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Formação profissional: olhar das reclusas

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Academic year: 2020

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Nota: A dissertação está escrita em português do Brasil segundo o novo acordo ortográfico Língua Portuguesa.

Nome: Adinéia Cabral de Sena Kowarick Endereço Eletrônico: adineiask@gmail.com Telefone: +55 98 981045555

Número do RG: 1050971997 SSP-MA

Título da Dissertação: Formação Profissional: olhar das reclusas

Trabalho realizado sob a orientação da Professora Doutora Manuela Ivone Paredes Pereira da Cunha e co-orientação da Professora Doutora Rafaela Patrícia Gonçalves Granja.

Ano de conclusão: 2018

Designação do Mestrado:

Mestrado em Crime, Diferença e Desigualdade

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTE RELATÓRIO APENAS PARA EFEITOS DE

INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE.

Universidade do Minho, ______/______/_____

Assinatura:

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AGRADECIMENTOS

A Deus, pela oportunidade da realização deste trabalho. Um sonho realizado depois de 37 anos de esperança.

Ao Diretor-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais e à Diretora do EPSCB, pela autorização para aplicar as entrevistas.

À Dra. Katarzyna Rocchi, Técnica do Serviço de Educação, pela atenção, disponibilidade, pelo apoio e amor com que me recebeu, sem os quais não teria sido possível a realização deste trabalho.

Aos guardas prisionais, que sempre me receberam com muita atenção e simpatia.

Às quinze reclusas que me doaram parte do seu tempo e com tanta singeleza se disponibilizaram a responder as perguntas das entrevistas aplicadas.

À Doutora Manuela Ivone Cunha, pela confiança e pelo apoio ao longo desta caminhada. À Doutora Rafaela Granja, pela disponibilidade, dedicação, paciência e pelo carinho com que conduziu a orientação deste trabalho.

Ao meu querido marido, Marcos Kowarick, que esteve sempre ao meu lado, me apoiando e me incentivando com muito amor e entusiasmo, e aos nossos amados filhos e netos, por terem buscado suprir a dor da ausência.

Aos meus irmãos e a minha mãe, pelos constantes incentivos e o permanente abraço de amor. A todas as pessoas que oraram por mim e àqueles que, mesmo indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho.

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Formação Profissional: olhar das reclusas

RESUMO

No contexto atual de crescimento da população prisional feminina, o presente trabalho pretende mostrar a visão das reclusas referente aos cursos de Formação Profissional realizados na Penitenciária de Santa Cruz do Bispo, na cidade do Porto em Portugal, como importante ação da Política de Reinserção Social no sistema prisional. Especificamente, buscou-se compreender como as reclusas percebem a eficácia dessa formação para suas vidas em liberdade.

A metodologia utilizada foi a qualitativa e a técnica de recolha de dados foi a entrevista. Foram aplicadas entrevistas às presas remanescentes que realizaram cursos de Formação Profissional ofertados pelo sistema prisional nos dois últimos anos. Foram feitas consultas à Técnica de Reeducação, aos documentos de estruturação dos cursos de Formação Profissional e demais documentos que apresentaram relevância para o referido estudo.

Este trabalho é apresentado em quatro capítulos. No Capítulo I, são apresentados e sistematizados os principais normativos e referências conceituais e analíticas utilizados para apoiar e sustentar esta pesquisa quanto à Prevenção Criminal e a Reinserção Social, ao Gênero e Trabalho, ao Gênero e Reclusão e da Formação Profissional nas prisões. Ao final é apresentada uma descrição da Penitenciária Feminina Santa Cruz do Bispo. A metodologia qualitativa utilizada na pesquisa, sob a perspectiva teórica e prática, é descrita no Capítulo II.

Os capítulos III e IV apresentam respectivamente: a sistematização e análise dos resultados da pesquisa quanto à caracterização sociodemográfica e jurídico penal das reclusas entrevistadas e o historial dos cursos; e os resultados do Guião de entrevista e as análises dos resultados das entrevistas com as reclusas, tanto sobre os seus olhares e expectativas sobre os cursos de Formação Profissional, no presente, quando ainda na prisão e para o futuro, fora da prisão.

As Considerações Finais e as sugestões para o aperfeiçoamento das ações de Formação Profissional na prisão, dadas as especificidades do tema e a escassa produção acadêmica, basearam-se nas respostas coletadas e nas percepções da autora em meio às reflexões, aos estudos e debates na literatura sobre a Formação Profissional no meio prisional.

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Professional Training: inmates view

ABSTRACT

In the current context of the female prison population growth, this study presents a survey to know the prisoners' vision regarding the professional training courses held in the penitentiary of Santa Cruz do Bispo in the city of Porto in Portugal, as an important action of the Social Reinsertion Policy into the prison system. Specifically, we sought to understand how inmates perceive the efficiency of these programs for their lives in freedom.

The methodology used was qualitative and the techniques of data collection were the interviews applied to the remaining prisoners who underwent courses of professional training offered by the prison system in the last two years, consultations to the technique of reeducation, to the documents of structuring of the professional training courses and other documents that presented relevance to the study.

This work is presented in four chapters, chapter I presents and systematizes the main normative and conceptual and analytical references used to support and sustain this research, namely, Criminal Prevention and Social Reintegration, Gender and Labor, Gender and training in prisons. The qualitative methodology used in the research, from a theoretical and practical perspective, is described in chapter II. Chapters III and IV present respectively: a description of the Santa Cruz do Bispo Women's Penitentiary, the systematization and analysis of the results of the research regarding the sociodemographic and criminal legal characterization of the inmates interviewed, and the history of the courses; the results of the interview script and the analysis of the results of interviews with the inmates, both on their looks and expectations about vocational training courses, in the present, while still in prison and in the future, out of prison.

The final considerations and suggestions for the improvement of vocational training in prison, given the specificities of the subject and the scarce academic production, were based on the responses collected and on the author's perceptions in the midst of the reflections, studies and debates in the literature on professional graduation in prisons.

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ÍNDICE

AGRADECIMENTOS ... iii

RESUMO ... v

ABSTRACT ... vii

CAPÍTULO I – REVISÃO TEÓRICA ... 13

1 Prevenção Criminal e Reinserção social ... 13

2 Gênero e trabalho ... 19

3 Gênero e Reclusão ... 24

4 Formação Profissional na Prisão ... 29

CAPITULO II – METODOLOGIA ... 37

1 Método de Análise ... 37

CAPÍTULO III - CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO ... 41

1 O Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo – EPESCB ... 41

2 Caracterização Sociodemográfica e Jurídico-penal das Reclusas Entrevistadas ... 45

3 Historial dos Cursos de Formação no EPESCB ... 47

CAPÍTULO IV – APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS ...51

1 Ocupação Profissional antes da Reclusão...51

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3 Trajetória na Formação Profissional: diferentes rumos ... 56

4 Experiência Profissional: exigência do mercado do trabalho ... 61

6 Desempenho e Aproveitamento Positivo ... 73

7 Expectativa de Trabalho após a Liberação ... 75

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 81

ANEXOS ... 85

Apêndice I - Guião de entrevista aplicada às reclusas ... 85

Apêndice II - Consentimento Informado ... 87

Apêndice III - Cronograma das atividades de pesquisa ... 88

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Lista de Tabelas

Tabela 1 Caracterização sociodemográfica e jurídico-penal das entrevistadas ...

44

Tabela 2 Ocupações remuneradas e escolaridade antes da reclusão ...

49

Tabela 3 Ocupações remuneradas e aspirações profissionais antes da reclusão ...

53

Tabela 4 Cursos de interesse, os realizados e experiência anterior ...

55

Tabela 5 Experiência profissional adquirida na área do curso... 59 Tabela 6 Motivação para a capacitação profissional... 62

Tabela 7 Desempenho das reclusas certificadas

... 70

Tabela 8 Expectativas após a liberação

... 72

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Lista de Abreviaturas e Siglas

ANEFA - Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos CITE - Comissão para a Igualdade do Trabalho na Europa CP - Código Penal

CPJ - Centro Protocolar de Formação Profissional para o Setor da Justiça DC - Despacho Conjunto

DGFV - Direção-Geral de Formação Vocacional DGRS - Direção-Geral de Reinserção Social

DGRSP - Direção-Geral da Reinserção Social e Serviços Prisionais DL - Decreto-Lei

EFA - Educação e Formação de Adultos EP - Estabelecimento Prisional

EPESCB - Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo FP - Formação Profissional

IEFP - Instituto de Emprego e Formação Profissional INE - Instituto Nacional de Estatística

IRS - Instituto de Reinserção Social ME - Ministério da Educação MJ - Ministério da Justiça

MTSS - Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social

OCDE - Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico OIT - Organização Internacional do Trabalho

ONU - Organização das Nações Unidas RAVE - Regime Aberto Voltado para o Exterior RAVI - Regime Aberto Voltado para o Interior RF - Regime Fechado

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INTRODUÇÃO

As políticas públicas têm origem e se desenvolvem conforme necessidades da sociedade e, uma vez implementadas, faz-se necessário avaliá-las. Fazer conhecer a sua eficiência e eficácia para poder aperfeiçoá-las e dar-lhes continuidade ou mesmo obstá-las, requer procedimentos que informem e deem conta à sociedade do resultado da aplicação dos recursos públicos utilizados no seu interesse.

O crescimento da população carcerária feminina nos últimos anos em Portugal e a correspondente ampliação dos investimentos nas ações de promoção da reinserção social das reclusas, por meio da Formação Profissional nas prisões, demandam estudos multidisciplinares sob várias perspectivas, para avaliar a eficiência e a eficácia destas ações.

O presente trabalho estudou, sob o olhar das reclusas, as ações voltadas para a qualificação profissional, que integra o Programa de Reinserção Social (PRS), desenvolvidas no estabelecimento Penitenciário Especial de Santa Cruz do Bispo – EPECB, no Distrito do Porto, em Portugal.

Assim, o objetivo geral do trabalho, foi conhecer quais as expectativas que as reclusas da Penitenciária Feminina de Santa Cruz do Bispo têm acerca da Formação Profissional ministrada na prisão como instrumento de Reinserção Social.

Para tanto, foram traçados os seguintes objetivos específicos: identificar os cursos profissionalizantes que foram aplicados nos dois últimos anos; conhecer as habilidades profissionais, teóricas e práticas, adquiridas antes da reclusão; conhecer as aptidões profissionais que as reclusas desejam desenvolver na prisão; caracterizar o perfil socioeconômico e profissional das reclusas entrevistadas; conhecer o grau de aproveitamento que as presas tiveram nos cursos; e conhecer a opinião das reclusas sobre a importância dos cursos profissionalizantes para a sua reinserção.

Busca-se com este trabalho contribuir com o aperfeiçoamento das ações de Formação Profissional de reclusas para a (re)inserção no mercado de trabalho e na sociedade. Visa apresentar como a ação profissionalizante é percebida por um contingente de reclusas com baixo nível socioeconômico e também em que medida está corresponde às suas expectativas de serem (re)inseridas no mercado de trabalho, de maneira que tenham garantidas a sua subsistência e segurança econômica, assim como melhores condições para a sua reinserção familiar, condições importantes para a não reincidência na prática de crimes.

Os estabelecimentos prisionais e prisões são aqui referidos como sinônimos e considerados enquanto instituições na perspectiva teórica do interacionismo simbólico em Carter e Fuller (2015, p. 45-46). Esses estudiosos consideram que as instituições podem ser vistas como domínios configurados

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relativamente por organizações sociais pela cultura, pelos atores sociais, constituidores, pela história, temporalidade, geografia social e demografia. Um vez, para eles, as instituições são construções sociais e, como toda construção, retroagem e moldam os comportamentos daqueles que as confrontam.

O termo recluso(a) adotado neste trabalho refere-se à pessoa que cometeu uma conduta “desviante” (Becker, 1977, p. 53), que cumpre pena privativa de liberdade por força de uma condenação judicial.

A Formação Profissional (especial) aqui é entendida como ações voltadas à públicos específicos, no caso, à população reclusa “que lhes permitam obter uma qualificação profissional essencial para o exercício de uma atividade no mercado de trabalho.” (Afonso & Ferreira, 2007, p. 30). Está inserida na “Formação para grupos com especiais dificuldades de inserção” e são promovidas pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), vinculado ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.

A partir da autorização da Direção Geral de Reinserção e Sistema Prisional (DGRSP) e da cooperação da Técnica Superior de Reeducação da Penitenciária Feminina de Santa Cruz do Bispo, foram feitas coletas das informações por meio de entrevistas com 15 (quinze) reclusas remanescentes que haviam concluídos os cursos ofertados, bem como suas percepções acerca desses cursos.

A metodologia adotada para a sistematização e análise dos dados da pesquisa foi a qualitativa, que permite a sistematização e análise dos dados da pesquisa em uma população que guarda particularidades enquanto indivíduos, com experiências distintas, origens e motivações específicas, características que inviabilizam a padronização (Haguette, 2000).

A análise qualitativa temática foi adotada em conformidade com os pressupostos e referenciais definidos por Braun e Clarke (2006, p.81), por permitir sua adequada aplicação, de modo que os dados e as análises possam refletir a realidade e também, desvendá-la.

Este trabalho constitui-se de quatro capítulos. No Capítulo I são apresentados e sistematizados os principais normativos e referências conceituais e analíticas utilizados para apoiar e sustentar esta pesquisa quanto aos seguintes temas: a Prevenção Criminal e a Reinserção Social, ao Gênero e Trabalho, Gênero e Reclusão e ao final a Formação Profissional nas prisões.

O Capítulo II trata da metodologia qualitativa utilizada na pesquisa sob a perspectiva teórica e prática, para a obtenção dos dados e para a sua sistematização e análise.

No Capítulo III faz-se a descrição do Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo - EPSCB, a sistematização e análise dos resultados da pesquisa quanto à caracterização sociodemográfica e jurídico-penal das reclusas entrevistadas e o historial dos cursos.

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O Capítulo IV apresentam-se os resultados do Guião das entrevistas e as análises dos resultados destas com as reclusas, tanto sobre o seus olhares e expectativas acerca dos cursos de Formação Profissional no presente enquanto ainda na prisão, e para o futuro - fora da prisão.

Encerra-se com as Considerações Finais e as sugestões da autora para o aperfeiçoamento das ações de Formação Profissional na prisão, como parte das ações de reinserção social para combater a reincidência criminal.

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CAPÍTULO I – REVISÃO TEÓRICA

1 Prevenção Criminal e Reinserção social

Ao longo da história, os estabelecimentos prisionais têm sido instrumentos de efetivação de controle social para onde são levadas e mantidas encarceradas as pessoas que transgridem as normas penais e são consideradas perigosas conforme a avaliação do perfil do risco (Rodrigues, 2007, p. 119). Embora existam outras medidas penais repressivas, as penas privativas de liberdade exercem maior impacto sobre a sociedade em geral e ao mesmo tempo sobre a vida de reclusos e reclusas, concebidos como fator repressor das condutas criminais. Todavia, a despeito do caráter repressor, a prisão também tem a finalidade de reabilitar a população prisional para a sua reinserção social.

A reinserção social do sistema prisional de Portugal está abrigada pela Lei nº 115/2009, pelo Código Penal de Portugal e pelo Decreto-Lei nº 215/2012, diplomas legais que apresentam medidas que refletem concepções das teorias da criminologia moderna, que dá ênfase à prevenção, sendo tema de destaque entre as várias questões relativas aos fins da pena, nomeadamente, a prevenção especial positiva ou de socialização (Dias, 2009, p.110). Nessa perspectiva, é importante ressaltar a previsão do dispositivo legal, artigo 2º da Lei de Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade (LEP), nº 115/2009, de 12 de outubro, atualizada pelo Decreto-Lei nº 215/2012 que preconiza:

1 - A execução das penas e medidas de segurança privativas da liberdade visa à reinserção do agente na sociedade, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, a proteção de bens jurídicos e a defesa da sociedade. (Portugal, 2009). Corroborando esta mesma finalidade, o Código Penal de Portugal, nos termos do artigo 43º, nº 1, dispõe: “A execução da pena de prisão […] deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes”. (Portugual, 2009).

Faz-se necessário enfatizar que nas últimas décadas a reinserção social tem despertado debates e estudos científicos, evocando o caráter multifuncional da prisão, demonstrando o relevo das atribuições do sistema prisional no processo de reinserção social, considerando o perfil socioeconômico da população carcerária. A esse respeito argumenta Baratta (2004, p.3):

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O sistema prisional deve, portanto, propiciar aos presos uma série de benefícios que vão desde instrução, inclusive profissional, até assistência médica e psicológica para proporcionar-lhe uma oportunidade de reintegração e não mais como um aspecto da disciplina carcerária – compensando, desta forma, situações de carência e privação, quase sempre frequentes na história dos sentenciados, antes de seu ingresso na senda do crime.

No mesmo sentido Rodrigues (2000, p. 24) chama atenção para o papel do Estado, como provedor dos instrumentos adequados para a reinserção social, uma vez que se trata de um dever jurídico, que tem como alicerce os direitos fundamentais dos reclusos e ao mesmo tempo o interesse da sociedade constituída em Estado.

Nessa perspectiva, é importante ressaltar que as normas voltadas à reinserção social, ainda que aplicadas de forma efetiva, não anulam o risco que a população reclusa, quando fora dos muros da prisão, tende a enfrentar, em face das imposições da dinâmica social. Assim sendo, os recursos e esforções investidos no processo de reinserção, poderão se mostrar insuficientes frente às incertezas impostas pelas mudanças, adaptações e readaptações da vida em liberdade. Logo, a reconexão com o exterior impõe certos desafios aos ex-reclusos, mesmo que entre os amigos, familiares e a vizinhança, nunca tenha havido o esfacelamento dos laços, seja por uma constância na relação dentro da prisão, seja porque alguns lá já estiveram presos, ou por conta das visitas.

Considerando o exposto convém salientar as contribuições dos estudos efetuados no estabelecimento prisional de Tires por Manuela Ivone Cunha, demonstrando a dinâmica das relações entre as pessoas fora e dentro das prisões, suas representações e significados incorporados às relações sociais estabelecidas entre as reclusas e ex-reclusas, seus familiares e vizinhos nos bairros. Foi verificada uma forma própria de expansão da “instituição total” (Goffman, 1980) para o bairro, adquirindo aspecto “material e simbólico”, “hiper-total” (Cunha, 2003, p. 11).

No que pese às implicações impostas pela “hiper-totalização”, estudos revelam que, em geral, ao serem liberados, os ex-reclusos, via de regra, enfrentarão a condição social de ex-presidiários. Em um contexto social mais amplo, que excede os muros dos bairros e ao mesmo tempo em circunstâncias específicas, como a habilitação para um emprego, tal condição marcará a sua identidade social, independentemente das circunstâncias, e da singularidade do fato criminoso. Em outras palavras, os ex-reclusos carregarão o “estigma da culpa” e este, de certo modo, vai “destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus” (Goffman, 1980, p. 14).

Além do peso do estigma, outro desafio para aqueles que tiveram interrompidas as suas trajetórias de vida é a problemática do desemprego, sobretudo para os que possuem baixa escolaridade. Situação que atinge a muitos em idade economicamente ativa e que gozam de liberdade. Importante fator socioeconômico e concretamente demonstrado segundo o Índice Nacional de Estatísticas – INE,

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indicando que, no terceiro trimestre de 2016, a população desempregada por nível de escolaridade apresentava a seguinte composição: 52,8 % de pessoas que concluíram o 3º Ciclo do Ensino Básico, 28,4%, o Ensino Secundário e pós-secundário e 18,8%, o ensino superior. (Estatísticas do Emprego – 3.º trimestre de 2016, 5/13- 20h30min, 25.09.2018). Portanto, faz-se mister compreender que o baixo grau de escolaridade e de Formação Profissional da população prisional é fator que agrava a situação da reinserção social do ex-recluso, na medida em que são barreiras para a inserção no mercado de trabalho.

Em face do exposto, é importante ressaltar que pensar em uma política criminal efetiva é pensar em Reinserção Social efetiva, vislumbrando todos os aspectos que a envolvem e que são por ela envolvidos, tendo como base os direitos fundamentais dos reclusos enquanto cidadãos integrantes da sociedade portuguesa.

Nesse contexto, se faz necessário salientar que nas últimas décadas, a política prisional tem sido modificada em Portugal, pois tem incorporado políticas criminais de reinserção social. Desse modo o Instituto de Reinserção Social foi inserido na política criminal pelo Decreto-Lei nº 319/82, 11.8. (Albuquerque, 2006, p. 285). Todavia, vale ressaltar que um marco da política prisional de Portugal foi a proposta de projeto da Lei Quadros da Reforma do Sistema Prisional de 2004, que apontou para a promoção de uma ampla reforma no sistema, a ser implantada ao longo de doze anos: 2005 - 2016.

Dentre os pressupostos constantes no referido pré-projeto da Lei Quadros de Reforma do Sistema Prisional, dois apresentam com relevo o âmago da reforma: o primeiro, de caráter geral: “A consecução de um sistema prisional humano, justo e seguro, orientado para a reinserção social dos reclusos”; e o segundo voltado para a reinserção social dos condenados: “A criação de oportunidades necessárias e adequadas para o desenvolvimento do processo individual de reinserção social de cada condenado”. (Portugal, 2004).

No contexto dessas reformas, destaca-se o DL nº 215/2012 de 28 de setembro, que criou a Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP) com autonomia administrativa na administração direta do governo de Portugal, para, conforme o preâmbulo do referido DL permitir sua ação centrada no indivíduo desde a fase pré-sentencial até a libertação e também para preparar e criar, em colaboração com os serviços do setor público e privado, oportunidades de mudança e de reinserção social dos reclusos, com o objetivo de diminuir as consequências negativas da privação da liberdade e reduzir os riscos de reincidência criminal.

A missão da DGRSP, conforme o artigo 2º do DL nº 215/2012, é:

O desenvolvimento das políticas de prevenção criminal, de execução das penas e medidas e de reinserção social e a gestão articulada e complementar dos sistemas tutelar educativo e

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prisional, assegurando condições compatíveis com a dignidade humana e contribuindo para a defesa da ordem e da paz social. (Portugal, 2012).

As vinte e oito (28) atribuições do DGRSP definidas no artigo 3º do referido DL, das quais se destacam para o tema as abaixo elencadas e suas cinco (05) alíneas, demonstram a ênfase geral da nova legislação na promoção da reinserção social do indivíduo, por intermédio da execução de programas e ações de caráter educativo e formativo, por meio do ensino, da Formação Profissional e do trabalho. Tais atribuições foram estabelecidas com foco no indivíduo e na sua preparação para a liberdade e reinserção social desde o processo de julgamento, a saber:

Artigo 3º. Atribuições:

a) Apoiar o membro do Governo responsável pela área da justiça na definição e execução da política criminal, especialmente nas áreas da prevenção da criminalidade, da reinserção social e da execução das penas e medidas privativas de liberdade, assegurando a avaliação permanente das condições de funcionamento dos sistemas tutelar educativo e prisional; [...] e) Promover e assegurar a avaliação permanente das condições de funcionamento do sistema tutelar educativo, de reinserção e prisional; [...] g) Promover a dignificação e humanização das condições de vida nos centros educativos e estabelecimentos prisionais, visando à reinserção social, designadamente através da prestação de cuidados de saúde, do ensino, da Formação Profissional, do trabalho, de iniciativas de caráter cultural e desportivo, da interação com a comunidade e outras que permitam o desenvolvimento da personalidade; [...] m) Coordenar e desenvolver, num quadro de sustentabilidade económica e financeira e em articulação com outras entidades públicas ou privadas, as atividades económicas dos centros educativos e dos estabelecimentos prisionais, com o objetivo de alcançar, nomeadamente, a Formação Profissional, a empregabilidade e a reintegração profissional, quer durante o cumprimento da pena ou medida, quer na vida livre; [..,] o) Conceber, executar ou participar em programas e ações de prevenção da criminalidade e contribuir para um maior envolvimento da comunidade na administração da justiça tutelar educativa e penal, através da cooperação com outras instituições públicas ou particulares e com cidadãos que prossigam objetivos de prevenção criminal e de reinserção social. (Portugal, 2012).

Esta concepção multidimensional do processo de cumprimento da pena, com foco na recuperação e reinserção social do preso, tem por base conceitos e práticas da moderna política de execução penal. O Direito Penitenciário de Portugal e o sistema de execução das penas e de medidas de segurança, definidos na Lei nº 115/2009, vêm atribuindo importância ao papel do Instituto de Reintegração Social, nomeadamente aos programas e projetos desenvolvidos para a readaptação à vida

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em liberdade, mediante o que preconizam os dispositivos legais.

A Lei em referência assim formalizou, no artigo 2º, que trata dos princípios gerais da execução e dos direitos e deveres do recluso, a finalidade da execução das penas e medidas de segurança:

Artigo 2º. Finalidades da execução:

1 - A execução das penas e medidas de segurança privativas da liberdade visa à reinserção do agente na sociedade, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, a protecção de bens jurídicos e a defesa da sociedade.

2 - A execução da prisão preventiva e do internamento preventivo visa assegurar a satisfação das exigências cautelares que justificaram a sua aplicação. (Portugal, 2019).

Em sequência, o artigo 3º e suas alíneas estabelecem os princípios que orientam a execução penal, referindo a preocupação em minimizar os efeitos da reclusão sobre a personalidade do recluso, ao mesmo tempo que busca evitar a discriminação e estimular a sua responsabilidade em ser um agente ativo do seu processo de reinserção social:

Artigo 3º. Princípios orientadores da execução

1 - A execução das penas e medidas privativas da liberdade assegura o respeito pela dignidade da pessoa humana e pelos demais princípios fundamentais consagrados na Constituição da República Portuguesa, nos instrumentos de direito internacional e nas leis.

2- A execução respeita a personalidade do recluso e os seus direitos e interesses jurídicos não efectados pela sentença condenatória ou decisão de aplicação de medida privativa da liberdade.

3- A execução é imparcial e não pode privilegiar, beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum recluso, nomeadamente em razão do sexo, raça, língua, território de origem, nacionalidade, origem étnica, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução ou situação económica, condição social ou orientação sexual. 4 - A execução respeita os princípios da especialização e da individualização do tratamento prisional do recluso, sem prejuízo do disposto no número anterior.

5 - A execução, na medida do possível, evita as consequências nocivas da privação da liberdade e aproxima-se das condições benéficas da vida em comunidade.

6 - A execução promove o sentido de responsabilidade do recluso, estimulando-o a participar nestimulando-o planeamentestimulando-o e na execuçãestimulando-o destimulando-o seu tratamentestimulando-o prisiestimulando-onal e nestimulando-o seu processo de reinserção social, nomeadamente através de ensino, formação, trabalho e programas.

7 - A execução realiza-se, na medida do possível, em cooperação com a comunidade. (Portugal, 2019).

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No artigo 4º e alíneas, nota-se a preocupação com o tratamento diferenciado de adolescentes, idosos, mulheres, estrangeiros e minorias linguísticas, para buscar assegurar as identidades culturais, sociais e biológicas. Na alínea 1, é previsto que a medida de segurança tem especial atenção à reinserção social do jovem interno, em relação ao seu aprendizado e Formação Profissional, por meio de programas específicos, conforme mencionado abaixo:

Artigo 4.º. Princípios orientadores especiais

1 - A execução das penas e medidas privativas da liberdade aplicadas a jovens até aos 21 anos deve favorecer especialmente a reinserção social e fomentar o sentido de responsabilidade através do desenvolvimento de actividades e programas específicos nas áreas do ensino, orientação e Formação Profissional, aquisição de competências pessoais e sociais e prevenção e tratamento de comportamentos aditivos.

2 - A execução das penas e medidas privativas da liberdade aplicadas a maiores de 65 anos deve respeitar as suas necessidades específicas e o seu estado de saúde e de autonomia, nomeadamente garantindo-lhes o auxílio necessário nas actividades da vida diária e assegurando-lhe condições de alojamento, segurança, actividades e programas especialmente adequados. 3 - A execução das penas e medidas privativas da liberdade aplicadas a mulheres deve ter em consideração as suas necessidades específicas, nomeadamente em matéria de saúde, higiene, protecção da maternidade e educação parental.

4 - A execução das penas e medidas privativas da liberdade aplicadas a reclusos estrangeiros ou pertencentes a minorias étnicas ou linguísticas deve, na medida do possível, permitir a expressão dos seus valores culturais, atenuar as eventuais dificuldades de integração social ou de domínio da língua portuguesa, designadamente proporcionando contactos com entidades consulares ou diplomáticas ou organizações de apoio aos imigrantes, cursos de português, tradução de documentos ou intervenção de intérpretes. (Portugal, 2019).

No artigo 5º e alíneas, a legislação prevê o princípio da individualização do tratamento prisional, sua base e a função do tratamento prisional, com vistas à promoção da reinserção social dos reclusos, a fim de evitar a reincidência, e ainda a previsão de alterações progressivas no regime de execução com vistas à vida em liberdade.

Artigo 5º. Individualização da execução

1 - A execução das penas e medidas privativas da liberdade orienta-se pelo princípio da individualização do tratamento prisional e tem por base a avaliação das necessidades e riscos próprios de cada recluso.

2 - O tratamento prisional consiste no conjunto de actividades e programas de reinserção social que visam à preparação do recluso para a liberdade, através do desenvolvimento das suas responsabilidades, da aquisição de competências que lhe

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permitam optar por um modo de vida socialmente responsável, sem cometer crimes, e prover às suas necessidades após a libertação.

3 - O tratamento prisional é programado e faseado, favorecendo a aproximação progressiva à vida livre, através das necessárias alterações do regime de execução. (Portugal, 2019).

Em suma, o desenvolvimento desta política de prevenção criminal conduziu na atualidade ao desenvolvimento de estratégias de reinserção social, para combater a reincidência por meio de um conjunto de atividades e programas. Estes, após a avaliação dos aspectos condicionantes de vulnerabilidades e as necessidades de cada recluso, buscam imprimir mudanças de comportamento no que tange ao desenvolvimento das suas responsabilidades frente à sociedade e a aquisição de competências, para que, quando estiverem em liberdade, tenham a possibilidade de escolher um estilo de vida em conformidade com os padrões sociais e sejam capazes de suprir suas necessidades sem cometer crimes.

2 Gênero e trabalho

Fonte: Google Imagens.

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início do século XX, no norte de Portugal, com tarefas distintas divididas, em que as mulheres transportam nas suas cestas os frutos que foram colhidos pelos homens.

A realidade de outrora, bem como a atual, demonstram não apenas a divisão do trabalho entre homens e mulheres com diferenças nas atividades desempenhadas, mas também outras diferenças que envolvem privilégios, como salários entre pessoas com a mesma profissão, ocupação de cargos de comando entre pessoas com a mesma formação e ainda a não aceitação e o tratamento dispensado às mulheres que abraçam profissões historicamente consideradas masculinas. Apesar das perceptíveis mudanças que vêm ocorrendo nas últimas décadas, tais questões permanecem e se mantêm invisíveis aos olhos empíricos do cidadão comum, porque estão inseridas no contexto cultural das sociedades. Assim, os estudos desenvolvidos por pesquisadores vêm buscando desvendar as questões que envolvem as implicações entre a ideologia de gênero e a divisão do trabalho em vários aspectos.

A esse respeito, é importante enfatizar que, segundo Connell (2002, citada em Amâncio, 2007, p.181), “A divisão sexual do trabalho foi a primeira estrutura de gênero reconhecida pelas Ciências Sociais”, tendo em vista a problemática oriunda das discrepâncias entre o trabalho dos homens e o das mulheres.

O conceito de gênero, refere-se, às características construídas socialmente, atribuídas a homens e mulheres como sendo-lhes naturais, portanto, “[…] codificando personalidades, identidades e comportamentos, idealtipicamente.”. (Aboim, 2007, p. 35).

Para Amâncio (2007, p183), a questão de gênero, no que concerne às diferenças entre homens e mulheres, a salário e à ocupação, revela relação de poder “[...] que se considere a hierarquia de poder entre os sexos”, assim “[...] como os significados simbólicos que enformam as práticas” (Connell, 2002, p.36) “[...] e conferem sentido à natureza e organização do trabalho” (Connell, 1987, p.36).

Nesse sentido, os estudos realizados por Schouten (2011) trouxeram contribuições importantes para a realização deste trabalho pela sua abrangência e profundidade.

Segundo esta autora, a divisão do trabalho com fundamento na da ideologia de gênero é comum em todas as sociedades, mas em cada sociedade essa divisão ocorre de forma diferente. Nas sociedades europeias, por exemplo, as profissões consideradas caracteristicamente femininas são denominadas “profissões de assistência”, “profissões administrativas” e as “ligadas ao comércio”. As de assistência são: “enfermeiras, professoras, educadoras, assistentes sociais”, as ocupações ligadas ao comércio e serviços: empregadas de balcão, cozinheiras, mulheres-a-dia e empregadas de limpezas. A justificativa estaria baseada na força física das mulheres, considerada reduzida em relação à dos homens, portanto, propícia às tarefas mais leves, e também ao formato dos dedos para execução de serviços do ramo têxtil,

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eletrônicas, bordados etc. (Schouten, 2011, p. 88).

Conforme a autora supracitada, não só as características físicas encontram respaldo ideológico para ocupação de mulheres nas tarefas consideradas femininas, mas também a ideia de que as mulheres teriam uma aptidão natural para desempenhar tarefas voltadas ao “cuidar”, que estariam relacionadas com o instinto maternal. (Schouten, 2011, p. 89). O “cuidar” é uma habilidade intrínseca em várias profissões, entre outras, a de secretária, cuidadora de animais, etc., em todos os níveis: horizontais e verticais. Como exemplo da relação estabelecida entre o instinto maternal e a tarefa ocupacional como cuidadora, cita o discurso de um empresário nos estudos realizados no Distrito de Castelo Branco:

Na parte que temos de tratar da maternidade dos animais, de leitões, é muito melhor ser tratado por mulheres do que por homens, porque há um instinto maternal inerente ao sexo feminino que, mesmo sendo um animal, nota-se a diferença (RoMann, 2006, citado em Schouten, Schouten, 2011, p. 89).

Também a autora constatou que algumas qualidades de cunho psicológico são atribuídas às mulheres, a exemplo, as relativas à aptidão para comunicação e o trabalho em equipe. Essas aptidões são incorporadas visando chamar atenção para o preenchimento das vagas de emprego destinadas a determinadas funções, como a de relações públicas. (Schouten, 2011, p. 90).

Além dos atributos pessoais, Schouten (2011) afirma que a localização geográfica exerce influência sobre a atividade feminina. Por isso, algumas atividades são consideradas próprias para as mulheres quando executadas dentro ou próximo de sua casa, para assim, poderem conciliar as tarefas domésticas e o cuidado com os filhos, quais sejam: serviço com costuras, cuidados com animais, “[...] teletrabalhos com aplicação das TIC- Tecnologia da Informação e da Comunicação”, em parte, tarefas no sistema de justiça e no ensino, possíveis de se trabalhar no âmbito da residência. (Schouten, 2011, p. 90).

Entretanto, no contexto da dinâmica social, têm ocorrido mudança, quanto ao trabalho feminino uma vez que as mulheres vêm conquistando espaço no mundo do trabalho, e constata-se o aumento de mulheres trabalhadoras fora do lar, o seu ingresso em atividades consideradas masculinas, embora muitas jovens ainda busquem qualificação em profissões consideradas femininas. (Schouten, 2011, p. 95).

De forma paralela, resistem às mudanças à “segregação vertical”, pois independentemente da atividade, do seu desempenho, é muito difícil ainda as mulheres ascenderem dentro da profissão a ponto de atingir o “topo”, em virtude da discriminação a que estão afetas quando desempenham atividades

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ou ocupam cargos considerados masculinos, “[...] a sobrevisibilidade e os escárnios dos quais são alvo, falta de respeito, inclusive o assédio sexual dificultam a vidas dessas trabalhadoras.” (Schouten, 2011, p. 92).

Nesse sentido, Amâncio (1994, p. 73) explicita:

A categoria de pertença das mulheres colocadas em posições ou atividades consideradas masculinas adquire particular saliência aos olhos dos observadores, o que dificulta o seu comportamento, que é suposto responder, simultaneamente, às exigências do contexto em que estão inseridas e às expectativas que os outros associam à sua categoria de pertença.

Quanto à concepção referente à segregação horizontal e vertical como características inerentes a estruturação da mão de obra no mercado de trabalho, Rego (2003, p.35) afirma que persiste uma forte concentração da mão de obra feminina num conjunto restrito de atividades e profissões, frequentemente associadas a atividades que constituem uma extensão profissionalizada das tarefas tradicionalmente desempenhadas pelas mulheres no contexto do espaço doméstico. Veja-se o exemplo do ramo das atividades que apresentavam maiores taxas de feminização: serviços pessoais e domésticos – 98,8%, saúde, ação social – 80,6% e educação – 75,6% (Inquérito ao Emprego - INE, 1998).

A respeito da segregação das ocupações, Amâncio (1994, p. 73) assevera que o significado masculino atribuído às profissões no contexto do trabalho é extensivo ao prestígio das profissões, tendo em vista que algumas profissões, por serem consideradas “femininas”, são tendentes a ser menos prestigiadas, indicando diferentes significados quando o trabalho é desempenhado por homens e por mulheres, refletindo a relação de poder na divisão sexual do trabalho.

Estudos indicam que um dos aspectos de resistência às mudanças diz respeito aos salários. Em geral, as mulheres ganham menos, independentemente da posição que ocupam, ou do trabalho que executem. Em Portugal, tal prática é ilegal, porém, a disparidade de salários ainda subsiste no setor privado, o que contraria a “legislação laboral e as orientações da Comissão Europeia, que condenam qualquer discriminação baseada em gênero, e não obstante a vigilância da Comissão para a Igualdade do Trabalho na Europa (CITE) e outras entidades”, as práticas resistem às mudanças. A autora ressalta que os avanços, em especial os normativos, geram um efeito contraditório, já que um dos fatores que leva as mulheres a receberem baixos salários é o reconhecimento dos seus direitos laborais pelos empregadores, o que dificulta as contratações delas, levando-as a estabelecer relações precárias de emprego com baixos salários. (Amâncio, 1994, p. 98).

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no mercado de trabalho é desigual, o que se traduz na marcante assimetria entre os rendimentos das mulheres e dos homens, levando a um número bem maior de mulheres em situação de pobreza. (Rego, 2003, p. 03).

No âmbito de Portugal, é importante ressaltar os reflexos do imperativo previsto no artigo 141º, do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia, em 1957, consagrando o princípio de igualdade entre homens e mulheres atribuindo ao trabalho o mesmo valor. Foi a partir de1975 que o princípio da igualdade se tornou mais abrangente, com novas diretivas, garantindo a igualdade de oportunidades ao emprego, à formação e à promoção profissional. Atualmente, existe um vasto leque normativo que garante a igualdade de direitos entre homens e mulheres, abrangendo matérias como a segurança social, os regimes legais e os regimes profissionais. (Glossário constante no Portal da União Europeia, http://europa.eu).

Além das normas previstas na Constituição Portuguesa, integram este leque de diretivas as seguintes legislações: o Decreto-lei nº 392/79, de 20 de setembro; Decreto-Lei nº426/88, de 18 de novembro; Lei nº105, de 13 de setembro, que regula a proteção da Maternidade e da paternidade. Vale lembrar que as organizações não governamentais e organizações internacionais também contribuíram para os avanços neste setor, com destaque para a ONU, a OIT, a OCDE e o Conselho da Europa. (Glossário constante no Portal da União Europeia, http://europa.eu).

Finalmente, como bem caracteriza a literatura, a despeito dos avanços conquistados e revelados na legislação que promoveu o Estatuto de Igualdade e Cidadania para Homens e Mulheres, verifica-se ainda que a maioria dos indicadores e costumes reproduzem padrões de papéis e expectativas sociais em função da divisão sexual tradicional do trabalho. Situação esta em que persistem as diferenças em desfavor das mulheres, entre elas, as das oportunidades de ocupação profissional e renda.

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3 Gênero e Reclusão

A população reclusa feminina tem crescido nos últimos anos e a atenção para esta mudança não tem passado desapercebida por alguns autores, a exemplo:

O índice de reclusão feminina em Portugal tem se destacado nos últimos anos como um dos mais elevados da Europa. Estamos perante uma especificidade não apenas do contexto português, mas de toda a Península Ibérica, onde a proporção de mulheres entre a população prisional tem oscilado entre 8% e os 9%. (Almeda, 2003, citado por Matos e Machado, 2007, p. 1041).

Mais recentemente, dados estatísticos revelam que entre 2010 e 2015, as mulheres tiveram presença discreta no universo prisional de 6,1% do total de reclusos (Direção Geral de Política de Justiça – DGPJ, 2016, p. 01), mas o mesmo boletim estatístico demonstra que em Portugal a taxa de crescimento populacional carcerário feminino foi maior nesse período que a taxa masculina. Entre os anos de 2010 e 2015, o número de reclusos aumentou cerca de 22,5%. Em 2010 eram 11.613 e, em 2015, 14.222. No período, a participação das mulheres cresceu em 37,5%, enquanto a dos homens foi de 21.6%. Segundo os dados estatísticos referentes à primeira quinzena do mês de setembro de 2016, a população carcerária feminina era de 837 reclusas, distribuída em dois estabelecimentos femininos: Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo – EPESCB, no distrito do Porto e Estabelecimento Prisional Regional de Odemira, no distrito de Évora, e em mais 8 unidades mistas. (DGRSP, 2016).

Embora com variações em relação aos dados acima, a figura a seguir demonstra o cenário no qual o número de mulheres recluídas aumentado em relação ao número de homens. Entre 2010 e 2016, houve um aumento de 18,7% do número total de reclusos, passando de 11.613 em 2010 para 13.779 em 2016. No total houve uma diminuição em relação ao ano anterior, entretanto, comparando-se à população carcerária, constata-se um número mais acentuado de mulheres: 38,6%, enquanto o de presos é de 17,5%.

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Figura 1 – Recluso nos estabelecimentos prisionais segundo o sexo.

Fonte: DGRSP (2016).

De acordo com Júlia Sudbury (citado em Silva, 2013, p. 63), o aumento “exponencial” da população prisional feminina é constatado a partir da década de 70, do século passado nos países ocidentais. A autora apresenta como uma das principais razões para esse crescimento a implementação de políticas neoliberais, que, entre outras, tem como característica a decadência do Estado de Bem-Estar Social e “[...] o reforço do aparelho punitivo do Estado, que se restringe à manutenção da ordem impondo a gestão policial e judiciária da pobreza.”. (Wacquant, 2000, citado em Silva, 2013, p. 63). Acrescenta a autora que tais políticas promovem “injustiças e desigualdades socioeconômicas”, atingindo principalmente as mulheres, gerando a “feminização da pobreza” por acirrar a estratificação econômica e de gênero. (Silva, 2013, p. 64).

Segundo Almeda (2002 citado em Silva, 2013, p. 64), o que leva a grande maioria das mulheres à prisão, de modo geral, é o cometimento dos “crimes de pobreza”, ou seja, delitos envolvendo drogas e os crimes contra a pessoa, “crimes violentos estão relacionados com retaliações a anos de abuso”.

Um exemplo bastante concreto, dentro de um contexto de “feminização da pobreza” é a questão do tráfico retalhista de drogas que surge como uma oportunidade ilegal para suprir necessidades de algumas mulheres não inseridas no mercado de trabalho formal, sem rendimentos, “desprovidas de recursos materiais, escolares, profissionais e econômicos,” conforme demonstra o estudo efetuado por Manuela Ivone Cunha no EP de Tires em Portugal:

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[...] Esta atividade, comumente presente nos espaços urbanos em que habitam, e tendencialmente revestida de carácter de informalidade e domesticidade, permite às mulheres obterem rendimentos adicionais para agregado familiar numa lógica supletiva, ao mesmo tempo que possibilita a desempenhar papéis de gênero tradicionais. (Cunha, 2002, citado em Granja, 2015).

Buscar conhecer as causas geradoras da reclusão feminina tem sido objeto de estudos na área da criminologia feminina. Não somente em Portugal, mas em outros países da Europa, como na Espanha, onde o tráfico de drogas tem levado muitas mulheres à prisão. São mulheres com menos recursos econômicos, laborais e educativos em relação aos homens reclusos. (Almeda, 2002, citado em Silva, 2013, p. 63).

O crescente aumento do número de mulheres reclusas é um fenômeno de impacto social que suscita interesse em saber, não somente quais as causas do aumento da criminalidade feminina, mas também a situação das mulheres que se encontram recluídas nos estabelecimentos prisionais, instituições que reproduzem o modelo das relações de gênero no contexto da vida em liberdade “[...] as relações de gênero operam em todos os níveis da vida social.” (Schouten, 2011, p.13).

Logo, a ideologia das relações de gênero e as teorias sobre a criminalidade feminina, subjacentes a essas relações, encontram eco no sistema penitenciário feminino, com a reprodução das representações do papel da mulher no exterior. A ideologia de gênero revela-se em elementos materiais, organizacionais e simbólicos da instituição “[...] as cadeias não existem no vácuo e, de algum modo, as lógicas internas reenviarão as lógicas extra prisionais, quer tomemos apenas o grupo recluso quer a instituição no seu todo.” (Cunha, 1994, p. 9).

Nestes termos, o ajustamento institucional das mulheres recluídas visa envolvê-las em atividades “ocupacionais/laborais e de formação que tenham em consideração aquele modelo e pouco ou nada vocacionadas para dotá-las de competências sócio profissionais à integração no mercado de trabalho e na própria dinâmica social”. (Almeda, 2003; Antony, 2007, Azaola, 2007, Biblão, 2007, Ramirez & Gonzales, 2007, citados em Fonseca, 2008, p. 26). Assim, há um reforço do papel de gênero com programas de intervenção que, nem sempre, condizem com as necessidades das reclusas e, mesmo assim, nem todas têm acesso. (Pollock, 1998, citados em Fonseca, 2008, p. 26).

Nessa perspectiva, o regime disciplinar adotado dentro das penitenciárias femininas é mais rígido do que nas penitenciárias masculinas, por refletirem concepções de “feminino e feminilidade”. Sobre a disciplina reguladora da conduta das reclusas, Silva (2013, p. 62) argumenta:

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O aparato, regulador e disciplinar, que governa o género consigna a dominação masculina sob o feminino, incitando à docilização diferenciada dos corpos femininos. Este aparato é manifesto nas prisões femininas gerando regimes de vigilância intensiva e disciplina, centrados em normas hegemónicas de comportamento feminino, através da imposição de modelos de feminilidade e domesticidade.

Existem registros de que nas prisões femininas há um número maior de processos disciplinares se comparadas com as prisões masculinas (Fonseca, 2008, p. 27). Estudos revelam que, ao narrarem suas trajetórias dentro da prisão, é comum constar nos discursos das reclusas as sanções disciplinares, (Matos, 2007, citado em Fonseca, 2008, p. 27). Para Almeda (2002), Carlen (2012) citadas em Silva (2013, p.64), a rigidez disciplinar é fruto das percepções sobre a ideologia de gênero que as/os guardas incorporaram como modelo. Por isso, adotam disciplinas mais rígidas quanto ao comportamento das reclusas.

A dimensão da concepção do papel de gênero apresenta reflexos históricos na política de reabilitação das reclusas e perdura em vários países. Estudos realizados em seis países europeus, Inglaterra, França, Alemanha, Hungria, Itália e Espanha, revelaram que os programas dirigidos para reclusas visavam à reprogramação cognitiva, mas tais programas, de modo geral, não resolvem a vulnerabilidade imposta pela exclusão socioeconômica na qual se encontra a maioria delas. Poís, quando livres, sentem-se, “confusas e culpadas” ao se depararem com situações “que são piores” do que as de antes de serem submetidas aos programas de reprogramação cognitiva durante a reclusão (Carlen, 2007, p. 1012).

Em Portugal, estudos realizados por Cunha (1994) no Estabelecimento Prisional Especial de Tires- EPET, revelaram que a questão de gênero se mostrou prevalente na definição dos papéis sociais. Segundo a autora, no início do funcionamento deste estabelecimento prisional, criado em 1953, tanto as ocupações disponibilizadas às reclusas quanto a organização e instalações do EPET refletiam a ideologia concernente à divisão profissional de gênero das modalidades de trabalho com características “domésticas”. Os estudos revelaram também que esta situação, em rigor, não acompanhou as mudanças percebidas no seio da sociedade, pois ficou constatado que as atividades laborais desempenhadas pelas reclusas eram as mesmas vigentes desde do início do funcionamento da Penitenciária, demonstrando assim a resistência desta instituição e a estreita absorção aos avanços, especificamente no que concerne “geografia de gênero”, atinente às ocupações profissionais das reclusas. (Cunha, 1994, p.75).

Percebe-se que as questões de gênero referem-se aos estereótipos construídos socialmente e subjacentes às diferenças naturais entre homens e mulheres. Contudo, não há como a busca pela

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igualdade de direitos e a imparcialidade da execução penal descaracterizar em homens e mulheres naquilo que naturalmente são diferentes. Nesse aspecto, entre os princípios orientadores da execução, com previsão legal no artigo 3º, da Lei nº 115/2009, de 12 de outubro, destaca-se o inciso 3, que prevê a imparcialidade da execução, não podendo “beneficiar, prejudicar, privar de qualquer direito ou isentar de qualquer dever nenhum recluso,” em razão de variáveis, entre elas, o sexo. Todavia, legalmente, não há negação das diferenças individuais, o que é regrado pelo inciso 4 ao dispor que “A execução respeita os princípios da especialização e da individualização do tratamento prisional do recluso, sem prejuízo no número anterior”. (Portugal, 2009).

Especificamente, com relação ao tratamento que deve ser dispensado às mulheres, a norma encontra abrigo no artigo 4º, inciso 3, entre os princípios orientadores especiais, que determina: “A execução das penas e medidas privativas da liberdade aplicadas a mulheres deve ter em consideração as suas necessidades específicas, nomeadamente em matéria de saúde, higiene, proteção da maternidade e educação parental.”.

Tais especificidades foram introduzidas no ordenamento jurídico penitenciário, pelo Decreto-Lei nº 265/79, de 1 de agosto, (revogado pela Lei 115/2009, de 11 de outubro), a princípio, a fim de atender as necessidade das reclusas mães. Os estabelecimentos prisionais femininos receberam a denominação “Especiais”, tendo em vista se tratar de necessidade peculiar das mulheres (artigo 158 nº 1, alínea c). O cumprimento das penas privativas da liberdade é executado em estabelecimentos prisionais especiais (artigo 158, nº 8, alínea b). Nestes estabelecimentos, há instalações específicas para mulheres grávidas, para reclusas cujos filhos sejam menores de 1 ano e infantário para crianças de até 3 anos de idade (artigo 161).

Apesar das mudanças impingidas pelas normas, visando atender às necessidades específicas das mulheres, ainda subsistem concepções estereotipadas de gênero, presentes no regime de tratamento prisional. A esse respeito, Granja (2015, p. 123), citando Cunha, e Granja (2012) refere que embora tenha ocorrido uma mudança quanto ao foco na “domesticidade e na maternidade” e, apesar de ambas as concepções terem sido excluídas dos regulamentos oficiais a partir de 1974, “algumas considerações do modelo de reabilitação que vigoram mantêm-se infundidas e imbuídas nas interações cotidianas e nas práticas do dia a dia dos estabelecimentos prisionais femininos atuais”.

Nessa perspectiva, Fonseca, (2008, p. 26) ressalta a importância da construção de uma política criminal que considere as questões de gênero como um relevante instrumento regulador da vida em sociedade, com o propósito de evitar a reprodução do modelo masculino nas concepções, organizações e administrações dos regimes penitenciários. Concepções de que as reclusas devem possuir aptidões,

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competências, destrezas adequadas ao que é considerado, previamente, condição feminina. Nesse enfoque, a reclusa será considerada duplamente transgressora por ter violado tanto as normas penais como as normas sociais, ao ser vista como uma mulher que não desempenhou o papel feminino de forma adequada.

4 Formação Profissional na Prisão

De modo mais abrangente, a dinâmica do sistema educacional e da Formação Profissional sofre os reflexos das transformações que ocorrem nas sociedades, mais especificamente as transformações socioeconômicas, na medida em que com o passar do tempo, os “saberes e as técnicas” passam a ser obsoletos. Mediante esse entendimento é que a Formação Profissional de adultos é apresentada como instrumento estratégico, capaz de promover a inserção e permanência do trabalhador no mercado laboral, além possibilitar o “desenvolvimento pessoal e social das pessoas”. (Osório, 2005, p. 199).

Em Portugal, a Formação Profissional para adultos é caracterizada por percursos formativos flexíveis, visando a adequação de uma qualificação profissional frente às necessidades dos destinatários. Tem por objetivo a manutenção, progressão ou reintegração no mercado de trabalho, por meio da aquisição ou do desenvolvimento de conhecimentos e competências nos aspectos técnico e social. (Afonso & Ferreira, 2007, p. 28).

Dessa maneira, a qualificação adquirida pela Formação Profissional tem a importante função de constituir modelos sociais mais coesos por implicar a redução dos riscos de exclusão e de segmentação no mercado de trabalho. Por outro lado, de modo geral, contribui, de forma significativa, no processo de competitividade das empresas e na melhoria da produtividade. (Resolução nº 173/2007, 7 de novembro, p. 8137).

Segundo Ferreira e Afonso (2007, p. 30) as principais modalidades de Educação e Formação Profissional voltadas para pessoas adultas, economicamente ativas, tanto as empregadas quanto as desempregadas, assim como as pessoas que estão em risco de desemprego ou grupos em risco de exclusão, são as seguintes:

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1- Cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), destinados aos indivíduos qualificados ou não qualificados, acima de 18 anos, com vistas a melhorar os níveis de escolaridade e qualificação profissional, por meio de oferta conjunta de educação e formação, “que potencie as condições de empregabilidade e certifique as competências adquiridas ao longo da vida” (IEFP, p. 28).

2- Formação para Grupos com Especiais Dificuldades de Inserção, dirigidas exclusivamente para os grupos com dificuldades de inserção no mercado de trabalho. Compreende quatro submodalidades:

2.1 Cursos de Formação Profissional para Grupos Desfavorecidos. 2.2 Curso de Formação Profissional Especial.

2.3 Portugal Acolhe.

2.4 Formação Profissional de Pessoas com Deficiência.

No contexto deste trabalho, entre as modalidades de Formação Profissional, destaca-se a Formação Profissional Especial, diferente das demais porque diz respeito a ações de Formação Profissional dirigidas a públicos exclusivos (Ferreira & Afonso, 2007, p. 30).

A promoção, organização e o funcionamento da Formação Profissional Especial foi regulamentada pelo Despacho Normativo nº 140/93, de 6 de julho, do Ministério do Emprego e Segurança Social, é dotada de características específicas, voltadas para a adaptação, formação e inserção de um público alvo. Visa, especificamente, qualificar e inserir socio- profissionalmente pessoas que se encontram em situação econômica bastante difícil, ou pertençam a grupos desfavorecidos, vulneráveis ou marginalizados, nomeadamente: desempregados de longa duração, pessoas com deficiência, minorias étnicas, imigrantes, reclusos, reclusos, toxicodependentes e ex-toxicodependentes, outras pessoas com índole comportamental e, em geral, pessoas que não atingiram o nível correspondente à escolaridade obrigatória ou se debatem com acentuada dificuldade de aprendizagem. (Portugal, 1993, Art. 1º, 4º).

A Formação Profissional Especial destinada à população que se encontra recluída tem por base os “[...] direitos fundamentais dos reclusos e os interesses da Sociedade constituída em Estado”. (Rodrigues, 2000, p. 24).

Como direito fundamental da população reclusa estão atribuídos ao Estado a definição da forma de organização, o planejamento, a execução e a avaliação das ações de Formação Profissional nos Estabelecimentos Prisionais. Coube ao Estado o “[...] específico dever jurídico de prestação ao cidadão

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recluso” disponibilizar os mecanismos preparatórios para que possa conduzir a sua vida sem mais reincidir (Rodrigues, 2000, p. 24).

Nesse contexto, a Formação Profissional passou a adquirir um novo significado com ampliação do papel desta em relação ao meio livre, por não mais se tratar de um instrumento promotor de meios para a aquisição de competências para o desenvolvimento pessoal, profissional e a melhoria no processo de competitividade, mas também de meios de evitar a reincidência criminal com a capacitação dos reclusos para a reinserção social. Neste particular, a Formação Profissional dirigida aos reclusos resulta em interesse de estudo, notadamente quanto ao olhar do recluso enquanto destinatário das ações de formação, como eles a recebem e quais as suas expectativas.

A Formação Profissional, assim como o trabalho destinado aos reclusos, que antes do DL nº 265/79, de 1º de agosto, cumpriam o papel terapêutico, disciplinar e ocupacional, como mecanismo de segurança e controle, a partir do DL em referência, passaram, a ter como função capacitar profissionalmente os reclusos para a vida em liberdade. “Perante as transformações que atravessamos, o trabalho deixou de ser esta técnica disciplinar, que outrora domesticava o corpo e a mente e passou a ser visto como um direito [...]”. (Roseira, 2012, p.3).

Conforme o Art. 63. do DL em referência o princípio geral, alínea “1”, destaca que “o trabalho, a formação e o aperfeiçoamento profissional”, têm o papel fundamental, “de criar, manter e desenvolver no recluso a capacidade” adequada para garantir a sua vida, quando em liberdade, “facilitando a sua reinserção social”. Para isso, deve ser dada a oportunidade de frequentar cursos de formação e aperfeiçoamento profissionais a todos os reclusos que estiverem aptos ao trabalho. (Art. 63, alínea 4).

O DL nº 265/79 foi revogado pelo DL nº 115/2009, de 12 de outubro, que aprovou o Código de Execução e Medidas de Segurança, que no artigo 38º, a mesma concepção ganha um contorno mais amplo ao estabelecer que o “ensino, a Formação Profissional e o trabalho” são organizados de forma contextual com vistas a “[...] promover condições de empregabilidade e de reinserção social, no quadro das políticas nacionais de educação, de emprego e de formação de adultos.”.

O mesmo diploma legal, no artigo 40º, alínea 1, define as ações de formação e aperfeiçoamento profissionais nos Estabelecimentos Prisionais, considerando não o contexto socioeconômico, mas o aspecto individual, no que tange às aptidões e necessidades do recluso, priorizando a empregabilidade: Nos estabelecimentos prisionais são desenvolvidas acções de formação e aperfeiçoamento profissionais que, considerando as necessidades e aptidões do recluso, privilegiem a sua empregabilidade; Na alínea 2, do mesmo artigo, refere que a Formação Profissional em contexto prisional, enquadra-se nas políticas nacionais de educação de adultos.

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Diante do exposto, pode-se inferir que reinserção social não é um conjunto de ações isoladas com vistas à reabilitação social e profissional do recluso, mas emerge de um amplo cenário das políticas nacionais de educação e de emprego, consideradas para fins de empregabilidade com vistas à reinserção social. “(...) como estratégia de inclusão dos reclusos na vida ativa, após a sua libertação e combate à reincidência.” (Pinho, 2015, p. 25).

Quanto à inserção dos reclusos no mercado de trabalho, após liberação, são previstas ações articuladas entre os serviços prisionais e os serviços de emprego e Formação Profissional, conforme o artigo 53º, da Lei nº 115/2009.

O Regulamento Geral dos Estabelecimentos Prisionais encontra abrigo no Decreto-Lei nº 51/2011, de 11 de abril, o qual regulamenta o artigo 40 do Código da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, dedicando o Capítulo II ao ensino e à Formação Profissional nas penitenciárias. Trata da organização, do acesso e da frequência às ações de formação.

As ações de Formação Profissional do sistema prisional são coordenadas pela DGRSP e desenvolvidas em nível oficial pelo Centro Protocolar de Formação Profissional para o Setor de Justiça – CPJ, nos termos da Portaria nº 538/88, de 10 de agosto. Foi criado pelo Ministério da Justiça, Ministério do Emprego e da Segurança Social e pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, por parte das Instituições Particulares de Solidariedade Social e Empresas de Formação. (DGSP, 2016).

As entidades formadoras, em colaboração com a DGRSP, apresentam candidaturas aos programas operacionais, Programa Operacional de Emprego, Formação e Desenvolvimento Social- POEFDS e ao Programa Operacional para a Região de Lisboa e Vale do Tejo - PORVL, fazendo uso de verbas do Fundo Social Europeu sob a égide do Ministério da Segurança e do Trabalho. (DGSP, 2016).

Quanto à organização, os cursos de Formação Profissional são estruturados conforme os mesmos princípios técnicos e pedagógicos adotados externamente no que couber, sendo parte integrante do tratamento penitenciário.

O suporte material e o espaço necessários para a realização das atividades formativas são providos pelo Estabelecimento Prisional, que garante as condições adequadas de funcionalidade e de segurança, mas as entidades formadoras também contribuem com o suprimento do suporte material quando necessário.

Cabe ao diretor-geral da DGRSP a aprovação do Plano Anual de Formação Profissional, baseado na análise das ofertas dos cursos de Formação Profissional apresentadas e das necessidades dos reclusos.

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Figura 1 –  Recluso nos estabelecimentos prisionais segundo o sexo.
Tabela 1 - Caracterização sociodemográfica e jurídico-penal das entrevistadas.
Tabela 2 - Caracterização sociodemográfica e jurídico-penal das entrevistadas (continuação)  Escolaridade antes da reclusão e
Tabela 3 - Ocupações remuneradas e escolaridade antes da reclusão.
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