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DISTÚRBIOS OSTEOMUSCULARES NO OMBRO: SÍNDROME DO MANGUITO ROTADOR E SÍNDROME DO IMPACTO. UMA ABORDAGEM BIOMECÂNICA

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DISTÚRBIOS OSTEOMUSCULARES NO OMBRO: SÍNDROME DO MANGUITO

ROTADOR E SÍNDROME DO IMPACTO. UMA ABORDAGEM BIOMECÂNICA

Claude Jacques Chambriard*

Universidade Federal do Rio de Janeiro claudechambriard@yahoo.com.br

Gisele Guimarães Daflon Antonio**

Ministério do Trabalho no Estado do Rio de Janeiro giseledaflon@gmail.com

Flavio Maldonado Bentes***

Fundacentro, Ministério do Trabalho flavio.bentes@fundacentro.gov.br

RESUMO

Os distúrbios musculoesqueléticos são a segunda principal causa de novos benefícios previdenciários auxílio-doença no Brasil. Muitos desses casos podem ser causados ou agravados por fatores presentes no ambiente ou nas condições de trabalho. Os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) são definidos como quadros resultantes de sobrecarga de trabalho, falta de tempo de recuperação do sistema osteomuscular entre outros. Não há uma causa direta para ocorrência de DORT, mas sim uma rede complexa de aspectos biológicos, psicológicos e sociológicos em condições de trabalho inadequadas. Entre os DORT, as lesões da articulação do ombro são consideradas um dos principais problemas. Este trabalho trata de um estudo relacionado aos aspectos conceituais e biomecânicos inseridos no contexto dos distúrbios osteomusculares estudados.

Palavras-chave: síndrome; manguito rotador; impacto, biomecânica.

OSTEOMUSCULAR DISORDERS IN THE SHOULDER: ROTATOR CUFF SYNDROME

AND IMPACT SYNDROME. A BIOMECHANICAL APPROACH - LITERATURE

REVISION

* Professor Assistente do Departamento de Traumato-Ortopedia da UFRJ, Especialista em Traumato-Ortopedia, Cirurgia da Mão, Microcirurgia, Tumores Ósseos de Conectivos, Médico do Trabalho, Mestre em Ortopedia e Traumatologia, Perito Legista da PCERJ, Coordenador do Grupo de Análise de Acidente de Trabalho (GAAT), Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

** Auditora Fiscal do Trabalho, Médica do Trabalho, Especialista em Endocrinologia, Mestre em Radioproteção e Dosimetria, Chefe da Seção de Segurança e Saúde do Trabalhador do Ministério do Trabalho no Estado do Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

*** Pesquisador/Tecnologista da Fundacentro, Ministério do Trabalho, Engenheiro Mecânico e de Segurança do Trabalho, Pós-doutor, Doutor e Mestre em Engenharia Mecânica. Chefe do Serviço Técnico da Fundacentro/RJ. Professor universitário nos cursos de graduação em Engenharia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.

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ABSTRACT

Musculoskeletal disorders are the second leading cause of new social security benefits in Brazil. Many of these cases can be caused or aggravated by factors present in the environment or in working conditions. Work-Related Musculoskeletal Disorders (WRMD) are defined as frames resulting from work overload and lack of recovery time of the musculoskeletal system. There is no direct cause for DORT, but rather a complex network of biological, psychological and sociological aspects in inadequate working conditions. Among WRMD, shoulder joint injuries are considered one of the main problems. This work deals with a study related to the conceptual and biomechanical aspects inserted in the context of the musculoskeletal.

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1 INTRODUÇÃO

Os distúrbios musculoesqueléticos são a segunda principal causa de novos benefícios previdenciários auxílio-doença no Brasil (Silva-Junior e Fischer, 2014). Muitos desses casos podem ser causados ou agravados por fatores presentes no ambiente ou nas condições de trabalho. Os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) são definidos como quadros resultantes de sobrecarga de trabalho e falta de tempo de recuperação do sistema osteomuscular.

Não há uma causa direta para ocorrência de DORT, mas sim uma rede complexa de aspectos biológicos, psicológicos e sociológicos em condições de trabalho inadequadas. Entre os DORT, as lesões da articulação do ombro são consideradas um dos principais problemas.

No Brasil, o diagnóstico CID-10 M75 (lesões do ombro) foi notificado como acidente de trabalho/doença ocupacional por 21.073 vezes, representando o oitavo principal agravo, ou 2,9% do total, no ano de 2013 (Silva-Junior e Fischer, 2014). A lesão do manguito rotador (LMR) é bastante comum na prática ortopédica, com prevalência entre 5% e 33% (Revista Brasileira de Ortopedia, 2015).

Estudos descrevem como fatores de risco específicos para distúrbios do ombro tanto variáveis individuais (idade, trauma, hipovascularização na inserção do músculo supraespinhoso, dentre outras) (Mirer, 1998), quanto aspectos do trabalho (biomecânica, fatores psicossociais do trabalho) (Van Rijn, 2010).

A revisão da literatura revela que os distúrbios do ombro são influenciados por fatores biomecânicos relacionados ao trabalho, como: flexão ou abdução de ombro por tempo prologados; vibrações; postura estática ou com carga nos membros superiores; além da associação entre os distúrbios do ombro e os fatores psicossociais como estresse; longas jornadas de trabalho e período de descanso insatisfatório (Silva et al, 2016).

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2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A ARTICULAÇÃO DO OMBRO

O ombro é uma articulação bastante complexa e a mais móvel de todo o corpo humano, entretanto, é considerada pouco estável por sua anatomia articular, especialmente na articulação glenoumeral.

A grande mobilidade e maior instabilidade podem ser atribuídas à frouxidão capsular associada à forma arredondada e grande da cabeça umeral e rasa superfície da fossa glenoide (Santos et al, 1995), sendo necessário harmonia sincrônica e constante entre todas as estruturas estáticas e dinâmicas que mantêm sua biomecânica normal.

Por esse motivo, qualquer alteração que comprometa sua estrutura e função faz com que esse complexo articular seja alvo de inúmeras afecções, sendo a síndrome do manguito rotador (SMR) / síndrome do impacto (SI) as mais comuns em indivíduos adultos. Esta patologia caracteriza-se por uma síndrome dolorosa do ombro, normalmente acompanhada por microtraumatismos e degeneração, além do déficit de força muscular e tendinite do manguito rotador (Moreira e Carvalho, 1998).

O ombro é formado por três articulações: articulação esternoclavicular (Smith et al, 1997), articulação acromioclavicular (Hamill e Knutzen, 2008) e articulação glenoumeral. Uma "falsa" articulação chamada “articulação Escapulotorácica” (Tortora e Grabowski, 2002) é formada quando a escápula desliza em lâmina contraparte posterior do tórax (costelas). Este conjunto é importante porque exige que os músculos que se inserem na escápula trabalhem juntos para manter os movimentos do ombro.

2.1 Manguito Rotador (MR)

A função principal deste grupo é manter a cabeça do úmero posicionada contra a cavidade glenóide, reforçar a cápsula articular e resistir a deslocamentos indesejáveis da cabeça do úmero em direção anterior, posterior e superior. Fazem parte do manguito rotador os seguintes músculos: supra-espinhoso; infra-espinhoso; redondo menor e subescapular.

Na figura 1 são representados alguns dos músculos componentes do manguito rotador, em sua posição anatômica, em visão anterior, representadas em um ombro do lado direito.

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Figura 1 - Músculos componentes do manguito rotador

Fonte: (PRIPAS, 2014)

O músculo bíceps braquial não faz parte do manguito rotador, mas contribui para a estabilização da cabeça umeral, estando em íntimo contato com os músculos componentes deste grupamento.

2.2 Anatomia funcional do MR

Para Andrade et al (2004) é formado por quatro músculos que se originam na

escápula e se inserem nos tubérculos do Úmero. Seus tendões tornam-se confluentes entre si e a cápsula articular quando se aproximam de suas inserções.

O MR trabalha como unidade combinada para estabilizar a cabeça do úmero na cavidade glenóide; o adjetivo rotador poderia perfeitamente ser substituído por compressor, provavelmente o componente mais importante entre as suas múltiplas funções.

Ele comprime a cabeça umeral contra a glenóide, aumentando a estabilidade, resistindo ao deslizamento e à translação da mesma (nos sentidos ântero-posterior e ínfero-superior), permitindo ainda alguma rotação em torno dos seus três maiores eixos (ântero-posterior, médio-lateral e diáfiso-umeral), isoladamente ou em conjunto.

A figura 2 representa a ação “compressora” do manguito rotador, sobre a cabeça umeral, comprimindo-a de encontro a Glenóide, aumentando a estabilidade desta articulação (visão posterior).

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Figura 2 - Ação compressora do MR sobre a cabeça umeral.

Fonte: (THE ROTATOR CUFF..., ©1999)

Nas amplitudes médias de movimento, todos os estabilizadores estáticos da articulação glenoumeral estão relaxados e, nesta situação, a estabilidade articular é quase que exclusivamente garantida pelo MR (Jobe, 2002; Mileski e Snyder, 1998).

O efeito compressivo exercido pelo MR é relativamente independente da posição em que se encontra a articulação, embora nos movimentos de deslizamento e translação sua função se alterne. Em abdução e rotação neutra, o infra espinhoso é depressor da cabeça umeral, mas em abdução e rotação externa, ele se torna elevador.

O infra espinhoso, juntamente como redondo menor, são os únicos rotadores externos (Matsen et al, 1998; Neer, 1990). O subescapular é depressor mais efetivo em rotação externa. Tem pouco efeito na translação ântero-posterior em abdução e rotação externa, sendo importante rotador interno nos últimos graus desse movimento.

O supra-espinhoso é importante estabilizador e compressor da cabeça umeral e está ativo em qualquer movimento envolvendo a elevação do membro superior (Morrey et al, 1998).

O músculo deltoide é um músculo volumoso e em forma de triângulo, que cobre a cintura escápulo-umeral e a estrutura do ombro. Apresenta um formato triangular, semelhante ao delta do alfabeto grego, advindo daí o seu nome. Situado na região da espádua, constitui-se como o seu músculo mais volumoso, estando localizado próximo da zona superficial, logo abaixo da pele, modelando o formato arredondado do ombro. Tem um formato côncavo, estando a face convexa voltada para o exterior. Neste músculo podem-se distinguir três partes, devido aos diferentes pontos de inserção e de fixação dos feixes que o

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formam: clavicular (de onde se originam se as fibras musculares anteriores), acrominal (origem das fibras musculares externas) e escapular (fixação das fibras musculares posteriores). Na clavícula, insere-se na metade externa do lábio inferior da borda anterior, enquanto que na escápula se fixa ao longo do lábio inferior da espinha.

Os vários feixes que compõe o deltóide unem-se num tendão que se fixa um pouco acima da zona média do primeiro osso do braço, o úmero, na zona da impressão rugosa deltoide. A figura 3, apresenta-se o músculo deltóide direito em vista lateral.

Figura 3 - Músculo deltoide direito em vista lateral.

Fonte: (DELTOIDES..., 2014)

O músculo deltóide, também tem como resultado de sua ação, a tração em sentido cranial da cabeça umeral, ocasionando a migração proximal desta, quando os músculos do MR não são suficientes fortes para mantê-la “comprimida” de encontro a glenóide (Rockwood and Matsen, 1998). A figura 4 ilustra um esquema resultante de forças da ação do músculo deltóide e do músculo supra espinhoso representando todo o conjunto do manguito rotador.

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Figura 4 - Resultante de forças da ação do músculo deltóide e supra espinhoso.

Fonte: (MATSEN III, 2006)

Quando a força do músculo deltoide é superior à dos músculos componentes do MR, o resultado deste desequilíbrio é a migração proximal da cabeça Umeral. A figura 5 apresenta um esquema onde é demonstrada a resultante de forças quando em desequilíbrio a ação do músculo deltóide e do músculo supra espinhoso (representando o manguito rotador), permitindo a migração da cabeça umeral, o que acarreta o choque entre a cabeça e o arco coraco acromial, mesmo sem que o membro superior esteja elevado acima de 90º.

Figura 5 - Resultante de forças em desequilíbrio, permitindo a migração da cabeça umeral em sentido proximal.

Fonte: (MATSEN III, 2006)

Naturalmente, o choque entre a cabeça umeral e o arco coraco acromial é mais evidente quando o membro superior está na posição de abdução, porém, a depender do grau de desproporção de força entre o manguito rotador e o deltóide, este choque pode ocorrer mesmo sem abdução, como representado na figura 5.

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O exame de eletroneuromiografia dinâmica mostrou que os músculos do MR e o músculo deltóide são ativos em todo arco de flexo-abdução, parecendo que os primeiros agem para contrapor-se às forças de cisalhamento geradas pelo músculo deltóide. Esse efeito combinado da ação sinérgica do MR gera um efeito compressivo da cabeça umeral contra a glenóide (Alpert et al, 2000).

Os músculos deltóide e supra espinhoso são os principais abdutores do braço. O deltóide é um músculo com três partes e sua parte média (porção acromial) é a parte abdutora por excelência. As porções escapular e clavicular, entretanto, são importantes na abdução, impedindo o deslocamento da cabeça do úmero, posterior e anteriormente, durante a ação abdutora da porção acromial.

O músculo supra espinhoso, frequentemente, não consegue abduzir o membro superior além de 45° quando o deltóide está paralisado. Isto parece indicar que o supra espinhoso só é importante no início da abdução. Porém, deve ser ressaltado que este músculo, como já expresso, por fazer parte do manguito rotador desempenha na abdução uma ação sinérgica fundamental; a de “comprimir” a cabeça do úmero contra a cavidade glenóide da escápula durante a ação do deltóide.

O MR também se beneficia das ações de outros músculos no desempenho de suas funções, ou por sinergia ou pela criação de um ambiente biomecânico mais adequado.

A função do deltóide demonstra claramente esse fenômeno. No início da elevação, com o membro superior em adução, a sua contração produz uma força de cisalhamento em direção cranial.

O deltóide ântero-lateral, pela direção de suas fibras contornando o tubérculo maior, cria uma força que se opõe à primeira e aumenta o efeito compressivo e a estabilidade Glenoumeral.

A criação de melhor ambiente biomecânico é exemplificada pela ação dos estabilizadores da escápula, que permitem a sua rotação superior no plano coronal durante a elevação do membro superior e previnem contato anormal do tubérculo maior e do manguito rotador com o arco Coracoacromial (Jobe, 2002; Mileski e Snyder, 1998; Matsen et al, 1998).

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3 FISIOPATOLOGIA DA LESÃO - SÍNDROME DO IMPACTO

Na patogênese das lesões do MR a literatura define duas diferentes causas: intrínseca e extrínseca ou traumática.

A primeira considera que a causa primária seria um processo degenerativo relacionado ao envelhecimento natural dos tendões (entesopatia), devido a mudanças na vascularização do manguito ou outras alterações metabólicas associadas com a idade.

Segundo Neer (1990), Codman, em 1934, foi o primeiro a descrever a “zona crítica”, uma porção do tendão do Supraespinhoso localizada a 1cm medial à sua inserção no tubérculo maior, na sua parte articular, como o local de maior mudança degenerativa.

Ele pensava que processos degenerativos em associação com trauma eram responsáveis pela ruptura do manguito.

Sua teoria continua recebendo o suporte daqueles que consideram a lesão degenerativa como começando pelo lado articular dos tendões (Lashgari e Yamaguchi, 2002). Foi observado um suprimento vascular esparso na inserção do supra-espinhoso, correspondente a sua parte articular e uma rica vascularização no lado bursal.

Autópsias em cadáveres demonstraram que a maioria das lesões ocorria no lado articular, sugerindo que as mudanças degenerativas e o suprimento vascular insuficiente eram fatores patogênicos importantes, havendo evidências claras de preexistirem mudanças degenerativas relacionadas à idade como consequência de microtrauma.

Portanto, todos esses indicativos nos levam a crer que a doença do manguito seja uma tendinopatia intrínseca causada por avascularidade, idade ou sobrecarga de uso.

Em 1972, Neer descreveu que o atrito anormal entre o arco coraco acromial e os tendões seria a causa da lesão que ele denominou de síndrome do impacto subacromial. Em adição, fricção e atrito na superfície do acrômio poderiam agravar as mudanças degenerativas, caso existissem, do manguito, conduzindo a uma lesão completa (Neer, 1972).

A figura 6 ilustra o impacto da cabeça umeral de encontro ao arco coraco acromial no ombro direito, com o membro superior em abdução (elevado). Chama-se a atenção também para a bolsa (bursa) subdeltoideana.

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Figura 6 - Impacto da cabeça umeral junto ao arco coraco acromial no ombro direito.

Fonte: (GOBBATO, [entre 2000 e 2018])

Bigliani et al (1991) descreveram tipos morfológicos de acrômio (reto ou plano, curvo e ganchoso) e que as lesões eram iniciadas pelo impacto subacromial; na presença de acrômios curvos e ganchosos, a predisposição seria maior. A figura 7 representa os tipos de acrômio descritos por Bigliani.

Figura 7 - Tipos morfológicos de acrômio descritos por Bigliani et al (1991).

Fonte: (GRACITELLI, [Entre 2000 e 2018])

Os fatores extrínsecos, como o esporão acromial, têm papel secundário na lesão do manguito rotador e sua etiologia, na verdade, é multifatorial.

As alterações do manguito são devidas a fatores intrínsecos, como lesão degenerativa intra-substancial ou tendinose, causada por avascularidade, idade ou sobrecarga excêntrica.

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Isso levaria à falência de suas fibras e, consequentemente, a diminuição funcional. Esta facilitaria a ascensão da cabeça umeral, levando-a ao impacto secundário na região subacromial.

Como a cabeça umeral fica contida no arco coraco acromial, resultaria também, em decorrência, modificação estrutural secundária no formato do acrômio (Fukuda, 2003; Gartsman e Milne, 1995; Nirschl e Guidi, 1998).

Recentemente, descreveram-se lesões intra-articulares secundárias ao impacto interno principalmente em jovens atletas arremessadores.

A interação repetitiva entre a superfície interna do manguito e a glenóide póstero-superior seria o fator responsável por tal lesão (Walch et al, 1992; Paley et al 2000).

Walch et al (1992) e Paley et al (2000), independentemente, descreveram a ocorrência de contato entre a superfície interna do manguito e a borda póstero-superior da glenóide quando o braço se encontra em abdução/rotação externa e extensão. Eles concluíram que as mudanças observadas no manguito e labrum eram resultado de um impacto interno. O estudo original de Walch et al (1992) incluiu jogadores de vôlei e tênis e mostrou que 76% dos pacientes tinham lesões articulares e 71%, esgarçamento do labrum póstero-superior.

Estudos em cadáver e clínicos, durante artroscopia em vivo, demonstraram que o contato entre o manguito e a glenóide póstero-superior poderia ser fisiológico (Edelson e Teitz, 2000; McFarland et al, 1999). No entanto, com as atividades atléticas esse contato fisiológico poderia ser mais intenso e frequente, levando com o tempo ao desenvolvimento de impacto e dor (Mithofer et al, 2004).

Andrews e Dugas (2001) demonstraram que arremessadores de beisebol apresentavam, com frequência, frouxidão da cápsula anterior da glenoumeral, representada clinicamente por excessiva rotação externa e restrição da rotação interna, concluindo que o impacto interno seria atribuído a instabilidade glenoumeral nos mais variados graus.

Segundo Paley et al (2000), os atletas têm estiramento da cápsula anterior e isso levaria ao impacto interno, mas não reconheceram a contratura da cápsula posterior.

Burkhart e Morgan demonstraram que a cápsula posterior, quando contraturada, determina uma translação imprópria da cabeça umeral, causando lesão da âncora do bíceps,

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e que o contato repetitivo com a superfície articular do manguito pode causar desgarro do labrum póstero-superior (peel back mechanism), levando a delaminação junto a glenóide pósterosuperior (Burkhart e Morgan, 1998).

Mais recentemente, tem-se tentado demonstrar que o impacto interno não é condição exclusiva de atletas arremessadores, mas que ocorre também na população em geral, durante o movimento de flexão provocada pelas atividades forçadas de vida diária e não apenas em abdução/rotação externa/extensão. Essa seria mais uma contribuição para a patogênese da doença do manguito rotador (Kim e McFarland, 2004).

Nesta categoria de trabalhadores estão incluídos os soldadores, pintores, digitadores, operários das linhas de montagem e outros.

Dentre as várias alterações que acompanham a síndrome do manguito rotador, pelo que foi aqui demonstrado, uma delas é a tendinite da porção longa do bíceps.

Verificou-se que a síndrome do manguito rotador pode ocorrer em indivíduos que, ao realizar atividades laborativas, não necessariamente tenham que posicionar seu membro superior em posição de abdução acima de 90º, nem que tenham que carregar peso sobre os ombros.

Foi também demonstrado que o tipo de acrômio, como acreditava Bigliani, não é causa exclusiva desta síndrome e que o tendão do músculo bicipital pode estar envolvido na lesão do MR, sem que o portador realize, unicamente, as atividades como descritas pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).

Por derradeiro, constata-se que os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho podem surgir a partir da associação de fatores intrínsecos e extrínsecos, e que a etiologia da patologia em questão é multifatorial. Outros achados importantes associam os distúrbios do ombro com fatores biomecânicos relacionados à prática laboral, como a realização de movimentos repetidos de membros superiores, longas jornadas de trabalho, manutenção da postura estática por um período prolongado, tipo de atividade laboral desenvolvida e a carga de trabalho (Silva et al, 2016).

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5 CONCLUSÕES

A partir do desenvolvimento do estudo observou-se que os distúrbios musculoesqueléticos são a segunda principal causa de novos benefícios previdenciários auxílio-doença no Brasil. Constatou-se que, no Brasil, o diagnóstico CID-10 M75 (lesões do ombro) foi notificado como acidente de trabalho/doença ocupacional por 21.073 vezes, representando o oitavo principal agravo, ou 2,9% do total, no ano de 2013.

Foi verificado que a lesão do manguito rotador é bastante comum na prática ortopédica, com prevalência entre 5% e 33% e também que a etiologia da LMR compreende aspectos biológicos, psicológicos e sociológicos em condições de trabalho inadequadas.

Observou-se que os fatores extrínsecos, como o esporão acromial, têm papel secundário na lesão do manguito rotador e que sua etiologia, na verdade, é multifatorial.

Mais recentemente, tem-se tentado demonstrar que o impacto interno não é condição exclusiva de atletas arremessadores, mas que ocorre também na população em geral, durante o movimento de flexão provocada pelas atividades forçadas de vida diária e não apenas em abdução/rotação externa/extensão;

Foi observado que a desproporção de força entre o músculo deltoide, sendo esta superior à dos músculos componentes do MR, tem como resultado deste desequilíbrio a migração proximal da cabeça umeral.

Verificou-se, também, que o músculo bíceps braquial pode ser comprometido quando da Síndrome do Manguito Rotador.

Conclui-se que os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho podem surgir a partir da associação de fatores intrínsecos e extrínsecos, e que a etiologia da patologia em questão é multifatorial. Outros achados importantes associam os distúrbios do ombro com fatores biomecânicos relacionados à prática laboral, como a realização de movimentos repetidos de membros superiores, longas jornadas de trabalho, manutenção da postura estática por um período prolongado, tipo de atividade laboral desenvolvida e a carga de trabalho.

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Imagem

Figura 3 - Músculo deltoide direito em vista lateral.
Figura 5 - Resultante de forças em desequilíbrio, permitindo a migração da cabeça umeral  em sentido proximal
Figura 7 - Tipos morfológicos de acrômio descritos por Bigliani et al (1991).

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