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análise de conjuntura temas de economia aplicada

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FUNDAÇÃO INSTITUTO DE PESQUISAS ECONÔMICAS

ISSN 1234-5678 Nº 354 Março / 2010

Fernando Homem de Melo aponta que a colheita de grãos iniciada em Fevereiro-Março de 2010 indica estagnação da agricultura, pelo quadro econômico recente e pela taxa de câmbio desfavorável prevista para 2010.

André Luis Squarize Chagas, em primeiro artigo da série, discute o possível trade-off entre açúcar e álcool, concluindo que o aumento do preço da terra se deve mais ao crescimento de todas as culturas do que de um só produto.

Antonio Carlos Lima Nogueira e Adolfo Schmukler, em primeiro artigo da série, ana-lisam os fundamentos do Projeto Terra Paulista, uma proposta de desenvolvimento regional sustentável.

Em terceiro artigo da série, Diva Benevides Pinho avalia as mudanças políticas ocorridas na China nos últimos 60 anos, apontando a atual expansão do consumo chinês e seus efeitos na economia mundial.

Julio Lucchesi Moraes, em sexto artigo da série sobre Economia da Cultura, apresenta os “estudos culturais”, os quais reformulam alguns conceitos marxistas, mas

Antonio Carlos Lima Nogueira estrutura uma análise do agronegócio do trigo, concluindo que uma possível elevação da alíquota de importação pode não resultar em aumento de preços ao consumidor final. Manuel Enriquez Garcia sintetiza dados recentes do IBGE, indicando que em 2009

houve decréscimo moderado do PIB, uma retomada do nível de atividade e do emprego industrial.

análise de conjuntura

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INFORMAÇÕES FIPE É UMA PUBLICAÇÃO MENSAL DE CONJUNTURA ECONÔMICA DA FUNDAÇÃO

ISSN 1234-5678

CONSELHO CURADOR

Juarez Alexandre Baldini Rizzieri (Presidente) Andrea Sandro Calabi Denisard Cnéio de Oliveira Alves Elizabeth Maria Mercier Querido Farina Miguel Colassuono Simão Davi Silber Vera Lucia Fava DIRETORIA

DIRETOR PRESIDENTE

Carlos Antonio Luque DIRETOR DE PESQUISA

Eduardo Haddad DIRETOR DE CURSOS

Cicely M. Amaral PÓS-GRADUAÇÃO

Dante Mendes Aldrighi SECRETARIA EXECUTIVA

Domingos Pimentel Bortoletto

PREPARAÇÃO DE ORIGINAIS E REVISÃO Alina Gasparello de Araujo EDITOR CHEFE

Gilberto Tadeu Lima CONSELHO EDITORIAL

Heron Carlos E. do Carmo Lenina Pomeranz Luiz Martins Lopes José Paulo Z. Chahad Maria Cristina Cacciamali Maria Helena Pallares Zockun Simão Davi Silber ASSISTENTE

Maria de Jesus Soares PROGRAMAÇÃO VISUAL E COMPOSIÇÃO

Sandra Vilas Boas

Nº 354 MARÇO DE 2010

AS IDEIAS E OPINIÕES EXPOSTAS NOS ARTIGOS SÃO DE RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DOS AUTORES, NÃO REFLETINDO A OPINIÃO DA FIPE ANÁLISE DE CONJUNTURA

agricultura ... 3 Antonio CArlos limA nogueirA

emprego, salário e taxa de ocupação ... 6 mAnuel enriquez gArCiA

TEMAS DE ECONOMIA APLICADA 8 ... o início da colheita e da comercialização da safra 2010 FernAndo Homemde melo

11 ... etanol ou alimento: existe esse trade-off? André luis squArize CHAgAs

17 ... uma proposta de desenvolvimento regional sustentável: parte 1 Antonio CArlos limA nogueirA, AdolFo sCHmukler

21 ... China III - de Estado comunista centralizado a socialismo de mercado e a capitalismo autoritário de resultados (Consenso de Pequim) divA Benevides PinHo

24 ... Economia da Cultura e os cultural studies Julio luCCHesi morAes

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março de 2010

análise de conjuntura

Antonio CArlos limA nogueirA (*)

o agronegócio do trigo no Brasil

A retaliação aos Estados Unidos no caso do algodão na Organização Mundial de Comércio (OMC) pode provocar um aumento no preço do pão francês para os brasileiros? Esta questão surgiu na mídia com a recente divulgação pelo governo brasileiro de que o trigo seria um dos produtos com elevação de tarifas de importação daquele país, tendo em vista os possíveis impactos nos preços internos de produtos derivados. A fim de buscar responder à questão, apresento neste artigo uma análise da situação atual do agronegócio do trigo no Brasil, considerando os aspectos de con-sumo, importações e produção interna. Inicio com o tema do consumo.

Conforme dados da consultoria MB Associados divul-gados pela Associação Brasileira da Indústria do Trigo (ABITRIGO) em seu congresso de 2009, o gasto das famílias brasileiras com produtos derivados de trigo tem apresentado um crescimento constante entre 1998 e 2008. Na categoria de produtos panificados, o valor chegou a R$ 23,6 milhões, com um incremento de 57,3%, em pão francês o valor de R$ 13 milhões foi atingido com um crescimento de 62,5%, em biscoitos, o valor foi de R$ 6,4 milhões, resultante de uma varia-ção de 60% e em macarrão, o valor de R$ 4,2 milhões representa um acréscimo de 26,6%.

A consultoria considera que esta tendência deverá se

dados de 2008. Na categoria de produtos panificados deve crescer 27,6%, em pão francês terá uma elevação de 26,6%, em biscoitos deverá aumentar 21,4% no período e em macarrão apresentará um incremento de 18,7%. Essas previsões estão apoiadas em expecta-tivas posiexpecta-tivas quanto ao crescimento da economia e da participação do consumo das famílias nas contas nacionais, principalmente pela redução da pobreza e aumento da classe C.

Nestes resultados, podemos destacar o nível de gastos inferior das categorias de biscoitos e macarrão em relação às categorias de produtos panificados e pão francês. Se o processo de distribuição de renda se acelerar nos próximos anos, é possível que as taxas de crescimento de gastos com biscoitos e macarrão nos próximos anos sejam superiores às previstas, provo-cando uma redução dessa diferença ou até um efeito de substituição de parte dos gastos com pão francês. Em vista dessas condições de consumo de produtos finais, torna-se relevante analisar o balanço de oferta e demanda de trigo no Brasil. Conforme o levanta-mento da Companhia Brasileira de Abastecilevanta-mento (CONAB) divulgado em fevereiro deste ano, os va-lores médios no período entre as safras de 2003/2004 até a de 2009/2010 foram de 9,9 milhões de toneladas de consumo, 5,7 milhões de importação e 4,8 milhões

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março de 2010

Cabe destacar que os três indicadores apresentam baixa dispersão em torno das médias, que represen-tam parepresen-tamares relativamente estáveis ao longo do período. Assim, nos últimos cinco anos, o aumento dos gastos das famílias em produtos derivados de trigo não tem se refletido de forma significativa no volume total de trigo utilizado no Brasil. A seguir, analisarei a participação dos principais fornecedores para importação de trigo pelo Brasil nos últimos três anos, com base em dados do “Intercâmbio Comercial do Agronegócio 2009”, divulgado pelo Ministério da Agricultura e Abastecimento (MAPA).

Em 2006, o Brasil importou 16.500 toneladas dos Esta-dos UniEsta-dos, em 2007 o volume foi de 354 mil toneladas e em 2008 a quantidade foi de 906,7 mil toneladas, referente a US$ 318,2 milhões. Assim, observa-se um crescimento de mais de 5.000% na quantidade impor-tada entre 2006 e 2008, mas os valores absolutos são inexpressivos em relação ao total de trigo importado. Por outro lado, em 2008 as importações pelo Brasil de produtos agrícolas dos Estados Unidos totalizaram US$ 660 milhões, 73,5% acima do valor importado em 2007. As importações de trigo foram responsáveis por mais de 80% desse incremento e representaram quase metade das importações brasileiras de produtos agrícolas provenientes dos Estados Unidos em 2008. Esse crescimento da importação de trigo dos Estados Unidos deve-se à redução recente na participação da Argentina no suprimento, que tem sido o principal fornecedor de trigo. Em 2006, o Brasil importou 5,9 milhões de toneladas de trigo desse país, 5,6 milhões em 2007 e 4,23 milhões em 2008. Esta redução não foi compensada pelo aumento da importação de farinha de trigo da Argentina, que foi de 120 mil toneladas em 2006, 616 mil toneladas em 2007 e 647 mil toneladas em 2008. Outro movimento decorrente da redução do fornecimento pela Argentina foi o aumento das importações de trigo do Canadá, ainda que em vo-lumes inferiores. Em 2006, o Brasil importou 71 mil toneladas, em 2007 a quantidade foi de 340 mil tone-ladas e em 2008, 272 mil tonetone-ladas. Nos parágrafos seguintes, tratarei das condições de produção de trigo no Brasil.

A área cultivada com trigo na safra 2009/2010 foi de 2,4 milhões de hectares distribuídos em oito Estados. A maior concentração de cultivo está localizada na Região Sul, sendo o Estado do Paraná o maior pro-dutor com 1,2 milhões de ha, (53,52% da área total). Seguem Rio Grande do Sul com 859,8 mil ha (35,41%), Santa Catarina com 117,0 ha (4,82%), São Paulo com 61,3 mil ha (3,52%), Mato Grosso do Sul com 42,4 mil ha (1,74%) e Minas Gerais (0,10%). Conforme dados da CONAB, o aumento de área cultivada ocorrido em Goiás (18,3%), Minas Gerais (12,3%) e Paraná (15,5%) foi compensado pela redução de área ocorrida nos Estados de São Paulo (23,0%), Distrito Federal (13,8%) e Rio Grande do Sul (12,3%), ficando no geral 1,3% superior à safra anterior.

Para a safra 2009/2010 estima-se uma produção de 5 milhões de toneladas, o que representa uma queda de 14,6% em relação ao ano anterior. Esta redução foi resultante da queda de 15,7% na produtividade média nacional, que deverá atingir 2070 kg por hectare, enquanto a área plantada aumentou 1,3%, chegando a 2,4 milhões de hectares. Os principais Estados produtores são Paraná (2,5 milhões de tone-ladas), Rio Grande do Sul (1,8 milhões de tonetone-ladas), Santa Catarina (283 mil toneladas) e São Paulo (127 mil toneladas).

Conforme o relatório da CONAB, a lavoura de trigo do Brasil é implantada predominantemente pelo sistema de plantio direto, com mais de 90% da área cultivada. Nos Estados de Minas Gerais e Goiás as lavouras, em sua maioria, são irrigadas. A cultura do trigo necessita de uma variação de clima diferenciada da maioria das culturas de grão. Na fase inicial do ciclo a exigência é por temperaturas baixas, enquanto na fase de flora-ção e granaflora-ção a preferência é por baixa umidade e temperaturas mais elevadas, que reduzem o ataque de doenças e favorecem a qualidade do grão. Nesta safra o clima foi bastante desfavorável, principalmente nos Estados de São Paulo, Goiás, Paraná e no Distrito Federal, onde ocorreram precipitações elevadas na fase final do ciclo vegetativo. No Rio Grande do Sul o clima foi favorável até a colheita, prejudicando apenas na fase final.

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março de 2010 Segundo a CONAB, no momento o mercado de trigo

é vendedor e ainda existe produto disponível da safra 2008/2009. A comercialização da safra 2009/2010 está sendo realizada com lentidão por falta de compra-dores. Os preços por saca de 60 kg variam conforme a região: Goiás e Distrito federal − R$ 30,00; Região Sul − R$ 21,62; Paraná − R$ 24,56, Minas Gerais − R$ 31,09 e Mato Grosso do Sul − R$25,00.

A qualidade do produto foi comprometida, na maioria dos Estados produtores, por consequência do excesso de chuvas ocorridas no terço final do ciclo da cultura. NoEstado de São Paulo, o produto colhido foi de baixa qualidade. No Paraná, 25% da produção é considera-da de baixo padrão, imprópria para panificação. Os Estados que colheram produto de melhor qualidade foram Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Um dos fatores que contribuiu para a melhoria da qualidade do produto foi a utilização de variedades específicas para produção de pão.

O tema da qualidade é particularmente relevante no agronegócio do trigo. Com relação à definição de qualidade, a pesquisadora Martha Z. de Miranda, da EMBRAPA Trigo, observa que ela teria diversas conotações. Segundo ela,

para o produtor, trigo com qualidade é aquele com resistência a doenças e pragas, palha forte, ampla adaptação e maior perfilhamento (elevado potencial de rendimento). Para o setor de armazenagem, grãos de boa qualidade são aqueles sadios, com baixo teor de impurezas e matérias estranhas, sem infestações e danos mecânicos e com umidade adequada para a sua conservação. (MIRANDA, 2008, p.1)

A pesquisadora argumenta, ainda, que

para o moageiro, o melhor trigo é aquele que possui grãos sadios, que produz elevados rendimentos em farinha e é estável nas diferentes safras, possibilitando a manutenção da qualidade da farinha de trigo a cada lote. Para a indústria, o trigo ideal é aquele que produz farinha adequada para cada produto final, com consistência a cada lote. Para o consumidor final, é aquele com o qual são elaborados produtos finais com características organolépticas adequadas (sabor,

aroma, cor etc.), a preço acessível e/ou características diferenciadas. (ibidem)

Assim, em cadeias produtivas complexas, como a do trigo, torna-se fundamental a estreita colaboração e coordenação entre os diversos agentes, principalmen-te no relacionamento entre fornecedores de matéria-prima e processadores. Nesse ambiente a escolha do fornecedor local ou estrangeiro tende a ser definida por critérios mais complexos do quesomente o pre-ço. Voltando à questão que motivou este artigo, uma eventualelevação de alíquota de importação pode não ter efeitos nos preços ao consumidor final, tendo em vista a possibilidade de busca de outros fornecedores no mercado internacional, ou autilização de estoques nacionais no curto prazo. Entretanto, a busca de no-vos fornecedores deve levar em conta os aspectos de qualidade mencionados, o que pode produzir uma elevação temporária nos custos de transação no âm-bito do agronegócio do trigo no Brasil.

referência

MIRANDA, Martha Z. de. Diferentes significados para

qualidade de trigo. Portal do Agronegócio, Seção

Agro-negócio, Agricultura – Trigo, abril de 2008. Disponível em: <http://www.portaldoagronegocio.com.br/con-teudo.php?id=23784>. Acesso em: 15 mar 2010.

(*) Mestre em Administração pela FEA-USP. (E-mail: aclimano@usp.br).

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março de 2010

mAnuel enriquez gArCiA (*)

emprego, salário e taxa de ocupação

Recentemente, o IBGE divulgou os dados do PIB − Produto Interno Bruto, referentes ao quarto trimestre de 2009 e constatou-se que a economia brasileira, no acumulado no ano de 2009 e em face de igual período de 2008, apresentou uma taxa de variação da produção nacional igual a -0,2%. As informações apontam, pelo lado da oferta global, e na comparação com igual período de 2008, que a indústria amargou recuo de 5,5%, seguida pelo setor agropecuário com queda de 5,2%, enquanto o setor serviços evidenciou crescimento de 2,6%. Pela ótica da demanda, as in-formações coletadas pelo IBGE dão conta de que as despesas de consumo das famílias registraram forte crescimento, de 4,1%, em 2009, enquanto as despesas de consumo da administração pública registraram variação positiva de 3,7%. Ainda nessa mesma base de comparação, destaca-se a forte queda observada na formação bruta de capital fixo, da ordem de 9,9%. Por sua vez, as exportações de bens e serviços e as importações apresentaram incrementos positivos, respectivamente de 10,3% e 11,4%, utilizando-se a mesma base de comparação.

Quanto à Produção Industrial, o IBGE, por meio da Pesquisa Industrial Mensal, informa que a produção industrial registrou, em janeiro de 2010, incremento positivo de 1,1%% em face do mês anterior, descon-tadas as influências sazonais. Diz o Instituto que em comparação com janeiro de 2009, a produção industrial experimentou expansão de 16,0%, reflexo da baixa base de comparação decorrente da crise financeira internacional. No acumulado de 12 meses a taxa permaneceu negativa (-5,0%), mas, deve-se ressaltar, inferior à registrada em igual período de 2008, quando o recuo observado foi de 7,4%.

O aumento da produção na passagem de dezembro de 2009 para janeiro de 2010 foi devido à expansão registrada em 14 dos 27 ramos investigados pelo IBGE

e nos aumentos na produção observados em três das quatro categorias de uso. Dentre esses 14 ramos que registraram incrementos positivos, destacam-se: produtos de metal (12,0%), material elétrico e de comunicações (14,3%) e bebidas (8,1%). Ocorreram incrementos, contudo mais moderados, nos ramos de alimentos (1,4%), indústrias extrativas (2,7%), meta-lurgia básica (2,5%), máquinas, aparelhos e materiais elétricos (4,5%) e outros produtos químicos (1,8%). Por seu lado, recuos foram registrados nos ramos de edição e impressão (-5,0%), veículos automotores (-1,2%) e farmacêutica (-2,2%).

Por sua vez, dentre as categorias de uso, e na compa-ração com dezembro de 2009, o segmento de bens de capital registrou recuo de 0,1%, praticamente estável, após crescer 29,0% nos nove meses anteriores. No ge-ral, o setor de bens de consumo registrou incremento positivo de 1,1%, enquanto no desagregado observa-se uma forte variação positiva em bens de consumo durá-veis, da ordem de 8,6%, enquanto a categoria de bens intermediários apresentou crescimento de 2,0%. O IBGE, em outra pesquisa, a Pesquisa Mensal de Emprego e Salário, registra que a taxa de desocupa-ção em janeiro de 2010 foi de 7,2%, com um aumento de 0,4% ante dezembro de 2009, todavia, com recuo de 1,0% em face de igual período de 2009, quando registrou 8,2%. Os dados do IBGE registram também que o contingente de pessoas ocupadas, estimado em 21,6 milhões em janeiro de 2010, para o total das seis regiões metropolitanas, apresentou recuo de 1,0%, ou seja, que houve perda de 210 mil postos de trabalho em relação a dezembro de 2009, contudo, observou-se crescimento de 2,1% em comparação com igual mês de 2009.

O número de trabalhadores com carteira assinada (9,8 milhões) permaneceu estável na passagem de

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março de 2010 dezembro a janeiro, todavia, cresceu 3,5% em relação

a janeiro de 2009. Quanto ao rendimento médio real habitualmente recebido pelos trabalhadores, relata o IBGE que em janeiro de 2009, para o agregado das seis regiões metropolitanas, o valor foi estimado em R$1.373,50 (um mil trezentos e setenta e três reais e cinquenta centavos), registrando um incremento po-sitivo de 1,1% em relação a dezembro de 2009 e recuo de 0,4% em relação a igual mês de 2009.

Quanto ao emprego industrial, os dados da Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário, publicados pelo IBGE, relatam que o emprego na indústria aumentou 0,3% em face de dezembro de 2009, mês imediatamente anterior, na série livre de influências sazonais. Na comparação com igual mês de 2009, as in-formações coletadas registram recuo de 1,1%, enquan-to no acumulado de 12 meses a taxa é negativa (-5,1%), praticamente a mesma registrada no fechamento de 2009 quando se situou em -5,2%. No confronto, janeiro de 2010 com igual mês de 2009, o IBGE aponta que no total do País houve recuo no emprego industrial em 13 dos 18 setores pesquisados, destacando-se com fortes quedas os setores de madeira (-13,8%), vestuário (-4,3%) e meios de transporte (-4,0%). Dentre os setores que apresentaram contribuições positivas, destaca-se o de papel e gráfica (8,8%).

Quanto ao número de horas pagas, os dados do IBGE registram queda de 0,3% na comparação com igual mês do ano anterior, na série livre de efeitos sazonais, após sete meses sem registrar quedas. No tocante à folha de pagamento real dos trabalhadores da indústria, em janeiro de 2010, em relação ao mês imediatamente anterior, apresentou crescimento de 5,9%, após ter acumulado perda de 4,0% no último

bimestre de 2009. Já em relação a janeiro de 2009, o valor total da folha de pagamento apresentou variação positiva de 2,4%.

Como se pode notar, os dados publicados pelo IBGE até este momento apontam para uma taxa de cresci-mento moderadamente negativa do PIB, em 2009, e também para a retomada do nível de atividade e do emprego industrial. Dados do relatório Focus, divul-gado pelo Banco Central do Brasil apontam para um crescimento da indústria da ordem de 8,7% em 2010, o que ensejará uma retomada do nível de emprego industrial, embora com um crescimento menor ao da produção física, devido ao ajustes que as empresas realizaram para se defenderem dos efeitos da crise financeira internacional.

(*) Professor da FEA-USP. (E-mail: enriquez@usp.br).

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março de 2010

temas de

economia aplicada

FernAndo Homem de melo (*)

o início da colheita e da

comercialização da safra 2010

A safra de grãos plantada (na região Centro-Sul) no segundo semestre de 2009 começa a ser colhida agora, em fevereiro-março de 2010. Nos próximos meses estará plantada a safra de grãos na região Nordeste. A área plantada na região Centro-Sul, como veremos a seguir, é praticamente definitiva. O mesmo não pode ser dito com respeito aos dados de produção. Problemas como excesso de chuvas já prejudicaram as safras de arroz no Rio Grande do Sul e de feijão no Paraná.

1. os dados de área plantada e de produção A Tabela 1 apresenta os dados mais recentes (feverei-ro de 2009) para área plantada e p(feverei-rodução de grãos no Brasil na safra 2009/2010. Os dados sobre trigo referem-se à área plantada em 2009 e também colhida em 2009. O plantio, agora iniciado, na região Nordeste, poderá alterar os dados mostrados na Tabela 1. As áreas plantadas com grãos na safra 2009/2010 indicam que a agricultura teve, no total, um quadro de estagnação (não crescimento). O desfavorável qua-dro econômico em 2008/2009 e as previsões também desfavoráveis para a taxa de câmbio em 2010 parecem ter influenciado o comportamento dos produtores. Apenas a soja e o trigo tiveram crescimento de área, salientando-se o da soja, pois a área de trigo foi

plan-tada no segundo trimestre de 2009 quando a taxa de câmbio estava mais favorável aos produtores.

tabela 1 – área plantada e produção de grãos no Brasil na safra 2009/2010 PRODUTO ÁREA PLANTADA (1.000 ha) PRODUÇÃO (1.000 ton) Algodão-Caroço • 817,6 ( - 3,0) 1.930,6 ( 2,1) Arroz • 2.795,1 ( - 3,9) 11.507,9 ( - 8,7) Feijão Total • 4.032,5 (. – 2,8) 3.546,9 ( 1,6) Feijão – 1ª safra • 1.438,0 ( 2,3) 1.486,6 ( 10,6) Feijão – 2ª safra • 1.826,4 ( - 7,5) 1.303,1 ( - 5,0) Milho Total • 12.893,3 ( - 9,0) 51.363,3 ( 0,7) Milho – 1ª safra • 8.156,2 ( - 12,0) 32.368,7 ( - 3,8) Milho – 2ª safra • 4.737,1 ( - 3,4) 18.994,6 ( 9,5) Soja • 23.209,5 ( 6,7) 66.733,2 ( 16,7) Trigo • 2.428,0 ( 1,3) 5.026,3 ( - 14,6) OUTROS • 1.475,6 ( 0,8) 2.986,7 ( - 3,6) TOTAL • 47.651,6 (zero) 143.094,9 ( 5 ,9)

Fonte: CONAB, fevereiro de 2010. Os dados entre parênteses re-presentam as variações percentuais.

Os demais produtos, comercializáveis e não comer-cializáveis, tiveram reduções de área plantada. Os casos mais expressivos foram os do milho – 1ª safra (-12,0%), arroz (-3,9%) e algodão (-3,0%). A evolução da

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março de 2010 taxa de câmbio, que será mostrada a seguir, favoreceu

a comercialização da safra no primeiro semestre de 2009, mas não o plantio da de 2009/2010:

tabela 2 – taxa de câmbio (RS / US$)

2009 1º Trimestre: 2,3107 2º Trimestre: 2,0753 3º Trimestre: 1,8653 4º Trimestre: 1,7407 2010 Janeiro: 1,7770 Fevereiro: 1,8380 02/03/10: 1,7843 1º Semestre (est.): 1,8190

É claro que a evolução da taxa de câmbio favoreceu a comercialização no primeiro semestre de 2009. Não houve a crise agrícola que muitos, precipitadamente, previam, pois a depreciação do real compensou, em parte, a queda de preços internacionais após a crise de setembro de 2008. Os períodos críticos para o plantio da safra de grãos, em termos de tomada de decisões, compra de insumos e efetivação do plantio são o ter-ceiro e o quarto trimestres de cada ano. Em 2009, eles foram marcados por uma forte apreciação do real. Daí, em nosso entendimento, a estagnação (excetuando-se a soja) da área plantada. A área de cana-de-açúcar deverá continuar crescendo a um bom ritmo.

O desempenho da produção foi melhor que o da área, havendo um crescimento para o total de grãos de 5,9%. Razões climáticas e tendências de melhorias de produtividade explicam isso. Novamente, o destaque será a soja. Ocorreram declínios nas produções de arroz (será ainda maior), de milho – 1ª safra, e de feijão – 2ª safra. A de trigo mostra um forte declínio na quantidade produzida, pelo excesso de chuvas. A qualidade do produto também foi muito prejudica-da. Uma parte desse trigo será usada como ração, inclusive sendo exportada. Apesar de tudo, o total

de 143,1 milhões de toneladas será o segundo maior da história, sendo a soja o grande destaque no caso de grãos.

2. o comportamento dos preços aos produtores Conforme mostrado no Gráfico 1, os preços recebi-dos pelos produtores brasileiros continuaram sua tendência de queda em dezembro de 2009, janeiro e fevereiro de 2010. Esse índice é formado pelos preços de feijão, milho, soja, algodão, batata, laranja, arroz, café, bovinos, suínos e frangos. A predominância, portanto, é de produtos comercializáveis (exportação), cujos preços internos têm grande influência da taxa de câmbio e dos preços internacionais. A evolução da taxa de câmbio em 2009 e até fevereiro de 2010 foi de forte apreciação, conforme acima mostrado. A partir de novembro último houve, na média, uma pequena depreciação. Entretanto, em 02 de março a taxa (R$ 1,7843 / US$) já marcava reversão.

Essa pequena depreciação dá algum alívio aos preços agrícolas neste início de comercialização. Entretanto, os preços dos principais grãos, notadamente soja e milho, continuam em queda aos produtores agora em fevereiro. O preço internacional da soja, influen-ciado por uma grande produção mundial, passou de US$ 380 / ton em dezembro de 2009 para US$ 344 / ton em fevereiro de 2010 na Bolsa de Chicago. Quedas um pouco menos pronunciadas ocorreram para algodão, trigo e milho. A grande exceção está sendo o preço do açúcar na Bolsa de Nova York. Ele passou, por razões de escassez de oferta, de US$ 269 / ton em janeiro de 2009 para US$ 626 / ton em janeiro de 2010 (US$ 586 / ton em fevereiro). A expectativa é de que as excelentes produtividades e menores custos de produção compensem, pelo menos em parte, esses preços menores para grãos no Brasil, mantendo um quadro de rentabilidade ligeiramente positiva. O caso mais grave é o do milho (preços abaixo dos custos). Sua 2ª safra já mostra redução de área (Tabela 1).

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março de 2010

(*) Professor Titular do Departamento de Economia da FEA-USP e Pesquisador da FIPE – Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (E-mail:- fbhm@usp.br).

gráfico 1 – evolução do índice total de preços reais – recebidos durante 2005, 2007, 2008, 2009 e 2010 (02/1990 = 100)

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março de 2010 André luis squArize CHAgAs (*)

etanol ou alimento: existe

esse trade-off?

1. introdução

A demanda crescente por fontes energéticas limpas, em substituição ao petróleo, tem provocado grande expansão da chamada agroenergia, isto é, a produção de combustíveis a partir de produtos agrícolas, com destaque para o etanol e o biodiesel. Estes produtos podem ser obtidos de diferentes fontes de matéria-prima. No caso do etanol, destacam-se a cana-de-açúcar e o milho e, no caso do biodiesel, a soja, a canola, o dendê, a mamona, entre outras diversas fontes. As novas necessidades energéticas conferem aos combustíveis derivados de produtos agrícolas maior destaque, além de significar maior potencial de geração de renda para os países que têm vantagem comparativa na produção desses bens.

Por isso, para o Brasil, as transformações ambientais e a necessidade de adoção de novas fontes energéti-cas, antes de representar um entrave ao crescimento, pela necessidade de mudanças da matriz energética, representam grande oportunidade de geração de valor e renda, uma vez que o País apresenta nítidas vantagens comparativas na produção de combustíveis de fontes renováveis.

A produção de etanol a partir de fontes renováveis coloca o Brasil na vanguarda do processo de busca de energia limpa, juntamente com a forte presença de usinas hidrelétricas na matriz energética do País. O Brasil é o único país do mundo que possui um pro-grama de larga escala de veículos com motores que utilizam fontes energéticas limpas e renováveis, no caso o etanol, seja na adição de porcentual significa-tivo à gasolina (álcool anidro), seja diretamente como combustível (álcool hidratado). A competitividade do etanol produzido a partir da cana-de-açúcar no Brasil

res, destacando-se em relação ao etanol de milho dos EUA tanto na questão dos custos de produção como do balanço energético.

Ainda existem controvérsias sobre os efeitos indire-tos da produção do etanol de cana-de-açúcar sobre o meio ambiente. Também preocupam as relações trabalhistas vigentes no setor. Em geral, associa-se o trabalho do setor sucroalcooleiro a uma mão de obra pouco qualificada, à forte presença de trabalhadores temporários para o corte manual, o que resulta em intensos fluxos migratórios para as regiões canaviei-ras nos períodos de safra, e a condições inadequadas de trabalho e elevado esforço físico, resultando em um número acentuado de acidentes de trabalho e mortalidade. Alguns trabalhos recentes mostram que o nível salarial na cultura canavieira é maior do que nas demais culturas, o grau de formalização das relações trabalhistas (posse de carteira de trabalho) é superior e a presença de trabalho infantil é inferior. Possivelmente, por ser uma cultura cujo produto tem maior inserção no mercado externo e com maior es-cala produtiva, suas relações de trabalho sejam mais formalizadas e de acordo com a legislação.

Ao longo dessa série de três artigos, consideraremos algumas das muitas interessantes e preocupantes questões acerca dos impactos econômicos e sociais do setor canavieiro. Neste artigo, analisa-se com mais detalhe a relação entre produção de cana-de-açúcar, preço da terra e preço dos alimentos.

2. disponibilidade de terra para agricultura e a produção de cana-de-açúcar

Uma preocupação que acompanha de forma recor-rente as discussões sobre a expansão do setor

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sucro-março de 2010

da produção e se haverá condições de atender a um aumento significativo na demanda mundial. Caso seja introduzido um porcentual de 5% de álcool na gaso-lina dos países desenvolvidos, a demanda de etanol será da ordem de 90 bilhões de litros/ano.1

Diante da ordem de grandeza destes números, é pos-sível pensar em insuficiência de espaço, o que geraria pressão sobre o preço da terra, prejudicando a van-tagem comparativa de custos que o etanol brasileiro possui. Este argumento é, no entanto, falacioso. O País utiliza hoje cerca de 7,8 milhões de hectares de terra com plantação de cana-de-açúcar (e, em média, 50% desta destina-se ao etanol e 50% à produção de açúcar). Ou seja, são cerca de 3,9 milhões de hectares para a produção de etanol. Trata-se de pouco mais de 1% da área destinada para agricultura e pastagens. Sem assumir nenhum ganho de produtividade para a produção de cana-de-açúcar do País e imaginando que a produção brasileira supra a demanda adicional por etanol, a produção de 90 bilhões de litros/ano de etanol demandaria menos de 20 milhões de hectares de terra, montante que é menos de 6% da área des-tinada à agropecuária do País. Um pequeno ganho de produtividade na pecuária, com redução da área de pastagens, disponibilizaria área suficiente para atender a parcela significativa da demanda potencial de etanol no mundo, para adição a gasolina.2

No que se refere à maior pressão sobre o preço da terra, há um conjunto de críticas que podem ser resumidas em dois grandes grupos: (i) no balanço energético do etanol, deve-se considerar o impacto da expansão da cana-de-açúcar sobre o meio ambiente, seja direto, com a cana-de-açúcar invadindo Áreas de Proteção Ambiental, seja indireto; (ii) o impacto sobre o preço dos alimentos ampliará a pobreza e propiciará maior concentração de renda (concorrência pelo uso da terra entre alimentos e energia).

No que se refere à primeira crítica, há dúvidas de que as áreas do Pantanal e da Floresta Amazônica sejam próprias para o cultivo da cana-de-açúcar, o que descarta os efeitos diretos da cultura sobre o desmatamento. A definição oficial do zoneamento

agrário do País, proibindo a cultura de cana-de-açúcar nessas áreas ajudaria a reduzir a força dos argumen-tos críticos ao setor. Restariam os efeiargumen-tos indireargumen-tos. As principais preocupações referem-se ao controle do uso da água, reserva legal e proteção de áreas de mata ciliares e das nascentes de água, conservação do solo e de recursos hídricos, adoção de boas prá-ticas para descarte de embalagens de agrotóxicos, minimização da poluição atmosférica, reciclagem e reuso de resíduos. Também preocupam os efeitos das queimadas, não apenas ao meio ambiente, como também sobre a saúde de trabalhadores e pessoas que vivem em regiões produtoras. Outras questões ambientais permanecem ainda no debate, como por exemplo, a utilização das queimadas, que reduzem o impacto positivo que a cultura da cana-de-açúcar tem sobre o meio ambiente. A organização do setor poderia visar à busca de certificações ambientais que atestassem as boas práticas agrícolas relacionadas ao uso de fertilizantes, herbicidas etc. e, principalmente, a eliminação das queimadas, de tal forma a se colocar em destaque, efetivamente, os benefícios ambientais da produção de cana-de-açúcar.

Uma controversa imputação na conta de impactos ambientais negativos do setor refere-se ao processo de competição pelo uso do solo, com a consequente expulsão de culturas menos produtivas para áreas de floresta, provocando o desmatamento. A quantifica-ção desse impacto é controversa, sobretudo quando consideradas as áreas plantadas de cada uma dessas culturas.

Finalmente, a última, e talvez principal preocupação quanto à expansão do setor refere-se à crença de que o aumento da produção ocorreria em terras hoje empre-gadas na produção de alimentos, o que pressionaria o preço destes, com consequências sobre as famílias mais pobres. Poderia a maior utilização da terra para cana-de-açúcar levar a uma redução de áreas para outras culturas, com consequente aumento do preço da terra e dos custos de produção de alimentos? Se isso acontecesse, poderia ocorrer uma redução na oferta de alimentos, o que elevaria seus preços e deterioraria as condições de vida da população de baixa renda? Se o argumento levantando é verdadeiro, então existe uma

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março de 2010

tabela 2 − teste de restrição sobre os parâmetros do vetor de cointegração

Testes individuais

Parâmetro restrito χ2 Prob

Ln da produção de cana 4,9238 0,0265 Ln do preço da terra 0,0630 0,8018 Ln IPCA 8,6225 0,0033 Testes conjuntos Ln da produção de cana 5,1876 0,0747 Ln do preço da terra Ln da produção de cana 8,6738 0,0131 Ln IPCA Ln do preço da terra 9,5649 0,0084 Ln IPCA Ln da produção de cana 10,8345 0,0127 Ln do preço da terra Ln IPCA

Fonte: Elaboração própria.

tabela 3 − vetor de cointegração reestimado

Coeficientes de cointegração normalizados: 1 equação de cointegração Ln Prod.

Cana Ln Preço da Terra alimentosLn IPCA

1,0000 0,0000 3,9579*

(0,6323)

Notas: Vetor de cointegração considerando restrição sobre o parâmetro do preço da terra.

relação direta entre aumento da produção de cana-de-açúcar, preço da terra e preço dos alimentos, e a causalidade se daria nessa direção. Ademais, caso a relação seja consistente ao longo do tempo, existiria uma relação de longo prazo entre as variáveis, de modo que elas teriam uma trajetória comum. Assim, um modelo econométrico de cointegração, acompa-nhado de testes de causalidade no sentido de Granger, poderia verificar essa relação (CHAGAS, 2009). 3. produção de cana-de-açúcar, preço da terra e

produção de alimentos: qual a relação?3

A Tabela 1 reporta o teste de cointegração de Johansen. Os resultados, tanto da estatística do traço, quanto a do máximo autovalor, sugerem a existência de um vetor de cointegração entre as variáveis.4 A Tabela 2 reporta testes específicos para os parâmetros estimados do vetor de cointegração. Nota-se que apenas o parâ-metro associado ao preço da terra apresenta elevada probabilidade de não ser diferente de zero, embora no teste conjunto esse resultado não permaneça. Os demais coeficientes estimados são estatisticamente

diferentes de zero, individual e conjuntamente. Caso se aceite que o parâmetro do vetor de cointegração associado ao preço da terra seja igual a zero, então essa variável não guarda relação estável de longo prazo com as demais variáveis. Assumindo essa restrição e normalizando o parâmetro da produção de cana para a unidade, o vetor de cointegração recalculado (Tabela 3) para o modelo seria [1 3,96].

Esse resultado sugere que há relação de longo prazo entre produção de cana-de-açúcar e preço de alimen-tos no sentido inverso ao que seria esperado, caso o argumento que diz que a produção de cana-de-açúcar aumenta o preço dos alimentos fosse válido. O sinal dos parâmetros sugere relação indireta entre as duas variáveis.5 Ou seja, a expansão na produção de cana-de-açúcar está associada à queda no preço de alimen-tos, medido pelo IPCA, no longo prazo.

tabela 1 − testes de cointegração

H0: posto = k Estat Traço p-valor Estat. Max autovalor p-valor

k = 0 41,3769 0,010 23,6707 0,0320

k = 1 17,7062 0,108 12,3744 0,1653

k > 1 5,3317 0,249 5,3317 0,2490

Coeficientes de cointegração normalizados: 1 equação de cointegração

Ln Prod.

Cana Ln Preço da Terra alimentosLn IPCA 1,0000 -0,0791 4,5825*

(0,2526) (0,860) Coeficientes de ajustamento: 1 equação de cointegração

D (Ln Prod.

Cana) D (Ln Preço da Terra) D (Ln IPCA alimentos) 0,0213** 0,1094 -0,1013*

(0,0119) (0,0982) (0,0239)

MacKinnon, Haug e Michelis (1999) p-values. * significativo a 1%.

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março de 2010

Para verificar a exogeneidade entre as variáveis, testes de restrição sobre os coeficientes de ajustamento são implementados. Os resultados (Tabela 4) sugerem que as variáveis preço da terra e produção de cana-de-açúcar são fracamente exógenas, pois seus coeficientes de ajustamento não são estatística e conjuntamente diferentes de zero (p-valores superiores a 10%). Por outro lado, o preço de alimentos é a variável endó-gena do modelo, determinada pelas outras variáveis. Em outras palavras, o resultado dos testes sugere que choques na produção de cana-de-açúcar ou no preço da terra são sentidos mais fortemente pelo preço dos alimentos do que pelas demais variáveis do modelo.

tabela 4 − teste de restrição sobre os coeficientes de ajustamento

Testes individuais

Parâmetro restrito χ2 Prob

Ln da produção de cana 1,9206 0,1658 * Ln do preço da terra 1,0451 0,3066 * Ln IPCA 9,4194 0,0021 Testes conjuntos Ln da produção de cana 3,7687 0,1519 Ln do preço da terra Ln da produção de cana 16,5857 0,0003 Ln IPCA Ln do preço da terra 9,4676 0,0088 Ln IPCA

Nota: * variável fracamente exógena. Fonte: Elaboração própria.

Impondo-se a restrição de que os coeficientes de ajus-tamento das variáveis produção de cana-de-açúcar e preço da terra são conjuntamente iguais a zero, o parâmetro para o preço de alimentos reestimado é -0,14 (Tabela 5). O sinal negativo significa que o ajus-tamento opera no sentido esperado, mas com uma intensidade muito reduzida. Assim, choques aleató-rios, que eventualmente façam as séries de produção de cana-de-açúcar e de preço de alimentos desviarem de suas trajetórias de longo prazo, são ajustados de maneira tênue (apenas 14%) no curto prazo.6

tabela 5 − coeficientes de ajustamento reestimados

Coeficientes de ajustamento: 1 equação de cointegração D (Ln Prod.

Cana) D (Ln Preço da Terra) D (Ln IPCA alimentos)

0,0000 0,0000 -0,1406*

(0,0315)

Notas: Coeficientes de ajustamento considerando restrições sobre os parâmetros do preço da terra e da produção de cana-de-açúcar.

* significativo a 1%.

Erros padrão entre parênteses. Fonte: Elaboração própria.

Dada a exogeneidade fraca das variáveis preço da terra e produção de cana-de-açúcar, o teste de causalidade de Granger permite identificar dentre estas duas variáveis aquela(s) que é(são) fortemente exógena(s). A Tabela 6 reporta os resultados deste teste e sugere que há causalidade, no sentido de Granger, no preço da terra para a produção de cana-de-açúcar, mas não o contrário. Esse resultado implica que o preço da terra é fortemente exógeno. Em outras palavras, a relação de causalidade, no sentido de Granger, não é da produção de cana-de-açúcar para o preço da terra (o que seria esperado caso o argumento fosse válido), mas em sentido contrário – de preço da terra para a produção de cana-de-açúcar.

tabela 6 − teste de causalidade de Granger

H0: χ2 Prob

Ln da Produção de Cana

Ln do preço da terra não Granger-causa 7,4308 0,0243 Ln do IPCA não Granger-causa 3,3545 0,1869 Conjuntamente não Granger-causam 10,1839 0,0374 Ln do preço da terra

Ln da produção de

cana não Granger-causa 0,2332 0,8900

Ln do IPCA não Granger-causa 4,0426 0,1325 Conjuntamente não Granger-causam 4,1148 0,3907

Nota: Teste de Wald de exogeneidade por blocos. Fonte: Elaboração própria.

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março de 2010 4. conclusão

Caso o aumento da produção de cana-de-açúcar levas-sea um aumento no preço da terra, e este, no preço de alimentos, então deveria existir uma relação direta e causal entre aumento da produção de cana-de-açúcar, preço da terra e preço dos alimentos. Ademais, sendo essa hipótese válida, deveria haver relação de longo prazo entre as variáveis, de modo que elas teriam trajetória comum.

Os resultados do teste de causalidade de Granger apontam que não existe precedência temporal da produção de cana sobre o preço da terra, mas sim o contrário, ou seja, é o preço da terra que causa (no sentido de Granger) a produção de cana-de-açúcar. A relação de longo prazo identificada pelo VEC estabe-lece uma trajetória comum entre essas duas variáveis, mas estatisticamente não significativa. Como o coe-ficiente de ajustamento de curto prazo para o preço da terra não é estatisticamente diferente de zero e, dado o resultado do teste de causalidade de Granger, conclui-se que o preço da terra é exógeno em relação à produção de cana-de-açúcar e ao preço de alimen-tos. Em outras palavras, a ordem de causalidade identificada não permite afirmar que um aumento na produção de cana-de-açúcar impacte positivamente o preço da terra, embora as variáveis caminhem no mesmo sentido.7

Especificamente, com relação ao preço de alimentos, conclui-se que há relação de longo prazo entre essa variável e a produção de cana-de-açúcar, mas em sen-tido inverso ao que seria esperado caso fosse válido o argumento de que a produção de cana-de-açúcar aumenta o preço de alimentos. Esse resultado é ro-busto caso se modifique a série utilizada para medir o preço de alimentos ao consumidor. O argumento, no entanto, parece válido com relação ao preço de gêneros alimentícios no atacado.

Essa diferença entre preços ao consumidor e preço no atacado se deve, possivelmente, ao fato de que no atacado os preços acompanham mais de perto as decisões de produção, enquanto os preços ao

consu-das inovações tecnológicas, que podem amortecer os efeitos eventuais de realocação do uso da terra. É provável que a noção de que o aumento da produção de cana-de-açúcar pode pressionar o preço da terra decorra mais da conjuntura atual, em que a produção agrícola de todas as culturas cresce, acompanhan-do o aumento da demanda por produtos agrícolas em decorrência do aumento na renda mundial (em especial de países pobres e populosos como China e Índia). É este movimento que pode pressionar o preço da terra − e não o aumento da produção de um único produto. Se isso é verdade, e estudos futuros poderão confirmar, não seria o aumento da produção de cana-de-açúcar a pressionar o preço da terra, mas o aumento da demanda por produtos oriundos do campo e a concorrência entre estas culturas que fariam o preço da terra aumentar.

Em termos de opção estratégica, cumpre examinar se o aumento da produção de outras commodities, com menor valor agregado e com elos muito mais fracos com os demais setores produtivos, é mais vantajoso do que investir na produção de commodity que pode assegurar vantagens comparativas energéticas ao País.

referência

CHAGAS, André L. S. Três ensaios sobre o setor produtor de

cana-de-açúcar no Brasil. Tese (Doutorado em Economia).

Departamen-to de Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, 2009.

1 Na safra de 2007/2008, a produção estimada é de 22,5 bilhões de litros. Para atender à demanda gerada por esta alteração, a produção deveria ser multiplicada por quatro.

2 Deve-se dizer que os cálculos acima não consideram eventuais ganhos de produtividade que poderão ocorrer com a introdução de novas variedades de cana, além de inovações tecnológicas na fase industrial, que poderão propiciar o maior aproveitamento da cana, por exemplo, pela hidrólise, ampliando a produção de etanol a partir da mesma quantidade de cana-de-açúcar e de terra. Não seria improvável projetar tais ganhos de produtividade, tendo em vista que a expansão da área destinada à

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cana-de-março de 2010

da produção superior a 60% e ganhos de produtividade da ordem de 20%.

3 Os dados de produção de cana-de-açúcar, Brasil, são calculados pelo Observatório do Setor Sucroalcooleiro da FEA-RP, com base na Pesquisa Agrícola Municipal (PAM) do IBGE; o preço de venda da terra de lavoura, Brasil, em R$ correntes, é da FGV- Agroanalysis; e o preço de alimentos é obtido do IPCA - alimentos e bebidas, também do IBGE. Para a produção de cana-de-açúcar e preço da terra, os dados são semestrais, para o período de 1977:1S a 2007:2S. Para o IPCA, os dados mensais foram semes-tralizados e estão disponíveis para o período 1981:2S a 2007:2S. A amplitude da amostra foi limitada, portanto, no período 1980:2S a 2007:2S. Como a relação que se quer verificar é o impacto que o aumento da produção de cana-de-açúcar tem, em última análise, sobre o custo de vida, em especial de famílias mais pobres, importa verificar, então, o impacto sobre o preço relativo de alimentos e não sobre os preços correntes. Igual raciocínio deve ser feito com relação ao preço da terra. Dessa forma, os dados originais foram deflacionados. O IPCA - alimentos e bebidas foi deflacionado pelo IPCA - geral, obtendo-se um índice de base 100 que expressa as variações no preço relativo de alimentos e bebidas em relação à cesta típica de consumo de famílias brasileiras que ganham até 40 salários mínimos. Já o preço da terra foi deflacionado pelo IGP-DI, obtendo-se um índice de baobtendo-se 100 que expressa variações no custo de oportunidade de imobilização de recursos em terra.

4 Testes específicos de raiz unitária foram implementados para verificar a adequação do modelo vetores de correção de erros.

5 O resultado deve ser interpretado corretamente e com cautela, uma vez que, para a estimação do modelo, as variáveis são “colocadas do mesmo lado da igualdade”. Assim, a relação de equilíbrio de longo prazo entre a ln da produção de cana e o ln do IPCA-alimentos é (ln Prod cana = -3,96 ln do IPCA-alimentos).

6 Esse resultado pode explicar, em parte, a associação aparentemente errônea entre expansão da produção de cana-de-açúcar e dos preços dos alimentos. Caso haja um choque exógeno (um choque de demanda, por exemplo) que aumente o preço dos alimentos ao mesmo tempo que incentive a produção de cana-de-açúcar, no curto prazo parecerá que essas séries têm relação direta. No longo prazo, contudo, não é essa a relação identificada no modelo.

7 A exogeneidade identificada para o preço da terra, no entanto, pode estar comprometida pelo período da amos-tra (em teste mais amplo, com IPC-FIPE e IPA-DI, esse resultado não se manteve) e pelos erros de medida dessa variável (CHAGAS, 2009).

(*) Doutor em Economia pelo IPE-FEA-USP e pesquisador da Fipe e da Fundace. (E-mail: achagas@usp.br).

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março de 2010 Nestes tempos de ansiedade global sobre a questão

ambiental, associada às dificuldades de se atingir um consenso entre países sobre como enfrentar as mudanças climáticas, torna-se relevante discutir as alternativas de atuação em âmbito local. Este é pri-meiro de três artigos sobre o caso do Projeto Terra Paulista, uma proposta de desenvolvimento regional sustentável (DRS) em andamento no território de cin-co municípios do Estado de São Paulo. Neste artigo são apresentados os fundamentos do projeto, com a discussão da metodologia e das premissas sociais, am-bientais e econômicas. O segundo artigo apresentará o histórico da implantação e as propostas sociais e ambientais do projeto. O terceiro tratará dos aspectos econômicos do projeto, com as propostas de parcerias público-privadas e negócios a serem fomentados. 1. o projeto

O Projeto Terra Paulista é uma proposta de DRS para os municípios de Porto Ferreira, Descalvado, Santa Cruz das Palmeiras, Santa Rita do Passa Quatro e Tambaú. O projeto tem como base a aplicação da fran-quia social Terras do Sol, idealizada pelo Instituto de Sociedades para o Desenvolvimento Autossustentável (ISDAS), uma organização social de interesse público (OSCIP) fundada em 1992, com sede na cidade de São Paulo.

Trata-se de um modelo de relacionamento entre agentes públicos e privados que pode ser considerado inovador na forma e no conteúdo. Quanto à forma, a franquia social é a concessão de uma metodologia de atuação de uma organização sem fins lucrativos para agentes públicos ou privados. Conforme citação da

Rede de Informações para o Terceiro Setor (RITS)1 de texto de uma instituição bancária, trata-se da “...ado-ção de modelos ou “marcas” bem-sucedidos de a“...ado-ção social por mais de uma empresa. Tal ideia permite a reedição de estratégias e metodologias já testadas e aprovadas na prática e a conquista de resultados em prazo mais curto ...”.

O conteúdo desta franquia é uma metodologia de apoio à elaboração e implementação de políticas públi-cas nas áreas social, ambiental e econômica que contri-buam para o DRS no âmbito de governos municipais e estaduais. O modelo pode ser uma oportunidade para que órgãos públicos elevem a eficácia e a eficiência da condução de seus programas e políticas por meio da parceria com entidades sem fins lucrativos e outras organizações privadas que possuam metodologias de trabalho e projetos compatíveis com os objetivos mais amplos da administração pública. O método tem sido aprimorado nos últimos cinco anos, a partir de inicia-tivas do ISDAS junto à Igreja Católica, associações de produtores rurais e prefeituras da região noroeste do Estado de São Paulo. Desse processo resultou a apro-vação de legislações municipais, mas a implantação foi interrompida por questões políticas.

No caso em análise neste artigo, o modelo foi adaptado às condições socioeconômicas locais e discutido com agentes públicos e privados dos municípios partici-pantes. O Projeto Terra Paulista foi concebido com a missão de apoiar políticas públicas nas áreas social, ambiental e econômica que contribuam para o DRS e favoreçam estratégias privadas para cadeias produ-tivas de bionergia, alimentos e produtos florestais e outros negócios sustentáveis.

Antonio CArlos limA nogueirA (*) AdolFo sCHmukler (**)

uma proposta de desenvolvimento

regional sustentável: parte 1

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março de 2010

O DRS envolve a atuação de agentes públicos e priva-dos em determinada região seguindo a orientação do desenvolvimento sustentável, um conceito que ainda está em construção e que por isso comporta diversas interpretações. Nos parágrafos seguintes são discuti-dos os aspectos social, ambiental e econômico que são considerados na maioria das discussões sobre o tema e que são adotados como premissas na concepção do projeto Terra Paulista.

2. dimensão social

Um critério geral para se avaliar o impacto social de políticas públicas ou de empreendimentos privados é a capacidade de promoção das condições de vida das populações urbana e rural de baixa renda. Esta capacidade pode se revelar na geração de empregos e condições de trabalho, educação e capacitação pro-fissional, acesso a serviços de saúde e condições de habitação e saneamento básico. Dentre esses temas, tomamos como exemplo a questão do emprego e tra-balho, tratado para as populações rurais e urbanas a seguir.

Considerando que as populações rurais de baixa renda sejam constituídas de forma predominante por agricultores familiares, podemos avaliar as con-dições que afetam as concon-dições sociais desse grupo. Em geral, observa-se que a produção de commodities agrícolas envolve economias de escala, o que favorece a consolidação das unidades produtivas e limita a ca-pacidade de sobrevivência no mercado das operações de pequena escala.

Assim, a viabilidade econômica dos produtores fa-miliares que operam de forma isolada fica restrita à produção de verduras e legumes convencionais, produtos diferenciados, como os orgânicos e com outras certificações ou de valor unitário elevado, envolvendo, na maioria dos casos, alta especializa-ção e treinamento da mão de obra. Outra opespecializa-ção, que tem sido adotada há décadas na produção de suínos, aves e fumo, é a integração de agricultores familiares em sistemas produtivos agroindustriais por meio de contratos de longo prazo.

Os agricultores familiares que operam isoladamente têm dificuldades de acesso a crédito, tecnologia, as-sistência técnica e canais de distribuição. Além disso, o modelo brasileiro de reforma agrária apresenta deficiências na capacitação e geração de renda desses agricultores nos assentamentos. A criação de políticas públicas municipais e estaduais que apoiem a agricul-tura familiar pode contribuir com o aprimoramento desse modelo, com a integração dos assentamentos a um projeto de DRS. Este apoio pode atuar tanto no di-recionamento para a operação isolada em mercados de maior valor agregado quanto na integração em cadeias agroindustriais por meio de contratos. Assume-se que as ações de inclusão social dos agricultores familiares também podem ser mais eficazes se realizadas por meio do relacionamento com associações ou coope-rativas desses agentes.

No caso das populações urbanas de baixa renda, a baixa escolaridade e a falta de capacitação profissional geram um quadro conhecido nas grandes cidades brasileiras, formado pelo enorme contingente de desempregados, subempregados, vendedores ambu-lantes e catadores de sucata, que moram em favelas ou nas ruas. Apesar de reconhecermos que a solução definitiva de longo prazo é a oferta de educação básica e profissionalizante, as políticas federais que oferecem respostas de curto prazo são os programas de renda mínima.

A partir dessa base mínima de sobrevivência, existe um enorme campo de ação para prefeituras, ONGs e empresas promoverem projetos de inclusão social com a oferta de oportunidades de trabalho para essas populações organizadas em cooperativas ou associa-ções. Exemplos de sucesso são as cooperativas de cata-dores, que têm desempenhado um papel essencial no processo de reciclagem de papel, alumínio e plástico pet, contribuindo para que o Brasil ocupe posições de destaque entre os países que fazem reciclagem de materiais.

A motivação para a adesão de empresas às práticas de responsabilidade social empresarial (RSE) é crescente e já não corresponde à abordagem tradicional da

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filan-março de 2010 tropia, conforme observado por Ricardo Abramovay

em artigo de 2006, ao afirmar que “ ... a responsabi-lidade social empresarial aparece como componente organicamente integrado ao próprio funcionamento dos mercados dos quais dependem as empresas e não como manifestação de boa consciência ou da tentativa de atenuar os efeitos nefastos das atividades econômicas”.

3. dimensão ambiental

A questão ambiental entrou na agenda da sociedade em âmbito global e de modo irreversível. Para José Eli da Veiga, esta agenda ambiental seria composta por 12 desafios graves, que podem ser agrupados em quatro categorias, conforme a origem: (1) destruições ou perdas de recursos naturais: hábitat, fontes proteicas, biodiversidade e solos, (2) limites naturais: energia, água doce e capacidade fotossintética, (3) artifícios nocivos: químicos tóxicos, espécies exóticas e gases de efeito estufa ou danosos à camada de ozônio e (4) relativos às populações humanas: seu crescimento e suas aspirações de consumo. Apesar de considerar que os desafios da agenda ambiental são interdepen-dentes, o autor destaca dois deles: a água doce e o aquecimento global. O primeiro é reconhecido como o mais grave de todos pelo seu potencial de geração de conflitos entre as nações.

O segundo tema, do aquecimento global, tem recebi-do grande destaque no debate ambiental em âmbito global, a partir do IV Relatório do Painel Intergover-namental de Mudanças Climáticas (IntergoverIntergover-namental

Panel on Climate Change - IPCC) da Organização das

Nações Unidas (ONU), publicado no início de 2007. A principal mensagem do relatório é um consenso dos cientistas participantes de que as atuais formas de crescimento econômico são os principais respon-sáveis pela aceleração do aquecimento. Essa questão foi o tema central da Conferência das Partes de Co-penhague no final de 2009 (COP 15), não qual não foi possível a construção de um acordo de caráter mandatório sobre as metas de redução nas emissões entre os participantes, principalmente devido à po-sição tímida adotada por EUA e China.

O resultado foi um instrumento político para um futuro acordo que limite o aquecimento do planeta em até 2 graus Celsius. Restaram as propostas ambi-ciosas da União Europeia e do Brasil, com a definição de uma meta voluntária em torno de 37% de redução na emissão estimada até 2020. Isto significa uma re-dução em 1 bilhão de toneladas de CO2 em relação ao

volume esperado de 2,7 bilhões de toneladas de CO2,

se nenhuma ação for realizada.

Uma das implicações do combate ao aquecimento global é estimular o interesse de agentes públicos e privados em fontes renováveis de energia, que podem contribuir para a redução na emissão de gases que provocam esse efeito. Os biocombustíveis reduzem a demanda de combustíveis fósseis e são obtidos de plantas que sequestram carbono durante o ciclo vegetativo. Assim, espera-se uma demanda global crescente por etanol e biodiesel, o que justifica a criação de políticas públicas municipais que apoiem esse segmento.

Ainda que representem uma alternativa aos com-bustíveis fósseis, os biocomcom-bustíveis também têm sido questionados em alguns mercados de países desenvolvidos. As dúvidas estão relacionadas ao uso de insumos derivados de petróleo na produção da matéria-prima, à destruição de ecossistemas naturais e ao deslocamento de culturas para alimentação hu-mana. Assim, acreditamos que os sistemas produtivos de biocombustíveis devem contemplar a coexistência da produção das matérias-primas energéticas com culturas de alimentos e a preservação de áreas de matas nativas ou ciliares. Portanto, a implantação de políticas públicas municipais que apoiem cadeias produtivas de biocombustível integradas à produção de alimentos e silvicultura pode ser bem recebida pelos contribuintes e eleitores no Brasil, assim como pode facilitar a abertura de mercados externos aos biocombustíveis brasileiros.

Outro aspecto relevante decorrente do aquecimento global é o mercado de créditos de carbono, conforme as regras estabelecidas pelos Mecanismos de Desenvolvi-mento Limpo criados pelo Protocolo de Kyoto. O Brasil

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tem aproveitado suas vantagens comparativas para a venda desses títulos, tendo em vista as possibilidades de aproveitamento de projetos de reflorestamento e geração de biogás a partir de dejetos de suinocultura ou aterros sanitários, entre outras opções. Outra opção de geração de receitas em projetos de preservação de florestas é o mecanismo REDD (Redução de Emissão de Desmatamento e Degradação). Atualmente existem 19 projetos em andamento no Brasil utilizando esta ferramenta, com perspectivas de aumento após a participação destacada do Brasil na COP-15. Existe um grande potencial de participação dos agentes públicos na elaboração de políticas públicas municipais que apoiem projetos com essas características.

4. dimensão econômica

O aspecto econômico do DSR é que viabiliza a re-alização de empreendimentos que contemplem os aspectos ambientais e sociais. A sustentabilidade é um fator cada vez mais relevante na tomada de decisões de investimento de agentes privados ou públicos, que consideram a viabilidade econômica, mas também analisam se os projetos são ecologicamente corretos e socialmente justos. Assim, políticas públicas muni-cipais que apoiem novos empreendimentos na área de bioenergia, alimentos e produtos florestais com essas condições podem conquistar uma imagem positiva para financiadores públicos e privados, facilitando a captação de recursos de fontes nacionais ou do exterior.

Há uma demanda crescente no Brasil e no Mundo por produtos oriundos de agropecuária orgânica, como alimentos de origem vegetal in natura (produtos hortícolas e frutas) ou processados (açúcar e bebidas), de origem animal (carnes e leite) e fibras (algodão). Observa-se também um crescimento na demanda por produtos oriundos de cadeias produtivas sustentáveis nos aspectos ambientais e sociais. Em geral, espera-se o mínimo impacto ambiental, ausência de condições degradantes de trabalho e impactos positivos nas comunidades locais. Esse movimento já aparece nas estratégias de corporações globais como Nestlé, Wal-Mart, Starbucks e Unilever, que têm investido em ca-deias de suprimento sustentáveis. Nesse sentido, pode

haver uma alta receptividade por parte dos eleitores e do setor privado para políticas públicas municipais que apoiem cadeias produtivas sustentáveis de bioe-nergia, alimentos e fibras, que tenham como base a agricultura orgânica e a participação de associações de agricultores familiares.

Por fim, destacamos o enorme desafio de construção coletiva de conhecimento que o Projeto Terra Paulista pretende enfrentar. O estabelecimento de parcerias entre agentes públicos, associações e empresas é o principal mecanismo para que seja possível compati-bilizar as premissas sociais, ambientais e econômicas e concretizar o DSR.

referências

ABRAMOVAY, R. Muito além da filantropia. Boletim Informações

Fipe, n.306, p.16-18, mar 2006. Disponível em: http://www.

fipe.org.br/publicacoes/downloads/bif/2006/1_bif306.pdf. Acesso em: 5 jan 2010.

VEIGA, J. E. A emergência socioambiental. São Paulo: Senac, 2007.

1 Disponível em: http://www.rits.org.br. Acesso em: 10 mar 2009.

(*) Engenheiro agrícola, mestre em administração pela FEA-USP (E-mail: aclimano@gmail.com). (**) Arquiteto, CEO do Projeto Terra Paulista (E-mail: xmukler@gmail.com).

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China III - de Estado comunista

centralizado a socialismo de mercado e

a capitalismo autoritário de resultados

(Consenso de Pequim)

Mao Tsé Tung, um dos principais fundadores da República Popular da China e considerado o grande “timoneiro” de um país comunista de economia

inte-gralmente planificada, foi sucedido em 1970 por Deng

Xiaoping, presidente que, na década de 1980, instalou o chamado “socialismo de mercado” e colocou a China entre os gigantes econômicos do mundo contempo-râneo. Em 2009, sob a presidência de Hu Jintao, o regime político-econômico da China voltou-se para um capitalismo autoritário de resultados (“Consenso de Pequim”).1

Jamais se acreditaria, à época em que Mao Tsé Tung fundou a República Popular da China (1949), que um Estado comunista autoritário pudesse adotar uma estrutura híbrida de capitalismo e comunismo sob a direção de um partido único – o PCC, Partido Comu-nista Chinês, de competência ilimitada e intolerante a oposições e dissidências.

Realmente, cabe ao Comitê Permanente do PCC (ou

Politburo, composto por nove membros não eleitos e

selecionados mediante prévia e rigorosa investiga-ção): escolher o presidente da República Popular e controlar tudo, desde o Comitê Militar, Conselho de Estado, Congresso Nacional do Povo (ou Parlamento, com cerca de 3 mil delegados de províncias, regiões autônomas, municipalidades e Forças Armadas), até os sistemas de produção, distribuição, transporte, comunicação, educação, prestação de serviços, saúde, entre outros.

Em apenas 60 anos de existência desse modelo polí-tico-econômico-administrativo centralizado e

autori-(inclusive fracassos como o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural) e a sérios problemas externos (como a Guerra Fria, de 1945 a 1991, e a implosão da URSS e seus satélites).

A China continua a surpreender: após a morte de Mao, o país pobre, durante séculos dilacerado por guerras e lutas internas, foi transformado por Deng Xiaoping (entre 1978 e 1980) em comunismo de mercado. E agora, Hu Jintao acaba de adotar pragmaticamente um “capitalismo autoritário de resultados” com o ob-jetivo de “melhorar a sociedade chinesa” e, ao mesmo tempo, encontrar respostas rápidas às turbulências da globalização econômica e aos desafios de crescimento de um país que está se emparelhando aos EUA. Sabe-se, ainda, que dificilmente os ideais de Mao Tse-Tung e as imposições da Revolução Cultural e do Estado autoritário resistiriam às mudanças de hábitos de consumo decorrentes da explosão da produção em um país de quase 1 bilhão e 400 milhões de pessoas e um território continental de cerca de 9 milhões e meio de km2.

Entretanto, para se avaliar o processo das recentes mu-danças econômicas na China é necessário entender, de um lado, a cultura chinesa e a dominação política do PCC e, de outro, as pressões de uma crescente produção quase totalmente voltada à exportação, mas que, atualmente, também se dirige para um crescente consumo interno.

Aliás, era inevitável a explosão do consumo interno na China devido, em primeiro lugar, ao aumento do trabalho e da renda per capita da população como

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decorrência da grande expansão da produção para exportação; em seguida, à estratégia político-estatal de conexão da economia nacional à economia mun-dializada; e, por último, à retração das importações em decorrência das turbulências econômicas nos principais países importadores da China (como a crise financeira que, em 2007, começou nos EUA, o coração do capitalismo mundial, e logo atingiu os países mais ricos da União Europeia).

Então, os especialistas em China insistem no fato de que o “consumismo conspícuo” partiu de cima para baixo como uma estratégia política de autodefesa do Estado diante da recessão mundial, já que é ele o maior proprietário ou acionista de tudo − terras, empresas, fábricas, indústrias, bancos, instituições financeiras, transporte etc.

Ainda com o objetivo de manter seu acelerado rit-mo de crescimento e de atenuar os impactos das recessões no mundo globalizado, a atual política de Pequim vem diversificando as reservas interna-cionais do país (as maiores do mundo, com mais de US$ 2 trilhões), reduzindo as compras de títulos do governo americano e migrando para investimentos reais, como petróleo e minério de ferro. Assim, re-centemente, o CIC (China Investment Corporation), fundo soberano do governo chinês, realizou inves-timento superior a US$ 500 milhões em papéis da companhia brasileira Vale do Rio Doce − uma das maiores aplicações realizadas por Pequim em Bolsa de Valores nos EUA.

O atual aumento e diversificação do consumo chinês pode ser acompanhado estatisticamente, segundo informações do New York Times: em 2010, os chineses compraram mais automóveis (cerca de 12,8 milhões) do que os americanos (10,3 milhões); o sistema bancá-rio chinês financiou quase 25% dos veículos vendidos em 2009 (cerca de 40% a mais do que em 2008); o mo-vimento de cartões de crédito expandiu cerca de 50% em 2008; no setor de informática, também o número de unidades de eletrônicos vendidos foi maior na

China do que nos EUA devido ao aumento geral do consumo de aparelhos domésticos, objetos pessoais, joias, roupas, calçados, cosméticos, móveis e outros, inclusive instrumentos musicais e obras de arte. Especula-se, entretanto, sobre a difícil continuidade, a longo prazo, dessa instável situação em que os EUA são consumidores e importadores de mercadorias, enquanto a China é sua “supridora” de manufatura-dos e “financiadora” de seu notável déficit por meio, sobretudo, da maciça compra de títulos do Tesouro dos EUA.

Aliás, os prognósticos sinalizam que a China deverá voltar a crescer por volta de 12% ao ano entre 2010 e 2011; então, provavelmente não continue colocan-do suas reservas prioritariamente nos EUA (o que é grave, ainda que esse país não continue aumentando suas dívidas internas e externas no elevado ritmo atual).

E se para o Brasil, grande fornecedor global de

com-modities, é auspiciosa a notícia da retomada do forte

ritmo de crescimento da China, para o mundo as perspectivas são sombrias, sobretudo se a produção e o consumo continuarem imitando o modelo dos EUA e do mundo rico ocidental.

O que acontecerá se a superpopulosa China repetir os atuais padrões de produção e de consumo dos EUA? Como será a reação da deusa Gaia2 diante do rápido esgotamento dos recursos naturais e do desequilíbrio induzido pelas necessidades crescentes de bilhões de seres humanos consumistas? Como ficará a relação entre os seres humanos, a natureza e as outras formas de vida do planeta Terra?

Aliás, segundo previsão do biólogo norte-americano Edward Osborne Wilson, no início deste século 21, seriam necessários mais quatro planetas como a Terra para atender à fantástica demanda atual de alimentos e de recursos naturais pela China e seus emergentes vizinhos asiáticos.

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1 Analistas internacionais comparam o Consenso de Wash-ington e o Consenso de Pequim salientando que o primeiro era mais um “manual geral” feito por banqueiros para atrair investimentos dos bancos, enquanto o segundo considera as peculiaridades geopolíticas da China e procura “melhorar a sociedade chinesa” pela combinação de Estado autoritário e concorrência econômica capitalista.

2 A Vingança de Gaia, do cientista inglês James Lovelock

(da NASA, nos anos 60), considera a Terra um organismo com capacidade de se manter saudável desde que tenha compromisso com todas as formas de vida e não apenas com o homem. Para Hesíodo, Gaia, Géia ou Ge, a deusa da Terra, era a segunda divindade nascida após o Caos e com enorme potencialidade geradora. Mas foi rompida a capacidade autorreguladora do sistema de Gaia com o aquecimento global, devido, sobretudo, às atividades de

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