• Nenhum resultado encontrado

[Recensões]

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "[Recensões]"

Copied!
14
0
0

Texto

(1)

GONZÁLEZ OÑA, Juan-Maria – “Sub Christi Lumine”: Hacia una

reno-vación cristocéntrica de la teología moral: Líneas de refl exión sobre

el Magisterio: del Vaticano II a Veritatis splendor. Romae: Pontifi cium

Institutum Joannes Paulus II Studiorum Matrimonii ac Familiae, 2011. 448 p.

Assinalamos o aparecimento deste livro, que é uma tese de doutoramento em teologia, apresentada ao conhecido Instituto João Paulo II para o Estudo do Matrimónio e da Família.

Nele se faz um exaustivo percurso pela história da teologia moral fundamental recente, desde o Concílio Vaticano II até à publicação da encíclica “O esplendor da verdade” (1993). Uma primeira parte é de índole analítica e versa primeiro sobre a reno-vação da teologia moral nos textos do Concílio, tanto nos textos preparatórios que não chegaram a ser aprovados, como nas duas grandes constituições (“Lumen Gentium” e “Gaudium et Spes”) e nos documentos sobre a formação sacerdotal (“Optatam totius”) e sobre a liberdade religiosa (“Dignitatis humanae”). Estuda, depois, os cerca de trinta anos que se seguiram, sobretudo os textos do pontificado de João Paulo II e a moral tal como é proposta no “Catecismo da Igreja Católica”, concentrando-se especialmente na encíclica “O esplendor da verdade”. A segunda parte é sistemática e tem como objetivo a exposição e o esclarecimento do tema principal, ou seja, o que o autor chama cristocentrismo moral da encíclica de 1993. Sucessivamente, o livro relaciona a cristo-logia com a verdade moral, ensaia uma fundação ontológica da moral na pessoa de Cristo e, finalmente, propõe um caminho para, nessa base cristocêntrica, fundar uma moral da virtude.

O Autor não se poupou a um esforço digno de grande apreço para propor uma lógica da história recente da teologia moral. O resultado é um percurso longo e exaus-tivo, que reconhecemos como de grande utilidade para os estudiosos desta matéria. Mas há neste livro um limite que lhe vem do facto de ser uma “tese” no bom e no mau sentido desta palavra. E é sobre este último sentido que pedimos ao Autor e aos leito-res para fazer algumas observações. De facto, quanto nos é dado observar, diversos estudos recentes do Instituto João Paulo II para o estudo da família ocupam-se, não da família, mas prevalentemente de questões de moral fundamental, como se quisessem mostrar aos seus colegas de mester uma via de coeficiente superior de fidelidade ao magistério da Igreja. Neste livro, de facto, existe um tom polémico, visível do início ao fim, que lhe limita o valor científico e a utilidade. São disso exemplo algumas teses,

}3.1.

(2)

entre as quais a que vem exposta logo no início (p. 6). A seu ver, a moral dos nossos dias está «desvinculada do fundamento sobrenatural e dominada por correntes filosó-ficas e culturais a-metafísicas ou pós-metafísicas». Temos sérias dúvidas de que se possa demonstrar que assim seja. Entre outras teses, a nosso ver, mais que discutíveis encontra-se esta que faz um juízo sumário sobre as principais correntes de teologia moral recente que, a ser verdade o ponto de vista do Autor, se passaram para um con-texto de autonomia e, portanto, de rebelião (em relação à fé em Deus). Este tom geral é injusto para tantos autores que tentaram propor a teologia moral de forma compreensí-vel, procurando manter a fidelidade a Deus e ao tempo que vivemos e que nos incumbe evangelizar. Se o Autor vier a continuar os estudos nesta matéria, propomos ainda que reveja a proposta da teologia moral pelo prisma da “renovação” e mesmo do “cristo-centrismo”. A renovação é, de facto, uma palavra do concílio. No entanto, parece-nos um tanto gasta pela usura do tempo. Mesmo o dito cristocentrismo que alguns usaram logo a seguir ao concílio foi progressivamente abandonado, não porque Cristo não seja a fonte da vida moral, mas porque é noção pouco apta para uma abordagem fecunda das fontes cristãs e da razão crente nos nossos dias.

(3)

SUAUDEAUX, Jacques – Promesses et limites de la thérapie génique

soma-tique: Une estimation éthique. Roma: Pontifi cia Universitas Lateranensis,

2008. 402 p.

Estamos, nesta obra, perante um equilibrado e excelente trabalho, no qual são abordadas as questões atuais e proeminentes da pr oblemática sobre os limites da investigação no âmbito da intervenção genética. O autor alerta, porém, para as pro-messas excessivas ao nível das terapias e, ao mesmo tempo, também foca a desilusão quando o entusiamo é excessivo e os resultados são nulos no que toca ao avanço da terapia genética molecular. Tal entusiasmo é frequentemente explorado pela comu-nicação social de forma pouco responsável, o que provoca, não raras vezes, o apa-recimento de voluntários pouco informados no que diz respeito ao sucesso de tais intervenções.

No essencial, o núcleo central desta obra, depois de um longo caminho percor-rido sobre o sucesso e o insucesso dos resultados obtidos pelas terapias genéticas, focaliza-se na questão do método terapêutico e na intervenção nos jovens doentes e atingidos por doenças hereditárias monogénicas, contrabalançando os resultados posi-tivos e negaposi-tivos, estes últimos com complicações secundárias – graves – desta nova via terapêutica.

Além disso, o leitor pode ainda perscrutar, nas palavras de Jacques Suaudeaux, quão doloroso é o sofrimento das crianças atingidas por doenças hereditárias e conde-nadas à degradação do seu corpo e do seu intelecto. Por isso, ainda que as promessas da terapia genética, como já referido, possam muitas vezes criar falsas esperanças, o autor admite que é necessário e obrigatório continuar a desenvolver a investigação neste domínio, mas com responsabilidade e cuidado ético, de maneira a não colocar em causa todo o esforço empreendido até ao estado atual da arte.

No entender do autor, a terapia genética tem futuro num quadro estrito de doen-ças monogénicas. Porém, se, por um lado, o sucesso das doendoen-ças tratadas pela tera-pia genética somática em doentes cujo prognóstico vital ou funcional é sombrio está longe de ser atingido, por outro lado, tudo leva a crer que o tratamento por esta via vai sendo cada mais basilar na sociedade, tornando-se, por isso, uma terapia comum-mente aceite e normal, como aconteceu no passado recente com a diálise e com as transplantações cardíacas.

Ao nível da bioética, para Jacques Suaudeaux, a questão da terapia genética somática não coloca problemas específicos que não possam ser resolvidos pelas orientações e pelas regras éticas que governam a boa investigação em seres humanos.

Temos então nesta obra um texto fluido que reclama uma atenção especial para a intervenção terapêutica com vista à cura de doenças genéticas. Por isso, o autor chama a atenção para o contínuo e necessário desenvolvimento investigacional nesta área, mas também apela para que todo este trabalho, com sucessos e insucessos, não se faça sem um fio de ética, tendo em conta o primado do ser humano – a pessoa – em toda a investigação. É uma obra notável.

(4)

TEIXEIRA, Joaquim da Silva – A experiência mística na obra de Dalila

Pereira da Costa: Fenomenologia e hermenêutica. Porto: Cosmorama,

2013. 255 p.

O livro a que se referirá esta recensão constitui uma oportuna publicação de uma tese de licenciatura canónica em teologia redigida por frei Joaquim da Silva Teixeira, o.c.d., presentemente – junho de 2013 – provincial dos Carmelitas Descalços portugue-ses. Como tema, diz-nos clara e venturosamente o seu título, pretendeu-se apresentar os registos da experiência mística de uma tão singular quão parcamente conhecida e, assim, apreciada escritora portuguesa: Dalila Pereira da Costa (DPdC). Dividido em duas partes, de valor consideravelmente distinto, trata-se de um esforço genuinamente interessante de desbravamento de terreno num horizonte que, lamentavelmente, ainda carece de estudos de firme monta. Estudos, precisamente, como aquele que, realizado por uma pessoa solidamente competente e conhecedora da obra de DPdC, aqui será ponderado nestas palavras.

A sua primeira parte constitui uma, talvez imperfeita, análise fenomenológica das ocorrências vividas, e automencionadas,no decurso da experiência mística de DPdC.

Num primeiro momento, centrado na biografia de DPdC e nos “êxtases” aludidos pela mesma nas suas obras, o Autor procura introduzir, com brevidade, o seu eventual leitor no universo histórico-espiritual daliliano. Tal contexto é, deveras, sempre o funda-mento incontornável para qualquer estudo sobre os escritos espirituais e místicos de um autor, e isto uma vez que a espiritualidade é uma realidade essencialmente expe-riencial e, consequentemente, de correlação direta com as coordenadas bioculturais da persona spiritualis.

Num segundo momento, é apresentada uma reflexão – não isenta, como vere-mos, de problemas – sobre, por um lado, alguns elementos tidos, por um Autor aqui norteado pelo parecer de Santiago Guerra Sancho, como característicos da experiên-cia mística cristã, e, por outro e conjuntamente, o modo como os mesmos podem ser encontrados, de um modo mais ou menos diáfano, nas narrações autobiográficas da, assim tida, vivência mística de DPdC.

Dissemos, mais acima, que esta secção “talvez fosse imperfeita”. E dissemo-lo por, pelo menos, três motivos. Em primeiro lugar, porque o Autor, não obstante oscilar na sua opinião, faz uma persistente confusão entre “fenómenos místicos” e “fenómenos (místicos) extraordinários”. De seguida, porque, na sua determinação dos traços da

mystica experientia, não explica, substancialmente e em nenhum momento, os motivos

para ter escolhido a opinião de certos autores – sobretudo o já mencionado Santiago Guerra –, quando, se tivesse optado por diferentes pensadores, outros traços distintos, por vezes dissonantes dos elencados, poderiam ser adotados. Por fim e num traço que perdurará ao longo de toda a obra, na medida em que quase restringe – ainda que, devido à sua vocação pessoal, compreensivelmente – aos dois grandes Reformadores do Carmelo aqueles autores místicos a quem alude para consubstanciar afirmações, suas e (ou) de DPdC, acerca da experiência mística.

Pois bem, estas três realidades comportam respetivamente: um privilegiar, na aná-lise da experiência mística da autora estudada, de situações que, não poucas vezes, surgem como dificilmente aptas para serem tidas como “místicas”; um dar flanco à

(5)

interpretação de que a adoção de determinadas obras, discriminadoras de certos traços da vivência mística, visou mais buscar elementos probatórios e justificadores de uma convicção previamente assumida pelo Autor do que buscar averiguadores de uma reali-dade a ser caracterizada; enfim, um permitir, injustamente e se não se estiver profunda-mente atento a tudo o que é dito, que se estime o Autor não só como relativaprofunda-mente des-conhecedor da mais ampla tradição mística humana e cristã, mas, sobretudo, incapaz de encontrar, nos diversos filões desta tradição, bem mais relevantes pontos de contacto e afastamento face ao patente nos textos de DPdC, os quais, talvez de um modo bem mais proveitoso, teriam iluminado melhor o que é essencialmente característico destes.

Tudo isto, segundo a nossa apreciação, empobrece uma – de resto muito perti-nente e bem estruturada – primeira secção desta obra, o que, pela própria natureza pri-migénia da mesma, condiciona tudo o que lhe segue, motivo pelo qual não voltaremos a referir, na nossa subsequente análise da obra aqui recenseada, aquelas insuficiên-cias que decorrem deste facto.

A segunda parte desta obra, inegavelmente a mais importante para os estudos dalilianos, foca-se numa interpretação, demorada e multifacetada, dos relatos de DPdC que são tidos pelo Autor como testemunhos de uma vivência mística.

Num momento inicial – e com uma vincada inclinação para preocupações de índole filosófica que, em geral, perpassam toda a obra –, o Autor versa sobre os esteios nucleares temáticos que podem ser encontrados nas autodescrições, assumidas por aquele como místicas, de DPdC. Tal empreitada surge plasmada de um modo que requer dois breves reparos. De um lado, é apresentada segundo uma estrutura aná-loga à que pode ser encontrada em estudos de teologia sistemática – de um belo estudo sobre os modos de conhecimento espiritual aduzidos nos textos da autora ana-lisada até ao apontar para as intuições da mesma sobre a escatologia –, o que, no caso vertente, quiçá seja demasiado forçado face à natureza do pensamento de DPdC. Por outro, é feita com um rigor e profundidade conceptual que pediriam uma maior aten-ção às estruturas expositivas, que, efetivamente e por vezes, poderiam ter sido mais cuidadas.

Num momento seguinte e mais uma vez aferindo-se – novamente sem verdadei-ramente justificar a sua opção – por uma catalogação (em nossa opinião assaz insu-ficiente) da experiência mística proposta por Santiago Guerra Sancho, o Autor tenta ponderar qual o enquadramento natural da, assim considerada, vivência mística de DPdC. Ainda que reconhecendo o quão artificial pode ser toda e qualquer delineação estrita no âmbito da mística, Joaquim Teixeira opta, com total justiça, por se inclinar para descrever a mesma como uma “mística da unidade a caminho da Trindade”.

Por fim, e numa diligência possivelmente motivada pelo desejo de prolongar o estudo, o Autor versa sobre as possíveis pontes de diálogo “ecuménico” – termo a ser tido no seu sentido amplo de “diálogo com o mundo” e não no teologicamente estrito de “diálogo com as distintas tradições cristãs” – entre os escritos dalilianos e as grandes correntes de pensamento, religioso ou não, da humanidade coeva.

Feita esta primeira apresentação do conteúdo da presente obra de Joaquim da Silva Teixeira, passamos, atualmente, a aprofundar um pouco mais a nossa apreciação da mesma.

Acerca dos aspetos menos felizes da mesma, deve ser dito, logo de início, que tudo o patenteado no texto fica a saber a pouco, talvez devido às limitações metodológi-cas já antes referidas, bem como, e em particular, o também já mencionado privilegiar

(6)

de preocupações filosóficas na abordagem da obra de DPdC. Colocados perante esta opção, o facto é que – embora sendo a espiritualidade justificadamente abordável a partir de distintos âmbitos do saber que dela são inseparáveis (história, sociologia, psi-cologia, teologia, estudos literários, etc.) –, sendo DPdC uma literata e historiadora da espiritualidade, e não uma filósofa, tal perspetiva analítica impõe duas observações muito sucintas. Primeiramente, a mesma parece ser uma opção relativamente artificial; uma que só não o será totalmente, pois o Orientador da tese que deu origem à presente publicação é um renomado filósofo. Segundamente e sobretudo, a aduzida perspetiva conduz o estudo a carecer de uma abertura de perspetivas que muito o poderiam ter enriquecido.

De seguida, é claro que o estilo e o cuidado postos, quer no concatenamento de ideias, quer na intercalação de citações de obras de DPdC com as reflexões do Autor, poderiam ter sido maiores, e sê-lo-iam, sem dúvida alguma, acaso o texto em apreciação tivesse passado por ulteriores revisões mais atentas. Revisões essas que teriam evitado inexatidões decorrentes, provavelmente, de um esforço possivelmente “apressado” ou “compartido” (com muitas outras solicitações).

Possivelmente conetado com este facto, que se repercute também em repetições textuais dos mesmos parágrafos em distintos locais da obra, surge uma patente vaci-lação nas afirmações do Autor. Talvez esse facto seja compreensível devido à natu-reza, sempre fluida e assim incontrolável, de um objectum mysticum que é, pelo Autor, tentado delinear a partir do, já de si espargido, registo autonarrativo das vivências mediante as quais DPdC terá contactado com um tal “objeto”. Um “objeto” que está, efetiva e incessantemente, a negar a sua natureza de ob-jectum.

Mais oneroso parece ser o facto de o Autor, não obstante a sua tentativa de ser generoso com tal denominação, não ter conseguido provar, de acordo com a nossa opinião, que as autonarrativas das vivências espirituais de DPdC permitem afirmar, inequívoca e totalmente, que as mesmas são tipicamente cristãs. De facto, e lendo-se o que o Autor apresenta nesta sua obra, poder-se-ia perfeitamente pensar – sem que isto signifique que assim seja – que DPdC usa os elementos conceptuais e terminológicos provindos do cristianismo apenas devido a ter vivido numa sociedade culturalmente próxima do mesmo. Ou seja, não o fazendo devido à necessidade de deles se servir para, naquilo que é condição essencial para a aduzida qualificação, traduzir uma reali-dade nuclearmente impossível de ser descrita sem os mesmos.

Apontando agora os elementos mais conseguidos desta obra, é inegável que se trata de um texto genuinamente poderoso – particularmente na sua abrangência temá-tica e inteligência explicativa –, que pode agradar a distintos públicos, sobretudo aos que mais estão familiarizados com (estudos sobre) a mística em geral, e que, em con-sequência, lograrão mover-se com mais desenvoltura por entre o apresentado, com inegável dedicação, por Joaquim da Silva Teixeira.

É, ainda, fascinante poder deparar-se com as constantes ligações, sempre per-tinentes e perspicazes, que o Autor estabelece entre, por um lado, o pensamento da autora por si estudada e, por outro, o mosaico social, religioso e cultural das socieda-des da última mudança de século. Neste exato contexto, são de mencionar e de socieda- des-tacar a atenção e a “intelligence fractale” com que, não se afastando do que a própria DPdC realiza ao longo da sua obra, tal é feito por Joaquim Teixeira.

Um terceiro elemento muitíssimo honroso nesta obra – trazida a lume pela Universidade Católica Portuguesa (Centro Regional do Porto), com a chancela das

(7)

edições Cosmorama, para assinalar o primeiro ano do falecimento de DPdC – é a ousa-dia, jamais regateada por parte do seu Autor, em adentrar, e dilatar, contextos e linhas de exploração, presentes e futuras, de uma obra literária e espiritual que merece e precisa, com vigor e urgência, ser cada vez mais conhecida.

De facto, e esta é uma derradeira virtualidade deste estudo de Joaquim da Silva Teixeira, o pensamento de DPdC, honestamente tentado delinear pelo Autor a partir das engenhosas autonarrativas das vivências espirituais dalilianas, é de uma relevância e importância tal que não pode, sob pena de não merecermos ser herdeiros espirituais de tamanha riqueza, permanecer tão incógnito e desconhecido como até aos nossos dias. A sua grandeza, quase que comparável ao que da pessoa de DPdC esta obra dá a conhecer, merece uma posteridade imensa. Uma posteridade que este livro de Joaquim da Silva Teixeira, que só se pode esperar que não tarde a tornar-se numa abo-natória obra de referência, antecipa a passos largos e seguros.

Resta-nos, se ainda necessário fosse, felicitar, com louvor, o Autor de A

experiên-cia mística na obra de Dalila Pereira da Costa – bem como o Orientador da tese que

deu azo à presente publicação e a quem a publicou – por tudo o que nesta é presen-teado. Que muitos dela possam beneficiar é o nosso sustentado desejo.

(8)

VAZ, Armindo dos Santos, Palavra Viva Escritura Poderosa: A Bíblia e

as suas linguagens. Lisboa: Universidade Católica Editora, 2013. 502 p.

Estudos Teológicos; 12.

Finalmente temos em português uma obra dedicada à Propedêutica Bíblica, que corresponde ao tratado clássico da Introductio Generalis in Scripturam Sacram. Esta obra vem preencher esse vazio, e preenche-o bem. Aliás, a essa qualidade sempre nos habitou o autor carmelita, grande conhecedor e contemplativo da Palavra de Deus. Por outro lado, com este volume 12 da coleção de Estudos Teológicos organizada por docentes da nossa Faculdade de Teologia, esta coleção fica mais enriquecida. No fim da obra o autor entrega-nos uma vasta bibliografia lida e comentada ao longo do seu texto, a qual revela o conhecimento aturado e acríbico dos autores e das temáticas prin-cipais. Isto só é possível depois de muitos anos de investigação atenta e cuidada nesta área (como é o caso), o que dá a esta obra a vantagem de ser uma obra de maturidade. Foi por isso de grande proveito lê-la de ponta a ponta.

A obra está dividida em quatro partes e em treze capítulos. Na primeira parte (A Palavra inspirada), o professor Armindo Vaz começa por tratar logo da inspiração bíblica nos dois primeiros capítulos, fazendo aí a história das diversas conceções da mesma ao longo da história da teologia. Na segunda parte (A palavra normativa. O

cânone bíblico) aborda a questão clássica do cânone bíblico, desde o capítulo III ao

V. Depois de fazer longamente a história da teologia do cânone, sintetiza, no capítulo IV, os critérios externos e internos de justificação do valor normativo dos nossos textos bíblicos que essa mesma história ofereceu. Termina esta parte com a difícil questão dos textos apócrifos. Neste capítulo, mais do que apresentar os textos mais repre-sentativos da literatura apócrifa (o que se compreende dada a vastidão deste corpo de literatura), sobretudo aprofunda com grande mestria a sempre difícil temática da canonologia. Por isso, não deixa de refletir sobre a difícil relação da Escritura com a gnose. Dada a vastidão da literatura apócrifa, deixou Qumran para a parte seguinte. Reconhecemos esta opção como ajustada. Com efeito, o contributo de Qumran reside no maior conhecimento da história do texto na crítica textual do Antigo Testamento (pp. 185-190), mais do que para a história do cânone, ainda que esta relação não seja estanque nem impossível. Apesar destas poucas páginas, o leitor encontra indicações preciosas em nota de rodapé para alargar os conhecimentos sobre os manuscritos do Mar Morto, do qual fazem parte os manuscritos essénios de Qumran.

Na terceira parte (A Palavra feita livro. O texto bíblico) dedica bastante tempo à história do texto. Aqui salientamos a quantidade enorme de dados que nos fornece sobre a história da transmissão do texto, para concluir no capítulo IX com a apresenta-ção das principais versões traduzidas do texto bíblico quer nas línguas antigas quer nas modernas. É aqui que o autor da obra nos confronta com toda a sua erudição e com a absoluta humanidade da palavra de Deus na sua materialidade escrita. No fundo, é a secção dedicada à crítica textual, esta última.

Na última parte (A Palavra interpretada. Hermenêutica bíblica) enfrenta-se com a outra questão clássica da interpretação bíblica. Consideramo-la a mais importante, e por isso até é – e bem – a mais extensa. Acrescentamos o adjetivo bíblica à herme-nêutica (aplicada neste caso à Escritura), pois, não descurando as regras necessárias

(9)

e aplicáveis à literatura enquanto tal, não deixa de ser contextualizada numa relação particular da fé (bíblica), da qual vem e à qual responde. Isto estabelece então alguns parâmetros que é necessário ter em conta na hora de interpretação da Escritura. Nesta secção, depois de resumir a história da interpretação do texto bíblico (cap. X) e a noe-mática bíblica (cap. XI), comenta longa e minuciosamente as metodologias à disposi-ção da exegese bíblica (cap. XII), rematando com uma reflexão sobre as incidências da Palavra de Deus na nossa existência e na existência quotidiana da Igreja (cap. XIII). Aqui o autor mostra como a Igreja é mãe e filha da Palavra, e como a Escritura é mãe e também filha da Igreja. Uma gera a outra.

O autor não se eximiu a questões difíceis, entre as quais a da canonicidade e inspiração da versão grega dos Setenta, o que também torna estimulantes a leitura e a reflexão. Daí sairmos enriquecidos da leitura e de nos ter chamado a atenção sobre um ou outro tema. Assim, por exemplo, na p. 222, quando acompanha a possibilidade da canonicidade e da inspiração da tradução dos Setenta, não apresenta a contestação de Rahner, pois para Rahner esse estatuto não lhe é merecido em nome precisamente da ausência de eclesialidade entendida como reconhecimento histórico autorizado por parte da Igreja sobre essa característica circunscrita para um conjunto de textos. Na verdade, o que está em causa sobre esta matéria na discussão a partir do período do Concílio é a própria possibilidade de reconhecer uma inspiração dupla, apesar de reconhecer que essa tese tem vindo a fazer o seu caminho e que «os Setenta gozaram de canonicidade prática por parte da Igreja apostólica». Com efeito, se isso é admitido (essa inspiração dupla), porque não aceitar uma inspiração tripla, quádrupla, quíntu-pla, ou tantas outras? Porque não equiparar a tradução dos Setenta (ainda que seja tradução e mais do que tradução) a um qualquer texto do património literário inspira-dor como o texto de outras religiões – que até o foi? Por isso, trazemos aqui Rahner à colação, apesar de já ter sido apresentado pelo autor na p. 21 aquando da sua proposta para pensar a inspiração num modelo social e editorial. A questão continua em aberto e provavelmente será insolúvel. Por causa disso, a Igreja nunca canonizou nenhuma versão mas apenas um texto, aquele que se tornou o mais preponderante no meio de vários. De modo positivo, este processo de cristalização canónica não se objetivou no todo do texto da versão dos Setenta, ainda que tenha sido assumido em grande parte e por isso se possa afirmar que «os Setenta gozaram de canonicidade prática por parte da Igreja apostólica». A dificuldade advém da parte que não foi integrada, a qual, como qualquer outro texto de uma qualquer tradição religiosa, não mereceu o reconheci-mento da eclesialidade.

O único ponto em que divergimos do autor encontra-se na p. 372, quando apre-senta como datação do deutero-Isaías o tradicional exílio. O deutero-Isaías nos últimos tempos tende a ser datado para um período posterior ao exílio. Vejam-se apenas os trabalhos de Caspari (1934), de Vincent (1977) e de Coggins (1998) como represen-tantes desta tese de maneira consistente, a qual tem vindo a fazer escola e a impor-se nos meios exegéticos. Na verdade, existem alguns sinais que não são despiciendos nesse sentido. Assim, Is 40-55 não é um texto unitário e não apresenta unidades fecha-das, como o demonstra a identidade de Is 48,22 (Javé diz: ‘para os ímpios não existe paz’) e Is 57,21 (‘para os ímpios não existe paz, diz o meu Deus’). Ora, Is 48,22 é do Isaías e 57,21 do trito-Isaías. Por outro lado, o carácter antológico do deutero--Isaías deteta-se no facto de que em alguns textos fala-se do povo de um modo nor-malmente cordial e positivo, com compaixão e abrindo portas para o futuro através da

(10)

esperança. Noutros textos do deutero-Isaías fala-se do povo num tom crítico e bastante duro, recriminando-o e lembrando o passado. Além disso, não é sem sentido colocar Is 54-55 em relação com o que se segue e não com o que está antes. O contexto social, geográfico e histórico dado por suposto não é seguro ou definido, pois surge como legí-tima pelo menos a pergunta: serão os exilados um grupo isolado e unido a conspirar contra o governo babilónico? Do ponto de vista geográfico, os argumentos a favor de um contexto babilónico são débeis, sendo preferível pensar, em vez disso, já depois em Jerusalém, no que leva a colocar Is 40-55 no meio do período persa e não no início, por-tanto bem mais lá para a frente depois do regresso do exílio – pelo menos a redação.

Finalmente, queríamos deixar a seguinte proposta, e que mais não é do que isso. Será útil acrescentar na bibliografia, numa próxima edição desta obra (que as terá, certamente), um instrumento de trabalho ao nível da metodologia bíblica. Estamos a falar da obra de Stanislaw Bazylinski, A guide to biblical research, Subsidia Biblica 36, Roma 2009, depois da primeira edição de 2006 e que constitui uma ferramenta muito útil ao nível da metodologia bíblica. Por último, pedimos ao autor para transliterar todos os termos hebraicos e gregos, para que o leitor menos familiarizado com estas fontes possa dar-se conta de, além do que é pronunciado, os eventuais jogos de linguagem que estão em causa a partir das figuras de semântica e de sintaxe que possam estar em causa.

Congratulamo-nos com o autor e queremos publicamente agradecer-lhe este grande contributo, que muito prestigia a nossa Faculdade e a editora da Católica em Lisboa.

(11)

VIDALIN, Antoine – Acte du Christ et actes de l’homme: La théologie morale

à l’épreuve de la phénoménologie de la vie. Préface de Vincent Holzer.

Paris: Parole et Silence, 2012. 571 p. Collège des Bernardins: Essai; 16.

Para quem, como é o nosso caso, pensava, com nostalgia, que se torna raro o aparecimento de algo novo na reflexão teológica sobre a ética e a moral, eis que nos cai na mão este volumoso ensaio de Antoine Vidalin, professor da Faculdade Teológica de Notre Dame, em Paris. É um trabalho que reconforta quem se dedica ao estudo da teologia. Foi apresentado como doutoramento por alguém que já se dedicou ao mesmo assunto em outros livros anteriores. Por isso, trata-se de matéria longamente meditada e assimilada.

O estudo apresenta duas grandes partes. Uma primeira, que versa sobre o ato humano tal como pode ser pensado a partir da fenomenologia da vida. Embora não seja explícito no título, trata-se de uma exposição do pensamento de Michel Henry (1922-2002), que foi quem desenvolveu a fenomenologia nesta direção. A segunda parte é uma teologia do ato humano, principalmente uma teologia moral geral, embora para o Autor as divisões de escola da teologia (moral, espiritual) não façam, à partida, grande sentido.

No primeiro momento do seu trabalho, A. Vidalin expõe detidamente a questão do ato humano, desde o ponto de vista da fenomenologia de M. Henry. É sabido como este pensador desenvolveu uma apreensão muito original da fenomenologia, levando-a na direção do que chama uma “fenomenologia da vida”, caminho que, na fase final da sua obra, lhe faculta um fecundo encontro com o cristianismo. Com uma grande coerência, Henry parte da problemática fenomenológica da vivência do sujeito, aplicando-a ao conhecimento, ao corpo, à economia, ao inconsciente, à arte e à cultura. Vidalin per-corre todos estes momentos do trabalho de Henry, à procura de uma explicação e de uma compreensão do ato humano. Os pressupostos henrianos dão-lhe a possibilidade de pensar o ato humano na sua imanência invisível, na sua ligação ao corpo, na vivência intersubjetiva, enfim, no seu carácter de passibilidade radical da vida absoluta que se vive no sujeito concreto. Pelo caminho, encontramos a exposição dos pressupostos do pensamento de Henry. Entre os mais importantes, aludimos aos seguintes. O primeiro é a duplicidade do aparecer: no mundo, como possibilidade de toda a manifestação, há a verdade da vida, aquela em que o dizer e o dito são coincidentes, e a outra, a verdade do mundo, a que, desde a Grécia, foi privilegiada na teoria do conhecimento, que olha apenas o que se manifesta na visibilidade. Não faz sentido distinguir entre visível e invisível. O segundo pressuposto de Henry é a crítica radical deste pensa-mento assente na representação, antepondo-lhe, como condição obrigatória de sua validade, um pensamento da imanência radical, condição da verdade de qualquer conhecimento do real. A transcendência é apreensível nesta radical imanência. O terceiro pressuposto, complementar dos anteriores e necessário ao projeto de uma teologia moral, é a ligação inseparável entre corpo e “carne”, sendo que esta última é o pressuposto de toda a possibilidade de corporeidade subjetiva ligada à vida, como condição da palavra e da verdade de todo o conhecimento. Estes pressupostos feno-menológicos de M. Henry dirigiram-na na direção de receber no seu pensamento algumas categorias de origem cristã, sobretudo do evangelho de S. João, entre elas

(12)

a de “filiação” e a de “arqui-inteligibilidade”. Antoine Vidalin percorre pacientemente todos estes passos, à procura de uma fenomenologia do ato humano. O verdadeiro ato humano é imanente e invisível; a sua eficácia (o seu poder) depende da imanência do “ego” na realidade da vida precedente, o seu fracasso é um processo de des-incar-nação, ou seja, de ilusão transcendental do ego. Tendo em conta esta sua origem e radicação na Vida precedente, o ato humano contém também em si o juízo sobre a sua eticidade e é uma entrada na felicidade. O ato humano resulta, pois, integrado pelos seguintes momentos: um sofrer-se, em que o sujeito se exprime em acusativo (“mim”, em vez de “eu”); uma angústia, em que se vive a liberdade que funda o agir (“eu posso algo”); um esforço penoso, que é o lugar em que algo se dá na existência humana, um rejubilar em que o agente se recebe como filho da vida (cf. p. 332).

Toda a segunda parte da obra integra estes elementos fenomenológicos numa teologia do ato humano, tornando explícito aquilo que estava implícito na obra de Henry: «No fundo de todo o agir concebível, do “eu posso” do ego, existe este outro agir, o agir da Vida absoluta que se revela a si mesma, religando o ego a si próprio, a Arqui-Revelação da Arqui-geração, o Olho-omnividente pelo qual todos os atos, mesmo os mais modestos, têm o seu enlace consigo mesmo e o seu poder agir – o Olho-omnividente que o precede e o acompanha como sua possibilidade mais interior e a mais inevitável» (C’est moi la vérité, 243). Por este caminho são redigidos os capítulos finais da obra: o ato humano é ligado a Cristo, como sua chave, à eucaristia, como seu fundamento, bem como à Sagrada Escritura que assim pode, num sentido radical, ser “a alma da teologia moral”.

Não é possível neste espaço ter em cota toda a riqueza deste longo trabalho. Aconselhamos vivamente a que seja lido para que cada pessoa que o lê faça o seu juízo. Porém, a obra de A. Vidalin levanta uma série de problemas a um leitor interes-sado em teologia moral, como é o nosso caso. Vamos expor alguns deles, não como diminuição da obra, mas como forma de receção dela.

Desde logo, alguns problemas metodológicos. Ao querer passar além da divisão da teologia em especialidades e, neste caso, ser mais do que uma teologia moral, não pode deixar de suscitar uma primeira questão. O ato humano é um tema de primeira ordem de importância para a moral geral e fundamental. Ora o nosso Autor constrói o seu tratado sem ter em conta o trabalho de muitos seus colegas de mester que têm dado um contributo para o assunto. Se excetuarmos o caso de S. Tomás de Aquino, não é dado lugar a mais ninguém no largo oceano dos teólogos que se ocuparam da matéria. Por certo que A. Vidalin não quis desconsiderar ninguém, antes visou pôr em evidência a novidade do seu ponto de vista. E, no entanto, há uma longa tradição que, desde a Idade Média, trata da questão do ato humano pelo ponto de vista da interio-ridade e da invisibilidade. Cremos que o parisiense Pedro Abelardo, para apenas dar um exemplo, apesar de ser uma companhia incómoda, merecia uma palavra como precursor desta linha de pensamento. Mas outro problema se levanta. Como é pos-sível tratar da questão dos atos humanos sem ouvir as ciências humanas? O trabalho resulta, deste modo, menos capaz de comunicação com os outros saberes e menos apto para propor um caminho de moralização da vida. O mesmo se diga das ciências bíblicas. Vidalin segue um caminho muito seu na interpretação da Escritura, mesmo do Antigo Testamento. A nosso ver, para entrar por esse caminho, era necessário ouvir mais biblistas, até por uma questão de justiça. O Autor pode desculpar-se dizendo que ninguém vai na sua direção quanto ao modo de abordar a Escritura. As afirmações

(13)

ousadas da conclusão, segundo as quais todas as temáticas de uma bioética ou de uma ética social estão contidas na Escritura, necessitam de uma longa explicação, para não parecerem desmedidas e algo biblicistas.

Outra questão, que toca método e conteúdo, leva-nos na direção de lamentar que A. Vidalin não tenha usado a distinção entre ética e moral, tal como é proposta por P. Ricoeur. Segundo este ponto de vista, a ética refere a exposição da vida boa, vida de comunhão e de sociabilidade, no contexto da instituição justa. Tem um propósito teleo-lógico. A moral, por sua vez, refere a justificação da norma de vida, numa perspetiva deontológica. Ora o trabalho de Vidalin apresenta-se como excelente, se tivermos em conta o primeiro aspeto, ou seja, na sua qualidade de uma ética teológica. Estamos inteiramente de acordo que este é o ponto de vista predominante de uma leitura teo-lógica da Escritura e do pensamento de Jesus sobre a matéria. Mas, a nosso ver, uma ética fica muito aquém do seu dever se não se prolongar na direção de uma moral, pois esta justifica precisamente a possibilidade do viver associado e histórico na con-dição finita que é a nossa. Ainda para mais, sendo a preocupação do Autor mostrar o contributo da teologia moral para uma bioética. «Se a bioética pode ter um sentido e uma autoridade, então ela tem de ser uma ética prescrita pela própria vida, quer dizer, a ética da vida» (p. 551). Porém, esta passagem da proclamação da ética a uma justifi-cação da norma moral não é, a nosso ver, satisfatória no discurso proposto. Apresenta consideráveis virtualidades, não temos dúvida em o afirmar. Mas não fica feito o cami-nho de forma automática. A vida concreta é feita de escolhas, muitas vezes em situação de conflito. O princípio geral da imanência do sujeito à Vida que nele se vive não basta para decidir em situação. Necessita de outros princípio mediadores que a tradição moral bem conhece. Seria muito interessante continuar este discurso, tentando mostrar como podem ser melhorados esses princípios da tradição. Esperemos que o Autor o venha a fazer.

Este ponto dá-nos entrada noutra perplexidade. Por um lado, não nos cansaremos de admirar a beleza das reflexões sobre o ato humano, visto desde a sua inclusão no ato de Cristo e na grande corrente da Vida precedente. Daqui decorre uma descrição da subjetividade humana mergulhada na ação criadora e redentora, superando a visão antiga ou moderna do sujeito autoconstituído e incomunicante com a alteridade e com a transcendência divina. Porém, fica-nos uma pergunta sobre o modo como podemos pensar, neste novo contexto, a consistência da subjetividade humana. De facto, a tra-dição bíblica e teológica sempre afirmou esta consistência, pois o ser humano é inter-locutor de Deus de forma livre e separada, com é próprio de quem se relaciona pela palavra. As belas páginas deste trabalho deixam-nos a sensação de que esta consistên-cia resulta algo diluída. A “intriga noturna” da religação do sujeito ao divino é uma bela metáfora cheia de sentido. Porém, os seres humanos, mesmo os crentes, vivem uma responsabilidade que parece ser do propósito divino conceder-lhe para poderem gerir o mundo, para cá dessa noite em que a sua origem remonta a Deus. Será que a fenome-nologia da vida evita aquilo que parece ser uma indevida “concentração teológica” da antropologia do ato humano? É uma pergunta que fica. Esta questão poderia prolongar--se para o terreno cristológico, para fazer algumas perguntas. Desde logo para confron-tar o Autor com a sensação do leitor de que não é dada à “carne” de Jesus o seu lugar absolutamente único, quando à possibilidade do “ser carne” de todos os outros seres humanos. Será verdadeira esta sensação? E logo de seguida para perguntar também se a subjetividade humano-divina de Jesus está suficientemente acautelada, no que

(14)

toca à perfeição da sua humanidade de agente moral, a qual tem de ser íntegra, e por-tanto não apenas coincidente com Deus mas interlocutora de Deus, para que a natureza humana seja assumida verdadeiramente.

Estas observações são oriundas de quem, como nós, lemos o livro com muita atenção e esperamos ter entendido boa parte da mensagem contida nele. A concluir, é justo dizer que o livro de A. Vidalin é uma lufada de ar fresco no reino da teologia moral que, quanto a nós, tem ficado para trás das outras disciplinas teológicas, quanto à assi-milação de elementos que lhe são essenciais para a sua missão de expor «a sublimi-dade da vocação em Cristo» (Optatam totius, 16). A nosso ver, este livro fará história e desejamos-lhe um longo caminho na tarefa de motivar a superação de alguns caminhos angustos que a teologia moral tem percorrido em vão recentemente, seja o biblicismo, seja o positivismo. Este último verifica-se especialmente como positivismo teológico e antropológico, no que toca à compreensão dos a tos humanos, tratados como algo visível e isolável da biografia do sujeito. Mas pode ser também, quanto à norma moral, positivismo da revelação e do magistério da Igreja. Visto como convite a uma boa ética teológica em ordem a uma boa moral normativa, este livro é um valiosíssimo contributo.

Referências

Documentos relacionados

DEF051952 Quando você faz upgrade do Marketing Platform 7.5.x para 8.1.0, o instalador solicitará para especificar o diretório no qual a versão 7.5.x está instalada. Se o instalador

lá!.. que em algum lugar, em algum reino distante, naquele momento nascera a que viria a ser a rainha do menino-rei. E que era bonita como um pingo d'água na folha do inhame. E você

Selecione esta opção para recuperar as regulações de origem do seu produto. Pressione o botão OK para passar as informações de texto fornecidas pelo relógio e proceder

Os cristãos são monoteístas e assim não reconheciam os deuses pagãos de Roma e também se recu- savam a adorar o imperador como divindade.. Acreditavam na vinda de um salvador;

A Lista de Fauna Ameaçada de Extinção e os Entraves para a Inclusão de Espécies – o Exemplo dos Peixes Troglóbios Brasileiros.. The List of Endangered Fauna and Impediments

O mundo, Natureza Naturada, está formado – além de pelos modos infinitos – pelos modos finitos, os quais, ainda que se constituam como determinações desses modos infinitos –

Monstros (no mundo humano) - Personagens são monstros / alguns monstros são bons e alguns monstros veem os humanos como comida.. Monstros (no mundo dos monstros) - Personagens

f) Talvez eu seja perdoado por ele. Adjunto adverbial de dúvida g) Falou muito pouco. Adjunto adverbial de modo.. h) Podavam-se as plantas com uma grande tesoura. Adjunto adverbial