanidade. Atualmente, pode-se concluir, de forma relativamente consensual, que a atividade humana tem um efeito considerável nos sistemas biofísicos, e que as alterações destes podem trazer consequências negativas e imprevisíveis no bem-estar social.1

Neste contexto, a economia ecológica (EE) tem demonstrado uma grande preocupação com as questões do crescimento económico e a forma como este afeta a sustentabilidade ecológica. A EE é um campo de investigação académica de carater transdisciplinar que aborda a interdependência e a coevolução entre a economia e o ecossistema (Costanza, 1989). Esta escola tem uma visão diferente da economia neoclássica (EN) dominante, na forma como encara os problemas ambientais, sociais e económicos. Enquadra o sistema económico como uma parte de um sistema maior representado pela biosfera terrestre. Isto faz com que a EE identifique problemas e soluções diferentes da EN, que depois se traduzem em objetivos, políticas e métodos de análise distintos. A EE aponta que certos aspetos estruturantes da economia, como a orientação das políticas para o crescimento económico, são a principal causa dos problemas ambientais. Em determinados aspetos, também usa a oposição à EN como um ponto de partida para definir a sua escola. Assim, afigura-se como uma alternativa ao paradigma económico atual, cuja análise é relevante no âmbito da

1 Em apêndice, coloco alguns dados que apoiam a conclusão de que os indicadores biofísicos do planeta estão a ser negativamente impactados pela atividade humana. Esta premissa é o ponto de partida que traduz uma motivação, pelo que apresentar aqui os dados seria demasiado extenso e fora do âmbito da dissertação.

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sustentabilidade ambiental da economia.

Apesar da pretensão de ter um impacto político no mundo real desde a sua fundação nos anos 80, em larga medida, a EE tem-se cingido à discussão de aspetos teóricos e normativos da economia política e ambiental no plano académico (O’Neill, 2015). Talvez por isso mesmo, pude constatar que, salvo algumas exceções (Boezeman et al., 2010; Farley et al., 2007), há poucos trabalhos que analisam a influência política da EE. Como tal, o elemento mais específico que motiva esta dissertação é a necessidade de ir para além da discussão académica e analisar empiricamente a influência política das ideias da EE. Boezeman et al. (2010) fizeram um dos poucos trabalhos sobre esta matéria. Usaram os Países Baixos como caso de estudo e, de forma semelhante, este trabalho incidirá sobre a União Europeia (UE). A investigação de Boezeman et al. (2010) será uma referência importante para este trabalho. No contexto de avaliar a influência nas políticas, um instrumento que reflete os objetivos da EE é o cap-and-trade (CaT) (Daly, 1992). Este instrumento também é proposto pelas correntes

mainstream da economia, e tem vindo a ganhar popularidade enquanto política ambiental para

reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE) (The World Bank, 2019). Assim, além duma análise do panorama geral da política, um aspeto importante para perceber a influência política da EE é de avaliar em que medida esta pesou na presença do CaT na agenda política da UE.

O objetivo elementar desta dissertação passa pela análise da influência política das ideias da EE na UE. Para avaliar isso, terá de se investigar de que forma estas ideias estão refletidas na agenda política da UE e como é que certos fatores explicam a presença do CaT na agenda. Assim, esta investigação pretende responder às seguintes perguntas:

1. Qual o impacto das ideias da EE na agenda política da UE?

2. Quais os fatores que contribuíram para a presença do CaT na agenda política da UE e qual a influência das ideias da EE nesse processo?

3. Quais as lições que a EE pode tirar do funcionamento do CELE?

Existe uma literatura vasta que analisa a política ambiental da UE ao longo dos anos. No entanto, não há trabalhos que cruzem esses dados com a visão da EE. Responder a estas questões, é fundamental para entender a efetividade do impacto político da EE na UE.

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1.2. Metodologia

Para responder à primeira questão, começa-se por fazer uma revisão da literatura para estabelecer os princípios da EE e os respetivos contrapontos do lado da EN. Estes dados formarão um quadro analítico que vai conter a informação-base a ser considerada na análise da agenda. A partir daí, a investigação é realizada em duas vertentes. Primeiro, através duma reconstrução temporal e análise geral à agenda política da UE, investigando de que forma esta foi traduzindo as ideias da EE. Isto estabelece o discurso predominante na política ambiental comunitária ao longo dos anos. De seguida, avaliando os fatores que influenciaram a entrada do CaT na agenda política da UE e o papel das ideias da EE no processo.

Para isso, seguirei o modelo conceptual de Boezeman et al. (2010), apoiado nas abordagens das ciências políticas para o estabelecimento da agenda política (análise geral à agenda política da UE). Assim, com base no enquadramento da teoria das correntes múltiplas irá definir-se a agenda política. A documentação utilizada para aferir a agenda, desde 1973 até à atualidade, são os sete programas de ação da UE em matéria de ambiente (PAAs) desenvolvidos pela Comissão Europeia (CE), outros dados de instituições europeias e literatura académica consultada para complementar e validar a informação. Estes mesmos documentos permitirão estabelecer a presença do CaT na agenda, recorrendo-se a literatura para analisar os fatores que influenciaram essa dinâmica. Numa fase posterior, também se pretende aferir possíveis conclusões e lições para a EE da operacionalização política do comércio de licenças de emissão de gases de feito estufa CELE. Isto será feito de conjetural e superficialmente, de forma a abrir portas a hipóteses futuras de investigação.

1.3. Estrutura do trabalho

O capítulo 1 é a introdução do trabalho, apresentando o enquadramento e motivação do estudo, a sua relevância, objetivos, questões de investigação, metodologia e estrutura do trabalho. O capítulo 2 consiste numa revisão bibliográfica de literatura, que vai estabelecer as pressuposições, os princípios operacionais e as políticas da EE. O capítulo 3 apresenta algumas das críticas e tópicos de discussão que envolvem a EE, que também se vão refletir no quadro analítica a usar para analisar a documentação. O capítulo 4 consiste na análise da documentação, estando divido por várias secções. Dá um enquadramento das teorias das ciências políticas que se usam, descreve a metodologia do trabalho, apresenta a grelha

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analítica, apresenta o caso de estudo da UE descrevendo e analisando a agenda política e avalia como os fatores influenciaram a presença do CaT na agenda. O capítulo 5 apresenta as conclusões finais do trabalho e possíveis investigações futuras. No fim do trabalho, haverá um pequeno glossário com a descrição de alguns conceitos associados à EE.

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2. Fundamentos da economia ecológica

Neste capítulo, pretende-se definir de forma fidedigna as ideias da escola da EE. Isso irá criar uma plataforma clara que permita entender alguns dos debates posteriores entre os economistas ecologistas e os seus críticos, nomeadamente os neoclássicos. Com este capítulo, pretendo contextualizar as ideias que vão estar em análise na documentação das diretivas e políticas ambientais. Desta forma, estou convicto que a pesquisa será mais objetiva.

A EE tem vindo a evoluir e a ramificar-se desde a sua criação nos anos 80. Atualmente, há quem aponte para o afastamento dos valores fundadores da escola e a aproximação às metodologias empíricas da economia ambiental neoclássica (B. Anderson & M’Gonigle, 2012; Plumecocq, 2014). No entanto, as ideias que aqui vão ser consideradas são as linhas normativas que estão na génese da escola da EE (Costanza et al. 2014; Costanza & Daly, 1992; Daly, 1996, 2003, 2005, 2010a; Daly & Czech, 2004; Daly & Farley, 2011). Muito do trabalho aqui referenciado tem Herman Daly como elo comum, o que se justifica pelo facto de Daly ser o grande teórico da economia steady-state (ESS) e um dos co-fundadores da EE. Acresce ao facto que colegas seus como Costanza e Farley alinham pelas mesmas ideias, sendo que possíveis diferenças de carácter mais minucioso entre estes autores não são relevantes no contexto de análise desta dissertação. O mesmo se aplica à escola da economia neoclássica/mainstream, em que existem várias nuances dentro dela, num espectro que vai desde uma economia laissez-faire até uma intervenção estatal considerável. São discutidas questões normativas e pressupostos que se centram na maximização da utilidade, adotando o produto interno bruto (PIB) como medida de valor dos bens e serviços gerados na economia.

2.1. Contexto histórico

A discussão em torno dos limites biofísicos para a expansão da atividade humana já é antiga. No século XVIII, os fisiocratas foram pioneiros nesta questão, considerando a terra como fonte primária de recursos para a economia (Røpke, 2004). Os primeiros economistas como Adam Smith, David Ricardo e mais tarde John Stuart Mill, também já levantavam a possibilidade de se encontrarem barreiras à expansão económica. No início do século XIX, Thomas Malthus defendeu que os limites ecológicos seriam um obstáculo ao desenvolvimento humano, com a produtividade agrícola a crescer a um ritmo inferior

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(aritmeticamente) à população (geometricamente), o que provocaria crises cíclicas de fome e decrescimento populacional. As suas previsões pessimistas não se verificaram, com a sua análise a não prever o avanço tecnológico acentuado a que se assistiu posteriormente (M. Anderson, 2012).

Ainda assim, o grande debate em torno das implicações ecológicas do crescimento económico remonta ao final dos anos 60 e início dos anos 70. Esta discussão teve origem com a publicação de trabalhos que alertavam para os perigos da poluição, como o livro Silent

Spring de Rachel Carson (Carson, 1962), que apontava para o impacto dos pesticidas (Røpke,

2004). À época, o crescimento exorbitante da população mundial no período pós-guerra relançava ideias neomalthusianas relativas à escassez de alimentos e de outros recursos. Estas preocupações provinham maioritariamente de cientistas das ciências naturais e ativistas políticos. No campo da economia, a visão paradigmática era sustentada por Barnet e Morse (1963), que concluíam que a descida dos preços dos recursos naturais indicava que o progresso tecnológico, a descoberta de novos recursos e a sua substituição preveniriam qualquer escassez específica (M. Anderson, 2012; Perez-Carmona, 2013).

Em 1972, foi publicado pelo Clube de Roma o relatório “Limites do Crescimento” (Meadows, Meadows, Randers, & Behrens, 1972). Este relatório marcante, utilizando um modelo computacional para simular diversos cenários futuros, ilustrou a forma como os crescimentos populacional e de uso de recursos poderiam chocar com os limites biofísicos impostos pelo planeta (depleção de recursos e absorção da poluição). O relatório concluiu que os limites iriam impor um fim ao crescimento material da economia durante o século XXI. No entanto, os principais economistas rejeitaram unanimemente o relatório, argumentando que o progresso tecnológico e os mecanismos de mercado preveniriam a escassez e a poluição de limitarem o crescimento económico a longo prazo (Perez-Carmona, 2013).

Este período de intensa discussão despoletou muitas das ideias e motivações que viriam a ser pioneiras na fundação da escola da EE. Em 1966, um ensaio de Kenneth Boulding causou impacto ao usar uma metáfora para criticar a visão prevalente entre os economistas. Falava da necessidade de transição duma “cowboy economy”, com planícies ilimitadas e recursos infinitos, para uma “spaceman economy” em que uma nave espacial representava a Terra com limite de recursos e de assimilação da poluição. (Boulding, 1966) (citado por Perez-Carmona, 2013).

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7 Um pouco mais tarde, Georgescu-Roegan (1971) escreveu sobre as implicações das leis da termodinâmica na atividade económica (principalmente a lei da entropia). A 1ª lei consiste no princípio da conservação de energia, que sustenta que a energia não é criada nem destruída, mas apenas transformada. Já a 2ª lei da termodinâmica, a lei da entropia, traduz o caminho irreversível que toda a energia percorre quando realiza trabalho. Parte dum estado de baixa entropia para um estado de alta entropia, no qual uma parte já não pode ser transformada em trabalho (M. Anderson, 2012). Na visão de Georgescu-Roegen, o processo económico consiste na transformação de energia e matéria de baixa entropia para alta entropia. Cada processo económico necessita de energia para realizar trabalho, e como tal, resulta num grau de entropia superior, o que faz com que parte da energia usada fique indisponível no futuro. A implicação imediata é a existência de um limite quantitativo para o uso de energia e matéria, traduzindo, inclusivamente, um limite à eficiência que o avanço tecnológico pode trazer. Georgescu vê a energia e matéria de baixa entropia como os inputs da economia e os resíduos de alta entropia como os seus outputs. O trabalho e o capital são meros “agentes transformadores” (Cechin & Veiga, 2010) (citado por Chaves, 2017). O matemático romeno foi um crítico acérrimo da escola neoclássica, apontando a sua conceção linear da economia e a abstração do ecossistema envolvente como erróneas, e considerando que os modelos de produção não traduzem o papel da realidade biofísica na economia e a sua circularidade.

Influenciado por estes trabalhos, no início dos anos 70, Herman Daly, estudante de Georgescu, combina os argumentos dos limites ao crescimento, as teorias da economia do bem-estar, os princípios ecológicos e as ideias do desenvolvimento sustentável (DS) num modelo a que chama “economia steady-state” (ESS) (CASSE, 2019). Contudo, é de notar que a noção de economia estacionária já tinha sido abordado por John Stuart Mill em 1848, no seu trabalho Principles of the Political Economy. Mill define-a como uma economia que não experiencia crescimento nem decrescimento material absolutos, com população e stocks de capital constantes (M. Anderson, 2012). Ele defendia que era possível ter uma sociedade com capital e população estáveis que apresentasse desenvolvimento económico.

Perante os limites ecológicos do planeta impostos pelas leis da termodinâmica, Daly sustenta a necessidade duma economia guiada pelos princípios de Mill para seguir um DS. Throughput, um conceito inicialmente proposto por Boulding, tornou-se um elemento central nas ideias de Daly e mais tarde na EE, é definido por Daly e Farley (2011) como:

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“Throughput é um fluxo de materiais e energia proveniente do ecossistema global, usado pela economia, e disposto de volta ao ecossistema como resíduos.” (p.6) Assim, juntando o conceito à formulação de Mill, Daly (1991) apresenta a sua visão normativa da economia steady-state:

“Uma economia com stocks constantes de pessoas e artefactos, mantidos a certos níveis desejáveis e suficientes por taxas baixas de sustento ‘throughput’, ou seja, pelos fluxos viáveis mais baixos de matéria e energia da primeira fase de produção (depleção de materiais de baixa entropia do ambiente) até à última fase de consumo (poluição do ambiente com resíduos de alta entropia e materiais exóticos).” (p.17) Assim, esta seria uma economia que não cresce nem decresce, apresentando capital e população (stock de trabalho) constantes e, idealmente, taxas de natalidade e mortalidade baixas. Nestas condições, para um determinado nível tecnológico, haveria um nível constante de bens e serviços produzidos e consumidos. Por constante, quer-se dizer com variações moderadas a curto prazo, mas tendendo para um equilíbrio estável a longo prazo (Daly & Czech, 2004). Ao longo dos anos, a definição de Daly, mantendo a base, tem vindo a evoluir para admitir uma variabilidade de capital e população, desde que estes sejam sustentados por um throughput estável e sustentável (O’Neill, 2015).

Daly usa o termo “steady-state” com uma tradução estritamente biofísica, sem qualquer preocupação de tradução ao nível do PIB. O termo aplica-se geralmente a nível nacional, podendo também traduzir-se a nível global, regional ou numa cidade (CASSE, 2019). É importante referir que, em economia, o termo steady-state tem um significado conforme os contextos. Por exemplo, na teoria de crescimento económico de Solow, o modelo converge para um steady-state que representa o ponto em que o capital per capita (K/Y) se mantém constante. Dada a constância dos fundamentos, o modelo tenderá a convergir no longo prazo para um ritmo de crescimento de steady-state (C. Jones & Vollrath, 2013).

Nos anos 70 e 80, as escolas da economia ambiental e dos recursos naturais cresceram consideravelmente. Isto relegou para segundo plano as perspetivas biofísicas da economia, que se foram desenvolvendo marginalmente. Na verdade, o trabalho que Daly foi desenvolvendo foi uma base para o que viria a ser a EE. Este foi o contexto histórico em que vários autores deram corpo a um conjunto de conceitos e ideias que mais tarde se vão consolidar na escola da EE. Esta foi criada formalmente no final dos anos 80, depois de Herman Daly, AnnMari Jansson, Robert Costanza and Joan Martinez-Alier organizarem os

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9 primeiros encontros e criarem a revista Ecological Economics e a International Society for Ecological Economics (Røpke, 2004).

2.2. Princípios e conceitos

O princípio base inerente ao pensamento da EE é a visão da economia como um subsistema aberto, albergado por um sistema maior que é finito, não crescente e fechado (com a entrada de energia solar), o planeta Terra (Daly & Farley, 2011). Dentro dele, a economia é sustentada por um fluxo metabólico denominado throughput.

Estes aspetos têm a implicação imediata de que a atividade humana é limitada pelo ecossistema envolvente. Como tal, numa perspetiva ecológica, os recursos naturais tangíveis devem ser usados a um ritmo inferior à sua renovação ou substituição, e emitir níveis de poluição que estejam dentro da capacidade assimilativa do ecossistema. Assim, as ideias da EE partem do facto incontornável da economia estar constrangida por limites biofísicos e da necessidade do sistema económico se adaptar a esses constrangimentos, reconhecendo um limite à sua escala nos modelos agregados (Daly, 2005).

Até há um passado relativamente recente, a existência de limites para o crescimento não era vista como uma questão premente. Só nas últimas décadas é que a discussão se tornou relevante, principalmente com o tópico das alterações climáticas. Anteriormente, a dimensão do subsistema económico era muito reduzida relativamente ao ecossistema terrestre. Os

stocks da Natureza produziam um fluxo de recursos naturais e serviços dos ecossistemas

(capital natural)2 que passavam por bens livres, uma vez que eram superabundantes

relativamente à escala da atividade humana. Devido à pequena dimensão relativa da economia, o seu crescimento tinha um custo de oportunidade baixo, pois não reduzia significativamente a capacidade do ecossistema em gerar um fluxo de bens e serviços fundamentais (Costanza & Daly, 1992).

No entanto, a revolução industrial começou a alterar este paradigma, e desde a segunda

2 Em economia, capital é geralmente definido como um meio de produção manufaturado pelo Homem. Os economistas ecologistas consideram a definição de Capital enquanto um stock que rende um conjunto de bens e serviços no futuro. Assim, capital natural (CN) é um stock que rende um conjunto de serviços dos ecossistemas e recursos naturais tangíveis (Daly & Farley, 2011). Divide-se em dois grandes tipos: renovável ou ativo e não renovável ou inativo. Energia solar e os ecossistemas são tipos de capital natural renovável (CNR), enquanto combustíveis fósseis e minerais são capital natural não renovável (CNNR) (Costanza & Daly, 1992).

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metade do século XX, como podemos verificar pelos dados apresentados no apêndice 1, a economia e a sua Pegada Ecológica respetiva cresceram significativamente em termos absolutos. O crescimento exponencial da economia mundial nas últimas décadas relativamente a um ecossistema não crescente agravou o risco de choque com os limites biofísicos. Desta forma, Daly (2005) fala duma transição abrupta de um “mundo vazio” para um “mundo cheio”:

“Durante meu tempo de vida (67 anos) a população humana triplicou, e o número de artefactos humanos, ou coisas que as pessoas produziram, aumentou muito mais em média. Estudos da “pegada ecológica” mostram que a energia total e materiais necessários para manter e substituir os nossos artefactos aumentou vastamente. À medida que o mundo se torna cheio de nós e das nossas coisas, torna-se vazio do que estava aqui antes. Para lidar com este padrão novo de escassez, os cientistas precisam de desenvolver uma economia de “mundo cheio” para substituir a economia tradicional de “mundo vazio.” (p.102)

Daly (2005) aponta para a alteração do padrão de escassez. Ele argumenta que, enquanto no passado, o fator limitativo era o capital humano (ex. barcos e redes de pesca), no presente, o fator limitativo é cada vez mais o capital natural (CN) (ex. peixes). A lógica recomenda economizar o fator limitativo mas, de acordo os economistas ecologistas, o pensamento neoclássico continua numa visão de “mundo vazio”, falhando em reconhecer a alteração no padrão de escassez ao promover um crescimento económico continuado (Daly, 2005). Nesta sequência, a EE opõe-se ao objetivo de crescimento do PIB e a políticas nesse sentido, considerando que o PIB é um indicador quantitativo cuja correlação com o bem-estar social é discutível (Max-Neef, 1995). Daly (2003) alerta para como o PIB não distingue entre dois tipos de crescimento económico: aquele que resulta do aumento da produção e consumo de bens e serviços, traduzindo-se num aumento físico da escala da economia (aumento do

throughput); e aquele em que, aumentando a eficiência alocativa mas mantendo a sua escala

física constante, a evolução da economia traz benefícios adicionais superiores aos custos, aumentando o bem-estar. O primeiro acarreta o aumento absoluto do throughput, enquanto o segundo coloca o ênfase no aumento da utilidade por unidade de throughput. Consequentemente, os economistas ecologistas dividem o crescimento económico nestas componentes quantitativa e qualitativa. À primeira dão o nome de “crescimento” e à segunda chamam “desenvolvimento” (Costanza & Daly, 1992; Daly, 2005).

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11 Surge então uma das principais contendas da EE: o crescimento económico não é inerentemente benéfico. Cada unidade adicional de PIB acarreta um certo custo de oportunidade, seja em termos de trabalho ou perda de capital manmade (CM) ou capital natural. Daly (2005) aponta que, no campo da microeconomia, existe um ponto que serve como regra de paragem para a expansão duma determinada atividade, correspondente à maximização do excedente dos produtores e consumidores. São considerados os custos de oportunidade do crescimento de determinada atividade na economia. Daly alega que não existe nenhuma regra análoga nos modelos macroeconómicos neoclássicos: os macroeconomistas tratam a economia como se estivesse a crescer para o vazio sem incorrer em custos de oportunidade em capital natural (Daly & Farley, 2011)3. Como tal, os

economistas ecologistas defendem que deveria proceder-se a uma análise custo-benefício do crescimento do PIB, para quando os valores marginais se igualassem, sinalizar o ponto ótimo do crescimento económico. A partir deste ponto, o incremento da produção e consumo traz um custo superior ao benefício do consumo dessa produção. A utilidade marginal torna-se menor (em valor absoluto) que a “desutilidade” marginal (figura 1). Nas palavras dos economistas ecologistas, entramos num período de crescimento não-económico (Costanza & Daly, 1992; Daly, 2005; Daly & Farley, 2011).

3 Neste contexto, a EE faz a distinção entre micro-alocação e macro-alocação. Enquanto a primeira se refere à alocação de recursos entre bens de mercado, a segunda consiste na alocação de recursos entre bens e serviços de mercado e não mercantis (Daly & Farley, 2011) (p.296). Alternativamente, Costanza e Daly (1992) definem macro-alocação como a alocação de matéria-energia entre o ecossistema e o subsistema económico e micro-alocação como a micro-alocação entre usos concorrentes de matéria-energia que já entrou no subsistema económico.

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12

Figura 1 – Curvas da Utilidade e Desutilidade Marginais à medida que a economia cresce. Por desutilidade, entenda-se o sacrifício marginal necessário para o crescimento da produção e consumo (depleção, poluição, destruição, desutilidade de trabalho (Daly & Farley, 2011. Alterado pelo autor) 4

A figura 1 ilustra as curvas de utilidade e desutilidade marginal. A curva da utilidade marginal, como explicado na sua definição da figura, é decrescente e tende para zero, pois os seres humanos satisfazem as suas necessidades mais básicas primeiro. Assim, o crescimento económico inicial vai proporcionar uma utilidade superior ao subsequente, traduzindo a lei da utilidade marginal decrescente. A curva da desutilidade representa um valor crescente de desutilidade, uma vez que as pessoas fazem os sacrifícios mais fáceis primeiro (Daly, 2005). Na figura, vemos o ponto b, a partir do qual o crescimento da economia passa a ser não económico. Este ponto, por ser a igualdade entre a utilidade marginal e a desutilidade marginal, representa o ótimo da escala da economia.

Para a escola da EE, esta representação ilustra a importância da economia passar de “crescimento” para “desenvolvimento”, entrando num regime “Steady-State” (Daly, 2005). Operacionalizando as suas ideias, os economistas ecologistas apontam este regime como

4 Perez-Carmona (2013) (p.123) apresenta um gráfico com a mesma lógica mas usando um eixo yy unidirecional. Representa as curvas dos benefícios e custos totais, desenha as tangentes para representar os seus valores marginais. O ponto em que o declive destas tangentes se iguala representa a escala ótima da economia, onde os benefícios líquidos são maximizados. Em determinado ponto de crescimento não-económico, deixa de existir benefício marginal, acabando por se atingir um ponto em que os custos totais da atividade económica são superiores aos benefícios totais.

MDU = sacrifício marginal necessário pelo crescimento da produção e consumo (e.g. desutilidade do trabalho, sacrifício de lazer, depleção, poluição, destruição ambiental, congestão). Como muitas pessoas retiram prazer do trabalho, assume-se que as primeiras unidades de trabalho aumentam a utilidade.

MU = utilidade marginal do consumo de bens e serviços produzidos. A MU diminui porque como seres racionais, satisfazemos as necessidades mais prementes primeiro.

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13 objetivo normativo:

“Tal como o crescimento económico é o objetivo predominante da política macroeconómica identificado ou implicado pela economia neoclássica, a economia

steady-state é o objetivo predominante da política macroeconómica identificado ou

implicado pela economia ecológica.” (CASSE, 2019)

Atualmente, apesar das alterações climáticas estarem a alterar gradualmente o paradigma, ainda é proibitivo na esfera política insurgir-se contra o crescimento económico enquanto fim operacional. A EE é crítica da visão de que o crescimento económico é a solução para problemas como a pobreza, sobrepopulação e degradação ambiental (Daly, 2003, 2005).

2.3. Contendas da economia ecológica com a economia

neoclássica

A EE define muitos dos seus fundamentos e ideias a partir da forma como estes divergem das posições da escola neoclássica/mainstream. Como tal, a apresentação desta dicotomia será profícua para a apresentação mais precisa da EE.

Os princípios ontológicos destas duas escolas diferem consideravelmente. A EE apresenta uma conceção circular da economia, ligando-se à teoria de valor dos economistas clássicos, na qual este provém dos fatores de produção (terra, trabalho e capital) empregues na criação de um bem e tem uma relação estreita com a realidade biofísica (Martins, 2016). Fazendo uma distinção clara entre o capital natural e o capital manmade (CM), adota a visão da sustentabilidade forte e de finitude do capital natural. Martins (2016) aponta para o contraste com a escola neoclássica, que adota uma teoria de valor sustentada nas leis da oferta e da procura: a oferta é um veículo para satisfazer a procura, que por sua vez se baseia em preferências individuais subjetivas. Nesta conceção, os recursos naturais têm valor, não como fator objetivo da produção, mas pelas preferências subjetivas.

Mais concretamente, é importante clarificar a relação entre a génese da EE e as escolas da Economia do Ambiente (EA) e dos Recursos Naturais (ERN). Daly (2003) considera que estas duas últimas são subdivisões da EN, mantendo como objetivo a análise da eficiência alocativa, mas incorporando o valor criado pela Natureza. A ERN trata da atribuição de valor aos recursos naturais, com base no capital e trabalho necessários à sua extração. Desconsiderando a questão da limitação da escala, usa conceitos como a regra de Hotelling, a

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renda de escassez e o user cost para, avaliando o tipo de recursos em questão, extraí-los de forma a maximizar o seu valor económico intertemporal. Por outro lado, a EA reconhece os danos causados por externalidades como a poluição e analisa o melhor modo de as internalizar nos preços, seja por atribuição de direitos de propriedade (Coase), seja aplicando impostos pigouvianos. O objetivo principal passa por atribuir o valor adequado aos bens da Natureza e o custo aos males ambientais, de modo a que o sistema de preços, consequentemente, possa representar a escassez ou os custos superiores. Já a EE, circunscreve a atividade económica à Natureza, vendo o processo económico com referência à capacidade de manutenção dos recursos dentro dos limites biofísicos. Liga as duas subdisciplinas neoclássicas através do conceito de throughput, que junta a depleção de recursos e a poluição que os seus usos causam num fluxo que traduz o “metabolismo” da economia: “ (…) na visão neoclássica a economia contém o ecossistema; na visão aqui advogada (chame-se economia ecológica), o ecossistema contém a economia à qual fornece um

throughput de matéria-energia obtido a partir de usos da natureza de acordo com

alguma regra de coleta sustentável em vez de ser de acordo com disposições a pagar individuais.” (Daly, 1992) (p.187)

Consequentemente, é possível estabelecer alguns pontos de divisão concretos entre grande parte dos economistas ecologistas e os neoclássicos que permitem clarificar certos aspetos normativos da EE:

2.3.1. Definição de sustentabilidade

A questão da distribuição e equidade intergeracional tem sido muito estudada pelos economistas. Por isso, não existe uma posição uniforme dentro da EE e da EN. Há várias visões neste tema: a utilitarista, que pretende maximizar o bem-estar intertemporalmente (Beckerman, 1994) e a da manutenção ou não-decrescimento dum determinado indicador, seja da utilidade (Pezzey, 1989), do capital natural Daly (1990, 2003) ou do capital agregado (Solow, 1986, 1993).

Daly (2003) apresenta a sua noção de sustentabilidade em oposição à dos neoclássicos. Ele considera que muitos neoclássicos, normativamente, definem sustentabilidade como manutenção da utilidade, no sentido em que a utilidade das gerações futuras deve ser não decrescente ao longo do tempo. Por utilidade, entenda-se a “utilidade média per capita” dos membros duma geração. Já os economistas ecologistas, definem sustentabilidade em termos

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15 de throughput não decrescente, mais precisamente, na capacidade do ecossistema suportar estes fluxos constantes. Para propósitos operacionais, isso implica manter o CN agregado constante (Costanza & Daly, 1992; Daly, 2006):

“Não penso que a teoria económica possa dar-se bem sem o conceito de utilidade. Apenas creio que throughput é um conceito melhor para definir sustentabilidade.” (Daly, 2006) (p.40)

Apesar de reconhecerem a dificuldade em valorar o CN, Costanza e Daly (1992) apresentam duas abordagens que podem sustentar as decisões políticas: uma delas passa por aferir a disposição a pagar dum agente económico abstrato que tem informação perfeita relativamente às interações da economia com o ecossistema e que tem um horizonte temporal muito longo. Este agente avalia o capital natural de acordo com o seu potencial para dar suporte à vida a longo prazo (quantidade de energia/matéria de baixa entropia). Esta abordagem assemelha-se às metodologias usadas pela economia ambiental neoclássica, que considera preferências através de pesquisas e questionários ou da economia experimental. A diferença consiste na construção de um agente económico idealizado, cujas preferências incluem a valorização da sustentabilidade ecológica. Outra abordagem que apresentam consiste na análise energética dos fluxos dos ecossistemas. Num caso concreto, os autores consideraram a produtividade biológica de um pantanal como base para a produção de produtos de valor económico (ex. peixes e vida selvagem), e converteram este num valor económico equivalente, baseado no custo para a sociedade de substituir esta fonte de energia por combustíveis fósseis (Costanza, Farber, & Maxwell, 1989).

Numa lógica com algumas semelhanças, certos economistas neoclássicos recorrem à regra de Hartwick, uma política de investimento das rendas ganhas pela exploração de recursos não renováveis em capital reproduzível, de forma à acumulação deste compensar a redução inevitável do fluxo de recursos. Isto vai permitir manter um consumo constante ao longo do tempo (Solow, 1986). Solow (1986) defende que a regra de Hartwick, definindo o investimento em CM necessário para fazer o offset do declínio dos stocks de recursos não-renováveis, apesar de não ser uma política comprovadamente robusta, serve como um bom princípio para garantir esse stock de capital constante e, inerentemente, um nível de consumo não decrescente.

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2.3.2. Controlo da escala (internalização vs pré-determinação)

Daly (2003) reconhece que, para os neoclássicos, não faz sentido falar em “crescimento não económico”. Como já foi referido, estes não distinguem entre crescimento económico quantitativo e qualitativo. Isto deve-se ao facto do PIB representar para eles o agregado das transações voluntárias entre indivíduos, que realizaram transações de bens cujos benefícios foram superiores aos custos para ambas as partes envolvidas. Assim, quando o PIB aumenta, a utilidade total também aumenta. No entanto, há um reconhecimento transversal dos economistas de que podem existir efeitos externos decorrentes de transações no mercado que fazem com que o volume de transações não seja o socialmente desejável e os preços não reflitam a escassez de recursos ou a geração de males. Os benefícios e custos individuais muitas vezes não correspondem aos benefícios e custos sociais. No caso de recursos comuns (commons), os benefícios do seu uso são maioritariamente individuais e os custos serão diluídos coletivamente, pelo que, da perspetiva dum agente económico, faz sentido incorrer na atividade. A solução dos neoclássicos passa pela internalização desses custos sociais nos preços de forma a traduzir o interesse social. Nessa situação, dado que o custo individual vai traduzir o custo social, será possível limitar a escala pela via do mercado, uma vez que acima de um certo nível, não haverá transações dessa quantidade de bem ou serviço, impedindo a escala de se tornar insustentável. Mas os economistas ecologistas consideram irrealista a possibilidade de internalizar os custos sociais nos preços devido aos requisitos de informação astronómicos que seriam necessários. Daly (2003) também considera tratar-se duma falácia do individualismo metodológico defender que custos sociais vitais como o efeito de estufa ou a perda de serviços de ecossistemas podem ser resolvidos com base na disposição a pagar individual (assumindo informação perfeita). Assim, a EE defende a criação de objetivos normativos de escala e distribuição (para além da alocação neoclássica), que deverão ser determinados politicamente de forma prévia ao funcionamento de mercado (Daly, 1992, 2003). Este aspeto será explorado mais à frente na dissertação.

2.3.3. Taxa de desconto

Este ponto está relacionado com a definição de sustentabilidade. Nas suas decisões intertemporais e nos contextos de empréstimo, a experiência revela que os indivíduos descontam o futuro, pois atribuem ao consumo futuro menos valor do que ao consumo presente (Daly & Farley, 2011). Inclusivamente, os economistas ecologistas admitem que há

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17 algumas razões plausíveis para esta situação, nomeadamente a preferência puramente temporal, o custo de oportunidade do investimento presente e a perspetiva de crescimento económico futuro, em que a lei da utilidade marginal decrescente traduzirá um valor de utilidade menor por unidade monetária no futuro (Daly & Farley, 2011).

Assim sendo, surge a questão de que valor atribuir ao capital natural futuro. Costanza e Daly (1992) consideram que não há razão para crer que as gerações futuras valorizem menos os próprios recursos do que a geração presente. A argumentação tem vários pontos. Primeiro, considerando que o comportamento individual não leva necessariamente a um ótimo social, Costanza e Daly (1992) defendem que a taxa de desconto usada pelo governo na política pública deve ser menor que a taxa usada por indivíduos em investimentos privados (algo que é relativamente consensual entre economistas). Justificam que bens públicos como a estabilidade e harmonia social prolongadas são da responsabilidade do governo, pelo que este deverá ter um maior interesse em promovê-los do que os indivíduos. Este interesse não é capturado de forma fidedigna por uma disposição a pagar individual.

Segundo, Costanza and Daly (1992) também apontam para o problema das explorações de CN cuja taxa de crescimento seja inferior à taxa de desconto serem colocadas em risco. Neste contexto, é consensual entre os economistas que a taxa de desconto a adotar deve refletir o risco relativo ao consumo futuro ou à disponibilidade de recursos naturais no futuro; nesse sentido, é defendida a proposta de que a taxa de desconto seja decrescente ao longo do tempo, prática recomendada na avaliação de projetos públicos na França e na Alemanha (Arrow et al., 2014).

Em terceiro lugar, a EE avança a ideia de que o desconto do futuro não deve ser efetuado com base na taxa de juro de mercado. A taxa de juro é um preço obtido a partir duma certa escala e distribuição de rendimento, e que difere com a variação destas. Daly (1996) considera que obter uma taxa de desconto a partir de determinada escala ou distribuição intergeracional, para depois obter a distribuição intergeracional justa ou escala sustentável é um raciocínio circular. Para ele, a taxa de juro determinada no mercado não é necessariamente uma variável importante uma vez que, numa situação de concorrência perfeita, o custo de oportunidade do capital (determinante da taxa de desconto) na margem iria corresponder a uma preferência temporal pura da geração atual (excluindo as gerações futuras).

Em quarto lugar, os economistas ecologistas acreditam que se continuarmos com a depleção do CN, o futuro ficará mais pobre, pelo que um dos argumentos para uma taxa de desconto

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18

positiva torna-se inválido (Daly & Farley, 2011).Daly e Farley (2011) defendem que apenas os bens e serviços de mercado devem ter taxas de desconto positivas, chegando a sugerir que o CN seja descontado a uma taxa negativa:

“ (…) se acreditamos que o capital natural deve ser tratado separadamente do capital

manmade (porque são complementos em vez de substitutos e o capital natural

tornou-se o fator limitativo), então o declínio de capital natural, junto com a lei da utilidade marginal decrescente, sugerem que devíamos aplicar uma taxa de desconto negativo ao capital natural.” (p.318)

Por todas estas razões, a EE é cética em descontar o futuro em larga escala e para grandes horizontes temporais5.

2.3.4. Substituibilidade vs Complementaridade

Por substituibilidade, considera-se a capacidade relativa de um fator ou bem ser usado no lugar de outro. Já complementaridade, o oposto de substituibilidade, consiste na necessidade de bens e fatores serem usados de forma combinada, ao invés de serem alternativas uns aos outros (Daly & Farley, 2011).

Os neoclássicos encaram o CN e o CM maioritariamente como substitutos, enquanto os ecológicos vêem-nos como complementos quase perfeitos, sendo substitutos num espectro muito curto. As consequências desta dicotomia traduzem-se no foco de certos neoclássicos no valor agregado do capital (sustentabilidade fraca), enquanto os ecologistas alertam para o capital com menor abundância servir de fator limitativo, sendo que, num paradigma de “mundo cheio” trata-se do capital natural (sustentabilidade forte) (Daly, 2005). Este aspeto será mais explorado no capítulo dos debates.

2.3.5. (Des)acoplamento entre o PIB e o

throughput

Os neoclássicos consideram esta ligação muito mais flexível que os ecológicos, que consideram que existe uma ligação estreita entre estes indicadores. Os neoclássicos veem o progresso tecnológico como a solução para o desacoplamento da economia face ao sistema

5 A EE insurge-se contra o desconto exponencial do futuro referindo também que estudos da economia comportamental apontam que as pessoas descontam o futuro de forma hiperbólica, ou seja, a taxa de desconto cresce mais rápido no futuro próximo do que no futuro distante (Daly & Farley, 2011; Gowdy & Erickson, 2005).

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19 biofísico, permitindo um “crescimento económico sustentável”. Para os economistas ecologistas, por muito que o avanço da tecnologia aumente a eficiência no uso dos recursos, isso não significa que a escala da economia não aumente. Daly (2006) alerta para o paradoxo de Jevons, em que uma eficiência superior produz um efeito no mesmo sentido do aumento da oferta do fator, o que diminuirá o seu preço e incentivará ao aumento da quantidade consumida. Assim, mesmo que o throughput por unidade monetária do PIB diminua, o aumento da procura poderá fazer o throughput absoluto crescer. Como tal, a EE advoga uma política de “frugalidade primeiro”, ao invés de “eficiência primeiro” (Daly, 2006). Impor limites quantitativos à escala vai aumentar os preços dos fatores de produção e encorajar o aumento da eficiência.

A existência do paradoxo de Jevons e a sua magnitude é um assunto que, ainda hoje, despoleta vários debates no campo da economia (Juknys, Liobikiene, & Dagiliute, 2014; Perez-Carmona, 2013). Apesar das possibilidades empíricas de estudo, as estimativas ainda apresentam metodologias pouco claras (Madlener & Alcott, 2009), apesar de se assistir a certos casos como o da UE, a um certo grau de desacoplamento entre as emissões/consumo energético e a atividade económica (PIB) (Denny Ellerman, Marcantonini, & Zaklan, 2016). Além disso, o crescimento económico também é muitas vezes apontado pela EN como solução para os problemas ambientais, uma lógica que é sustentada pela teoria de Kuznets ambiental, que prevê que a relação entre o PIB per capita e a degradação ambiental se reflete numa curva em U-invertido. Nesta curva, a partir de um determinado agregado (ponto de inflexão), a degradação ambiental começa a diminuir com o aumento do crescimento económico. No entanto, esta teoria só foi validada empiricamente para determinados gases poluentes, não se aplicando a stocks de recursos naturais nem a gases com custos mais dispersos e de longo-prazo como o CO2 (Arrow et al., 1995; Stern, 2017).

2.3.6. (Des)acoplamento entre o PIB e o bem-estar

De forma geral, os países que apresentam um PIB per capita mais elevado são aqueles cujas populações apresentam um nível de bem-estar superior (Bannister & Mourmouras, 2017).A abordagem neoclássica identifica o bem-estar largamente como uma função do consumo e defende que o rendimento é um bom indicador para o progresso económico. No entanto, os economistas ecologistas consideram que, a partir dum determinado valor, o crescimento do PIB não proporcionará um aumento do bem-estar (Max-Neef, 1995). Há duas análises

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paradigmáticas desta divisão. Nordhaus e Tobin (1972) validaram a correlação entre estas duas variáveis nos EUA no período de 1929-1965 e Daly e Cobb (1989), usando outro índice de avaliação de bem-estar (ISEW), rejeitaram uma relação tão acentuada a partir de 1947, e consideraram-na como possivelmente inexistente a partir de 1980 (Daly & Farley, 2011). Concluem que, a partir de certo ponto, o bem-estar advém apenas do rendimento que se tem relativo aos outros. Isto implica que, a certa altura, com o crescimento económico, o aumento do bem-estar de alguém irá implicar a diminuição do de outrem.

2.3.7. Importância daquilo a que é adicionado valor e o valor

adicionado em si

A principal reivindicação dos ecologistas é que a Natureza deveria ter um valor intrínseco. Daly (2003) refere-se à diferença entre o valor do capital e trabalho (valor adicionado) e o valor da Natureza ou CN (aquilo a que é adicionado valor). Os recursos naturais e os serviços dos ecossistemas retiram o seu valor da quantidade de trabalho e capital necessários para usufruir deles. Assim, as rendas recebidas pelos donos dos recursos naturais são fruto da sua exploração económica, ou seja, da aplicação dos fatores produtivos trabalho e capital. O epítome desta lógica é o PIB, que representa a soma do valor criado pelo capital e trabalho de todos os bens e serviços finais (visão neoclássica).

Os economistas ecologistas defendem que é mais difícil acrescentar valor a recursos naturais de baixa entropia do que de alta entropia. Para eles, o valor atribuído aos recursos naturais deve ser baseado na recetividade desses recursos a ganharem valor através de capital e trabalho (Daly, 2007b). Este conceito é semelhante ao de renda económica, ou aplicando a recursos naturais, renda de escassez. Isso é confirmado pela proposta de Daly e Farley (2011), em que o governo cobraria às indústrias extrativas royalties equivalentes à renda de escassez6.

2.3.8. Categorias mal concebidas no PIB

Costanza and Daly (1992) alertam para a necessidade da medida do rendimento (PIB) dar conta do CN, uma vez que o seu consumo não vai deixar a capacidade produtiva e de consumo intactas para o futuro. Para eles, à semelhança do que é feito com o CM, o CN deve ser sujeito a taxas de depreciação e depleção. Outro aspeto referido por estes autores é que

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21 certas despesas não deveriam ser contabilizadas no PIB, na medidaa que representam custos incorridos para mitigar efeitos externos do uso excessivo de recursos ou do congestionamento da atividade humana.

Assim, uma das recomendações de Daly (2010a) é reforma da contabilidade nacional, categorizando o PIB em custos e benefícios e comparando-os marginalmente. Daly e Cobb (1989) (citado por Perez-Carmona, 2013) operacionalizaram estas recomendações com a criação do indicador Index of Sustainable Economic Welfare (ISEW)7.

De notar contudo, que há economistas neoclássicos que apresentam uma visão que se aproxima da EE, propondo a correção do produto nacional líquido para este incluir o uso de recursos naturais e a deterioração do ambiente (Solow, 1993):

“ (…) os ajustamentos apropriados necessários para medir os stocks e fluxos de recursos naturais e de ativos ambientais não estão a ser feitos nas contabilidade nacionais publicadas (…) o produto nacional líquido devidamente ajustamento daria um indicador mais significativo da contribuição para o bem-estar económico.” (p.163)

2.3.9. Internacionalização vs Globalização

Daly (2007) distingue internacionalização de globalização. A primeira passa pelo ligação crescente entre países através de acordos comerciais, tratados internacionais, relações culturais entre outros, mas mantendo cada nação como o principal centro político. Já a globalização refere-se à integração económica de cada país numa economia global, sustentada no comércio livre e no movimento de capital e trabalho através de movimentos migratórios. Para Daly (2007b), existem quatro problemas principais com a globalização. O primeiro passa pela dificuldade acrescida que esta traz à internalização dos preços. No contexto competitivo atual, as nações que internalizem os custos sociais e ambientais nos seus preços perdem competitividade perante as nações que não o façam. Como tal, Daly (1996) dá ênfase à necessidade de implementar um protecionismo face às nações que não realizam uma internalização de custos eficiente. Além disso, a globalização aumenta as desigualdades de rendimentos no interior dos países desenvolvidos, em resultado da concorrência de salários mais baixos nos países em desenvolvimento. O segundo problema apontado por Daly

7 Ver também outro economista ecologista que estabelece a fundamentação teórica deste indicador (Lawn, 2003).

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(2007b) é a perda da capacidade produtiva nacional, sob o mantra de expandir as empresas a nível global. De acordo com ele, isto provoca situações monopolistas e incapacidade de regulação governamental. O terceiro problema consiste no comércio livre e circulação livre de capital, o que provoca a especialização excessiva dos países. Neste contexto de vantagem comparativa no comércio, defende a imobilidade do capital. O último problema prende-se com a atribuição de direitos de propriedade intelectual ao conhecimento, que como bem não rival e apenas excluível por forma de patentes, deveria ser partilhado e de acesso livre internacionalmente.

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2.4. Princípios operacionais

Daly e Farley (2011) apresentam seis princípios de planeamento e implementação de políticas que a EE deve seguir:

1. Cada objetivo político independente requer um instrumento político independente8:

aplica-se aos problemas económicos reconhecidos pela EE (explorado mais à frente);

2. As políticas devem procurar obter controlo ao nível agregado sem sacrificar a liberdade e a variabilidade ao nível micro: por exemplo, impor uma política restritiva às emissões globais foca-se em primeira linha no valor agregado.

3. As políticas devem dar uma margem de erro ao abordar o sistema biofísico: há bastante incerteza envolta dos limites ecológicos e a estrutura dos ecossistemas é composta por sistemas complexos com comportamentos não lineares, o que aumenta a sua imprevisibilidade. Uma margem de erro irá garantir maior segurança e menor restrição das liberdades coletivas e individuais, que iria ocorrer em consequência dos limites biofísicos.

4. As políticas devem reconhecer as condições iniciais de partida: é sensato um certo gradualismo, usando instituições já existentes (sistema de mercado, regulação governamental, propriedade privada, propriedade pública, etc.) para atingir os objetivos.

5. As políticas devem-se adaptar a alterações nas condições: os resultados reais das políticas devem ter mais peso do que teorias estilizadas. O processo de desenvolver e implementar uma política deve responder ao feedback do mundo real, alterando as políticas à medida que as condições mudam.

6. O centro político deve ser congruente com as causas e efeitos dos problemas em questão: as decisões políticas devem seguir o princípio da subsidiariedade, ou seja, os problemas devem ser resolvidos no domínio mais pequeno possível, por instituições à mesma escala do problema. Problemas globais como o aquecimento global devem ter uma solução global, enquanto problemas locais como a recolha do lixo devem ser resolvidos localmente. Estas escalas nunca se devem misturar. A juntar a estes princípios gerais de desenvolvimento e implementação das políticas,

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Costanza and Daly (1992) apresentam alguns princípios operacionais da sustentabilidade forte, ou seja, manutenção do capital natural agregado:

1. Limitar a escala da atividade humana a um nível que esteja dentro da capacidade assimilativa do planeta.

2. Usar o progresso tecnológico para aumentar a eficiência e não o throughput. Isso pode ser feito com políticas de tributação sobre o uso de recursos.

3. O CN renovável deve ser explorado de forma a maximizar o seu rendimento, mas sob a restrição da sustentabilidade. Na sua função de fonte (source), deve ser usado a um ritmo inferior ao seu ritmo de regeneração e na sua função de sumidouro (sink), as emissões de resíduos não devem exceder a capacidade assimilativa do ambiente. 4. CN não renovável deve ser explorado ao ritmo a que se encontram substitutos

renováveis, de forma a manter constante o rendimento anual do agregado do capital natural.

2.4.1. Escala, distribuição e alocação

As linhas normativas da EE traduzem-se no reconhecimento de três problemas económicos distintos: escala da economia relativamente ao ecossistema, distribuição de riqueza e alocação de recursos (Costanza, Cumberland, Daly, Goodland, & Norgaard, 1997; Daly, 1996, 2003). A escala refere-se ao volume físico de throughput relativamente à capacidade de carga, podendo-se considerar como o consumo de recursos per capita multiplicado pela população (Costanza et al. 1997). Uma boa escala é sustentável, no sentido em que o seu CN não diminui ao longo do tempo. A relevância da escala está na sua relatividade para com a capacidade dos ecossistemas em regenerar recursos (inputs) e assimilar poluição (outputs). A distribuição consiste na divisão relativa do fluxo de recursos na forma de bens e serviços finais entre pessoas alternativas ao longo do tempo (gerações presentes e futuras). Uma boa distribuição é justa, na qual a desigualdade é limitada a um nível máximo aceitável. A alocação refere-se à divisão relativa do fluxo de recursos entre produtos alternativos. Uma boa alocação é eficiente, significando que se alocam recursos entre os diferentes usos em conformidade com as preferências individuais, que por sua vez são influenciadas pela capacidade do indivíduo para pagar. O mercado vai assegurar esta eficiência através dos mecanismos de oferta e procura (Costanza et al., 1997).

Referências

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