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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS Programa de Pós-Graduação em Educação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS

Programa de Pós-Graduação em Educação

TESE

PELOTAS, setembro de 2009

DOCÊNCIA EM ARTES VISUAIS:

CONTINUIDADES E DESCONTINUIDADES NA (RE)

CONSTRUÇÃO

DA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL

CARMEN LÚCIA ABADIE BIASOLI

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DOCÊNCIA EM ARTES VISUAIS:

CONTINUIDADES E DESCONTINUIDADES NA (RE) CONSTRUÇÃO

DA TRAJETÓRIA PROFISSIONAL

Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial à obtenção do título de Doutora em Educação.

Orientadora: Profª Drª Márcia Ondina Vieira Ferreira

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Dados de catalogação na fonte: Aydê Andrade de Oliveira CRB - 10/864

Tavares Santos Silva. – Pelotas, 2008 . 124f.

Dissertação (Mestrado em Educação) Faculdade de Educação. Universidade Federal de Pelotas. 1. Professor leigo. 2. Educação em escolas ru- rais. 3. Trajetória de vida profissional. I. Zanchet , Beatriz Maria Boéssio Atrib, orient. II. Título. CDD 371.3 B579d Biasoli, Carmen Lúcia Abadie.

Docência em artes visuais : continuidades e descontinuidades na (re)construção da trajetória profissional / Carmen Lúcia Abadie Biasoli ; Orienta- dora: Márcia Ondina Vieira Ferreira. - Pelotas, 2009. 311f. : il. ; color.

Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação. Universidade Federal de Pelotas.

1.Trabalho docente. 2. Metodologia biográfico- narrativa. 3. Ciclos de vida profissional. 4. Docência em Artes Visuais. I. Ferreira, Márcia Ondina Vieira, orient. II. Título.

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Banca examinadora:

Prof.ª Dr.ª Eliane Terezinha Peres Prof.ª Dr.ª Ilma Passos Alencastro Veiga Prof.ª Dr.ª Lúcia Maria Vaz Peres

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AGRADECIMENTOS

RESUMO

Aos professores pelas suas narrativas, porque sem elas eu não teria o que contar.

À Márcia Ondina pela delicadeza da presença e competência profissional.

À Ilma, Mabel. Lúcia, Eliane, pela segurança que me deram na banca de qualificação e por continuarem comigo.

Aos colegas do Instituto de Artes e Design pelo incentivo e apoio.

Aos professores do Curso de Cinema e Animação pela parceria e compreensão da minha ausência.

Ao Paulo pela fase de companheirismo e por me fazer compreender que uma “puxada de tapete” não significa queda, mas salto.

À Fernanda, Silvana, Margareth, Isabel Larissa, Aceves, Bolivar, Igor, amigos daquela hora difícil e dos momentos de desabafo e descontração.

À Margareth, novamente, só que agora pelo precioso auxílio na elaboração das biovias.

A todos que estão sempre muito próximos, mesmo estando longe.

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descontinuidades na (re) construção da trajetória profissional. 2009. 307f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas.

Esta pesquisa discute a problemática da profissão docente em Artes Visuais a partir do estudo do ciclo de vida profissional, ou seja, do ciclo vital pelo qual passam os professores. Assim, teve como objetivo investigar as continuidades e descontinuidades na (re) construção da trajetória profissional de docentes de Artes Visuais, defendendo a idéia de que aspectos significativos da vida pessoal e profissional e o momento docente em que se encontram os professores interferem tanto na construção dessa trajetória quanto para uma melhor compreensão da pessoa do professor e, como conseqüência, da sua atuação docente. No campo do ensino das Artes Visuais, esta tese igualmente reconstrói a história das instituições responsáveis pelo ensino da Arte em nosso país, enfocando mais precisamente o caso do atual Instituto de Artes e Design (IAD) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), cuja criação remonta a 1949.

A tese está assentada em diferentes pesquisas sobre trajetórias biográficas, incluindo as que abordam as fases da carreira do professor (centradas nos anos de experiência profissional), e os ciclos de vida, indicando a dimensão pessoal como fundamental no processo pelos quais os professores se constroem e dinamizam seu trabalho, deixando claro que o aperfeiçoamento profissional está associado ao desenvolvimento pessoal, ou faz parte dele. Ademais, são trazidas contribuições de autores que investigam o trabalho docente, especialmente os que tratam da profissionalização, do desenvolvimento profissional e dos saberes docentes, bem como de investigadores que analisam a escola como produtora de cultura.

A abordagem metodológica é a biográfico-narrativa, que possibilita aos professores falarem sobre o que conhecem e fazem, o que faziam ou o que poderiam ou deveriam fazer, ou seja, permite a explicitação das dimensões do passado que pesam sobre as situações atuais e sua projeção em formas desejáveis de ação. Os professores que participaram da pesquisa exercem a docência na rede municipal de Pelotas e atuam na área de Artes Visuais, todos formados pelo IAD. O estudo assume um caráter quanti-qualitativo, ao combinar questionário com entrevista. O questionário envolveu 40 professores e possibilitou conhecer características e expectativas formativas comuns no coletivo. A entrevista foi realizada com 7 professores, formados em diferentes etapas do curso de formação docente (conforme as mudanças da legislação educacional) e com distintos tempos de atuação no magistério, permitindo compreender aspectos relativos à escolarização; escolha da profissão com seus fatores determinantes e expectativas; trajetória acadêmica com suas influências; lembranças e formação prática de ensino; carreira docente, com seus primeiros anos; se o fato de ser mulher/homem afetou a carreira; exercício da docência, anterior e atual. Para melhor compreensão da trajetória docente, a partir da análise das entrevistas foram criados os caminhos biográficos, aqui denominados de biovias. Outro elemento usado para complementar as entrevistas e

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análise de dados biográficos foram Imagens Viajantes de obras de Arte solicitadas aos professores, escolhidas por eles para significar o momento atual em que estão vivendo. Para a elaboração das fases partiu-se do princípio de que os anos de carreira são significativos para definir o início da primeira fase, denominada de impacto (1-6 anos), mas não foram balizadores do seu término, porque os acontecimentos vividos pelos professores, tanto na escola quanto na vida pessoal, foram determinantes para uma mudança de fase. Já a aproximação da segunda fase, a de personalização (7-12 anos), justificou–se porque os professores definiram um estilo pessoal de ensinar Artes Visuais para turmas de níveis diversificados e escolas com realidades diferentes, o que requer tempo e maturidade, sem descartar uma mudança mais rápida provocada por um ou outro tipo de acontecimento, um momento crítico enfrentado pelo professor. A fase de alternância (13-18 anos) correspondeu a um período no qual o tempo de atuação possibilitou ao professor uma maior compreensão do sistema educacional e da docência, do que pode ou não, do que quer ou não fazer, o professor permitiu-se optar. Já a proximidade com o final da carreira determinou a fase de individualização (19-25 anos), responsável pelo distanciamento do professor dos problemas educacionais e pela busca de satisfação pessoal.

Deste modo, os anos de docência são considerados significativos na trajetória profissional, mas não são definidores das fases, pois as narrativas dos professores comprovam que as fases se mesclam constantemente - ou não - e uma não afasta nem elimina a possibilidade de outra. Portanto, as modificações nas fases da vida dos professores são ocasionadas pelas condições de tempo e lugar determinados, ocorreram pelas oportunidades e limitações vividas por cada um deles; o entrecruzamento das histórias pessoais e das trajetórias profissionais nesses diferentes espaços e tempos configuram uma singularidade na prática docente desses professores. Embora todos tenham passado, de um modo geral, por fases similares da carreira docente, ficou evidente que cada um tem uma história de vida e trajetória profissional singular, cada um tem uma trajetória subjetiva específica, cada um deles é único.

Por fim, pode-se dizer que a compreensão dos ciclos de vida, através das fases da carreira docente, entrecruzando histórias pessoais e trajetórias profissionais em diferentes espaços e tempos da prática docente, possibilita pensar alternativas e incentivar propostas de inovação para a formação docente inicial e continuada.

Palavras-chave: Trabalho docente. Metodologia biográfico-narrativa. Ciclos de vida profissional. Docência em Artes Visuais.

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discontinuities in the (re) construction of the professional career. 2009. 307f. Thesis (PhD program) – Post Graduation Program in Education. Education College. Federal University of Pelotas, Pelotas.

The present research discusses the problematic of the teaching career in Visual Arts based on the study of professional life cycle, that is, the vital cycle through which the teachers face. Thus, it aimed at investigating the continuities and discontinuities in the (re) construction of teachers’ professional careers in Visual Arts, defending the idea that significant aspects of both personal and professional life and the teaching moment lived by the teachers interfere both in the construction of this career as well as in a better understanding of the role of the teacher and, consequently, his / her teaching performance. In the field of Visual Arts teaching, this thesis equally reconstructs the history of institutions responsible for the teaching of Arts in our country, focusing more specifically the present situation of the Instituto de Artes e Design (Arts and Design Institute) from the Federal University of Pelotas (UFPel), which was opened back in 1949.

The thesis is based in different researches about biographical data, including the ones which concern the different teacher’s career phases (centered in the years of professional experience), and the life cycles, indicating the personal dimension as fundamental in the process by which the teachers build their careers and make their work dynamic, making it clear that the professional improvement is associated to the personal improvement, or is also part of it. Besides this, there are contributions from authors who investigate the teaching activity, specially the ones involved with the professionalization, the professional development and the teacher’s knowledge, as well as investigators who analyze the school as a culture producer.

The methodological approach is biographic-narrative, which enables the teachers to talk about what they know and do, what they did or what they could or should do, that is, it makes possible to make explicit the past dimensions which have an influence on the present situations and its projection into expected action forms. The teachers who participated in the research teach in city public schools in Pelotas in the area of Visual Arts, all having graduated at IAD. The study takes a quanti-qualitative character, as it combines the questionnaire with interviews. The questionnaire involved 40 teachers and enabled to know characteristics and expectations common to the people as a whole. The interviewed was made with 7 teachers, graduated in different phases of the teaching course (according to changes in the educational legislation) and with distinct teaching experience, permitting to understand aspects related to school history; the choice of the career with their determinant factors and expectations; academic history and their influences; remembrances and teaching practical education; teaching career, within its initial years; whether the fact of being a man / woman affected his / her career; the teaching experience, previous and present. For a better understanding of the

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teaching career, biographical paths were created based on the analysis of the interviews, here so-called biopaths. Another element used to complement the interviews and the analysis of the biographical data were “Travelling Images” of Art pieces asked by the teachers, chosen by them in order to express the present moment which they have been facing.

For the elaboration of phases, the starting point was the principle that the years of career are meaningful to define the beginning of the first phase, called impact (1-6 years), but they were not standards for its end, because the events faced by the teachers, both at schools as well as in their personal lives, were significant for a change of phase. The closeness to the second phase, the personalization one (7-12 years), was justified because the teachers defined a personal teaching style to teach Visual Arts for groups of different levels and schools with different realities, which demands time and maturity, without discharging a faster change provoked by one or another type of event, a critical moment faced by the teacher. The phase of alternation (13-18 years) corresponded to a period in which the teaching experience enabled the teacher to better understand the educational and the teaching system, what he / she can or cannot do, what he / she wants to do or not, the teacher gave him /herself the chance to choose. Finally the fact of being close to the end of the career determined the so-called individualization phase (19-25 years), responsible for the distance between the teacher and the educational problems and the search for personal satisfaction.

Therefore, the teaching years are considered meaningful in the professional career, but they are not the ones which define the phases, as the narratives from the teachers prove that the phases constantly mix - or not – and one does not place away nor eliminates the possibility of another. Finally, the modifications in the life phases of teachers are caused by the conditions of determined time and places, having occurred due to the opportunities and limitations dealt by each one of them; the crisscrossing of personal histories and the professional careers in these different moments and places configure a singularity in the teaching practice of these teachers. Although all have gone through, in a general way, similar phases in their teaching careers, it was evident that each one have their own and unique life experience and professional career, each with a specific subjective experience, each one of them is unique.

To end, it can be said that the understanding of the life cycles, through the phases of the teaching career, crisscrossing personal histories and professional careers in different places and moments of the teaching practice, enables thinking about alternatives and motivating innovation proposals for the initial and continuing teacher’s education.

Key words: Teaching work. Biographical-narrative methodology. Professional life cycles. Visual Arts teaching.

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Figura 1 - Articulação entre os diferentes instrumentos da pesquisa Quadro 1 – Formação do Professor de Arte no IAD/UFPel

Quadro 2 – Professores entrevistados por curso, ano de conclusão e tempo de docência Quadro 3 – Fases por ano de carreira

Quadro 4 – Fases da carreira por aproximação dos anos de docência Quadro 5 – Professores entrevistados por anos de docência

Quadro 6 – Mutações coloridas da trajetória profissional dos docentes

35 33 36 124 203 205 219

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Professores formados no curso de Licenciatura de 1º Grau em Educação Artística

– IAD/UFPel (1975-1990)

Tabela 2 – Professores formados no curso de Licenciatura Plena em Educação Artística com habilitação em Música – IAD/UFPel (1975-1979)

Tabela 3 – Professores formados, segundo habilitação,

no curso de Licenciatura Plena em Educação Artística – IAD/UFPel (1978-1992)

Tabela 4 – Professores formados, segundo habilitação,

no curso de Licenciatura Plena em Educação Artística – IAD/UFPel (1994/1998))

Tabela 5 – Professores formados, segundo habilitação, no curso de Licenciatura em Artes

– IAD/UFPel (1999/2007)

Tabela 6 – Professores formados, por curso e habilitação – IAD/UFPel (1994-2007)

Tabela 7 – Professores formados, por curso e habilitação - Licenciatura – IAD/UFPel (1975/2007)

Tabela 8 – Professor por formação: curso e habilitação Tabela 9 – Professor por tempo de docência

Tabela 10 – Alternativas para o exercício da docência Tabela 11 – Espaço físico para as aulas de Artes Visuais

Tabela 12 – Freqüência no planejamento das aulas pelos professores Tabela 13 – Instrumentos avaliativos utilizados pelos professores Tabela 14 – Recursos materiais utilizados pelos professores

Tabela 15 – Tipos de reunião promovida pela escola que os professores participam Tabela 16 – Freqüência na participação em reuniões por áreas de estudo

Tabela 17 – Fatores de impedimento para formação continuada

48 49 49 50 51 52 52 131 133 136 139 139 141 143 146 146 148

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Biovias 1

Professora Ana - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência Biovias 2

Professora Sílvia - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência Biovias 3

Professora Maria - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência Biovias 4

Professora Diva - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência Biovias 5

Professora Eduarda - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência Biovias 6

Professor Paulo - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência Biovias 7

Professora Jenice - Trajetória docente por acontecimentos e anos de docência

212 213 214 215 216 217 218

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SUMÁRIO

TRADUZIR-ME

1. EU NO ESPELHO: A PESSOA, A PROFESSORA A memória

Uma relação delicada Uma decisão saborosa Uma opção decisiva Uma mudança geográfica

Uma caminhada de re-configuração Um exercício de escrita de si

Um discurso assumido

Um caminho para novas pisadas

2. O CAMINHO SE FAZ CAMINHANDO Achados no caminho

Inquietações e objetivos da caminhante O traçado do caminho

Os caminhantes

3. LUGAR DE FORMAÇÃO: A CASA E O CORPO A casa e o corpo: alicerces fundacionais

A casa: Instituto de Artes e Design/UFPel O corpo: Professor de Arte

4. PINCELADAS QUE MUDARAM A HISTÓRIA Ensino da Arte: rupturas na concepção

Cultura Visual no ensino das Artes Visuais Leitura de imagens no ensino das Artes Visuais Professor de Artes Visuais: desafios na atuação 5. OLHARES TEÓRICOS SOB PERCEPÇÃO Escola em questão

A escola como lugar de cultura

A escola como espaço da produção de vozes Trabalho docente em foco

Saberes docentes em discussão Trajetória biográfica em voga

1 7 8 9 10 10 11 13 15 17 20 26 30 33 38 43 46 55 61 64 69 75 77 85 88 100 114

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6. IMPRESSÕES PRIMEIRAS Imagens delineadas

Imagens percebidas

7. DE ONDE VÊM? QUEM SÃO? PARA ONDE VÂO? Ciclos de vida dos professores

A escolarização A escolha da profissão A trajetória acadêmica A carreira docente A escola

Fases da carreira docente

8. OS PROFESSORES PELAS SUAS TRAJETÓRIAS

9. OS PROFESSORES PELAS SUAS IMAGENS VIAJANTES

A VOZ: IMPRESSÕES FINAIS Imagens delineadas pelo gesto Imagens construídas pela voz Imagens (in)concluídas

REFERÊNCIAS

APÊNDICES

Protocolos de Registro de Narrativas Protocolo nº 1 Protocolo nº 2 Protocolo nº 3 Protocolo nº 4 Protocolo nº 5 Protocolo nº 6 Protocolo nº 7 130 152 157 158 161 165 175 190 194 201 210 220 228 231 235 238 247 257 263 272 278 286 294

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TRADUZIR (ME)

Se uma imagem presente não faz pensar uma imagem ausente, se uma imagem ocasional não determina uma prodigalidade de imagens aberrantes, uma explosão de imagens,

não há imaginação. Gaston Bachelard

Ao iniciar a apresentação deste trabalho, entendo ser necessário traduzir (me). Buscar significados para a palavra traduzir foi o começo. Ferreira Gullar diz: “Uma parte de mim pesa, pondera. Outra parte delira”, eu digo: “Uma parte de mim é pessoa, outra professora e ambas pesam, ponderam e deliram”. Nesse misto de ser, o sentido do meu traduzir é manifestar, explanar, explicar. Manifestar minha eterna preocupação com o professor, explanar razões para realizar esta pesquisa e explicar porque a construí assim como está e não de outra forma.

O foco central da pesquisa foi, mais uma vez, e como não poderia deixar de ser, a formação e atuação do professor de artes visuais. A formação do professor, não só de arte, mas de todas as áreas do conhecimento humano e para todos os níveis de ensino, tem sido amplamente discutida nas agendas educacionais de hoje. Centrar o foco nesta questão indica que a função do

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professor, no processo de ensinar e aprender, ganha contornos mais precisos. Isto aponta para a existência de um processo de revisão tanto na atuação do professor quanto na sua história de vida e, ainda, de retomada de uma identidade profissional, pois pela análise de Nóvoa (1995b) “nos últimos 30 anos, depois de ter sido ignorado, esmagado e controlado pelo próprio sistema educacional”, o professor passou a ser objeto de inúmeras pesquisas em produções acadêmicas, provocando reflexões sobre a sua formação e a prática pedagógica na busca de um maior domínio das ações educativas.

Fui, então, em busca de uma nova forma ou outra maneira de olhar e entender o professor, que não apenas aquela tentativa de encontrar um melhor método para o ensino, ou aquele destaque dado à análise do ensino no cotidiano da sala de aula, ou ainda, pela busca de características intrínsecas ao “bom” professor.

Desta vez, a idéia inicial foi motivada pelo texto de Nóvoa (1995b): “Diz-me como ensina, que dir-te-ei quem és, ou vice versa”, lido algum tempo atrás, que me fez entender que a profissão docente é uma profissão de interações humanas e um professor sempre se apresenta inteiro, com toda a sua personalidade.

Pensando, então, que o professor na relação pedagógica apresenta-se com toda a sua história e personalidade, pelo menos nas formas de ensino que implicam uma interação presencial entre professor e estudantes, tomei como ponto de partida analisar a problemática da profissão docente a partir do estudo dos ciclos de vida com base nas fases da carreira do professor, centradas nos anos de experiência profissional. Queria identificar aspectos significativos da vida pessoal e profissional que interferem na construção dessa trajetória para uma melhor compreensão da pessoa do professor e, como conseqüência, sua atuação docente.

A história pessoal, a trajetória pré-profissional, e, especialmente, a trajetória como aluno, tem uma influência decisiva no estilo de ensino de um professor. Acredito que tendemos a reproduzir, ou a excluir, formas de trabalho ou atitudes de professores que marcaram nossa vida escolar quando alunos. Entendo que os professores exercem uma profissão em instituições que são muito semelhantes àquelas nas quais passaram longos anos de suas trajetórias

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escolares. Essas experiências marcam profundamente a escolha do magistério como carreira profissional, a prática docente e as mentalidades dos professores.

Por isso - e devido a isso – voltei meu olhar sobre a vida pessoal do professor, considerando que a maneira como cada professor ensina está diretamente dependente daquilo que ele é como pessoa quando exerce seu ensino

Para estruturar este trabalho, enredei meus pensamentos na busca de uma solução agravável para mim que o escrevo e sedutora para quem o lê. Talvez querer seduzir o leitor seja muita pretensão, mas pensei assim e por isso me motivei na busca de organizar uma seqüência com um pouco de imaginação para apresentar os resultados desse trabalho.

Inspirada em Bachelard (2001), destaco que a imaginação é a faculdade de formar imagens. Ora, ela é antes a faculdade de deformar as imagens fornecidas pela percepção, é, sobretudo, a faculdade de libertar-nos das imagens primeiras, de mudar as imagens. Se não há mudança de imagens, união inesperada das imagens, não há imaginação.

Assim, fui buscar na memória imagens cristalizadas. As imagens de artistas em diferentes espaços e tempos foram, então, utilizadas na abertura de cada capítulo deste trabalho e por mim denominadas de “viajantes”, porque me inspiraram um exercício de pensamento estético visual, combinado com reflexões, múltiplas, aspiradas, respiradas e transpiradas nas especificidades dos conteúdos de cada um dos textos que compõem todo trabalho.

O primeiro capítulo, Eu no espelho: a pessoa, a professora, estrutura-se com base em um exercício de pensamento que narra minha trajetória de vida. Busco, através do espelho, um olhar profundo sobre mim e a partir da minha memória trazer fatos do passado que contribuíram na minha construção pessoal e profissional.

O segundo capítulo, O caminho se faz caminhando, apresenta a origem do estudo: as razões e motivações, problemática de pesquisa e objetivos, destacando investigações realizadas anteriormente como o contexto gerador deste estudo. O caminho traçado para entender a trajetória profissional também se faz presente nesse capítulo, cujo enfoque foi a metodologia biográfico-narrativa, uma abordagem quanti-qualitativa, que possibilitou aos professores

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explicitarem as dimensões do passado que pesam sobre as situações atuais e sua projeção em formas desejáveis de ação.

Lugar de formação: a casa e o corpo caracteriza-se como o terceiro

capítulo, tendo por objetivo apresentar a casa da Arte, que também gradua profissionais nessa área, os professores formados nessa casa, narrando um pouco da história das instituições de ensino de arte no país que, de certa forma, influenciou o ensino da arte e, como conseqüência, a formação dos professores do Instituto de Artes e Design /UFPel.

O quarto capítulo, Pinceladas que mudaram a história, discute as mudanças nas concepções de Arte e de ensino de Arte ocorridas a partir do início do século XX e suas implicações acerca do lugar da arte na escola, da formação do professor e do trabalho docente em artes visuais.

Olhares teóricos sob percepção, o quinto capítulo, trabalha olhares de

alguns teóricos para a compreensão de questões relativas à escola, ao trabalho docente, aos saberes docentes, aos ciclos de vida e as fases da carreira pelas quais passam os professores.

No sexto capítulo, Impressões primeiras, são apresentadas as características dos professores comuns no coletivo. A partir do questionário com questões, subdivididas em questões fechadas e de alternativa múltiplas, agrupadas em torno das seguintes dimensões: dados de identificação, escolaridade, carreira e expectativas profissionais, processo de trabalho. Por fim, solicito aos professores informações sobre as dificuldades encontradas para ensinar arte e sugestões para a melhoria desse ensino.

O sétimo capítulo, De onde vêm? Quem são? Para onde vão? apresenta a voz dos professores através de suas narrativas, destacando os eventos e experiências, passados e presentes, que configuram a vida e a carreira e suas expectativas acerca do futuro, ou seja, acontecimentos histórico-sociais que fazem desse professor uma pessoa total. O estudo dos ciclos de vida, através da trajetória biográfico-narrativa dos professores compreendeu aspectos relativos à escolarização; à escolha da profissão, com seus fatores determinantes e expectativas; à trajetória acadêmica, com suas influências, lembranças e formação prática de ensino; à carreira docente com seus primeiros anos de docência; ao exercício da profissão e, se o fato de ser mulher/homem afetou ou

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não a carreira; ao exercício da docência e, por fim, os professores falaram da escola onde exercem a docência, destacando a história pessoal vivida na instituição, bem como o grau de satisfação com essa escola e o momento profissional em que se encontram.

Os professores pelas suas trajetórias docentes e Os professores pelas suas imagens viajantes, correspondem ao oitavo e nono capítulos,

respectivamente, são dois capítulos visuais onde no primeiro aparecem as biovias, os caminhos individuais de cada professor, determinados pelos acontecimentos vividos - momentos críticos – que marcaram a trajetória docente em artes visuais. Já no outro capítulo visual é possível ver os professores pelas cores e formas de suas próprias imagens refletidas nas imagens de artistas por eles selecionadas.

A Voz: Impressões finais configura-se como apreciação, à guisa de (in)

conclusão, sobre as continuidades e descontinuidades na (re) construção da trajetória profissional do docente em Artes Visuais, conclusão sobre a importância – e necessidade – de compreender que é impossível separar o eu pessoal do eu profissional; (in) conclusão porque é preciso visualizar outros caminhos, ainda pouco conhecidos, que possam contribuir mais efetivamente para e na formação inicial e continuada do docente em artes visuais e, assim, quem sabe, incentivar propostas de inovação.

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EU NO ESPELHO: A PESSOA, A PROFESSORA

Eis-nos de novo face à pessoa e ao profissional, ao ser e ao ensinar. Aqui estamos. Nós e a profissão. E as opções que cada um de nós tem que fazer como professor, as quais cruzam a nossa maneira de ser com a nossa maneira de ensinar, e que desvendam na nossa maneira de ensinar a nossa maneira de ser.

Antônio Nóvoa

A Imagem Viajante nº1, “Moça em frente do espelho” de Picasso1, leva-me a passear no tempo e no espaço, um tempo que é só meu e um espaço que retrata minha realidade ordenada. Na imagem refletida no espelho o artista mostra como é possível construir um rosto com poucos elementos e com a ausência de relevo. A solidez e a profundidade da imagem são motivadoras da escrita dessa primeira parte do projeto; destina-se a um exercício de pensamento que narra minha trajetória de vida. Busco, através do espelho, um olhar profundo sobre mim e a partir da minha memória trazer fatos do passado que contribuíram na minha construção pessoal e profissional.

1

Pablo Picasso (1881-1973), pintor espanhol, sua pintura é um “gesto de revolta com que se abre o processo revolucionário do Cubismo” (ARGAN, 1992, p.426). Cubismo: corrente estilística que apresenta duas tendências distintas: o cubismo analítico (1908-1911) e o cubismo sintético (1911-1914). O cubismo analítico trabalha com a decomposição da estrutura do objeto, uma verdadeira fragmentação, já o sintético decompõe sumariamente as formas, desintelectualizando as cores,

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A memória

O processo de lembrar, ou melhor, a memória é sempre uma interpretação do passado à luz do presente, uma avaliação com os olhos de hoje. Na lembrança, o passado se torna presente e se transforma, contaminado e influenciado pela percepção atual de quem lembra, do aqui e agora.

Sem memória, somos de alguma forma conduzidos por registros do passado, contidos em nosso inconsciente, que vão influenciar, sem o crivo da crítica, nosso comportamento. Daí a importância de, não somente nos deixarmos levar ao sabor e prazer (ou desprazer) de memórias ocasionais, mas, essencialmente, de recuperarmos como mecanismo de uma ação lúcida e consciente, conteúdos de nosso passado mais ou menos recente e, identificando sua influência em nosso pensamento, conduta, ação.

Na obra “Memória e sociedade: lembrança de velhos” de Ecléia Bosi (1983, p.17), eu encontro a concepção de Halbwachs (1990) acerca da memória que diz que “na maior parte das vezes, lembrar não é refazer, reconstruir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências do passado. A memória não é sonho, é trabalho”.

É dessa concepção de memória, presente nas palavras do autor, que aqui compartilho. É, então, através da lembrança das experiências vividas que destaco eventos significativos que me produziram e fizeram produzir-me como sujeito, mulher, professora.

E, assim inicio minha narrativa.

Bem, mas antes, devo dizer que narrativa sobre o que sei daquilo que vivi enquanto forma de conhecimento é um exercício de reflexão que envolve não só o fazer, mas também o escrever.

Para Ferrer (1994, p.166) "a narrativa do conhecimento confere compreensão à realidade, o escrito explica a vida”. E mais, para a autora a diferença entre o pensamento e a escrita é a de que o que está escrito, escrito está, ou seja, complemento isso dizendo que para o bem e para o mal registrado e, de alguma forma, definido e definitivo posto está.

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Uma relação delicada

A paisagem onde constituí meu imaginário geográfico primeiro localizava-se em Porto Alegre. Aos cinco anos de idade posso dizer que minha relação com a arte iniciava, pois começavam meus estudos de ballet. No ano seguinte fazia minha estréia acadêmica num renomado colégio de freiras para cursar a primeira série do curso primário. Alguns meses depois, enfrentei o primeiro preconceito institucionalizado contra a arte. Na época eu ensaiava euforicamente um espetáculo de dança que seria a minha estréia no palco, até que um dia a professora de religião chamou-me ao púlpito para reproduzir oralmente uma lição que deveria ser decorada, como não tinha estudado, argumentei prontamente que havia sido por pura falta de tempo porque os ensaios para o espetáculo estavam sendo excessivos. Quando terminei minha singela justificativa fui retirada abruptamente da sala de aula e depositada no gabinete da direção à espera de meu pai. É claro que nunca mais pisei na tal escola.

Recomecei meus estudos imediatamente em outra escola de freiras. Só que desta vez foi tudo diferente. Era uma escola pequena e muito alegre. Eu pude até contar para a Madre Superiora, uma grande amiga por muito tempo, meu sonho de ser, além de bailarina, uma artista de circo. Sonho acalentado por muito tempo, quando das minhas fugidas ao circo em frente a minha casa, sempre tinha um circo saindo e outro chegando. Assim, começava a minha paixão pelo palco e pelo picadeiro; a pelo palco continua até hoje e o picadeiro daquele circo de lona colorida ficou na lembrança.

Tudo na minha vida ia muito bem, até que por decisão familiar, fui para um colégio de Cônegas Francesas em regime de semi-internato. É evidente que elas foram avisadas sobre as minhas aulas de ballet. O cenário da escola era belíssimo, ficava num local afastado da cidade, a disciplina extremamente rígida era a tônica da escola, o corpo docente mais parecia um grupo japonês de Teatro Kabuc, pela seriedade e pela falta de humor. Estudava, além das disciplinas curriculares, Latim, Francês, Inglês e ainda tinham as aulas de polidez. Até hoje lembro o horror de almoçar com uma freira ao lado, em pé como uma coluna grega, falando, cutucando freqüentemente. Não sei como não fiquei com um trauma gástrico. No entanto, não é dos melhores o meu relacionamento com

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alguns alimentos, ainda hoje. O que mais me agradava nesta escola era o intervalo do almoço. Fiz amizade com uma freirinha que escutava um radinho de pilha e que me ensinou a jogar bolinha de “gude”. Assim, após o almoço, escutávamos rádio, jogávamos bolinhas e, por vezes, eu a ensinava a dançar. Ela era diferente das outras, estava sempre sorrindo e todas as tardes, na hora do lanche, ela carregava uma enorme cesta com pãezinhos bem quentinhos. Eu pensava que ela não era professora, e sim a responsável pela padaria da congregação. Muito tempo depois, a escola já não existia mais, encontrei a freirinha no Colégio Anchieta, como professora de Ciências. Aí nessa escola, eu iniciava minha trajetória de professora de arte, e eu e a freirinha alegre trabalhamos juntas em várias atividades integradas.

Por motivos político-familiares saí do Colégio das Cônegas e fui para outra escola, também de freiras, para concluir o ginasial. O que mais me fascinava nesta escola era o Núcleo de Artes e Cultura, eu fazia tudo o que era possível, teatro, dança, pintura, escultura, canto. Foi neste clima que concluí, tranqüilamente, meus estudos ginasiais. E, a partir daí, a minha relação com a arte se solidificou e o ser professora de arte irreversível.

Uma decisão saborosa

Criou-se, então um impasse familiar: de um lado meus pais achavam que eu deveria cursar o 2º Grau, pela manhã, em outro renomado colégio de freiras; por outro lado eu queria estudar, à tarde, em uma escola normal pública e pela manhã lecionar ballet para crianças. O convite para lecionar surgiu logo após minha formatura em dança clássica, era irrecusável. O resultado deste impasse foi a minha derrota temporária. Matricularam-me, então no tal colégio para fazer o “Clássico”. Eu saía de casa, todas as manhãs bem cedo, para ir à escola, carregada de livros, só que eu ia dar minhas aulas de ballet. Nunca entrei no renomado colégio. Sustentei esta situação insuportável por quase dois meses, até que fui prestar exame de seleção para o tão desejado Curso Normal e ao receber o resultado de aprovação pude chegar em casa e reverter a pseudo-vitória familiar. Com certeza a minha carreira teatral definiu-se aí. E aí, também a minha carreira no magistério, logo que formada comecei a lecionar, na rede escolar do

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município, em uma escola de periferia com uma classe de 3ª série. Uma opção decisiva

O que eu queria mesmo era ser professora de arte, então ao concluir meu curso Normal prestei vestibular para o curso de Licenciatura em Artes Plásticas do Instituto de Artes e para o Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da UFRGS. Passei nos dois. Porém, mergulhei no mundo da arte e o que me agradava era o ambiente artístico e cultural daquela casa de ensino. Respirava arte por todos os poros. Minha vida universitária foi de fundamental importância tanto na aquisição do meu conhecimento teórico da arte quanto na minha produção artística. Meus cursos universitários foram, sem dúvida, grandes performances. Era tempo de atuar, o estágio obrigatório levou-me ao Colégio Anchieta para ser a professora de arte e encontrar a freirinha minha amiga. O estágio acabou e eu continuei lecionando, como professora contratada.

Uma mudança geográfica

A paisagem onde constituí meu imaginário geográfico segundo, localizava-se em Pelotas. Minha vinda para Pelotas, apenas uma mudança geográfica, em nada interferiu nos meus ideais profissionais, pelo contrário, oportunizou-me meios para concretizá-los ainda mais. Aqui retornei a minha grande paixão, o palco – só que desta vez através do teatro. E o picadeiro? Este, eu não tive a oportunidade de experimentar, mas não perco nenhum circo que apareça na cidade, do mais simples ao mais sofisticado. Isso não importa, o que importa mesmo é estar sentada, comendo pipoca, ouvindo aquela música de circo e aquela voz dizendo: “Respeitável público”. É a glória!

Meu contato com a Universidade Federal de Pelotas deu-se através da Pós Graduação em Artes do Instituto de Letras e Artes, onde concluí o curso de Especialização em História da Arte. Nesta época conheci os integrantes do grupo Teatro Universitário e por dois anos consecutivos atuei como atriz e figurinista. Foi, então, que eu recebi meu primeiro prêmio de melhor atriz, outros se seguiram, em outro grupo, a Cia. Teatro Frio, como atriz profissional, já

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devidamente sindicalizada, com carteirinha e tudo.

Em 1989 ingressei no quadro docente da UFPEL, através de concurso público, no Departamento de Artes e Comunicação do Instituto de Arte e Design, para lecionar Expressão Cênica, Expressão Corporal e Fundamentos da Arte-Educação, no curso de formação de professores. Durante este período inicial desenvolvi Projetos de Extensão que me permitiram contato com professores em serviço nas redes municipal, estadual e particular de ensino da Pelotas e região. Experiência marcante na minha trajetória docente.

Uma caminhada de re-configuração

Na tentativa de organizar uma seqüência de lembranças dessa experiência, relembro Comparato (1983, p.45) quando diz que "a memória é a cristalização de fatos”, e complemento que não só de fatos, mas também de gestos, de falas que formam um acervo de imagens e pensamentos. E na profusão desses, procuro organizar tal seqüência com um pouco de imaginação, isto é, buscar a maneira de fazer a leitura de acontecimentos tão marcantes. Surgem, imediatamente, três cenas em "flash back” 2: um grupo de professores

sentados no chão; um grupo de alunos ao redor de uma mesa e eu lendo questionários preenchidos por professores e alunos. Essas cenas são absolutamente necessárias para a ação narrativa, só que assim reordenadas:

Flash Back nº 1: Leitura de questionários Uma pilha de questionários, já preenchida, descansava sobre uma mesa num dia cansativo de janeiro de 1992. Há algum tempo que eles estavam ali esperando por mim. Naquele tal dia, quente e abafado, iniciei a leitura dos "ditos" para, posterior, tabulação e análise. Um trabalho artesanal. Na medida em que ia lendo questão por questão, anotava as respostas em seus respectivos lugares nas grades primitivamente elaboradas. Essa atividade foi à tônica das minhas tardes daquele abafado janeiro. O trabalho representava uma tentativa de fazer um diagnóstico das condições dos docentes e da docência em Artes nas escolas da cidade de Pelotas, que possibilitassem a obtenção de dados capazes de permitir uma análise mais

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Cena que revela algo passado. É uma técnica usada para mostrar algo que aconteceu no passado da personagem. (COMPARATO, 1983, p.121).

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fundamentada das questões relativas ao ensino da arte e à formação do futuro professor. E assim, através das respostas, tanto dos professores como dos alunos, iam surgindo os contornos do perfil do professor e da situação do ensino da arte. Daí configurou-se uma imagem problemática do ensino da arte, cujo cerne da questão - concluí - tinha relação com a formação do professor de arte e com sua prática pedagógica.

Flash Back nº 2: Professores sentados no chão No início do 2º semestre letivo de 1993, eu e um grupo de alunos - a "Gang" da Carmen, como era conhecida - partimos para a realização de mais um projeto de extensão denominado "Arte-Educação: vivenciar, integrar e agir". Desta vez o local foi o município de Piratini e a clientela formada por professores do Ensino Fundamental e de Educação Artística das escolas estaduais, municipais e da zona rural. Assim, na manhã do dia 6 de agosto rumamos para mais uma experiência de ensino da arte. Lá chegando, dirigimo-nos à sede do Banco do Brasil, onde seria realizado o curso, Para espanto de todos nós, o espaço físico era o ideal: um salão muito grande, bem iluminado, com todos os recursos materiais possíveis e imagináveis. É claro que estranhamos, pois nós que ensinamos Arte não estamos acostumados com tanta coisa assim. Mas o que realmente marcou foi à cena com que nos deparamos: eram 64 professores sentados no chão olhando para nós com muita curiosidade e expectativa. Nunca tínhamos ministrado um curso com tantos professores juntos e com um grupo tão heterogêneo. Nosso objetivo com o projeto era o de vivenciar e de integrar as linguagens artísticas (plástica, cênica, música) como forma de aprendizagem refletida no agir, visto que todas as atividades artísticas estão ligadas à cognição, pois fazer arte é produzir conhecimento. Fomos, então, ao longo de todo o semestre vivenciando e integrando linguagens artísticas, aplicando nosso conhecimento com os professores e estes com seus alunos em suas escolas. Fato este que nos levou a concluir que é possível aliar saber artístico com fazer artístico, ou seja, a teoria com a prática.

Flash Back nº 3: Alunos ao redor da mesa Num final de tarde de agosto de 1995, quando cheguei no Instituto de Letras e Artes, ainda na rua olhei, pela porta de vidro, a sala da Biblioteca e vi um grupo de alunos sentados ao redor de uma mesa. Entrei, fui direto para onde eles estavam, eram todos conhecidos, eram os companheiros de extensão, era a minha "Gang". Partilhei com eles as novidades e as reflexões no e em decorrência do Curso de Mestrado que eu estava realizando. E foi deles mesmo a idéia inicial do que viria a concretizar-se numa experiência de ensino da arte na perspectiva da produção do conhecimento. Com esse projeto de extensão para alunos da própria instituição, nosso objetivo era discutir a questão dos paradigmas predominante e emergente de Educação, de Arte e de Ensino da Arte, refletindo sobre suas influências na prática pedagógica e suas conseqüências na formação de professores de arte. E, por meses, assim foi feito. Muito

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discutimos, muito estudamos, muito refletimos e concluímos, ao final da experiência, que não é impossível aproximar a Arte da Educação para um efetivo ensino da arte na perspectiva da produção do conhecimento.

A utilização do "flash back" serviu para mostrar fatos e ações de três cenas absolutamente fundamentais e marcantes na minha trajetória profissional, todas elas concretizadas através de projetos de extensão. Um "flash back" tem que integrar uma história, tem que ter um significado para uma ação, e estas cenas narradas foram, sem dúvida, as "molas propulsoras" das minhas ações subseqüentes, uma após a outra.

A reflexão sobre tais cenas apontou para questões básicas do ensino da arte: a formação do professor, a relação saber / fazer artístico (teoria e prática) e a produção do conhecimento em arte. Estas questões, teoricamente fundamentadas e praticamente vivenciadas à luz do meu "olhar", levaram-me a re-configurar meu conhecimento e a investir em novas propostas de trabalho de ensino de arte, quer com alunos da nossa instituição, quer com professores da nossa comunidade.

Um exercício de escrita de si

As ações educativas aplicadas em aula baseiam-se em teorias de educação. A atuação do professor está impregnada dos pressupostos e diretrizes de uma concepção de mundo que, por sua vez, nutre tal teoria. É claro que isso ocorre, também, com o ensino de arte. As concepções de mundo do professor embasam as relações que ele estabelece entre as aulas de arte e a sociedade. A ação do professor em sala de aula possui sempre uma teoria de educação. Uma ação impregnada de pressupostos teóricos de uma determinada concepção de mundo. Minhas ações também foram e continuam impregnadas de teorias educacionais.

Lembro de ouvir, certa vez, uma frase de Leonardo Boff que dizia: “a cabeça pensa a partir de onde os pés pisam”, e a minha cabeça pensou e pensa pelos caminhos que pisei e piso. Pisei em teorias que pregavam o ensino da arte como livre expressão, ensinei arte privilegiando a técnica do fazer artístico. Hoje,

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procuro pisar de forma mais reflexiva no caminho que considera a arte uma área de conhecimento e seu ensino a possibilidade de uma alfabetização visual. Procuro compreender os estudos da imagem e da cultura visual como principal exemplo de um mundo inventado pela visualidade que apresenta novos rumos para o campo da arte, principalmente, das artes visuais contemporâneas e também para o ensino da arte.

As preocupações com a formação e a prática do professor de arte têm origem na minha própria prática como professora num centro de formação docente. Pensar na formação de professores, outros que não eu, levou-me a reconstruir meu próprio percurso, ou seja, caminhos que percorri para ser hoje a professora que sou e assumir hoje o lugar que ocupo profissionalmente.

Minha primeira experiência em sala de aula, como professora de crianças, sofria na época, de um grande entusiasmo profissional. Eu acreditava que a escola era a solução para todos os tipos de problemas sociais e que a educação era a responsável pelas ações transformadoras do homem na sociedade. Eu sorria muito, eu era muito feliz ao ver meus alunos expressarem-se através da arte revelando as suas mais puras emoções. Nessa época, eu acreditava

piamente que essas crianças seriam amanhã os adultos capazes de transformar

realidades.Por um longo tempo pensei assim.

Ao ensinar jovens adolescentes descobri-me uma professora diferente, todos diziam que era preciso ter pulso forte, ter domínio da classe. Foi assim que, com disciplina na repetição dos conteúdos oficiais, no exercício da memória, eu trabalhava a pedagogia da ordem e, também, a conhecida “pedagogia da nuca”, alunos quietos, sentados um atrás do outro com os olhos fixos na nuca do colega. Sofri a influência da visão psicologista do ensino, encaminhava sempre que possível, minha relação com os alunos numa perspectiva afetiva, mas eu não sorria muito. Nessa época eu me achava “o máximo” como professora.

Registro, ainda, a minha vivência em uma instituição marcada pelo autoritarismo estrutural, era preciso formar o aluno para o mercado de trabalho. A regra era ensinar numa perspectiva marcadamente tecnicista. O lema era obediência e competência - os melhores sempre vencerão.

Num determinado momento, um fato novo surgiu: o movimento da crítica à educação eclodiu nacionalmente, derrubando o caráter de reprodução do ensino,

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repensando o papel da escola na sociedade e definindo a educação como um ato político. Pensar nesse sentido mudou tudo. Iniciei um caminho de descobertas e ambigüidades. Passei a ter outro compromisso,o compromisso da professora que forma professores. Segui um caminho sem volta: continuar estudando aquilo que tanto gosto, a formação de professores.

Hoje, procuro, numa perspectiva mais reflexiva da minha prática, produzir uma mudança, fazer surgir uma nova realidade material e humana qualitativamente diferente; quero, através de uma prática docente mais reflexiva, estabelecer uma ação recíproca com meus alunos e com nossas realidades, propor uma atividade criadora em oposição à atividade mecânica e repetitiva, vincular teoria à prática tanto no saber e fazer artístico como no saber e fazer pedagógico.

Um discurso assumido

Minha intenção, aqui, é pensar o discurso como resultado da prática, considerando a fala não como um simples ato de comunicação ou de dizer, mas uma construção de significados que transcendem a uma situação imediata e na qual estão implicadas determinadas relações históricas, culturais, sociais, políticas, econômicas que marcam a forma e o conteúdo do que é dito.

O discurso assume, desta maneira, a função de representação externa da experiência interna. E, na medida em que se reconstrói a experiência através da narrativa, reconstrói-se o discurso. Conforme afirma Cherryholmes (1987, p. 23), baseado em Foucault, os discursos "não são simplesmente construções idealistas. As práticas discursivas não podem ser desligadas de seu contexto histórico". Se assim é, o que entendo e digo daquilo que fiz e faço representa a minha prática discursiva, os meus saberes. Bem, mas qual é então o discurso que assumi?

A reflexão sobre minha trajetória docente aponta para questões atuais - e básicas - do ensino da arte: a formação de professores, a relação saber e fazer artístico e a produção de conhecimento. Acredito - e mesmo afirmo – que é a partir da reflexão sobre a própria experiência que surgem os referenciais necessários ao processo de construção do novo, um novo saber, uma nova

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prática. E, ainda, reforço que esse processo acontece também no interior do espaço de vivência da situação de ensino, formal ou não formal, pelas relações que o professor mantém com seus alunos.

Ao longo desse tempo venho, através de estudos, lendo vários autores, buscando - ou melhor, tentando buscar - algumas respostas aos meus questionamentos e indícios de outros caminhos que eu possa percorrer para encontrar tais respostas, ou, pelo menos, compreendê-las melhor.

Hoje encontro possibilidades de um novo "olhar", um "olhar para" novas perspectivas de análise para as minhas inquietações.

Em Zeichner (1993) está à alternativa para pensar a formação de professores que aponta para o professor como um prático reflexivo, um agente ativo responsável por seu desempenho docente, um produtor do seu saber teórico, prático e teórico-prático. A concepção de reflexão na ação e sobre a ação envolve um saber que vai sendo acumulado ao longo do tempo, visto que o professor está sempre criando o seu saber. Encontro, aí, a base para falar da formação dos professores, da relação teoria e prática, ou seja, saber e fazer artístico.

Em Penin (1994) encontro a compreensão sobre a diferenciação entre o saber cultural, cotidiano, leigo ou empírico, e o conhecimento sistematizado, numa ação de interação entre professores e alunos num espaço de conhecimento, num lugar de cultura como uma situação de ensino formal ou não formal. O professor no exercício de sua função na escola depara-se com a "cultura escolar", que compreende o ideário pedagógico resultante de discursos pedagógicos já realizados sobre questões relativas à educação, à escola, e o conhecimento das disciplinas escolares, embora apresente níveis diferentes de sistematização. E, ao mesmo tempo em que o professor vai construindo um conhecimento sobre o ensino, vai partilhando com os alunos o resultado de sua elaboração a respeito dos saberes e conhecimentos culturais a que tem acesso.

Isto implica em pensar que o processo de construção do conhecimento é orientado por duas suposições: uma de representação que o professor vive; a outra por um espaço constituído, de um lado, pelas concepções que o professor vai acumulando sobre o ensino com base no conhecimento sistematizado e por

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outro lado pela experiência da situação de ensino e pelas relações que mantém com seus alunos.

Identifico aí a situação de ensino como o espaço de produção do conhecimento. Encontro nos Estudos Culturais à resposta para uma velha crença: "Por que não, no ensino da arte, a colcha da vovó”?”, “Por que não ensinar a arte popular?”

Isto porque acredito que a experiência estética já é desfrutada pelo indivíduo antes de ele entrar para a escola. Se pensarmos bem, nós os professores de arte, não introduzimos a experiência estética, apenas a incrementamos a partir de algo que já existe, ampliando o âmbito e a qualidade da experiência visual e estética.

E mais, os Estudos Culturais estão preocupados com a cultura popular, com a cultura da mídia, com o terreno cotidiano das pessoas, e com todas as formas pelas quais as práticas culturais chegam a essas pessoas ou fazem parte da vida dessas pessoas. Os Estudos Culturais - lembro aqui Giroux (1992) - oferecem algumas possibilidades para os professores repensarem a natureza da teoria e da prática educacionais.

A Cultura Visual de Hernandez (2000) destaca a importância da imagem e a necessidade do professor de arte ser aquele que vai possibilitar a construção de um olhar atento frente a este mundo de imagens coloridas. A docência em arte, na contemporaneidade, tem dado grande ênfase às questões da imagem e sua interpretação, estabelecendo, assim, o uso tanto de imagens da arte como de imagens da mídia.

Encontro aí os caminhos para pensar que o professor deve ensinar num contexto mais amplo de currículo, considerando também, um cenário educacional e cultural bem mais amplo, fora do sistema formal de escolarização.

Um caminho para novas pisadas

Penso que não há um ponto de chegada, definitivo, quando se trabalha em educação, há apenas mais um ponto de partida. E, com este trabalho, fui buscar mais um ponto de partida, trilhar um novo caminho para pensar e pisar diferente.

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Meu encontro com Nóvoa (1995b) foi decisivo para vislumbrar outras possibilidades para pensar o professor, principalmente, quando li o texto “Diz-me como ensinas, dir-te-ei quem és e vice versa”. Nesse texto, o autor aponta uma realidade recente no modo de pensar os professores e sua profissão e mais, pensar a pessoa e o profissional que habitam cada professor. Isto aponta para a compreensão de que é impossível separar o eu pessoal do eu profissional.

Minha motivação para a realização deste trabalho foi a necessidade de buscar uma compreensão mais articulada e elaborada sobre continuidades e descontinuidades na (re) construção da trajetória profissional do docente em Artes Visuais, para que mais ciente de suas implicações, visualizasse alguns caminhos que pudessem contribuir mais efetivamente para e na formação docente. Um grande desafio para mim.

Pisei, pisei. Confesso que pisei. Pisei firme. Pisei fraco. Pisei em falso. Torci o pé. Pisei com medo. Pisei sem medo. Pisei feliz. Pisei errado. Parei e não pisei. Pisei novamente. Pisei firme. Pisei forte. Pisei distraída. Pisei na lama. Pisei consciente. Pisei diferente por diferentes caminhos e descobri novas pisadas.

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O CAMINHO SE FAZ CAMINHANDO

Não, não tenho caminho novo. O que tenho de novo é

o jeito de caminhar.

Thiago de Melo

Em ”Os Valores Pessoais”, a Imagem Viajante nº2, Magritte3 transforma as proporções dos objetos e ressalta o arbitrário da relação entre as coisas e os nomes que lhes damos. Na imagem, uma cama acolhe um pente, um guarda roupa acolhe um pincel de barba e o espelho é uma parede ao fundo, é o céu, é o finito no infinito. Um ambiente inteiro que transcende a si mesmo, pente é, ao mesmo tempo, pente e não pente, cama é cama e não cama. O olhar de Magritte para muitos pode parecer absurdo, mas é só dele. O que é absurdo para uns, não é, necessariamente, absurdo para outros.

A imagem escolhida leva-me a pensar nos meus valores pessoais, normas, princípios, padrões aceitos ou mantidos, inscritos num caminho que é só meu. Um caminho próprio, traçado por valores pessoais e eventos profissionais, um

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René Magritte (1898-1967), pintor belga, foi um dos principais artistas surrealistas, ele “se declarava empenhado acima de tudo em explicar aquilo que chamava o mistério do mundo”. (PIERRE, 1991, p. 96). Surrealismo: termo inventado por Guilherme Apollinaire (1880-1918) em 1917, mas usado pelo movimento fundado por André Breton (1896-1966) em 1924. Movimento que pretende libertar o patrimônio do inconsciente, através da supremacia do sonho e a suspensão do controle consciente (CUNHA, 2005, p. 276).

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caminho que hoje transcende ao vivido e busca não um caminho novo, mas uma nova forma de caminhar e que dá origem a este estudo.

Achados no caminho

A preocupação com a formação do professor de Arte e a conseqüente melhoria na qualidade do ensino da Arte emerge de minha própria prática pedagógica no centro formador do professor de Artes - o Instituto de Artes e Design (IAD) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).

Ao longo de minha experiência - como professora e como coordenadora, por quatro gestões, do Curso de Artes Visuais, Modalidade: Licenciatura - percebo a necessidade, mais uma vez, de profunda revisão no ensino nesta área e, paralelamente e como parte do mesmo, na formação do futuro professor de Arte. Agora, através de uma investigação com professores de Artes Visuais em exercício nas escolas públicas da rede municipal da cidade de Pelotas. Isto porque documentos oficiais como a Lei de Diretrizes e Bases, os Parâmetros Curriculares Nacionais e as Diretrizes Curriculares têm gerado novas posturas pedagógicas e mudanças tanto políticas quanto conceituais no ensino da Arte.

Durante minhas atividades no curso, ora como coordenadora e professora, ora como palestrante e supervisora de estágios, o contato com professores de Arte e com a realidade escolar das escolas públicas e particulares do município de Pelotas e região fez com que eu passasse a refletir sobre a seguinte situação: de um lado, a atuação desestimulada de um número muito significativo de professores e, por vezes, um sentimento de impotência diante da necessidade de intervir na realidade escolar; de outro, estagiários questionando a formação acadêmica, que segundo eles, não fornece uma instrumentalização básica e necessária para ações educativas nas aulas de Arte.

Na busca de compreensão dessas situações três investigações foram

realizadas anteriormente. Na primeira, parti para a elaboração de um diagnóstico das condições docentes e da docência em Arte nas escolas da cidade de Pelotas, o que possibilitou a obtenção de dados capazes de permitir uma análise mais fundamentada das questões relativas ao ensino e à formação do professor. A

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segunda aconteceu no centro formador do professor de Arte e procurou saber quais os compromissos do professor que forma professores, identificando o tipo de prática pedagógica predominante. E, retornando aos professores em exercício, a terceira pesquisa teve como objetivo indagar a respeito das teorias educacionais que participam das escolhas pedagógicas e estéticas do professor.

O levantamento dos dados, no primeiro trabalho, foi realizado durante o ano letivo de 1991, através da aplicação de questionários a professores e alunos de quinze escolas - dez estaduais e cinco municipais - da cidade de Pelotas.

De um total de cento e sessenta e oito professores de Educação Artística (termo extinto e substituído por Arte pela LDB 9394/96) - distribuídos em cerca de oitenta e quatro escolas de educação básica4 da cidade, das quais cerca de cinqüenta e seis de âmbito municipal, foi sorteada uma amostra de cinqüenta professores, sendo que 98% egressos do IAD-UFPel.

Cem foi o número total de alunos envolvidos na pesquisa. A média de alunos das turmas consideradas foi de trinta e cinco alunos por turma.

Este trabalho permitiu-me identificar dados referentes aos professores que apontam para os seguintes problemas: (a) atuação polivalente, atuação em sala de aula com diversas linguagens artísticas (artes plásticas, música, teatro); (b) desconhecimento da concepção de Arte como forma de construção de conhecimento; (c) concepção do ensino da Arte como sendo somente expressão pessoal através do fazer artístico; (d) deficiência de domínio do conhecimento e na apreensão das estruturas básicas desse conhecimento para possibilitar o trabalho dos conteúdos da educação básica, tanto com crianças como com adolescentes e adultos, em cursos diurnos e noturnos e (e) dissociação do conhecimento de Arte com a realidade concreta do aluno e da escola.

Outros problemas mais diretamente relacionados à prática da Arte em si mesma estão relacionados à concepção do ensino com ênfase no fazer artístico e ao fato de não existir uma compreensão generalizada de que a Arte, como qualquer outra área do domínio específico do conhecimento humano, possui conteúdos próprios, capazes de produzir situações adequadas e viáveis à construção do conhecimento aliada à produção artística, por parte do aluno.

4Educação básica formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio. Cap. I, Art. 21, I, da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional “LDB” - Lei Darcy Ribeiro - nº 9.394 de 20.12.1996, publicada no Diário Oficial da União em 23.12.1996, Seção I.

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Registro, ainda, como conseqüência, problemas relativos a critérios utilizados para elaboração de programas de ensino e definição de objetivos pretendidos; dificuldades para diferenciar conteúdos de técnicas e para avaliar o desempenho dos alunos; dúvidas na utilização de recursos materiais e bibliográficos e na aplicação das linguagens artísticas em sala de aula.

A visão dos alunos, por outro lado, revelou que: (a) a identificação com a aula de Arte era com a simples realização de atividades que envolviam o fazer artístico; (b) não priorizam a aquisição de conhecimentos e apreensão de conteúdos de Arte e (c) não manifestam nenhuma mudança no comportamento a partir das aulas de Arte.

A segunda investigação, “Prática Pedagógica em Arte: os compromissos do professor que forma professores”5, foi realizada no centro formador do professor de Arte, o Curso de Licenciatura em Artes do Instituto de Artes e Design da Universidade Federal de Pelotas, no período de setembro de 1996 a janeiro de 1997. A questão norteadora do trabalho estava relacionada à prática pedagógica em Arte, procurando compreender e analisar essa prática e os indícios de avanços necessários à construção do conhecimento em Arte e ao comprometimento com a formação dos profissionais da área. Era de fundamental importância compreender, ainda, se essa prática exercia um papel contraditório, sendo ela reiterativa ou reflexiva.

Participaram da pesquisa professores efetivos que ministravam disciplinas teóricas do núcleo básico do 2º semestre e os que atuavam nas disciplinas práticas da parte diversificada do 8º semestre de cada habilitação (Artes Plásticas, Desenho, Música) do curso de Licenciatura Plena em Educação Artística, perfazendo um total de sete (07) disciplinas e de sete (7) professores interlocutores.

A participação dos alunos, como interlocutores desta investigação, foi de fundamental importância para a minha análise da prática pedagógica em Arte. Os alunos selecionados foram aqueles do 2º semestre do curso matriculados em duas disciplinas do núcleo comum às três habilitações - perfazendo um total de trinta e dois (32) interlocutores - e os alunos do 8º semestre estavam matriculados

5Dissertação de Mestrado que resultou na publicação do livro “A formação do professor de Arte: do ensaio... à encenação” pela editora Papirus de Campinas, São Paulo -1ª ed.: 1999; 2ª ed.: 2004; 3ª ed.: 2007.

Referências

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