• Nenhum resultado encontrado

Conflito e Conciliação: percepções do operador do direito

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2017

Share "Conflito e Conciliação: percepções do operador do direito"

Copied!
114
0
0

Texto

(1)

Universidade

Católica de

Brasília

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA

STRICTO SENSO PSICOLOGIA

MESTRADO

CONFLITO E CONCILIAÇÃO: PERCEPÇÕES DO

OPERADOR DO DIREITO

Autora: Maristela Muniz Gusmão

Orientador: Dr. Vicente de Paula Faleiros

Co-Orientadora: Drª. Maria Aparecida Penso

(2)

MARISTELA MUNIZ GUSMÃO

CONFLITO E CONCILIAÇÃO: PERCEPÇÕES DO OPERADOR DO DIREITO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto

Sensu em Psicologia da

Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Psicologia.

Orientador: Dr. Vicente de Paula Faleiros.

Co-Orientadora: Drª. Maria Aparecida Penso

(3)

Conciliação: percepções do operador do direito, apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Psicologia da Universidade Católica de Brasília, em 10 de dezembro de 2009, defendida e aprovada pela Banca Examinadora abaixo assinada:

__________________________________ Prof. Dr. Vicente de Paula Faleiros - UCB

Orientador

__________________________________ Prof.ª Dr.ª Maria Aparecida Penso - UCB

Co-Orientadora

__________________________________ Prof.ª Dr.ª Claudiene Santos - UCB

Membro

__________________________________ Prof.ª Dr.ª Maria Fátima Olivier Sudbrack - IP/UnB

Membro

(4)
(5)

Ao professor Dr. Vicente de Paula Faleiros, meu orientador, por sua gentil forma de partilhar o saber, pela postura democrática com que conduziu as discussões que levaram aos resultados deste trabalho.

Gostaria expressar minha profunda gratidão ao professor Dr. Richard Bucher (in memoriam), que foi o grande responsável pelo meu desejo de

“aprender a conhecer”. Foi quem oportunizou minha primeira experiência em pesquisa, bem como minha inserção profissional em Brasília.

À professora Drª. Maria Aparecida Penso que, além de co-orientadora, acumula diversas funções em minha vida. É companheira de trabalho, de idéias e, principalmente, uma grande amiga. Obrigada por sua confiança e estímulo ao longo desses anos de convivência.

Às professoras Drª. Alexina Ribeiro e Drª. Claudiene Santos, por suas valiosas contribuições na ocasião em que compuseram a banca de qualificação do projeto desta pesquisa. Agradeço o acolhimento, a acessibilidade e, sobretudo, o carinho que me dedicam diariamente.

Às professoras Dr.ª Maria Fátima Olivier Sudbrack e professora Dr.ª Claudiene Santos, por aceitarem generosamente o convite para participar da banca examinadora desta dissertação.

À professora Msc. Maria Eveline Cascardo Ramos, pela amizade e cumplicidade de muitos anos. Além de grande amiga, é companheira de projetos, de idéias e de sonhos. É minha grande e eterna mestra. Sua forma generosa de compartilhar o saber me fez psicóloga.

À professora Drª. Sandra Eni Fernandes Nunes Pereira, pela amizade e leitura crítica do material desta dissertação. Agradeço sua generosidade, seu carinho e sua alegria contagiante.

Ao professor Dr. José Eduardo Pandóssio, por sua amizade nesses anos de convivência. Obrigada por me escutar, me acolher, me criticar e me incentivar para concretização desta pesquisa.

(6)

Às amigas Deyse Resende, Ana Carla Domingues, Aldenira Cavalcante e Viviane Ferro, cuja ajuda, de modo particular e especial, foi fundamental para a realização deste trabalho.

Ao Rogério, marido na forma da lei e companheiro na forma de viver, por me proporcionar um ambiente familiar afetivo e acolhedor. Sem o seu incondicional apoio este trabalho não seria finalizado. Obrigada pela compreensão, pelo incentivo, e pela “sorte de um amor tranqüilo”.

À minha mãe, que mesmo distante geograficamente, se mantém afetivamente presente e atuante em minha vida.

(7)

Referência: GUSMÃO, Maristela Muniz. Conflito e Conciliação: percepções do operador do direito. 2009. 114 folhas. Dissertação de Mestrado – Mestrado em Psicologia, Universidade Católica de Brasília/UCB, Brasília, 2009.

O Juizado Especial Criminal vem sendo apresentado como um novo paradigma de justiça penal em que se introduz o modelo consensual de resolução de conflitos. Essa lei insere a oportunidade de conciliação e transação no processo penal em casos de infrações de menor potencial ofensivo e atribui aos operadores do direito a função de conciliador e mediador de conflitos. A presente pesquisa buscou analisar as percepções dos juízes de direito, promotores de justiça e auxiliares de justiça sobre a conciliação e resolução de conflitos no Juizado Especial, bem como a interferência de tais percepções na operacionalização desta nova perspectiva penal. A questão colocada para efeito de análise neste estudo, foi a conciliação e resolução de conflitos em espaços tradicionalmente regulatórios, quais o poder sempre esteve centralizado na figura de autoridade do operador do direito. Com base nos pressupostos metodológicos para estudos qualitativos, foram realizadas observações de audiências de conciliação e entrevistas semi-estruturadas com os operadores do direito. As informações obtidas foram trabalhadas de acordo com a análise de conteúdo e resultou na construção e discussão das seguintes categorias temáticas: o cenário e a dinâmica de funcionamento da conciliação; os paradoxos do encontro com as pessoas e não só com os processos; conflito e crime: diferentes gradações das relações de poder; os desafios da conciliação: entre o processo e os atores. A discussão dessas categorias temáticas mostra que as mudanças na forma de tratamento penal preconizadas na lei 9.099/95 ainda não alcançaram relevantes transformações na prática jurisdicional. Evidenciou-se que a conciliação é dirigida à estrita obediência normativa, uma vez que é conduzida com o objetivo da solução processual e não na atenção à demanda dos sujeitos. Nesta perspectiva, o poder das decisões, que nos Juizados teriam lugar os sujeitos em conflito, permanece ressaltando a figura de autoridade dos operadores do direito.

(8)

Reference: GUSMÃO, Maristela Muniz. Conflict and conciliation: perceptions of Law operator. 2009. 114 sheets. Master's degree dissertation - Master of Arts in Psychology. Universidade Católica de Brasília/UCB, Brasília, 2009.

The Juizado Especial Criminal (Special Criminal Court) has been presented as a new paradigm of penal justice on wich is introduced the consensual model of conflict resolution. This law inserts the oportunity of conciliation and transaction in the penal process in case of infractions of lower potential and attributes to the Law operators the conciliator and mediator function. The present research aimed to analyze the civil judge, the district attorney and the justice assistant's perceptions upon the conciliation and conflict resolution in the Juizado Especial, as well as the interference of such perceptions in the arragement of this new penal perspective. The issue analyzed in the study was the conciliation and resolution of conflicts in tradicionaly regulatory spaces on wich the power has always been centralized in the figure of the Law operator authority. Based on the methodological tenets for qualitative studies, hearing observations were accomplished as well as semi-structured interviews with the Law operators. The informations acquired were seen through according to the content analisys and resulted on the construction and discussion of the following thematic cathegories: the scenery and the dynamic of the conciliation process; the paradoxes of the meeting with people and not only with the lawsuits; conflict and crime; different levels of the power relations; the challenges of the conciliation: between the lawsuit and the actors. The discussion of these thematic categories shows that the changes in the way of treatment preconized by the law 9.099/95 haven't already achieved relevant transformations on the juriditional practice. It was evinced that the conciliation is directed to the strict regulatory obedience once it is leaded aiming the procedural resolution and not the attention to the person's demand. On this perspective, the power of the decisions, wich in the Juizados (courts) would acclaim the people in conflict, remains highlighting the figure of the Law operators.

(9)
(10)

1 – INTRODUÇÃO... 12

2 – OBJETIVOS... 17

2.1 – Objeto de Estudo... 17

2.2 – Objetivo Geral... 17

2.3 – Objetivos Específicos... 17

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA... 18

3.1 – Os Juizados Especiais Criminais e os avanços legais... 18

3.1.1 – Atores do sistema de conciliação e os papéis previstos na Lei 9.099/95.. 23

3.2 – Conceituação de conflito... 27

3.2.1 – Conciliação de Conflitos – dificuldades e perspectivas... 35

4. MÉTODO... 39

4.1 – Delineamento da pesquisa... 39

4.2 – O contexto de realização da pesquisa... 40

4.3 – Participantes... 40

4.4 – Instrumentos ... 44

4.5 – Procedimentos de coleta de dados... 45

4.6 – Procedimentos para análise dos dados... 47

4.6.1 – Descrição do processo interpretativo... 49

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO... 51

5.1 – O cenário e a dinâmica da conciliação... 51

5.1.1 – O espaço e o movimento... 51

5.1.2 – Os atores em inter-relação... 54

5.2 – O discurso e a prática da conciliação... 65

5.2.1 – Os paradoxos do encontro com as pessoas e não só com os processos. 65 5.2.1.1 – A busca da valorização pessoal na prática profissional nos Juizados Especiais Criminais 66 5.2.1.2 – O encontro com as pessoas... 69

5.2.1.3 – A constatação da impotência... 72

5.2.2 – Conflito e crime: diferentes gradações de poder... 76

5.2.2.1 – O risco da criminalização dos conflitos humanos... 77

5.2.2.2 – A busca da conciliação pela ausência de proteção... 81

(11)

5.2.3.3 – O poder de conciliar... 90

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 97

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 103

8 ANEXOS... 109

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido... 110

Roteiro de Observação... 112

(12)

1 INTRODUÇÃO

As preocupações acerca da violência no Brasil e as críticas ao modelo penal vigente oferecem um amplo campo de discussões, não restritas ao âmbito jurídico, sobre a necessidade de reformulação da prestação do serviço jurisdicional. Essas discussões tomam força principalmente no que tange à resolução de infrações de menor potencial ofensivo que se apresentam no âmbito penal, e demandam respostas diferenciadas. Na esfera penal, essas respostas exigem como sinaliza Azevedo (2000) novas estratégias de controle e novos mecanismos de resolução dos conflitos.

A criação e implementação de novos mecanismos de resolução de conflitos no sistema de justiça, foram impulsionadas a partir da promulgação da Constituição de 1988, período em que foram criados novos mecanismos para solução de litígios, entre eles, destaca-se a regulamentação dos Juizados Especiais Criminais por meio da Lei 9.099/95.1 Essa lei insere a oportunidade de conciliação e transação no processo penal no caso de infrações de menor potencial ofensivo, que são definidas como aquelas cuja pena máxima não ultrapassem dois anos de detenção e aplica-se a sujeitos não reincidentes. Assim, são tipificados por essa lei os delitos decorrentes de brigas de vizinhança, conflitos entre colegas de trabalho, alguns conflitos familiares, desacato a autoridades, uso de drogas, acidentes de trânsito e outras infrações de menor gravidade.

No Distrito Federal, os Juizados Especiais Criminais estão em pleno funcionamento em todas as cidades, e uma recente investigação exploratória realizada em Brasília, por Pinheiro (2007), mostra uma ampliação expressiva da intervenção penal por esses juizados, uma vez que a distribuição do número de inquéritos nos últimos dez anos quintuplicou. Esse estudo demonstra, por um lado, que houve crescimento da procura pela intervenção do sistema penal na administração dos conflitos privados, e, por outro, que aumentou o controle

1 Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serão criados pela

União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência. (LEI 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995, CAPÍTULO I –

(13)

penal de condutas que antes não ingressavam na esfera de controle penal formal.

Além da investigação acima citada, uma série de outras pesquisas vêm sendo desenvolvidas no âmbito do que tem sido denominado de justiça consensual. Entre elas, podemos citar o estudo sociológico sobre a implantação dos Juizados Especiais Criminais de Porto Alegre, realizada por Azevedo (2000), que buscou compreender a especificidade do funcionamento das instâncias de controle social formal no Brasil, e indicar o sentido e os limites da informalização da justiça para resolução de conflitos sociais.

No âmbito do Distrito Federal, podemos citar duas pesquisas desenvolvidas pela Universidade Católica de Brasília/UCB, em parceria com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios/MPDFT e com a Escola Superior do Ministério Público da União/ESMPU. A primeira, intitulada “A participação da Comunidade na Aplicação e Execução da Justiça Penal”

(MARILLAC; PENSO, 2009), foi realizada em 2006 e avaliou a eficácia dos mecanismos adotados pelo MPDFT no que tange à participação da comunidade na aplicação da Justiça Penal. E a segunda, realizada em 2007,

intitulada “Construção da rede comunitária de apoio às medidas alternativas no

DF: uma investigação interventiva” (MARILLAC; PENSO, fase de elaboração),

cujo objetivo foi avaliar a percepção da comunidade sobre as medidas alternativas – aplicadas no âmbito dos Juizados Especiais Criminais a sujeitos que cometeram delitos de menor potencial ofensivo – sobre os autores de fato, e a influência dessa percepção na sua aplicação e execução.

Atualmente, e ainda no âmbito das parcerias acima descritas, está em andamento uma pesquisa que busca investigar a operacionalização da conciliação no sistema penal, bem como as conseqüências e benefícios dessa conciliação para os sujeitos – em situação de conflito – da intervenção penal. A referida pesquisa, na qual atuamos como pesquisadores, iniciou-se em 2008 e denomina-se “Conciliação e Conflito no Sistema Penal: da operacionalidade do

sistema penal à demanda pela intervenção penal”

(14)

despertou o interesse e gerou motivações para o desenvolvimento desta proposta. É necessário esclarecer que as pesquisas citadas anteriormente partiram de uma iniciativa da Justiça, o que, de alguma forma, sinaliza a intenção em se discutir e avaliar o funcionamento dos Juizados Especiais Criminais. Entretanto, percebe-se que um importante eixo dessas discussões tem sido pouco investigado. Este eixo refere-se ao papel que operadores do direito, que atuam nos Juizados Especiais Criminais, têm no processo de conciliação dos conflitos, uma vez que os termos expressos nessa lei pressupõem o exercício de novos papéis a esses sujeitos.

Trata-se de um novo paradigma da justiça, no qual o poder não está centrado em uma das partes. Nesse sentido, muitos autores apontam que os princípios da oralidade, simplicidade e informalidade, previstos na lei dos Juizados, são ferramentas absolutamente inovadoras e exigem uma nova postura institucional por parte dos operadores do direito (ANDRIGHI; BENETI, 1996; AZEVEDO, 2000; BITENCOURT, 1997).

É nesse contexto que esta proposta se insere, buscando analisar a conciliação de conflitos no sistema penal sob a ótica de juízes de direito, promotores de justiça e auxiliares de justiça. Para tanto, buscamos investigar as percepções que esses sujeitos têm a respeito de conflito, de conciliação de conflitos, de seu papel e de sua função na implementação da Lei 9.099/95; bem como o modo como percebem as pessoas que buscam o sistema de justiça para resolução de seus conflitos. Buscamos ainda analisar a relação entre essas percepções e os critérios que estabelecem para o processo de conciliação.

(15)

Os pressupostos de nossa análise ancoram-se fortemente nos fundamentos teóricos da Psicossociologia. Essa escolha se justifica pela complexidade que compõe tanto o objeto de investigação desse trabalho – a compreensão da conciliação do conflito na perspectiva do operador do direito –

quanto o campo de investigação em que ocorrerá – o sistema de justiça – e, sobretudo, por entendermos que o campo de estudo e atuação da

psicossociologia “é o dos grupos, das organizações e das comunidades,

considerados como conjuntos concretos que mediam a vida pessoal dos indivíduos e são por esses criados, geridos e transformados” (MACHADO;

ROEDEL, 1994, pag. 7). Interessa-nos, pois, compreender a percepção dos operadores do direito sobre a conciliação do conflito, contemplando as perspectivas individuais e as relações grupais e institucionais, uma vez que esses sujeitos têm sua atuação profissional atrelada a essas diferentes instâncias.

A relevância desse estudo é evidente, uma vez que pode auxiliar o sistema penal, enquanto espaço de resolução de conflitos atribuído pela Lei 9.099/95, nas alterações de rotina quanto à forma de compreender e realizar a conciliação. Por outro lado, poderá contribuir para que a justiça e a sociedade como um todo descubram mecanismos ou criem outros espaços de resolução e enfrentamento de conflitos cotidianos, sem que esses precisem ser classificados como crimes. Outra consideração importante refere-se ao fato de que as discussões sobre violência, criminalidade, sistema penal, bem como as alternativas penais, já extrapolaram o âmbito jurídico para se situar no terreno das ciências humanas e sociais; discussões nas quais a psicologia é convidada a participar.

(16)

Em seqüência, apresentamos os fundamentos metodológicos que pautam nosso estudo, bem como o contexto em que foi realizado. Descrevemos os passos metodológicos do trabalho: participantes, instrumentos utilizados, procedimentos para coleta e análise dos dados, e a descrição do processo interpretativo.

A partir disso, iniciamos nossa análise e discussão sobre os conteúdos que emergiram deste trabalho e que organizamos em categorias temáticas. Assim, discutimos o Cenário e a dinâmica de funcionamento da conciliação em dois sub-temas: O espaço e o movimento e Os atores em inter-relação. Em seguida discutimos O discurso e a prática da conciliação de conflitos em três temas: Os paradoxos do encontro com as pessoas e não só com os processos; Conflito e crime: diferentes gradações das relações de poder; e Os desafios da conciliação: entre processos e atores.

(17)

2 - OBJETIVOS

2.1 Objeto de Estudo

A conciliação de conflitos em espaços tradicionalmente regulatórios –

sistema penal – nos quais o poder sempre esteve centralizado na figura da autoridade do operador da lei.

2.2 Objetivo Geral

Analisar as percepções dos juízes de direito, promotores de justiça e auxiliares de justiça sobre a conciliação e resolução de conflitos no sistema penal, bem como a interferência de tais percepções na operacionalização desta nova perspectiva penal.

2.3 Objetivos Específicos

 Conhecer as percepções que os operadores do direito têm a respeito de conflito;

 Conhecer as percepções que operadores do direito têm sobre conciliação de conflitos no sistema de justiça;

 Conhecer as percepções dos operadores do direito a respeito dos sujeitos em conflito que participam do processo de conciliação;

 Conhecer as percepções que os operadores do direito têm de seu papel no processo de conciliação;

(18)

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A discussão dos conceitos considerados relevantes para a construção e compreensão do objeto de estudo deste trabalho ancora-se nos pressupostos da psicossociologia que, segundo Nastiutti (1998), pressupõe a formação e desenvolvimento interacional e dialético entre o indivíduo e a sociedade. A autora acrescenta que os processos sociais e individuais, sejam estes conscientes ou inconscientes, são tratados com o mesmo grau de importância. O objeto do estudo psicossociológico é considerado de modo complexo e atravessado por múltiplos determinantes, o que exige que seus fundamentos teóricos sejam multi-referenciais.

Assim, a psicossociologia sugere uma interface entre a sociologia, psicologia social, psicanálise, antropologia, ciência da linguagem, filosofia, história e direito. No entanto, como afirmam Barus-Michel, Enriquez, Levy (2006), em todos esses campos ela tem renovado as perspectivas no que diz respeito ao funcionamento dos grupos e das organizações, aos processos de mudança, às relações de poder, ao tratamento de conflitos psicológicos e sociais, e às relações entre pesquisa e prática social. Seu campo de reflexão e atuação está ligado aos aspectos sociais e psíquicos que concernem à convivência social.

A revisão da literatura sobre o tema exposta a seguir, compõe-se da contextualização sobre a criação e funcionamento dos Juizados Especiais Criminais, bem como sobre os pressupostos dessa lei no que se refere ao papel designado aos operadores do direito. Em seguida, faremos uma breve exposição sobre as concepções de conflito e, além disso, explanaremos sobre as perspectivas em discussão quanto à conciliação de conflitos no espaço jurídico.

3.1 – Os Juizados Especiais Criminais e os avanços legais

(19)

controle e punição de seus atores, os sujeitos em conflito com a lei. No Brasil, as formas de punição mais freqüentes e, talvez, mais desejadas são as penas privativas de liberdade. Entretanto, nos moldes em que se apresentam, distanciam-se da proposta de educação, reintegração e recuperação dos sujeitos sentenciados e encarcerados, uma vez que o cárcere não oferece medidas nem condições para tal, como sinaliza Bitencourt (1997).

Ao discutir a forma de tratamento que o Estado oferece aos sujeitos delituosos, Paixão (1987) afirma que os presídios se apresentam como espaços de purgação, sofrimento e aprendizagem do isolamento, uma vez que o sujeito delituoso fica segregado das relações familiares e sociais. Outro aspecto apontado por esse autor refere-se ao fato de que, ao expor os sujeitos às técnicas de sofrimento, as penitenciárias oferecem um espaço de interação e aprendizagem criminosa. Para o autor em tela, as características presentes nas penitenciárias sinalizam por um lado, escolas do crime, e por outro, escolas de sofrimento. A este respeito Foucault (1987), ao discutir as origens2 das penas e das instituições penais, afirmou que estas foram criadas e apresentadas como formas de punições menos cruéis e mais humanas, no entanto, sempre estiveram ancoradas na crueldade dos castigos dirigidos ao corpo supliciado.

O distanciamento da perspectiva dos presídios como instituições educacionais, considerando não só as relações estabelecidas e a precariedade das condições físicas, mas, sobretudo as relações de poder que ancoram a criação de tais espaços, resulta no que vem sendo denominado de colapso carcerário. A esse respeito, Faleiros (2001) observa que a realidade penitenciária, na qual a crueldade e o poder pessoal se apresentam como características predominantes, tem demonstrado a falência da privação da liberdade como castigo, bem como forma de reintegração social.

As discussões acerca das alternativas penais, segundo Azevedo (2000), tiveram impulso na década de 80, período em que foram criados – a partir da promulgação da Constituição de 1988 – novos mecanismos para a solução de litígios. Entre esses mecanismos, o autor destaca a regulamentação dos

2 Estudos aprofundados sobre as origens das penas e das instituições penais podem ser encontrados em

(20)

Juizados Especiais Cíveis e Criminais por meio da Lei 9.099/95. A referida lei insere a oportunidade de conciliação e transação no processo penal aplicados a determinados tipos de infrações e norteia-se pelos princípios da informalidade e da oralidade, conforme destacado no Art. 2º3.

Essa lei se inscreve em um novo paradigma na política criminal que, conforme sinalizam Marillac e Penso (2009), reflete a ascensão epistemológica da criminologia crítica sobre a criminologia de vertente positivista e seu paradigma, a dogmática penal. As autoras pontuam o seguinte:

Inscreve-se, nessa transição paradigmática, o esforço por hegemonia de potenciais emancipatórios (atividade enunciativa de sujeitos, produtora de cidadania) sobre os potenciais reguladores; um abandono de referenciais colonizadores, verticalizantes, em prol de referenciais geradores de solidariedade, propiciadores de relações horizontais. Temos já uma gama de estudos que desestabilizam os pressupostos do paradigma criminológico positivista. Além disso, podemos contar com uma base principiológica constitucional razoável para dar suporte à transição ao novo paradigma, que tem como cerne a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o comprometimento com a produção de relações sociais mais justas. (MARILLAC; PENSO,2009; p. 16, grifo das autoras).

Essa lei tem sido considerada um grande avanço na legislação brasileira, conforme afirmam Grinover, Filho, Fernandes, Gomes (1999), sobretudo por se fundamentar em uma proposta despenalizante, uma vez que prevê a aplicação de penas não privativas de liberdade a crimes considerados de menor potencial ofensivo. Cabe ressaltar que os crimes de menor potencial ofensivo são definidos como aqueles cuja pena máxima não ultrapassa dois anos de detenção e aplica-se a sujeitos não reincidentes.

Para Azevedo (2000), a lei se pauta na constatação da complexidade dos fenômenos presentes na sociedade moderna em que as ações repressivas não se mostram eficientes na resolução de determinados conflitos sociais. Além disso, o autor sinaliza que os pequenos delitos, como brigas de

3 Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia

(21)

vizinhança, conflitos entre colegas de trabalho, alguns conflitos familiares e delitos de trânsito, são compreendidos, pelo Sistema de Justiça, como demandas que ocupam sobremaneira o Poder Judiciário, atrapalhando o andamento do julgamento de crimes mais graves. Nesse sentido, os juizados dariam agilidade aos encaminhamentos dos delitos de menor potencial ofensivo e, conseqüentemente, o poder judiciário se ocuparia dos julgamentos de graves delitos.

A criação dos Juizados Especiais Criminais situa-se, segundo Campos (2003), em um discurso que por um lado procura evitar a danosidade causada pelo sistema carcerário, já que a prisão deixa de ser a alternativa para todos os males, e por outro no efeito estigmatizante sobre os sujeitos classificados como delinqüentes, uma vez que se investe na busca de novas formas punitivas e preventivas de delitos.

Outro aspecto importante a ser ressaltado refere-se à possibilidade de participação nas decisões – tanto da vítima, quanto do autor do fato delituoso –

uma vez que a lei se orienta pelos objetivos de reparação dos danos sofridos pela vítima e de aplicação de penas alternativas à prisão, rompendo, assim, com o modelo tradicional de resposta ao delito. O que está sendo preconizado, portanto, é um modelo consensual de justiça criminal no qual a verdade e suas conseqüências deixam de ser construídas verticalmente, sendo o conflito compreendido a partir do ponto de vista de todos os envolvidos.

Azevedo (2000), ao discutir a informalização da justiça, traça um fluxograma que facilita a compreensão do funcionamento dos juizados, sobretudo para profissionais que não são do direito, e ainda expõe aspectos importantes sobre o papel do legislador nesses Juizados. O autor identifica as seguintes fases: fase policial, fase cartorária, fase conciliatória, fase da transação penal e fase de instrução e julgamento.

(22)

de observações e registros de campo de audiências no Juizado Especial Criminal de Brasília realizadas em investigações nas quais atuamos e que foram citadas na introdução deste trabalho.

De acordo com a Lei 9.099/95, diante de uma situação conflituosa que resulta, por exemplo, em lesões corporais leves, a autoridade policial4 não abre inquérito por se tratar de crime de menor potencial ofensivo. A lei orienta, então, que seja feita uma ocorrência por meio de um instrumento específico para essas situações, denominado termo circunstanciado, que é encaminhado ao juizado. Os sujeitos envolvidos no conflito são intimados para uma audiência preliminar5, também denominada de audiência de conciliação, com a presença de um advogado, do juiz e do promotor de justiça. Cabe ressaltar que o momento conciliatório pode ser conduzido por um conciliador, auxiliar de justiça, devidamente orientado pelo juiz conforme nos esclarece Grinover et al. (1999). O intuito da audiência é a conciliação, ou melhor, o acordo entre as pessoas envolvidas. Quando não há êxito, ou seja, quando as pessoas envolvidas não desejam o acordo formal, a vítima pode oferecer queixa-crime6. Nesse caso o processo é encaminhado para a fase da transação penal, aí sim, necessariamente conduzida pelo juiz e pelo promotor de justiça, cujos resultados tanto podem levar ao arquivamento do processo, quanto ao encaminhamento para a fase seguinte.

Grinover et al. (1999), em seus comentários sobre os objetivos da audiência preliminar, ressaltam que esta se destina à tentativa de conciliação e conseqüentemente à harmonia das pessoas envolvidas no conflito, uma vez que estes têm uma participação ativa nas decisões e soluções discutidas nessas audiências. Os autores acrescentam ainda que esta audiência se constitui como a grande novidade introduzida no sistema penal brasileiro, pois

4 Art. 69 A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o

encaminhará imediatamente ao juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários. (LEI 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995, Capítulo III, Seção II - Da fase preliminar).

5 Art.72 Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a

vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade.( LEI 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995, Capítulo III, Seção II - Da fase preliminar.

6 Art. 75. Não obtida a composição dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade

(23)

cria um instrumento – a conciliação – que possibilita a autocomposição aos sujeitos envolvidos em determinado conflito, tendo na figura do conciliador um veículo de aconselhamento e orientação. Caberia, então, ao conciliador (operador da lei), o exercício de um novo papel: o de mediador, aconselhador, pacificador e, com base no respeito às vontades dos sujeitos em conflito, indicador das vantagens da conciliação (GRINOVER et al., 1999).

Conforme vimos, a lei 9.099/95 surgiu a partir de discussões sobre a criação de novos mecanismos de soluções de litígios, rompendo, assim, com a lógica do tratamento penal tradicional, cujos mecanismos limitam-se à privação da liberdade. Ressaltamos que os princípios da referida lei pautam-se na solução consensual dos litígios e se orienta pela reparação dos danos sofridos pelos sujeitos em conflitos, sobretudo a vítima. Nesse sentido, vislumbra-se que o trabalho dos operadores do direito que atuam nos Juizados Especiais Criminais seja bastante diferente daqueles que atuam nas varas criminais tradicionais, já que se acrescenta ao papel tradicional de julgador, o papel de aconselhador, de conciliador, de mediador de conflitos.

3.1.1 – Os atores do sistema de conciliação e os papéis previstos na Lei 9.099/95

De acordo com os termos expressos na lei citados anteriormente, as audiências no âmbito dos Juizados Especiais Criminais deverão ser pautadas nos princípios da oralidade, simplicidade e informalidade. Esses princípios são absolutamente inovadores e exigem uma nova postura institucional por parte dos operadores do direito (ANDRIGHI; BENETI, 1996; AZEVEDO, 2000; BITENCOURT, 1997).

(24)

Andrighi e Beneti (1996) esclarecem que a informalidade e a simplificação dos julgamentos de processos no âmbito da justiça especial só serão possíveis por meio da modernização dos velhos conceitos e institutos e que estes devem ser adaptados à exigência de agilidade imposta pelos fatos sociais da vida moderna. Acrescentam, ainda, que o dinamismo do magistrado se constitui como a própria alma do juizado, uma vez que deverá atuar com base no imediatismo e na presteza.

São muitos os autores (ANDRIGHI; BENETI, 1996; BITENCOURT, 1997; GRINOVER et al., 1999) que, ao discutirem a Lei 9.099/95 e o funcionamento dos Juizados Especiais Criminais, apontam para a necessidade do exercício de um novo papel por parte do operador da lei. Diante disso, consideramos oportuno ressaltar alguns aspectos que se referem ao lugar que os operadores do sistema de justiça, sobretudo juízes e promotores, ocupam e que são reforçados pelas representações presentes no imaginário social.

No sistema jurídico tradicional, Jesus (2001) afirma que existem procedimentos e regras que visam obter um sujeito judicial que possa ser capaz de avaliar fatos, tomar decisões sem estar contaminado por distorções, além de ser imparcial e não considerar informações que possui, se limitando àquelas apresentadas em juízo.

Nesta perspectiva, a formação acadêmica dos operadores do direito enfoca o treinamento e o conhecimento das normas legais. O autor acima citado acrescenta que estes sujeitos, por vezes, parecem ficar limitados em suas atribuições, uma vez que os comportamentos delitivos estão tipificados em lei restando-lhes aplicar a norma jurídica.

(25)

Outra jurista que, seguindo uma perspectiva crítica do direito, questiona o ensino e a prática jurídica é Marillac (2009). A autora, em um necessário exercício crítico, ou melhor, de auto-percepção e autocrítica, como ela própria faz questão de mencionar, alerta para o fato de que nos cursos de direito há uma mensagem que limita a criação e instiga a reprodução dos velhos modelos. Mantém-se o compromisso com os rituais da lei e não há lugar para a vivência do direito pelas comunidades. Segue dizendo a autora:

“Os cursos jurídicos são processos eficazes de distanciamento da

realidade, são instrumentos potentes de difusão da ideologia dominante, por serem alienantes e estarem divorciados da realidade da comunidade onde estão inseridos. Não são fontes de questionamentos e transformação das práticas jurídicas; ao contrário, sustentam e reforçam os discursos unidirecionais, monológicos e autoritários que fazem uma prática jurídica antiquada e

descontextualizada”. (MARILLAC, 2009; p. 126).

A autora mostra a ausência de processos emancipatórios na formação do operador do direto, já que as relações comumente estabelecidas na academia privilegiam a transmissão de conhecimento com base na crença de que os conceitos precisam ser decorados e repetidos. Com isso, a lógica que impera no processo de formação é a da explicação, em que os professores detêm um saber e o despejam sobre os alunos. Para Marillac (2009), existe

“uma passarela onde as estrelas não são os saberes, os diálogos e as

construções conjuntas, mas os cargos, os títulos e as vaidades” (p.127).

Somos levados a questionar a viabilidade da conciliação de conflitos no âmbito penal nesse cenário, já que a conciliação, como veremos adiante, pressupõe o reconhecimento do outro, o diálogo e a construção conjunta de alternativas. Ora, se os sujeitos conciliadores não tiveram a possibilidade de experimentar uma relação com esses princípios em sua formação, é de se supor que podem vir a ter dificuldades no exercício de novos papéis, ou incorrem no risco de reproduzir tal modelo em sua prática profissional. Marillac

(26)

Retomamos aqui as proposições de Aguiar (2004) que postula que a maior parte dos estudantes de direito quando ingressam nos cursos de formação, mostram-se abertos, flexíveis às transformações, dada a ânsia pelo conhecimento. No entanto, a experiência vivida nos cursos de graduação, conforme sinalizamos sucintamente, faz emergir um sujeito judicial, cuja prática do direito, conforme Marillac (2009), fica cada vez mais distante da realidade social de que faz parte.

A atuação, na justiça tradicional, tem como base a formalidade, a imparcialidade, o princípio da legalidade e da decisão punitiva. É essa a exigência que tradicionalmente perpassa a formação desse profissional. Em contraponto, a justiça consensual, como vem sendo denominado o modelo proposto nos Juizados Especiais Criminais, estabelece novas exigências aos operadores da lei, ao atribuir-lhes a função de “[...] propulsores da conciliação no âmbito penal [...]” (GRINOVER et al., 1999, p. 122). Esse novo papel pressupõe uma nova orientação para a prática do operador da lei, que deverá conduzir as audiências de maneira informal e pautada no diálogo com e entre os envolvidos. Os autores afirmam que:

Cabe ao juiz, nessa audiência, o relevante papel de mediador de conflitos, ao qual também deve aproximar-se com nova postura e mentalidade renovada. Sem prejulgar, deverá orientar os interessados pelos critérios de equidade, despindo-se de sua vocação legalitária, para fazer com que as partes se componham segundo os critérios de justiça e de pacificação social. [...] Deverá conduzir a audiência de maneira informal, dialogando com todos os envolvidos e permitindo o amplo debate sobre a conveniência e os inconvenientes, para cada um deles [...] (GRINOVER; FILHO; FERNANDES; GOMES, 1999; p. 123).

Os autores ressaltam ainda que a conciliação não deve ser encarada como um procedimento formal no processo, ou como simples homologação de acordos determinados previamente.

(27)

absolutória de uma figura, detentora do poder, neutra e alheia ao ambiente social. Outra constatação da referida pesquisa refere-se ao fato de que a maioria dos magistrados não teve contemplada em sua formação acadêmica, a possibilidade de informalização processual e pouco tem sido feito no sentido de prepará-los para o exercício desse novo papel.

Procuramos, nessa explanação, contextualizar a atuação dos operadores do direito na perspectiva da lei 9.099/95. Nossos apontamentos demonstram a ascensão de uma política criminal, cujos fundamentos se diferenciam do modelo formal e, nesse sentido, prevê a construção e o exercício de novos papéis para atores cuja função e atuação pareciam claras e objetivas. Resta-nos, então, questionar como estes sujeitos, com história pessoal e social particulares, cuja subjetividade e escolha profissional foram construídas a partir de suas experiências de vida, concebem a conciliação de conflitos a partir dessa nova perspectiva.

3.2 – Conceituações de conflito

Os conflitos são inerentes à vida humana, mas assumem formas extremamente variadas e são distintamente definidos e compreendidos por diferentes ciências. Algumas definições ressaltam seu caráter positivo e necessário para o desenvolvimento individual e para a vida social, com as quais partilhamos, e outras enfatizam o aspecto negativo de luta, perigo e desestrutura das relações, sobretudo quando as soluções dos conflitos se configuram por meio da violência. Em linhas gerais, o termo nos remete às oposições entre consenso e dissenso, integração e ruptura, estabilidade e mudança.

Na sociologia o conflito se expressa por diversas formas, seja como contradição e luta de classes em Marx, expressão de violência em Weber, anoma em Durkheim, de positividade e mudança em Crozier (ABERCROMIE, et al, 2006). O Dictionnary of Sociology define o termo conflito como “[...] uma

luta por valores e reivindicações de status, poder e recurso escassos, em que o

objetivo dos oponentes consiste em neutralizar, lesionar ou eliminar os rivais”

(28)

conflito como um processo dissociativo caracterizado pela suspensão da comunicação entre as partes oponentes. Porém, uma análise mais atenta da literatura sobre o assunto mostra que mesmo dentro das ciências sociais, a compreensão de conflito constitui-se em diversos sentidos.

Na breve discussão sociológica sobre o conflito aqui efetuada consideramos relevante sinalizar, ainda que de forma sucinta, as concepções de Marx, Durkheim, Weber e Simmel sobre a sociologia do conflito, tendo em vista a grande influência desses pensadores para diversas ciências, sendo a psicossociologia uma delas.

As explicações marxistas para o conflito têm ênfase na luta de classes sociais e de relações de exploração, tendo como pano de fundo a busca pelo poder econômico. Para Marx, segundo o Dicionário do Pensamento Marxista (1990), tudo se encontra em constante processo de mudança e o motor dessas mudanças são os conflitos resultantes das contradições existentes entre duas classes sociais antagônicas, aqueles que controlam os meios de produção e os que ficam à margem dele, com interesses diferentes e por isso conflitantes entre si.

Já a teoria de Durkheim (1982) tem como ênfase a perspectiva do consenso e da integração social. Assim, preocupou-se em analisar a maneira pela qual o social, por meio de aparelhos de coerção, contribui para regular, controlar e moldar o comportamento individual, tornando os processos coletivos aparentemente harmônicos e estáveis. Ressalta a idéia de que a sociedade determina o indivíduo e se impõe sobre o mesmo. Sendo assim, os fatos sociais – processos culturais, hábitos, costumes, etc. – de uma determinada sociedade, e que são formados pelas representações coletivas, resultam na coesão social, na interdependência entre as pessoas e na solidariedade social. Para esse pensador, toda sociedade cria mecanismos de integração que limitam a amplitude dos conflitos, e a presença destes deve ser compreendida como conseqüência de uma estrutura social enfraquecida.

(29)

integração do sistema. Além disso, a ênfase no determinismo estrutural exclui a perspectiva de que as relações sociais são formas de interação entre indivíduos dotados de intencionalidade. O autor pontua que a noção de conflito adquire uma nova dimensão a partir do pensamento de Weber, saindo do caráter patológico para tornar-se inerente ao mundo social. Diz o autor.

[...] a origem do conflito era uma só, uma vez que tinha sua fonte nas relações de produção ou ainda no estado da divisão do trabalho; reduzida assim apenas ao elemento econômico, pouca importância era atribuída à vontade que é própria dos atores, de impor seu poder específico enquanto simples indivíduos em rivalidade entre si na conquista de recursos tão distintos como o poder, a riqueza e o prestígio, detidos de maneira não cumulativa. Por outro lado, o

conflito é visto agora como “normal” em todas as sociedades e não se

concebe que possa acabar algum dia. (BIRNBAUM, 1995, p. 256)

Para Weber, o conflito refere-se a uma relação social que se orienta pela intenção dos sujeitos de fazer prevalecer sua vontade contra a resistência de outros sujeitos. O conflito, então, diz da luta entre indivíduos que buscam impor sua própria vontade por meio de elementos diversificados como força física, capacidades intelectuais, ou organizacionais (BIRNBAUM, 1995). Sendo assim, está intrinsecamente relacionado à luta pelo poder.

É importante salientar, que a clássica teoria sociológica do conflito foi elaborada por Simmel (BIRNBAUM, 1995; DICIONÁRIO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, 1986) que, na mesma perspectiva interacionista de Weber, considerou o conflito uma das formas de interação entre os indivíduos. Podemos sinalizar, a partir da revisão literária sobre o assunto, que o conflito para Simmel se constitui como um processo de associação que eclode devido aos fatores de dissociação, como inveja, desejo, ódio, entre outros. O conflito, então, não é visto como um processo de dissociação, e sim como resultado de fatores de dissociação.

(30)

dos pensadores anteriormente citados, já foram superados, ou melhor, reelaborados pela sociologia moderna. No entanto, muitos de seus conceitos continuam vigentes nos estudos da sociedade atual e exercem, como sinalizado anteriormente, forte influência nos estudos do direito, bem como nos construtos da Psicologia e da Psicossociologia.

Essa influência pode ser constatada, por exemplo, no modo como a psicologia compreende o conflito que, assim como algumas vertentes da sociologia, é entendido como forma de interação entre os sujeitos (RAMOS, 2003). O referido autor distingue os conflitos decorrentes de comportamentos antagônicos entre os indivíduos, que são expressos nas relações sociais sendo que sua compreensão segue a lógica do que foi explanado até o momento, e os conflitos decorrentes de desejos antagônicos na mesma pessoa, denominados de conflitos psíquicos.

A descoberta da existência dos conflitos psíquicos pertence principalmente a Freud (1924) que, a partir de suas experiências clínicas, constata que grande parte das recordações traumáticas de seus pacientes não estavam relacionadas a acontecimentos reais e sim a fantasias. Passa, então, a considerar a fantasia como algo relevante à realidade e que a determina, e ainda, a reconhecer a presença do conflito psíquico na produção de sintomas. Essas constatações são fundamentais para a elaboração conceitual do Complexo de Édipo que, segundo Laplanche e Pontalis (1998), refere-se a um conjunto de desejos ambivalentes – amorosos e hostis – que a criança sente em relação aos pais. De modo resumido, pode ser descrito pelo desejo da criança pelo progenitor do sexo oposto e ódio pelo progenitor do mesmo sexo, ou em sua forma negativa, desejo pelo progenitor do mesmo sexo e ódio pelo progenitor do sexo oposto.

No entanto, Baamonde (2000) nos esclarece que esse desejo de posse não é um instinto, tampouco diz de uma relação objetiva entre sujeito e objeto, mas sim um desejo de algo porque outro a possui. “Lo que proporciona el valor

(31)

A constatação de que não existe a satisfação plena é fundamental para estruturação do sujeito e para orientação do desejo humano. A criança, ao deparar-se com impossibilidade de ter seu objeto de desejo, a mãe, parte em busca de satisfação em outros espaços. Entretanto, é preciso ressaltar que essa busca é mediada pela linguagem que se estabelece nas relações com o outro. Cabe-nos concluir que a produção do conflito psíquico se estabelece nas fantasias criadas na relação com o outro, e da mesma forma, é na relação com o outro que surgem as possibilidades de resolução dessa situação conflitiva.

Apesar das diferenças epistemológicas entre as várias abordagens teóricas no campo da psicologia, parece ser um consenso que o conflito é considerado constitutivo do ser humano nas diversas perspectivas, e que a presença de um conflito psíquico é denotada quando no indivíduo se opõem exigências internas contrárias (LAPLANCHE; PONTALIS, 1998). Os autores esclarecem que o conflito manifesto caracteriza-se pela presença de oposição entre um desejo e uma exigência moral, por exemplo, ou entre dois sentimentos contraditórios. Já o conflito latente se expressa de maneira deformada no conflito manifesto e com isso traduz-se designadamente pela formação de sintomas, desordens de comportamento, etc.

Muszkat (2003), em suas discussões sobre a mediação de conflitos nos espaços jurídicos, pontua que os conflitos fazem parte das relações interpessoais, quando existe dificuldade para compreender, administrar e tolerar seus próprios conflitos. A autora considera que a ação violenta se apresenta como forma de solução. Entretanto, salienta que a violência não é a conseqüência necessária de um conflito, apenas o testemunho da dificuldade de conviver com a diversidade e encontrar soluções satisfatórias para administrá-las.

(32)

aos indivíduos o campo para as manifestações psíquicas, para a confrontação interpessoal e para a ação individual, e ao mesmo tempo, representam espaços de regulação por meio das imposições legais, políticas e econômicas.

Em uma de suas obras mais recentes, Enriquez (2007) discute a existência da guerra no Estado Moderno, civilizado, e afirma que o principal abalo provocado pela Revolução Francesa foi criar um mundo onde os indivíduos e grupos elaborassem voluntariamente seu futuro, numa base simultaneamente comunitária e conflituosa. Para o referido autor, a instauração da sociedade exige a formação de laços que viabilizam as atividades produtivas, lúdicas, que por sua vez, favorecem a formação de laços afetivos e solidários. Assim, caracteriza o que denominou de base de relações comunitárias.

No entanto, essas relações se fundam no conflito, uma vez que os indivíduos, por se considerarem conscientes e conduzidos somente pela razão, tentam fazer com que prevaleçam suas opiniões e seus desejos sobre os dos outros. Os indivíduos tornaram-se livres em suas decisões, já que não estariam mais sujeitos à decisão do rei, e com isso, inauguraram a era da luta pelo poder político, com tudo ela comporta de elementos de sedução, de limitações

e de manipulações. Conclui o autor que “a democracia é o reino do conflito generalizado num universo regido estritamente por regras com as quais em princípio todos concordam e que serão editadas pelo Estado, árbitro dos conflitos e garantidor da unidade” (ENRIQUEZ, 2007, p. 160).

Parece correto afirmarmos que cada sujeito interpreta e responde aos mesmos fenômenos de modo particular e, ainda, que as distintas maneiras como as pessoas constroem e dão sentido ao seu mundo, são baseadas nas diferenças culturais, religiosas, raciais, econômicas ou geográficas que caracterizam os diversos e complexos contextos da cultura contemporânea. Em tal contexto, conforme nos explica Schnitman (1999), os conflitos entre pessoas, sistemas ou subsistemas podem ser vistos como oportunidade de mudança, mas também podem ser percebidos como um aspecto indesejável.

(33)

pressuposto de que a justiça se configura como conjunto de ferramentas cujo intuito é responder aos conflitos de modo a pacificá-los. Estes estão presentes nas relações humanas desde sempre, no entanto, como afirma Córdoba (2000), as ferramentas com que a sociedade busca resolver a conflitividade vêm variando ao longo da história, de acordo com a complexidade das relações sociais.

Para compreendermos as resoluções de conflitos no âmbito do Poder Judiciário – que se configura como uma das instituições básicas do Estado que têm como função dirimir conflitos e promover o controle social – é necessário entendermos como é concebido o dito conflito jurídico-penal.

A existência de um conflito jurídico-penal, ou melhor, de um crime ou delito, é constatada quando existe lesão a um bem jurídico penalmente tutelável conforme nos esclarecem Zaffaroni e Batista (2003). Bens jurídicos não se referem apenas a propriedades materiais, mas são definidos como todos os valores éticos sociais importantes para o ser humano e para a sociedade. Assim, são bens jurídicos: a vida, a liberdade, o casamento, a família, a honra, a saúde, entre outros. Os autores esclarecem que o Estado, então, tipifica penalmente as condutas que afetam esse bem e, com o intuito de eliminar os conflitos e promover o controle social, cria medidas punitivas de pacificação social. Trata-se de um sistema, como observa Baamonde (2000), que tem predeterminado um modo de funcionamento, uma série de procedimentos e normas que tomam e transformam o conflito, tipificando-o como delito.

(34)

Juizados Especiais Criminais é bastante difícil definir os lugares de vítima e ofensor, uma vez que se trata de conflitos entre pessoas com algum grau de conhecimento prévio e muitas vezes se desentenderam momentaneamente, ou o conflito faz parte da história de relacionamento.

Consideramos oportuno retomar a valiosa pesquisa realizada por Azevedo (2000) nos Juizados Especiais Criminais de Porto Alegre, que constatou a predominância de dois tipos de delitos, os de ameaça e os de lesões corporais leves, que juntos correspondem a 76% dos casos observados. Além disso, a pesquisa constatou que 41% desses delitos são resultados de situações de conflito entre vizinhos, 27% entre parentes ou cônjuges, 10% entre consumidor e comerciante, 8% entre pessoas com relação de trabalho, 5% entre pessoas desconhecidas – brigas eventuais em locais públicos – e 5% conflitos de trânsito. No Juizado Especial Criminal de Brasília, com base nas observações que realizamos, a realidade parece não ser muito diferente.

Já no que se refere aos tipos de decisões tomadas nas audiências de conciliação, a realidade não parece ser tão semelhante. Nos Juizados Especiais Criminais de Porto Alegre verificou-se o predomínio das soluções de conciliação (36%) – por meio do que os juízes chamam de compromisso de mútuo respeito, no qual as pessoas em situação de conflito se comprometem a não mais entrarem em conflito – ou arquivamento do processo (33%), abrangendo os casos de renúncia voluntária da vítima ou sua ausência na audiência. No Juizado Especial Criminal de Brasília, conforme mostra o estudo exploratório de Pinheiro (2007) sobre os processos já arquivados, o número de conciliações parece insignificante (11,90%) sendo expressivo o número de arquivamentos por retratação do ofensor, ausência ou renúncia da vítima (58%).

(35)

conciliação. No entanto, não estamos certos de que isso implica na resolução dos conflitos para os sujeitos demandantes, mas para os conciliadores, segundo os autores acima citados, esse é um resultado de sucesso, além de ser a principal solução apresentada pela justiça aos sujeitos em situação de conflito.

A partir das nossas considerações sobre o conflito, em que ressaltamos que sua existência é inerente às relações sociais, e que, independente de sua forma de manifestação, tem raízes na luta pelo poder, podemos afirmar, em concordância com os pressupostos que impulsionaram a implantação da lei 9.099/95, que a complexidade dos conflitos que se apresentam para resolução nos Juizados requer o rompimento com a lógica puramente punitiva.

Então, para esse trabalho o conflito é compreendido numa visão complexa, não só em sua relação com a dinâmica de forças em presença nas relações de poder, mas como algo que faz parte das relações interpessoais, sobretudo quando existe dificuldade para compreender e administrar os próprios conflitos. Nessa perspectiva, a violência se expressa, ao mesmo tempo, como uma forma de solucionar o conflito e como a dificuldade de conviver com as diversidades. Em síntese, compreendemos que o conflito se estabelece na relação com o outro, e é também na relação com esse outro que surgem as possibilidades de resoluções das situações conflitivas.

3.2.1 Conciliação de Conflitos dificuldades e perspectivas

(36)

sinalizam o quanto tem sido difícil a operacionalização desses princípios na prática dos Juizados Especiais Criminais.

Diante disso, consideramos relevante apontar algumas perspectivas atuais no campo da conciliação de conflitos. Comecemos então, tentando esclarecer quais os princípios que indicam a autocomposição dos sujeitos em conflito. Para tanto, nos reportaremos aos trabalhos de mediação no cenário jurídico em Buenos Aires de Hightn e Álvarez (1999) que esclarecem que só há autocomposição quando as próprias partes ditam a solução ao conflito.

“Nenhum terceiro toma ou impõe uma decisão, este age como um facilitador da

comunicação, mas não detém o poder da decisão” (p. 190). As autoras

esclarecem que quando a solução não é possível de ser alcançada desse modo, as partes podem recorrer à heterocomposição, ou seja, a uma solução sugerida ou imposta de fora.

A autocomposição, para as autoras acima citadas, só é possível por meio de estratégias de resoluções alternativas de conflitos, como a mediação, que permite resolver um conflito sem recorrer à força e sem que o mesmo seja resolvido por uma autoridade judicial. A não ser que este tenha a formação de mediador, o que é considerado perfeitamente possível, já que a mediação se desenvolveu a partir de raízes multidisciplinares e, por isso, tem sua prática profissional enriquecida. Entretanto, as autoras alertam para o fato de que também podem confundir, uma vez que os profissionais que atuam como mediadores vêm de outras áreas e podem ficar tentados a importá-las. Se o mediador for um profissional do direito, por exemplo, poderá ter suas condutas ditadas por seu entendimento e interpretação da lei e do direito. Do mesmo modo, se o mediador for um psicólogo ou psiquiatra poderá ter uma atuação interpretativa ou terapêutica.

(37)

opções de soluções, além de dificultar a relação entre as pessoas envolvidas e gerar altos custos econômicos e afetivos.

As principais críticas aos modelos tradicionais de resolução de conflitos, de acordo com os autores anteriormente mencionados, residem no fato de que suas estratégias são pouco eficazes para resolvê-los. Além disso, não conduzem os sujeitos a aprender como fazê-lo – uma vez que não direcionam a uma co-participação responsável – não admitem a consideração e o reconhecimento da singularidade de cada participante no conflito e não consideram a possibilidade de ganhar conjuntamente. O que obviamente exclui a possibilidade do protagonismo, além de desresponsabilizar os sujeitos da condução de seus problemas, uma vez que são pressionados ou obrigados a aceitar uma de decisão vinda de terceiros.

O investimento no protagonismo das partes envolvidas no conflito também é sinalizado por Muszkat (2003) na experiência brasileira em resolução alternativa de conflitos. A autora ressalta a importância do encontro e da possibilidade do diálogo entre as partes. A mediação “[...] tem como

finalidade oferecer às partes em litígio uma forma não adversarial de tratar suas questões (p. 34). A autora segue dizendo:

O caráter pacifista do método se baseia na superação das dicotomias vítimas/agressor, certo/errado, culpado/inocente, apoiando-se no princípio da complementaridade que pressupõe, em todo conflito, a presença ativa de dois opositores responsáveis pela sua manifestação e manutenção.(...) o caminho mais curto para a resolução de qualquer conflito é aquele que decorre do conhecimento e aceitação das partes sobre suas formas singulares de ação e sua responsabilidade na dinâmica das relações. (MUSZKAT, 2003; p. 35).

Lernar, Maidana e Fernandez (2000), ao descreverem um modelo de resolução alternativa de conflito penal, traçam uma diferenciação entre mediação e conciliação bastante interessante. A mediação se caracteriza pelo maior nível de horizontalidade entre as partes envolvidas, e o terceiro –

(38)

ao diálogo. Além disso, trata-se de um processo com curto tempo de duração, não se estendendo por mais do que algumas horas.

Já na conciliação, o terceiro tem uma participação maior nas sessões de modo que, ao identificar a origem do conflito, pode indicar alternativas de soluções, mas jamais deverá dizer qual solução é a melhor, uma vez que as partes continuam em poder de seus problemas e, assim, apenas elas poderão indicar o resultado. A conciliação é mais indicada para os casos em que há maior conflitividade e pouca predisposição para o diálogo e, por isso, o conciliador/mediador poderá recorrer a estratégias como reuniões privadas com as partes envolvidas no conflito. A conciliação tende a ser um processo mais longo, sendo necessário, em média, três sessões.

Por fim, consideramos importante sinalizar que a necessidade de implantação de políticas alternativas para a resolução de conflitos parece ser um consenso entre os autores aqui citados e Hightn e Álvarez (1999), especificamente, defendem que a incorporação desses novos mecanismos é uma função do Estado.

Diante do exposto, não podemos negar o avanço do sistema de justiça brasileiro ao criar a Lei dos Juizados Especiais Criminais. Cabe-nos reconhecer ainda, que o discurso proferido por essa Lei vai ao encontro dos pressupostos que norteiam as resoluções alternativas de conflitos. No entanto, também nos cabe alertar para o fato de que a operacionalização dessas resoluções exige da justiça uma nova interpretação a respeito dos conflitos, além de ter que assumir, de fato, uma função reparadora e apaziguadora.

(39)

4 MÉTODO

4.1 Delineamento da pesquisa

O presente estudo seguiu os pressupostos do enfoque qualitativo em pesquisa, devido à especificidade do fenômeno investigado. A escolha deste enfoque justifica-se pela pluralidade de olhares permitidos e exigidos pela pesquisa qualitativa, aliada à realidade múltipla e incerta do objeto estudado. Além disso, acreditamos que este enfoque possibilita-nos formalizar os fenômenos subjetivos a métodos científicos sem simplificá-los ou mesmo empobrecê-los, como bem sinaliza Demo (1998).

A preocupação fundamental dos estudos qualitativos, segundo Turato (2003) é a investigação e análise do mundo empírico em seu ambiente natural. O interesse das investigações qualitativas é verificar como determinados fenômenos se manifestam nas atividades, procedimentos e interações diárias e qual o significado que os sujeitos atribuem a esses fenômenos. Diante disso, a realidade é apreendida e compreendida dentro de sua complexidade.

Em pesquisas qualitativas valoriza-se o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e a situação estudada. Para alguns autores (DEMO, 2000; MINAYO, 2007; GODOY, 1995), o pesquisador é compreendido como um instrumento fundamental no processo investigativo, desde a construção e observação até a seleção, análise e interpretação dos dados coletados. Demo (2000) ressalta que o processo interpretativo passa, necessariamente, pelo sujeito pesquisador uma vez que a produção do conhecimento não se dá por meio de uma expressão direta dos instrumentos, o que lhe exige uma postura ética, crítica e questionadora.

(40)

sociais, na fala e nas demais expressões que acompanham a comunicação dos participantes.

4.2 O Contexto de realização da Pesquisa

Na introdução desse texto de pesquisa esclarecemos que esse estudo

foi realizado em diálogo com uma ampla pesquisa denominada “Conciliação e

Conflito no Sistema Penal: da operacionalidade do sistema penal à demanda

pela intervenção penal” desenvolvida por meio de uma parceria entre o curso de psicologia da Universidade Católica de Brasília e a Escola Superior do Ministério Público da União. O referido trabalho busca investigar a operacionalização da conciliação no sistema penal, bem como as conseqüências e benefícios dessa conciliação para os sujeitos – em situação de conflito – da intervenção penal.

A relevância em retomar esses esclarecimentos, está no fato de que a inserção nos espaços para coleta de dados, bem como o acesso aos participantes foi viabilizada por meio dos procedimentos metodológicos criados para a pesquisa acima citada.

A presente pesquisa, assim como a pesquisa anteriormente citada, foi realizada no Juizado Especial Criminal de Brasília, cuja circunscrição judiciária abrange as quatro varas de Brasília, as duas varas do Guará e as duas varas do Núcleo Bandeirante. Assim, a coleta de dados ocorreu nos Fóruns e Promotorias de Justiça das regiões administrativas acima citadas. Essa escolha justifica-se pelo fato de que nessas circunscrições judiciárias já existem levantamentos quantitativos, conforme nos mostra o estudo realizado por Pinheiro (2007), e que podem ser confrontados com os dados qualitativos que o presente estudo se propôs a analisar e discutir. Pareceu-nos, então, coerente que os dados fossem coletados em regiões administrativas onde outras questões referentes à operacionalização dos Juizados Especiais Criminais estivessem sendo estudadas.

4.3 Participantes

(41)

(04) promotores de justiça e quatro (04) auxiliares de justiça – denominados de conciliadores -, somando um total de doze (12) participantes em uma amostra equilibrada no que se refere à questão de gênero.

Cabe ressaltar que todos os participantes entrevistados foram, em momentos anteriores à realização das entrevistas, observados em sua prática profissional nos Juizados em que atuam, conforme esclareceremos adiante.

No projeto apresentado para qualificação desta pesquisa, tínhamos como meta a realização de entrevistas com dezesseis (16) participantes divididos igualmente em duas categorias – juizes e promotores. Essa quantidade havia sido delimitada em função dos locais de coleta dos dados –

Fóruns e Promotorias de Justiça das regiões administrativas de Brasília, Núcleo Bandeirantes e Guará – sendo esse o número total de operadores do direito que atuam nesses locais. Além disso, delimitamos como critério para a escolha dos participantes o tempo mínimo de seis meses de atuação em Juizados Especiais Criminais. Cabe ressaltar que este critério foi mantido no decorrer do trabalho.

É importante esclarecer que, após nossa inserção no campo de coleta, algumas alterações se fizeram necessárias. A primeira refere-se à inclusão de auxiliares de justiça – denominados de conciliadores – como mais uma categoria a ser investigada devido ao número expressivo de audiências conduzidas pelos mesmos, o que é previsto no Art. 73 da lei 9.099/957.

A segunda alteração refere-se à quantidade de participantes contemplada na pesquisa, já que não foi possível atingir o número de sujeitos inicialmente proposto devido a recusa de alguns profissionais em participar do estudo. Não encontramos dificuldades no acesso aos profissionais pertencentes à categoria de promotores de justiça, visto que todos os que foram contatados se mostraram muito disponíveis em colaborar com a pesquisa. No entanto, no que tange ao acesso aos juízes a realidade foi completamente diferente. Alguns se recusaram a participar da entrevista, e outros declaram não ter disponibilidade de tempo, alegando inclusive que

7 Art. 73. A conciliação será conduzida pelo juiz ou por conciliador sob sua orientação.

Parágrafo único. Os conciliadores são auxiliares da Justiça, recrutados, na forma da lei local,

Imagem

TABELA 1  –  Perfil dos Participantes da Pesquisa  Sexo  Tempo de  profissão  Tempo de  atuação no  JEC  Percurso profissional anterior ao JEC  J

Referências

Documentos relacionados

O município de Ponta Grossa, assim como os demais apresentam enormes dificuldades, tanto operacional quanto estrutural para captar recursos oriundos do Governo Federal,

The DCF model using the Free Cash Flow to the Firm (FCFF) method, estimates in the first place the Enterprise Value of the company, that represents the value of all future cash

Desta forma, conforme Winnicott (2000), o bebê é sensível a estas projeções inicias através da linguagem não verbal expressa nas condutas de suas mães: a forma de a

Super identificou e definiu construtos e a respectiva interacção no desenvolvimento da carreira e no processo de tomada de decisão, usando uma série de hipóteses: o trabalho não

Starting out from my reflection on the words cor, preto, negro and branco (colour, black, negro, white), highlighting their basic meanings and some of their

As rimas, aliterações e assonâncias associadas ao discurso indirecto livre, às frases curtas e simples, ao diálogo engastado na narração, às interjeições, às

Como visto no capítulo III, a opção pelo regime jurídico tributário especial SIMPLES Nacional pode representar uma redução da carga tributária em alguns setores, como o setor

Our contributions are: a set of guidelines that provide meaning to the different modelling elements of SysML used during the design of systems; the individual formal semantics for