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Paridade entre casamento e união estável, em sede de efeitos sucessórios do art. 1790CC, nas relações homoafetivas, sob a perspectiva do direito civil

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

DEPARTAMENTO DE DIREITO PÚBLICO

DHIEGO NUNES RODRIGUES

PARIDADE ENTRE CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL, EM SEDE DE EFEITOS SUCESSÓRIOS DO ART. 1790/CC, NAS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS, SOB A

PERSPECTIVA DO DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL

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DHIEGO NUNES RODRIGUES

PARIDADE ENTRE CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL, EM SEDE DE EFEITOS SUCESSÓRIOS DO ART. 1790/CC, NAS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS, SOB A

PERSPECTIVA DO DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL

Trabalho apresentado ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Áreas de concentração: Direito das Famílias e Direito das Sucessões.

Orientador: Prof. Ms. William Paiva Marques Júnior.

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

R696p Rodrigues, Dhiego Nunes.

Paridade entre casamento e união estável, em sede de efeitos sucessórios do art. 1790/CC, nas relações homoafetivas, sob a perspectiva do direito civil-constitucional / Dhiego Nunes Rodrigues. – 2015.

71 f. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direito das Famílias e Direito das Sucessões. Orientação: Prof. Me. William Paiva Marques Júnior.

1. União estável - Brasil. 2. Casamento (Direito) - Brasil. 3. Casamento entre homossexuais - Brasil. 4. Herança e sucessão - Brasil. 5. Trabalhadores estrangeiros. I. Marques Júnior, William Paiva (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

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DHIEGO NUNES RODRIGUES

PARIDADE ENTRE CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL, EM SEDE DE EFEITOS SUCESSÓRIOS DO ART. 1790/CC, NAS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS, SOB A

PERSPECTIVA DO DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL

Trabalho apresentado ao Programa de Graduação em Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Áreas de concentração: Direito das Famílias e Direito das Sucessões.

Aprovado em: _16_/_12_/_2015_.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Ms. William Paiva Marques Júnior (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profª Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profª Dra. Gretha Leite Maia de Messias

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A Deus.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pelo dom diário da vida, pelas forças para enfrentar os obstáculos ao longo de meu caminho e pelo Seu amor incondicional, que sempre oferece tanto, mesmo quando recebe tão pouco em troca.

Ao Prof. Ms. William Paiva Marques Júnior, pela excelente orientação, pela disponibilidade, atenção e zelo para com todos os alunos da Faculdade de Direito, pelos valiosos ensinamentos, tanto sem sala de aula, como fora dela, e por ser um profissional ímpar, mas também uma pessoa por quem tenho grande admiração e estima.

Às respeitáveis membros da Banca Examinadora, Profª Dra. Raquel Cavalcanti Ramos Machado e Profª Dra. Gretha Leite Maia de Messias, pela presteza, solicitude e prontidão em aceitar o convite para avaliar o presente trabalho.

À minha mãe, Zulmira, meu maior exemplo de força e determinação, o meu porto seguro em meio às tempestades tormentosas e o farol que me guia dentro das noites tenebrosas. Muito obrigado por tudo o que tem feito por mim ao longo dessa jornada que chamo de vida. Agradeço não só o amor e o carinho desmedidos, mas também os necessários puxões de orelha e os abraços nos momentos de tristeza. Espero um dia poder retribuir um décimo da dedicação que tem por mim e, na esperança de passar muitos anos ao seu lado, já agradeço por tê-la ao meu.

Ao meu pai, Raimundo, in memoriam, que tão cedo nos deixou, mas de certo cuida de todos nós.

Aos meus irmãos, Thiago e Fellipe, a quem aprendi admirar pelas posturas firmes, mas que nunca abandonaram a alegria de poder sorrir despreocupadamente.

À Valderina, minha segunda mãe, por ter me ensinado que, se no coração de mãe sempre cabe mais um, no coração de filho também.

A meus primos queridos, Lidiane, Dayanne e Romário, pelos momentos juntos e pelas experiências trocadas.

À minha amiga, Natália Oliveira, por me conhecer melhor do que eu mesmo, por todos os altos e baixos vividos, pelas desventuras e aventuras, mas principalmente por ser uma das pessoas mais incríveis que tive o prazer de conhecer na vida.

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sinceras e desprendidas; e Marina Aguiar, amiga que fiz no primeiro dia de faculdade e que estará comigo defendendo os trabalhos finais no último.

À Naiara Frota, pela enorme paciência e disposição para ouvir a “palavra da monografia”; à Lara Forte, pelas promessas feitas em defender as verdades em que acreditamos; e à Ana Clara; pelo abraço mais receptivo e caloroso do mundo.

Aos meus amigos do A-Game, com quem compartilhei as memórias mais inusitadas e um incontestável amor pela dança.

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“Ohana quer dizer família.

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RESUMO

A família cumpre um papel de fundamental relevância para o desenvolvimento da sociedade, tendo em vista a inserção de seus membros no convívio social, estabelecendo entre estes as suas primeiras relações interpessoais, bem como promovendo realização pessoal e busca da felicidade para cada um. A Constituição Federal promove especial proteção a todas as entidades familiares, baseando-se nos princípios da dignidade da pessoa humana, da isonomia e da afetividade. Equiparam-se os institutos do Direito das Famílias, o casamento e a união estável, sendo ambos considerados entidades familiares merecedoras da proteção estatal. Entretanto, ainda que sejam equiparados, o casamento e a união estável possuem suas particularidades, principalmente no que tange ao Direito das Sucessões. O legislador erigiu ao cônjuge uma série de direitos sucessórios, dispensando ao companheiro tratamento legislativo muito inferior, que beira a inconstitucionalidade. Essas divergências refletem-se nos pares formados por pessoas do mesmo sexo. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132, reconheceu à união estável homoafetiva as mesmas regras e consequências da união estável heteroafetiva. Nesse ínterim, o Conselho Nacional de Justiça editou a Resolução nº 175, proibindo aos cartórios de todo país negar a habilitação, celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas do mesmo sexo. Essas providências tomadas pelo Judiciário refletem omissão do legislador, que afronta os princípios constitucionais que baseiam o atual estádio do Estado Democrático de Direito. O estudo do casamento homoafetivo no Brasil mostra-se relevante diante da sua situação jurídica, completamente desprendida de normatização infraconstitucional, mas ainda assim suficientemente eficaz para garantir que os pares homoafetivos possam vir a ter os mesmos direitos sucessórios que os heteroafetivos.

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ABSTRACT

The family plays a role of fundamental importance for the society development, considering the inclusion of its members in social life, establishing their first interpersonal relationships, as well as promoting personal fulfillment and happiness for each member. The Brazilian Constitution promotes special protection to all family entities based on the principles of human dignity, equality and affection. There is a relative equiparation between the institutes of the Family Law, marriage and stable union, both considered family entities and deserving of State’s protection. However, despite being similar, the institutes still have their particularities, especially regarding the Succession Law. The legislator erected the spouse a series of inheritance rights, dismissing the partner a much lesser treatment, boarding the unconstitutionality. These differences reflect in the pairs formed by people of the same sex. The Supreme Court, in the judgment of the Direct Action of Unconstitutionality 4277 and the Accusation of Breach of Fundamental Precept 132, recognized the stable homosexual union the same rules and consequences of hetero-affective stable union. Meanwhile, the National Judicial Council issued the Resolution No. 175 prohibiting notaries from all over the country to deny the license, civil wedding celebration or conversion of stable union in marriage between same sex people. These steps taken by the judiciary reflect an omission of the legislator that affront the constitutional principles underlying the current Democratic State. The homoaffective wedding study in Brazil shows to be relevant in face of their legal situation, completely detached from formal regulation, but still effective enough to ensure that homosexual couples can come to the same inheritance rights that heteroaffectives.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 13

2

2.1

CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL NA PERSPECTIVA DO DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL NAS RELAÇÕES

FAMILARES ...

Entidades Familares... 15 15 2.1.1 2.1.1.1 2.1.1.2 2.1.1.3 2.2 2.2.1 2.2.2 2.2.2.1 2.2.2.1.1 2.2.2.1.2 2.2.2.1.3 2.2.2.1.4 2.3 2.3.1 2.3.2 2.3.3

Perspectiva principiológica civil-constitucional nas entidades familiares.. Pressuposto da Dignidade da Pessoa Humana... Princípio da Isonomia... Princípio da Afetividade...

Considerações Sobre o Casamento ...

Conceito; Espécies e Natureza Jurídica ...

Efeitos Patrimoniais do Matrimônio ... Regime de Bens... Comunhão Parcial ... Comunhão Universal ... Separação de Total de Bens ... Participação Final dos Aquestos ...

Considerações Sobre a União Estável ...

Conceito e Características da União Estável ... Conversão da União Estável em Casamento ... Efeitos Patrimoniais da União Estável ...

17 18 20 21 23 25 28 29 30 31 31 32 32 33 34 34 3 3.1 3.1.1 3.1.2 3.2 3.2.1 3.2.2 3.3 3.4 3.4.1 3.4.2

EFEITOS SUCESSÓRIOS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002 ...

Aspectos Gerais do Direito Sucessório ...

Tratamento no Código Civil de 2002 ... Abertura da Sucessão ... Modalidades da Sucessão ...

Sucessão Legítima ... Sucessão Testamentária ... Ordem de Vocação Hereditária ...

Concorrência Sucessória ...

Concorrência do Cônjuge e do Companheiro ... Concorrência com os descendentes ...

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3.4.3

3.4.4

3.5 4

4.1

4.1.1

4.1.1.1 4.1.1.2

4.1.1.3

4.2

4.2.1

5

Concorrência com os ascendentes ... Concorrência com os colaterais ... Direito Real de Habitação ...

PARIDADE ENTRE CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL EM SEDE DE EFEITOS SUCESSÓRIOS DO ART. 1790/CC, NAS RELAÇÕES HOMOAFETIVAS, SOB A PERSPECTIVA DO DIREITO CIVIL-CONSTITUCIONAL ...

As Uniões Homoafetivas ...

As Uniões Homoafetivas no Direito Brasileiro ...

União Estável Entre Pessoas do Mesmo Sexo ...

Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4277 e Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132 ... Casamento Civil Entre Pessoas do Mesmo Sexo ...

A Insconstitucionalidade das Diferenças entre Casamento e a União Estável ...

Inexistência de Hierarquia entre as Modalidades de Família ... CONSIDERAÇÕES FINAIS...

REFERÊNCIAS... 47 48 48

50 50 52 53

57 62

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1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 reconhece, através de seus preceitos básicos, direitos fundamentais para o desenvolvimento tanto do ser humano como do próprio Estado Democrático de Direito, influindo, assim, não só nas matérias atinentes ao Direito Público, mas também ao Direito Privado.

O presente estudo analisa, sob a perspectiva do Direito Civil-Constitucional, a atual conjuntura das uniões homoafetivas no direito brasileiro, levando em consideração os aspectos sucessórios do artigo 1790 do Código Civil e a divergência existente entre os institutos do casamento e da união estável.

A metodologia utilizada para viabilizar o feito estribou-se em pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, buscando, a um primeiro momento, a contextualização histórica das relações familiares e a evolução do próprio conceito de família. A análise dos institutos do casamento e da união estável foi feita com a utilização da legislação em voga, junto dos devidos comentários da doutrina. Observou-se a jurisprudência no que tange às relações homoafetivas. O método aplicado ao longo da pesquisa foi o hipotético-dedutivo, o qual propõe uma verdade geral para, então, a obtenção da verdade em casos mais específicos.

Assim, o primeiro capítulo deste trabalho faz uma investigação sobre as entidades familiares, considerando a égide constitucional à família que, como base da sociedade, passou a encontrar-se sob a proteção do estatal.

Foi realizada uma análise doutrinária sobre o casamento e a união estável, na qual levou-se em conta, além dos aspectos básicos de cada instituto, os efeitos patrimoniais peculiares aos mesmos. Em relação ao casamento, especificamente, constam comentários acerca dos regimes de bens e as consequências patrimoniais de cada um.

No segundo capítulo, estudou-se os efeitos sucessórios existentes no Código Civil. A um primeiro momento, fez-se um exame quanto às questões gerais e históricas do Direito Sucessório, para, então, observar o tratamento dispensado pelo Codex à Sucessão mortis causa.

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O terceiro, e último capítulo, abordou como a humanidade tem lidado com as relações homoafetivas sob uma perspectiva histórico-social. Fez-se uma pesquisa quanto o tratamento dispensado à homoafetividade em épocas distintas por povos com culturas diversas.

Uma vez, feita a digressão no plano histórico-social, foi estudado o tratamento jurídico dado pelo Direito Brasileiro às relações entre pessoas do mesmo sexo, fazendo-se uma análise cuidadosa de diversas decisões que abordem o tema, junto dos comentários pertinentes da doutrina nacional.

Analisou-se principalmente a Ação Direita de Inconstitucionalidade nº 4277 e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 132, que foram julgadas em conjunto pelo Supremo Tribunal Federal e reconheceram as uniões homoafetivas como entidade familiar, equiparando-as às uniões estáveis heteroafetivas.

Foram tecidos comentários à Resolução nº 175 do Conselho Nacional de Justiça, que proibiu aos cartórios de todo o país a recusa de habilitação, de celebração de casamento civil ou de conversão de união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Como ponto final, foi analisada a existência ou não de inconstitucionalidade entre as diferenças entre o casamento e a união estável, quando dos efeitos sucessórios do art. 1790 do Código Civil, levando em consideração os paradigmas constitucionais atinentes ao Direito das Famílias.

O objetivo do presente trabalho é analisar a relevância do matrimônio entre pessoas do mesmo sexo, tendo em vista as diferenças existentes entre casamento e união estável, em sede de efeitos sucessórios.

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2 CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL NA PERSPECTIVA DO DIREITO CIVIL –

CONSTITUCIONAL NAS RELAÇÕES FAMILIARES

O presente capítulo trata sobre os aspectos básicos do Direito das Famílias, levando-se em consideração o desenvolvimento histórico do próprio conceito de família, bem como a constitucionalização do Direito Privado.

Fez uma análise à legislação atual que versa sobre o casamento e a união estável, procurando não só caracterizar os referidos institutos, mas também evidenciar suas similaridades e diferenças.

2.1 Entidades Familiares

A família, organismo básico das sociedades, tem, em nosso Estado, especial proteção constitucional, tendo em vista a sua função precípua em promover a inserção de seus membros na sociedade, estabelecendo entre eles as primeiras relações interpessoais, bem como a realização pessoal e a felicidade de cada um deles.

Neste sentido, aduzem Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona 1 2 que é na formação da unidade familiar que são consolidadas não só as primeiras relações de afeto, mas também relevantes relações jurídicas de conteúdo material como também extramaterial; salientando-se um aspecto eudemonista das entidades familiares:

Numa perspectiva constitucional, a funcionalização social da família significa o respeito ao seu caráter eudemonista, enquanto ambiência para a realização do projeto de vida e de felicidade de seus membros, respeitando-se, com isso a dimensão existencial de cada um.

Sabe-se que Eudemonismo3 é a doutrina na qual se admite que a felicidade, seja ela individual ou coletiva, encontra fundamento na conduta humana moral, ou seja, são moralmente aprováveis as atitudes que propiciam a conquista da felicidade. Assim, o caráter eudemonista das famílias busca identificá-las pelo seu envolvimento afetivo, a construção dos vínculos interpessoais e a realização pessoal dos membros.

1 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-37.

2 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-99.

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Por tal perspectiva, expõe Maria Berenice Dias4:

A busca da felicidade, a supremacia do amor, a vitória da solidaderidade ensejam o reconhecimento do afeto como único modo eficaz de definição da família. [...] Para essa nova tendência de identificar a família pelo seu envolvimento afetivo surgiu o nome: família eudemonista, [...].

O reconhecimento do afeto como uma das maneiras de identificar os núcleos familiares tornou mais abrangente o número destes, ganhando, com o passar dos anos, força e aceitação efetiva da sociedade. Eis que novas formatações de família passaram a ingressar o mundo jurídico, a exemplo da união estável, que, até ser legitimada, vivia à sombra do casamento, o qual foi por anos o único meio, jurídica e socialmente aceito, de se constituir uma família.

Quanto ao reconhecimento do matrimônio como única maneira de se instituir um núcleo familiar válido, apresenta Maria Berenice Dias5:

Como a sociedade só aceitava a família constituída pelo matrimônio, a lei regulava somente o casamento, as relações de filiação e o parentesco. O reconhecimento social dos vínculos afetivos formados sem o selo da oficialidade fez as relações extramatrimoniais ingressarem no mundo jurídico por obra da jurisprudência, o que levou a Constituição a albergar no conceito de entidade familiar o que chamou de união estável.

Coadunando com o entendimento supracitado e complementando quanto a impossibilidade de obter um conceito único e absoluto do que vem a ser família, bem como delimitar tal instituto e tipificar em um rol taxativo a multifária gama de relações socioafetivas, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona678, expõem ao longo de sua obra:

Especialmente por considerarmos [...] que o conceito de família não tem matiz único, temos a convicção de que a ordem constitucional vigente consagrou uma estrutura paradigmática aberta, calcada no principio da afetividade, visando a permitir, ainda que de forma implícita, o reconhecimento de outros ninhos ou arranjos familiares socialmente construídos.

[... ] por conta de sua evolução conceitual, o Direito de Família ampliou o seu âmbito de incidência normativa, para regular não apenas o casamento, mas também todo e qualquer arranjo familiar, tipificado ou não, em seus aspectos pessoais ou patrimoniais.

4 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p-59.

5 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p-33.

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Visto a transformação social que perpassou pelo conceito de família, a Constituição Federal, em seu artigo 226, §3º e §4º9, elenca um rol aberto de entidades familiares, calcado em princípios gerais do Direito, como o da dignidade da pessoa humana e o da isonomia, e em princípios específicos do Direito de Família, como o da afetividade.

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

[...]

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

Não é a pretensão do presente trabalho enumerar, muito menos exaurir, um rol de núcleos familiares existentes. Pretende-se aqui estudar e analisar os institutos do casamento e da união estável, devido à proximidade fática e jurídica dos mesmos, que, por vezes, se confundem ante o próprio desconhecimento da norma. Portanto, a família monoparental, núcleo familiar integrado por qualquer um dos genitores e a sua prole, protegido pela Constituição no mencionado art. 226, §4º, não tem análise relevante para o desenvolvimento do presente feito.

2.1.1 Perspectiva Principiológica Civil-Constitucional das Entidades Familiares

A eficácia imposta às normas constitucionais que definem e garantem direitos fundamentais provocou uma revolução paradigmática na maneira de estudar e, principalmente, de aplicar a legislação brasileira.

Os princípios constitucionais, antes relegados a mero papel inspirador de leis, passaram a ter aplicação efetiva na realidade jurídica, sendo invocados, inclusive, para dirimir as injustiças provocadas pelas leis infraconstitucionais.

Com essa aquisição de eficácia imediata dos princípios constitucionais, nos termos de Maria Berenice Dias10, ocorreu o fenômeno da constitucionalização dos direitos

civis e a consagração da dignidade da pessoa humana como fundamento básico do Estado

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Democrático de Direito.

Os princípios constitucionais – considerados les das leis – deixaram de servir apenas de orientação ao sistema jurídico infraconstitucional, desprovido de força normativa. Agora, na expressão de Paulo Lôbo, são conformadores de lei. Tornaram-se imprescindíveis para a aproximação do ideal de justiça, não dispondo exclusivamente de força supletiva. Adquiriram eficácia imediata e aderiram ao sistema positivo, compondo nova base axiológica e abandonando o estado de virtualidade a que sempre foram relegados.

A partir do momento em que ocorreu a constitucionalização do direito civil e a dignidade da pessoa humana foi considerada como fundamento do Estado Democrático de Direito (CF 1º, III), [...].

Haja vista que os princípios constitucionais ganharam força jurídica, norteando a intepretação da norma em consonância com o exposto em seus valores, acabou por trazer a nova hermenêutica também ao Direito de Família.

2.1.1.1 Pressuposto da Dignidade da Pessoa Humana

Ante o vertente cuidado com os direitos dos seres humanos e a justiça social, o constituinte consagrou, no art. 1º, III da Constituição Federal11, a dignidade da pessoa humana

como preceito fundamental do Estado Democrático de Direito.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

[...]

III - a dignidade da pessoa humana;

A dignidade da pessoa humana se tornou verdadeira “bússola principiológica” no ordenamento jurídico, servindo de referência para a concretização dos direitos fundamentais e o desdobramento de um vasto número de princípios dela decorrente.

Neste sentido, aduz Caio Mário12:

Na contemporaneidade, o principio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º. III, da CRFB) assumiu posto de macroprincípio constitucional, de sorte que todos os princípios que se concretizam na dignidade da pessoa humana constituem direitos fundamentais.

Bem como Maria Berenice Dias13:

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[...] A preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional. [...]

O princípio da dignidade humana é o mais universal de todos os princípios. É o macroprincípio do qual se irradiam todos os demais: liberdade, autonomia privada, cidadania, igualdade e solidariedade, [...].

Com a relevância que passou a ser dado ao ser humano, informa Maria Berenice Dias, ocorreu um fenômeno da “despatrimonialização e a personalização dos institutos jurídicos, de modo a colocar a pessoa humana no centro protetor do direito.”14 Perante este novo olhar, o princípio da dignidade estende um manto de proteção estatal sob os núcleos familiares, ainda que os mesmo não se encontrem constitucionalmente elencados, a exemplo das uniões entre pessoas do mesmo sexo, a serem analisadas posteriormente.

Sob o referido entendimento, têm-se os ensinamentos de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona15:

Sob o influxo do principio da dignidade da pessoa humana, epicentro normativo do sistema de direitos e garantias fundamentais, podemos afirmar que a Constituição Federal consagrou um sistema aberto de família para admitir, ainda que não expressos, outros núcleos ou arranjos familiares para além daqueles constitucionalmente fixados, a exemplo da união homoafetiva.

Cabe salientar que a aplicação da dignidade da pessoa humana no Direito de Família não se limita às entidades familiares e a suas configurações, expostas ou não, na Carta Magna. Como expuseram os supracitados autores no decorrer de sua obra16, a dignidade humana é preservada na medida em que se garante o respeito à dimensão existencial do indivíduo não somente em sua esfera pessoal, mas também no âmbito de suas relações sociais, avultando, deste modo, a perspectiva familiar em que cada indivíduo projeta-se ou encontra-se inencontra-serido.

2.1.1.2 Princípio da Isonomia

Por vezes também referido como o princípio da igualdade, o princípio da isonomia, tal qual o da dignidade da pessoa humana, pode ser estudado sob diferentes

13 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p-65.

14 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p-66.

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aspectos, sendo interesse para o presente trabalho a sua análise no que se refere às disposições constitucionais aplicáveis às relações familiares.

A Lei Magna dispõe em seu art. 5º, I17, consagrando, entre todos os brasileiros, a

igualdade de direitos e obrigações:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;

Entretanto, faz-se necessário reiterar os dizeres de Rui Barbosa sobre “tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real”18. Ainda que a lei considere todos iguais, as desigualdades devem ser ressalvadas, para que possa se aproximar de um ideal de igualdade material, não apenas formal.

Essa equivalência real, nas palavras de Maria Berenice Dias19, está intimamente ligada ao conceito de justiça. Justo não é somente aquilo que está conforme a lei ou que afeta a todos da mesma maneira, mas sim aquilo que, respeitando as diferenças de cada um, supre suas necessidades de modo equitativo.

No âmbito das famílias, o princípio da igualdade vê-se representado ao longo das diversas relações e vínculos instituídos: na igualdade de deveres e obrigações entre os homens e as mulheres no que se refere a sociedade conjugal – art. 226, §5º, da CF –; na proibição de designação discriminatória entre filhos existentes dentro ou fora do casamento, ou daqueles que foram adotados – art. 227, §7º, da CF.

Apesar de encontrar-se legalmente estabelecido, o princípio da isonomia não deve ser apreciado apenas na presença da norma jurídica, mas também na falta dela. Por mais que o legislador tente, não será possível prever as mudanças sociais e, nas íntimas relações familiares, elas são ainda mais constantes. Destarte, caberá ao aplicador do direito reconhecer a igualdade àqueles que a lei ignora.

17 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado. htm>. Acesso em: 06/09/2015 18BARBOSA, Rui. Oração aos moços. Edição popular anotada por Adriano da Gama Kury. – 5. ed. – Rio de Janeiro : Fundação Casa de Rui Barbosa, 1997. p-25.

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Nestes termos, aduz Maria Berenice Dias20:

[...] Em nome do princípio da igualdade, é necessário que assegure direitos a quem a lei ignora. Preconceitos e posturas discriminatórias, que tornam silenciosos os legisladores, não podem levar também o juiz a se calar. Imperioso que, em nome da isonomia, atribua direitos a todas as situações merecedoras de tutela. O grande exemplo são as uniões homoafetivas, que, ignoradas pela lei, foram reconhecidas pelos tribunais.

De acordo com o entendimento supracitado, apresentam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona21:

“Todo esforço tem sido feito pela doutrina especializada, amparando-se no direito comparado e, especialmente, nos princípios da igualdade e da liberdade de orientação sexual, para permitir a efetiva tutela, no Brasil, desse núcleo família [união homoafetiva]”.

Ante a inviabilidade em apresentar todos os casos da aplicação do princípio da isonomia, cabe reiterar sua relevância na defesa dos direitos fundamentais e no reconhecimento dos inúmeros vínculos familiares constituídos pela sociedade com o passar dos anos, ainda que não tenham o devido reconhecimento no âmbito normativo.

2.1.1.3 Princípio da Afetividade

Peculiar ao Direito de família e às relações familiares, o princípio da afetividade tomou grande magnitude no Direito Constitucional no momento em que o conceito de família passou a ter características eudemonistas. Ampliou-se, destarte, o rol de arranjos familiares constitucionalmente protegidos para além daquelas formadas exclusivamente pelo matrimônio, mas destinando o paládio da Lei Maior aos núcleos de famílias integrados principalmente pelo afeto.

Assim, alude Maria Berenice Dias22:

[...] Ao serem reconhecidas como entidade familiar merecedora de tutela jurídica as uniões estáveis, que se constituem sem o selo do casamento, isso significa que a afetividade, que une enlaça duas pessoas, adquiriu reconhecimento e inserção no sistema jurídico. Ou seja, houve a constitucionalização de um modelo eudemonista e igualitário, com maior espaço para o afeto e a realização individual.

Completando a concepção supracitada, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona23

20 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p-69.

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explicitam que os núcleos familiares, normatizados na Constituição Federal: casamento, união estável e monoparental, não exaurem em si o rol de entidades familiares válidas, do contrário, teria o legislador chancelado uma discriminação normativa para com os grupos não estandardizados na Carta Magna, mas que dela recebem o devido amparo, ante as características principiológicas da mesma.

Interessante considerar que o princípio da afetividade não se resume apenas nas relações familiares, ao reconhecimento de novos núcleos familiais, mas também encontra respaldo ante a proteção do direito dos filhos, como o reconhecimento dos filhos não biológicos e a especial atenção direcionada ao melhor interesse da criança.

Com tal acepção, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona24:

[...] hoje, na vereda da afetividade, o importante reconhecimento das relações filiais desbiologizadas, mitigando-se, assim, com justiça, o entendimento, até então, dogmático, da supremacia genética decorrente do laudo de exame de DNA, podendo, inclusive, gerar a consequente obrigação alimentar [...].

A jurisprudência nacional reconhece o afeto como um bem jurídico de importância fundamental ao desenvolvimento do ser humano e à sua busca pela felicidade. Nesse entendimento, tem-se a possibilidade, por exemplo, da reparação por dano moral do genitor quando abandou afetivamente a sua filha25.

Junto do princípio da isonomia, o da afetividade corresponde à mudança no panorama jurídico da família constitucionalmente válida no Direito Brasileiro. Nesse ínterim salienta-se que o respeito à diversidade e à valorização dos vínculos familiares são os

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principais vetores para tal variação paradigmática.

2.2 Considerações Sobre o Casamento

Ainda que o casamento tenha, durante séculos, definido o conceito de família na nossa sociedade, a constituição de um organismo social fundado apenas na necessidade de proteção de seus membros, na produção de meios de subsistência e na reprodução natural da espécie, já esboçava um conceito primitivo de família, desvinculado de qualquer ritual, seja ele social ou religioso.

Neste sentido, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona26, adimplindo que a noção do que vem a ser família é de fato muito anterior ao instituo do casamento, comentam:

“A depender da acepção da expressão, os primeiros grupamentos humanos podem ser considerados núcleos familiares, na medida em que a reunião de pessoas com a finalidade de formação de uma coletividade de proteção recíproca, produção e/ou reprodução, já permitia o desenvolvimento do afeito e da busca da completude existencial.”

Portanto, o casamento, como a instituição que é conhecida, deriva, nas palavras do autor supramencionado, “de um sistema organizado socialmente, com o estabelecimento de regras formais, de fundo espiritual ou laico.” 27, fazendo, assim, referência ao Direito Romano e ao Sistema Canônico para a compreensão do himeneu no mundo ocidental.

Explica brevemente, Maria Helena Diniz28, a perspectiva do Direito Romano

sobre o casamento:

Pela convetio in manum a mulher e se patrimônio passavam para a manus maritalis, mediante (a) a confarreatio, que era o casamento religioso, da classe patrícia, caracterizando-se pela oferta aos deuses de um pão de trigo, sendo que somente os filhos nascidos desta forma de matrimônio é que podiam ocupar certos cargos sacerdotais; (b) a coemptio, reservada à plebe, consistindo numa espécie de casamento civil celebrado pela venda fictícia do pai para o marido, do poder sobre a mulher; (c) o usus, espécie de usucapião, em que o marido adquiria a sua mulher pela posse, consistente na vida em comum durante um ano. Pela convetio sine manus a mulher continua a pertencer o lar paterno. E finalmente, em Roma, após uma longa evolução, surgiu a justae nuptia, ou seja, o matrimonio livre, cujos requisitos eram: capacidade e consentimento dos cônjuges e ausência de impedimentos.

Pode-se concluir que, para o Direito Romano, mesmo o casamento tendo efeitos

26 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-46

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jurídicos e sociais - como a vinculação de uma esposa à família de seu marido, rompendo os laços familiares com seus genitores e passando a viver sob a égide do pater familias29 de seu

cônjuge -, consistia em ato jurídico de âmbito privado, sem a necessidade da intervenção do Estado para a sua celebração e validade.

Cabe reiterar que o matrimônio foi responsável, ao longo do tempo, pela perpetuação e pela preservação de riquezas e bens dentro de uma mesma família, assumindo um papel patrimonial, o qual persiste até hoje e será abordado de maneira mais completa ao longo deste trabalho.

Assim, preceituam Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona30:

Essa utilização do matrimônio como fato jurídico lato sensu para a produção de efeitos foi continuamente observada na história da humanidade, inclusive como instrumento para a reunião de patrimônio, como se fosse uma negociação financeira ou, muitas vezes, de Estados, notadamente na Idade Média, em que casamentos eram literalmente negociados entre nobres de reinos distintos.

Até o advento da República, no Brasil só era reconhecido o casamento religioso, de modo que, até ser promulgada a primeira constituição da República, em 1891, a Igreja Católica, amparada pelo Direito Canônico, era detentora da chancela de todo e qualquer ato nupcial que ocorresse no território nacional.

Nestes termos, pronuncia-se Maria Helena Diniz que “aqui no Brasil, por muito tempo, a Igreja Católica foi titular quase que absoluta dos direitos matrimoniais, pelo Decreto de 3 de novembro de 1827 os princípios do direito canônico regiam todo e qualquer ato nupcial, [...]”31 até a promulgação da primeira Constituição da República.

A Constituição de 24 de fevereiro de 1891, no seu art. 72, §4º, estatuía: ‘A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita’, constituindo o religioso apenas um interesse da consciência de cada um. Deu-se, então, a generalização do casamento civil, celebrado paralelamente ao religioso, hábito social que perdura até hoje.32

29 “No Direito Romano, o vínculo [lê-se: parentesco] não se estabeleceu apenas em razão da consanguinidade – cognação – mas também com base na autoridade do pater famílias – agnação. [...]Parentesco por agnação é o parentesco civil entre membros de uma mesma família baseado na autoridade do pater famílias. Segundo SUMNER MAINE: ‘A base da agnação está no poder do pai...São parentes por agnação todos aqueles que estão sob poder paterno ou que ali estiveram ou poderiam estar, se o seu antepassado tivesse podido viver bastante tempo, para exercer o seu império. Foi o parentesco por excelência em Roma primitiva. Na realidade... o parentesco é limitado pelos poderes paternos.” (TABOSA, Agerson. Direito Romano. 3ª ed – Fortaleza: FA7, 2007. P – 173)

30 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-113 31 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família. – 28 ed – São Paulo : Saraiva, 2015. p-65

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Importante lembrar que a laicização estatal ocorreu juntamente com a proclamação da República, e, até o momento em que os vínculos entre o Estado e a Igreja eram constitucionalmente validados, o padre, que celebrava a cerimônia do casamento, assumia uma função não só perante a Igreja, mas também em relação ao Estado.33

Entretanto, não só no Brasil a Igreja confundia-se com o Estado. Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona34 afirmam que, ante a grande influência cristã no mundo ocidental, diversos aspectos da sociedade, dentre eles o casamento, eram tutelados pelo Direito Canônico. O matrimônio passou de um fato social do qual advinha alguns efeitos jurídicos, para um fundamento da sociedade pelo qual, segundo a dogmática canônica, era o único meio legitimo para a constituição de uma família.

Portanto, ainda segundo os ensinamentos de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona35, com a sacralização da união matrimonial, alterou-se a própria acepção de família, que deixava de ser, na forma do Direito Romano, o núcleo de pessoas submetidas à autoridade de um mesmo pater familias, para identificar aqueles que estavam unidos pelo sagrado matrimônio religioso.

2.2.1 Conceito; Espécies e Natureza Jurídica do Matrimônio

O Código Civil de 2002, em seu Livro IV – Do Direito de Família -, propôs no artigo 1511 a máxima de que “o casamento estabelece a comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres entre os cônjuges.” Nos artigos que se seguem, ao longo do Subtítulo I - do Casamento -, não é trabalhado o conceito do que vem a ser o matrimônio, mas se estabelece requisitos para a sua celebração, elenca uma série de direitos e deveres dos cônjuges, disciplina os regimes matrimoniais e as questões pertinentes à dissolução do vínculo conjugal.

Nos seguintes termos, expõe Maria Berenice Dias36:

[...] o legislador não traz qualquer definição nem tenta conceituar o que seja família ou casamento. Não identifica sequer o sexo dos nubentes. Limita-se a estabelecer requisitos para a sua celebração, elenca direitos e deveres dos cônjuges e disciplina

33 MARCILO, Maria Luiza. Os Registros Paroquiais e a História do Brasil. Varia Historia, Minas Gerais, n. 31, p.13-20, 31 jan. 2004

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diversos regimes de bens. Também regulamenta o seu fim, ou seja, as questões patrimoniais, que decorrem da dissolução do vínculo conjugal.

Entretanto, a doutrina não só tem trazido uma gama de definições do que vem a ser o casamento, como tem discutido as indagações acerca da própria natureza jurídica do conúbio, tipificando um rol de espécies legalmente estabelecidas de matrimônios.

Maria Helena Diniz37 conceitua o casamento como sendo o vínculo jurídico entre o homem e a mulher, pelo qual se visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família.

Ao passo que Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona38 desenvolvem uma definição

própria do matrimônio mesclando à concepção da natureza jurídica, à qual os autores acreditam que o conúbio pertença, aduzindo:

[...] (o casamento é) um contrato especial de Direito de Família, por meio do qual os cônjuges foram uma comunidade de farto e existência, mediante a instituição de deveres, recíprocos e em face dos filhos, permitindo, assim, a realização dos seus projetos de vida.

Cabe esclarecer sucintamente que a doutrina divide-se em três correntes para discutir a natureza jurídica do casamento: a primeira pressupõe que seja um instituto, destacando-se o conjunto de norma imperativas que aderem os requerentes; a segunda, influenciada pelo Direito Canônico, vê o matrimônio como um contrato entre as partes para a obtenção de fins jurídicos; e a terceira mescla as duas anteriores, tendo a concepção de que o casamento seria um contrato entre as partes, quando da sua formação, e uma instituição no que diz respeito ao seu conteúdo.39

Assim explora, Maria Helena Diniz, em sua obra:

[...] o matrimônio é contrato civil, regido pelas normas comuns a todos os contratos, ultimando-se e aperfeiçoando-se apenas simples consentimentos dos nubentes, que há de ser recíproco e manifesto por sinais exteriores. [...]

O casamento é tido como uma grande instituição social, refletindo uma situação jurídica que surge da vontade dos contraentes, mas cujas normas, efeitos e forma encontram-se preestabelecidos pela lei.40

“Nesta controvérsia não faltou uma doutrina eclética ou mista, que une o elemento volitivo ao elemento institucional, tornando o casamento, como pontifica Rouast, um ato complexo, ou seja, concomitantemente contrato (na formação) e instituição

37 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família. – 28 ed – São Paulo : Saraiva, 2015. p-51.

38 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-117. 39 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p-157

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(no conteúdo), sendo bem mais do que um contrato, embora não deixe de ser um contrato.”41

Por mais que o casamento seja um ato jurídico que dependa da anuência de duas partes para que seja considerado válido, a visão contratualista não abarca uma série de características próprias do matrimônio, como aduz a autora supracitada em sua obra, de modo que o conúbio não pode ser considerado um simples contrato, ante a existência de uma série de normas regulamentadoras que devem ser seguidas, independente da vontade das partes.

Portanto, a visão institucional do matrimônio corresponde de modo mais efetivo com a sua realidade jurídica.

Faz-se necessário reiterar que, além da natureza jurídica, o ritual matrimonial tem sido dividido em razão das especificações enumeradas pelos próprios artigos do Código Civil. Desse modo, admitem-se duas formas de celebração principais: civil e religioso com efeitos civis; e outras secundárias: por procuração, nuncupativo, em caso de moléstia grave e perante autoridade diplomática.

Para o desenvolvimento do presente trabalho, o casamento civil e o religioso com efeitos civis são os mais relevantes para serem analisados, visto que os outros, em geral, possuem os mesmos efeitos normativos, mas tendo sido celebrados em situações incomuns, a exemplo do casamento por procuração, art. 1542 do CC, pelo qual um representante do nubente, em nome dele, participa da celebração do matrimônio.

Art. 1.542. O casamento pode celebrar-se mediante procuração, por instrumento público, com poderes especiais.

§ 1o A revogação do mandato não necessita chegar ao conhecimento do mandatário; mas, celebrado o casamento sem que o mandatário ou o outro contraente tivessem ciência da revogação, responderá o mandante por perdas e danos.

§ 2o O nubente que não estiver em iminente risco de vida poderá fazer-se representar no casamento nuncupativo.

§ 3o A eficácia do mandato não ultrapassará noventa dias.

§ 4o Só por instrumento público se poderá revogar o mandato.42

Em seu texto, Maria Berenice Dias43 discorre sobre o casamento civil e o religioso com efeitos civis, informando que o primeiro se trata de ato solene levado a efeito por um

41 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família. – 28 ed – São Paulo : Saraiva, 2015. p - 56

42 BRASIL. Código Civil (2002). LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm >. Acesso em: 13/09/2015

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celebrante, na presença de testemunhas, na dependência ou não de um cartório. Ao passo que o casamento religioso com efeitos civis se utiliza da própria cerimônia religiosa para validar a união, ficando este condicionado à habilitação44 e à inscrição feita em Registro Civil de Pessoas Naturais, ou seja, dependendo da ratificação Estatal.

Deve-se frisar, conforme comentários de Maria Berenice Dias45, o fato de que o Brasil, país laico que é, não pode priorizar uma religião em detrimento de outras, visto o próprio direito de crença assegurado pela Constituição Federal, art.5º, VI. Por mais que não se deva admitir a celebração de casamentos múltiplos nos casos de religiões poligâmicas, não seria justo escolher quais serão as cerimônias religiosas que merecem a chancela estatal.

2.2.2 Efeitos Patrimoniais do Matrimônio

O matrimônio, como observa Maria Helena Diniz46, produz diversos efeitos que se projetam no ambiente social, nas relações pessoais e econômicas dos cônjuges e nas relações pessoais e patrimoniais entre pais e filhos, dando origem a uma série de direitos e deveres que são disciplinados por normas jurídicas.

Tais efeitos podem, segundo a supracitada autora, se agrupam em três classes: social, pessoal e patrimonial47. Explica a autora que: enquanto, os efeitos sociais do matrimônio criam a família matrimonial, estabelecem os vínculos de afinidade entre os cônjuges e emancipam o consorte de menor idade, os efeitos pessoais do conúbio elencam um rol de direitos e deveres dos cônjuges e dos pais em relação aos filhos. Os efeitos patrimoniais do casamento aludem quanto às questões de cunho econômico, como a fixação do dever de sustento da família, a obrigação alimentar, o termo de início de regime de bens e os ônus e bônus deles decorrentes.

Dentre os efeitos jurídicos do casamento arrolados acima, os patrimoniais são os que apresentam uma maior relevância para o presente trabalho, tendo em vista a limitação

44 “A habilitação para o casamento consiste em um procedimento administrativo, disciplinado pelo Código Civil e pela Lei de Registros Públicos, por meio do qual o Oficial do Registro Civil afere a concorrência dos pressupostos de existência e validade do ato matrimonial, expedindo, ao fim, a habilitação necessária à concretização do enlace” (GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-175)

45 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.159.

46 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família. – 28 ed – São Paulo : Saraiva, 2015. p - 143

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temática aqui proposta.

2.2.2.1 Regimes de Bens

Em um breve histórico sobre a constituição patrimonial do casamento, Maria Berenice Dias48 aponta em seu texto importantes atualizações que ocorreram desde o Código Civil de 1916 até a edição do Código Civil de 2002, como: a implementação do Estatuto da Mulher Casada49 e a Lei de Divórcio50, mostrando as mudanças realizadas na comunicabilidade dos bens adquiridos antes e depois do matrimônio.

Sabe-se que ao se casar, os nubentes, no geral, devem escolher entre quatro regimes de bens; que se entende, nos termos de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, como o “conjunto de normas que disciplina a relação jurídico-patrimonial entre os cônjuges”51; sendo eles: comunhão parcial, comunhão universal, separação total e participação final nos aquestos.

Até a vigência do Código Civil de 2002, como aduzem Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona52, não era possível aos cônjuges trocar, no curso do matrimônio, o regime de bens adotado. Entretanto, a transição de um regime para o outro atualmente só é possível quando observado os requisitos legais.

Faz-se necessário frisar que a escolha do regime de bens opera-se ante a existência de pacto antenupcial53, pelo qual os nubentes, no processo de habilitação para o casamento,

convergem não só os termos referentes ao regime de bens a ser escolhido, mas também sobre o patrimônio em si, podendo, inclusive, haver cláusulas sobre o direito sucessório.

Neste sentido, Maria Berenice Dias54 comenta:

Antes do casamento, durante o processo de habilitação (CC 1525 a 1532), podem os nubentes, livremente, por meio do pacto antenupcial, estipular o que quiserem sobre os regimes de bens (parágrafo único). Essa liberdade só não é absoluta porque, em determinadas hipóteses, impõe a lei o regime obrigatório da separação de bens.

48 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.226-227.

49 BRASIL. Lei nº 4121, de 27 de agosto de 19682. Estatuto da Mulher Casada. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L4121.htm>. Acesso em: 09/09/2015.

50 BRASIL. Lei nº 6515, de 26 de dezembro de 1977. Lei do Divórcio. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6515.htm>. Acesso em: 09 set. 2015.

51 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-314. 52 GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de Família – As famílias em perspectiva constitucional. 2ed. rev., atual. e ampl. São Paulo. Saraiva. p-314. 53 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.243.

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Um aspecto muito importante do patrimônio do casal é a sua divisão. No geral, existem os bens particulares de cada cônjuge e os bens comuns aos dois, sendo estes divididos, quando findo o casamento, em sua metade. Desse modo, tem-se a meação dos bens compartilhados, a qual ocorre, conforme aduz Maria Berenice, nos seguintes termos:

No regime da comunhão universal, integra a meação todo o acervo: os bens particulares de ambos os cônjuges e os adquiridos, a qualquer título, antes e depois do casamento. Na comunhão parcial, a meação incide sobre os aquestos: o patrimônio adquirido na constância do matrimônio. Mesmo na separação obrigatória (obrigatória porque é imposta por lei), existe direito à meação dos bens adquiridos na constância do enlace matrimonial, por força da Súmula 337 do STF. No regime da participação final dos aquestos, só cabe falar em meação quanto aos bens amealhados em comum durante o casamento. Os adquiridos em nome próprio, na vigência da sociedade conjugal, sujeitam-se à compensação, e não a divisão. Por fim, no regime da separação convencional, inexiste comunicação dos patrimônios.55

Portanto, a meação do patrimônio em comum dá-se de acordo com o regime de bens adotados pelo casal, sendo um aspecto muito importante não só ao momento do divórcio, mas também à época da sucessão de um dos cônjuges.

2.2.2.1.1 Comunhão Parcial

Disposto do art. 1658 ao art.1666 do Código Civil, o regime da comunhão parcial dispensa a existência do pacto antenupcial, vez que é o regime legal, ou seja, caso os nubentes não disponham sobre que regime desejam adotar ou o pacto antenupcial seja considerado nulo ou ineficaz, o casamento é celebrado sob a égide da comunhão parcial dos bens. Assim, aduz o art. 164056 do CC:“Não havendo convenção, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará, quanto

aos bens entre os cônjuges, o regime da comunhão parcial.”

O regime da comunhão parcial tem como regra geral que os bens adquiridos na constância do matrimônio, ainda que o seja por apenas um dos cônjuges, são considerados como sendo comuns ao casal; e que os bens que pertenciam particularmente a cada cônjuge, até a celebração do casamento, continuam a pertencer-lhe com exclusividade. Assim, conforme propôs Maria Berenice Dias57, “resta preservada a titularidade exclusiva dos bens particulares e garantida a comunhão do que for adquirido durante o casamento.”.

55 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.229.

56 BRASIL. Código Civil de 2002. LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm >. Acesso em: 20/09/2015

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É válido reiterar que nem todos os bens, mesmo adquiridos na constância do casamento, são comuns ao casal, a exemplo dos adquiridos por um dos cônjuges através de doação ou sucessão.

2.2.2.1.2 Comunhão Universal

Quando sob o regime da comunhão universal de bens, o patrimônio particular dos cônjuges inexiste. Desse modo tudo o que foi adquirido, inclusive as dívidas, seja individualmente, seja antes da celebração do matrimônio, torna-se patrimônio comum do casal. Assim aduz o art. 166758do Código Civil: “O regime de comunhão universal importa a

comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas, com as exceções do artigo seguinte.”

Como na comunhão parcial de bens, existem alguns destes que fazem exceção a regra geral da comunhão universal, mantendo-se no patrimônio individual de cada cônjuge, como os bens de uso pessoal e instrumentos de trabalho.

A comunicação das dívidas também é limitada. No art. 1668, inciso III, do CC, tem-se que os débitos contraídos anteriores ao casamento, não sendo em proveito deste, também não se comunicam.

2.2.2.1.3 Separação Total de Bens

Influenciado precipuamente pelo principio da autonomia da vontade, o legislador, em apenas dois artigos, 1687 e 1688, do CC, tratou do regime da separação de bens, o qual pode ser classificado como o diametralmente oposto ao da comunhão universal de bens, não havendo qualquer comunicabilidade entre o patrimônio dos cônjuges.

Enquanto na comunhão universal são comunicáveis todos os bens do casal, sejam adquiridos antes ou depois do casamento; na separação de bens, os bens adquiridos pelos cônjuges, mesmo depois da celebração do matrimônio, continuam a pertencer exclusivamente ao consorte que o adquiriu. Assim, propõe o art. 168759: “Estipulada a separação de bens, estes

permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real.”

58 BRASIL. Código Civil de 2002. LEI No 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm >. Acesso em: 20/09/2015

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Entretanto, o casal ainda poderá estipular a existência de um patrimônio em comum, quando ocorrer a celebração do pacto antenupcial, necessário para a validade do presente regime de bens. Além disso, é obrigação comum aos cônjuges a manutenção e o sustento da família como um todo, nos termos do art. 1688, do CC.

Outro ponto a ser ressaltado é o da separação obrigatória de bens, imposta pela legislação, nos termos art. 1641, do CC, no qual se arrola uma série de situações, que ocorrendo, condiciona o casamento ao regime da separação total de bens. É o caso do matrimônio com pessoas maiores de 70 anos.

2.2.2.1.4 Participação Final dos Aquestos

Tal regime foi criação do Código Civil de 2002, sendo disciplinado do artigo 1672 ao 1686. Trata-se de um meio termo entre a comunhão parcial de bens e a separação total, visto que há possibilidade de se adquirir bens particulares, mesmo na constância do casamento, coexistindo com o patrimônio comum do casal.

Quando ocorre a separação, Maria Berenice60 explica:

[...] cada cônjuge ficará: (a) coma totalidade de seus particulares adquiridos antes do casamento; (b) com a metade dos bens comuns ao casal, adquiridos em condomínio, por ambos, durante a união; (c) com os bens próprios adquiridos durante o enlace; e (d) fará jus À metade da diferença do valor dos bens que outro adquiriu no próprio nome, na constância do vínculo conjugal.

Cabe sinalizar que, ante a peculiaridade de existir bens particulares, mesmo durante a vigência do matrimônio, o regime da participação final dos aquestos necessita, por vezes, de minuciosa perícia destinada à divisão correta do patrimônio, não sendo, portanto, de comum escolha no momento da celebração do casamento.

2.3 Considerações Sobre a União Estável

Por anos, o casamento foi reconhecido como o único meio de constituir uma família, sendo as uniões existentes sem o selo matrimonial, como afirma Maria Berenice Dias61, identificadas com o nome de concubinato, relegadas à rejeição social e legislativa, tendo em vista as diversas punições que existiam para a concubina, a qual, por exemplo, não

60 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.252.

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poderia ser alvo de doações nem ser beneficiada no testamento do convivente.

Entretanto, hoje, a união estável recebeu uma nova dimensão jurídica, sendo reconhecida como uma entidade familiar pela Constituição, merecendo, inclusive, especial proteção do Estado, como já mencionado no presente trabalho.

Assim, esclarece Maria Berenice Dias62:

Ainda que a união estável não se confunda com o casamento, ocorreu a equiparação das entidades familiares, sendo todas merecedoras da mesma. Ao criar a categoria de entidade familiar, a Constituição acabou por reconhecer a juridicidade às uniões constituídas pelo vínculo de afetividade.

A normatização constitucional, como bem colocaram Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona63, não igualou a união estável ao casamento, mas conferiu espaço e dignidade ao companheiro na sociedade, que antes via-se denegrido quanto ao tratamento jurídico que lhe era dispensado.

Entretanto, como pontua o supracitado autor64, ainda que a legislação constitucional tenha reconhecido a união estável como uma entidade familiar equiparável ao casamento, a legislação infraconstitucional ainda diverge quanto ao reconhecimento de certos direitos ao companheiro, como os referentes à sucessão, quando o cônjuge possui uma gama de vantagens em face do convivente, vantagens essas que serão explicitadas com melhor propriedade no decorrer dos próximos capítulos.

2.3.1 Conceito e Características da União Estável

Com o surgimento do Código Civil de 2002, a união estável passou a ser regulamentada também por este, sendo definida nos termos do art. 172365, como a entidade familiar, entre um homem e uma mulher, a qual se estabelece com o objetivo de constituir família, tendo entre suas principais características a convivência pública, contínua e duradoura.

Ainda que a dualidade de gêneros tenha sido exposta como requisito caracterizador da união estável, admitir a existência de tal entidade familiar apenas para

62 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.175.

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núcleos compostos por pessoas de sexos distintos, seria ir de encontro aos preceitos constitucionais que dão validade a todas famílias, independentemente do modo que são constituídas.

Neste sentido, expõe Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona66:

“[...] no sistema, inclusivo e não discriminatório inaugurado a partir da Constituição de 1988, espaço não há para uma interpretação fechada e restritiva que pretenda concluir pela literalidade da norma constitucional (art. 226, § 3º, CF) ou até mesmo da legislação ordinária (art. 1723, CC) com o propósito de somente admitir a união heterossexual.”

A publicidade, a continuidade, a estabilidade e o objetivo de constituir família continuam sendo elementos essenciais para a verificação da existência da união estável e para diferenciar a mesma dos outros tipos relacionamentos, como o namoro.

2.3.2 Conversão da União Estável em Casamento

Mesmo que a união estável tenha se equiparado ao matrimônio e seja reconhecida como uma entidade familiar, a possibilidade da sua conversão em casamento prova que os dois institutos possuem suas peculiaridades.

O art. 1726 do Código Civil, acompanhando o que diz a Constituição Federal no art. 226, § 3º, informa que: “A união estável poderá converter-se em casamento, mediante pedido dos companheiros ao juiz e assento no Registro Civil”. Entretanto, não há na lei civil regras de como se deve proceder a tal conversão, assim afirma Maria Berenice Dias67.

Coube aos tribunais a operacionalização da matéria, tendo cada estado resoluções próprias para o procedimento de conversão. Neste ínterim, o CNJ através da Resolução nº 175, após o reconhecimento da união estável homoafetiva pelos tribunais superiores, regulamentou a sua conversão em casamento, o que será analisado com mais concretude no último capítulo deste trabalho.

2.3.3 Efeitos Patrimoniais da União Estável

Os efeitos patrimoniais da união estável são similares aos do casamento, assim

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afirma Maria Berenice Dias68. No casamento, os noivos podem escolher qual ao regime de bens, graças ao pacto antenupcial, ou aceitar o regime legal da comunhão parcial de bens. Na união estável, os companheiros podem firmar um contrato de convivência, nos termos do art. 1725 do Código Civil, estipulando os mais diversos termos, mas, quedando-se em silêncio, presume-se escolhido o regime da comunhão parcial de bens.

Em seu texto, Maria Berenice Dias69 informa que, no regime da comunhão parcial de bens, todos os bens amealhados durante a união estável são considerados fruto do trabalho em comum dos companheiros, tal qual ocorre quanto aos cônjuges, ressalvadas as exceções legais de incomunicabilidade, nos termos dos arts. 1659 e 1661, ambos do Código Civil.

Ressalte-se que os bens de um casal, que deveria estar casado sob o regime da separação obrigatória de bens, como no caso de pessoas com idade superior a 70 anos, mas que vive apenas em união estável, não são mais considerados frutos do esforço em comum, necessitando-se de análise de provas para tanto.

Em recente decisão, o Superior Tribunal de Justiça70 entendeu que “na dissolução de união estável mantida sob o regime de separação obrigatória de bens, a divisão daquilo que foi adquirido onerosamente na constância da relação depende de prova do esforço comum para o incremento patrimonial.”

Saliente-se que, apesar das similaridades, a união estável e o casamento não são iguais, e é em sede de direito sucessório que o tratamento dispensado pela legislação ao companheiro e ao cônjuge tem a sua maior divergência.

68 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.187-188.

69 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed., rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. p.188.

Referências

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