Do conceito de Complexidade I
Uma introdução ao tema dacomplexidade e dos sistemas complexos.
Uma preocupação:
Tema complexo e vago que acena para o irracional?
Uma motivação:
Está em curso uma mudança profunda na
concepção de ciência? Há emergência de uma nova forma de racionalidade?
O que é complexidade?
Um bom começo vem a ser examinar o significado do termo registrado nos
dicionários.
Estes associam ao termo complexidade dois significados: composto e complicado.
É complexo o que tem partes, possivelmente muitas, conectadas entre si, ou seja,
entretecidas.
É complexo o que se mostra difícil de
entender ou explicar porque contém inúmeros aspectos.
Além desses sentidos, ao final, um outro aspecto emergirá:
É complexo aquilo que se transforma e que se
produz a si mesmo, ou seja, que ora é uma coisa, mas logo vem a ser outra coisa por força
Sistema complexo
Deixe-se, por um momento, o conceito de complexidade, para examinar primeiro o
conceito de sistema complexo.
Como os textos descrevem usualmente um sistema complexo?
Características
dos sistemas complexos
Possuem grande número de componentes (às vezes simples);
Os componentes interagem dinamicamente; As interações são variadas e ricas;
As interações são não-lineares;
Não há em geral conexões diretas entre elementos distantes;
Características... (continuação)
Eles são sempre abertos;
Operam longe do equilíbrio, quando este existe;
A história do sistema é importante para entendê-lo;
As partes do sistema não tem acesso a toda a informação gerada no sistema como um todo. As partes do sistema agem com base em
informação local;
As propriedades do sistema como um todo são emergentes.
Ora, descrição não é conceituação...
Na busca de conceito, pode-se começar
examinando o significado do termo “análise”. Que concepções de mundo estão encobertas na
Análise em geral
Análise significa sempre decomposição.
Tem-se, portanto, um todo e suas partes. O método analítico requer sempre a divisão do
todo para chegar aos seus elementos mais
Método analítico
O propósito, então, é distinguir e examinar os elementos que formam o todo para conhecer
as suas propriedades (intrínsecas ou relacionais).
Daí, então, busca-se verificar se é possível
agrupar os conhecimentos das partes para
Análise: redução e separação
• Tem-se, portanto, um todo e suas partes. A questão, agora, é saber se as partes formam
um agregado, uma composição, um todo integrado e organizado ou uma totalidade.
• Se as partes forem separáveis – e o todo for
redutível a elas –, as partes formam um
Cont.
• Se as partes forem ainda separáveis – mas o
todo não for redutível a elas –, elas formam um composição e esta composição é o todo. • Mantida a impossibilidade de redução, se as
partes não forem separáveis, elas formam ou
um todo funcionalista ou uma totalidade
As partes e todo
• Quando se admite a redutibilidade do todo às
partes, tem-se uma concepção atomista do
mundo.
• Quando se nega a redutibilidade, mas se
aceita a separabilidade, tem-se uma
As partes e todo
• Quando se admite a irredutibilidade e a
inseparabilidade do todo às partes, tem-se uma concepção de mundo holística ou,
alternativamente, dialética.
• A distinção entre a concepção holística e a concepção dialética de mundo será feita
As raízes as concepções atomista e holística
Na história da civilização ocidental firmaram-se dois grandes paradigmas: o aristotélico e o da
ciência moderna.
A concepção de mundo aristotélica é holística,
mais precisamente, cósmica.
A concepção de mundo da ciência moderna é
O que é mecanicismo?
Um sistema é dito mecânico se as suas partes só estão vinculadas por nexos externos.
Nesse caso, essas partes só se relacionam externamente por causalidade eficiente
(também chamada de motriz).
O que é o holismo?
• Um sistema holístico é um conjunto de parte que se encontram internamente vinculadas
formando um todo bem organizado. • Assim, um todo não separável possui uma
ordem, uma organização interna, uma
Mas, o que é estrutura?
Aqui “estrutura” significa o conjunto dos nexos
internos que definem as partes enquanto tais e que constitui o todo como todo (ou seja,
não como mera agregação ou mera composição).
Mas organização pode ser compreendida sem empregar o conceito de estrutura. Nesse caso,
Holismo antigo e moderno
O todo aristotélico é um cosmos, ou seja, um
universo finito, orgânico e harmônico;
Na sociedade moderna, o todo não redutível não é pensado como cosmos, mas como totalidade funcionalista – pelo menos pela
Dialética
É também pensado, pelo menos pela ciência excepcional, como totalidade permeada por
contradições [dialética].
Mas é preciso, aqui, colocar provisoriamente a dialética entre parênteses.
Nesse momento, é preciso dizer que há duas
concepções bem diferentes de sistema
complexo:
• Uma delas, que é ainda mecânica, mas não
reducionista. Para ela, o sistema é uma
composição de partes que interagem.
• Uma outra, que é holística e estrutural – mas
não cósmica. O sistema é uma todo
O que é a ciência moderna?
A ciência moderna está fundada numa pré-concepção do que vem a ser uma explicação
científica.
“Toda boa explicação científica pode ser posta na forma nomológica e dedutiva, a qual pode,
então, ser formalizada, passando assim a ser representada por meio de um algoritmo
O que são leis (nomos) para a ciência moderna?
Vimos que a ciência moderna se levanta sobre o paradigma mecanicista.
O mundo é formado por “átomos” vinculados externamente. Ele tem regularidades que são
apreendidas como leis. As leis denotam conjunções de eventos ou conexões de fenômenos; são expressas por proposições
Ademais, em sua forma ideal, as leis científicas
expressam relações quantitativas atribuíveis
às conjunções de fenômenos do próprio mundo.
Por isso, a ciência moderna está fundada na
quantificação, ou seja, na subsunção das qualidades às quantidades. E, assim, na
Da matematização à formalização
A dedução em sua forma ideal e pura requer o formalização. Ou seja, a construção de uma
linguagem composta por símbolos sem
significado e regulada por regras de operação lógica, puramente sintáticas. Nessa forma ideal, toda dedução vem a ser um algoritmo
Identidade e Paralelismo
Há uma identidade entre a concepção moderna de ciência e a concepção mecânica de mundo.
Há, ademais, um certo paralelismo entre tal concepção de ciência e o formalismo em
Feito o desvio, é possível agora apresentar as duas concepções
antes referidas de sistema complexo
Concepção mecânica, mas não reducionista.
• Conserva como norma a explicação dedutiva da ciência moderna, substituindo as leis por
regras locais de comportamento.
• Define sistema complexo como base na teoria da computação, ou seja, como sistema
dinâmico complicado, mas ainda solúvel computacionalmente
Stephen Wolfram, trabalhando com sistemas dinâmicos que simulam paralelismo e que
evolvem a partir de interações locais, descobriu quatro tipos de padrões de
comportamento.
O primeiro tipo tende a uma ordem dada; o segundo tende a um comportamento cíclico; o
terceiro tende ao caos.
Um quarto, que fica na fronteira entre a ordem e o caos, foi classificado como complexo.
Limitações dessa concepção
Desse modo, se chega a uma concepção de complexidade a partir da noção de interação.
Sistema complexo = sistemas em que ocorrem muitas e variadas interações.
Mas é possível pensar a complexidade a partir dos nexos internos.
Concepção não mecânica
• Às vezes se diz que os sistemas mecânicos podem ser complicados, mas não
verdadeiramente complexos.
• E se define complexidade como o que não se pode apreender por meio de algoritmos.
• O que não pode ser assim apreendido é algo orgânico, que apresenta a propriedade da
Abrindo janelas...
Ao se desejar compreender os sistemas não-mecânicos, é preciso perceber que eles
requerem uma concepção mais rica de causalidade.
Por exemplo, admitindo da existência de causa final autêntica (teleologia) quando se
considera o comportamento humano individual.
Para enxergar Aristóteles...
Uma ideia é retornar, de algum modo, aos
conceitos de causalidade de Aristóteles, com o objetivo de tornar a ciência capaz de
apreender os sistemas internamente
estruturados que evolvem diacronicamente. Nesse caso, pode-se ter uma compreensão do
movimento bem diferente da concepção mecânica de movimento.
Causalidade aristotélica
Ela nem é mera conjunção de eventos (Hume), nem é mera conexão externa entre
fenômenos (Newton), mas geração ou
produção, ou seja, transformação da potência em ato.
Ex.: “Uma bolota é um carvalho em potência; a árvore será em ato quanto tiver crescido”.
Continuação:
Em Aristóteles, “o devir aparece como o despertar do que está adormecido”.
Exemplo clássico: a escultura que sempre requer o mármore e o escultor.
Continuação:
A causa material é aquilo do que a coisa é feita: o mármore.
A causa formal (ou essência) é aquilo que faz da coisa o que é ou que vem a ser: a ideia do
escultor.
A causa eficiente é aquilo que produz o
movimento: os golpes do cinzel.
Uma dúvida?
• Note-se que essa noção de causalidade faz sentido, inicialmente, em razão da
compreensão holística (cósmica) de mundo de Aristóteles.
• Será possível aproveitá-la quando já não se pensa o mundo como cosmos, mas se passa a entendê-lo como processo funcional ou como
Complexidade e dialética
• Nesse caso, “complexo” vem a ser uma totalidade estruturada que evolve por si
mesma em virtude das suas próprias contradições.
• As contradições são estruturais. Elas se
expressam nas interações entre os elementos do complexo e nas relações entre esses