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Propostas de alterações do regime de exoneração do passivo restante

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Academic year: 2021

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Sumário: 1. Nota prévia. 2. Análise das alterações em especial: assembleia de apreciação

do relatório e exoneração do passivo restante. 3. A extinção do Cofre Geral dos Tribunais.

1. Nota prévia

Em matéria de regime de exoneração do passivo restante, o projeto de Decreto-Lei de alterações ao CIRE limita-se fundamentalmente a dois pontos que implicam, no entanto, a reformulação de alguns artigos:

i) o primeiro ponto respeita à eliminação da necessidade de realização da assembleia de apreciação do relatório na exoneração do passivo restante mediante dispensa fundamentada pelo juiz;

ii) o segundo respeita a uma atualização decorrente da extinção do Cofre Geral dos Tribunais efetuada pelo artigo.º 133.º da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro. Neste caso o projeto de decreto-lei optou por uma referência genérica ao organismo do Ministério da Justiça competente em matéria de gestão fi nanceira e patrimonial.

Não se levantam objeções a qualquer das referidas alterações, que se inserem no quadro da Resolução do Conselho de Ministros 42/2016, de 18 de agosto, e do Programa Capitalizar por ela aprovado, em particular nos Eixos I e III deste Programa sobre simplifi cação e medidas de reestruturação empresarial1.

Deve referir-se, porém, que a matéria da exoneração do passivo restante mereceria porventura ser objeto de uma revisão mais alargada, dado encon-trar-se a ser objeto de discussão, a nível europeu, no âmbito da Proposta de

1 Cf. Nota de enquadramento de 16 de março de 2017, disponível em:http://www.portugal.

gov.pt/media/26218493/20170316-mj-meco-capitalizar.pdf e http://www.portugal.gov.pt/ media/26218490/20170316-mj-meco-capitalizar-medidas.pdf

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Diretriz do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a meios preventivos de reestruturação, insolvência e exoneração do passivo restante e à alteração da Diretriz 2012/30/EU, discussão essa que assenta em dois eixos fundamentais:

i) antecipação da aplicação da exoneração do passivo restante a situações pré-insolvenciais, como sejam o sobre-endividamento dos empresários; e

ii) estabelecimento de um período de cessão do rendimento disponível não superior a três anos em todos os Estados-Membros da União Europeia, de modo a evitar as situações de forum shopping1 ou o bankruptcy tourism2.

Ora, não resulta da exposição de motivos do projeto de decreto-lei que estas questões tenham sido ponderadas. Para além disto, é de salientar, ainda, no contexto europeu, a Recomendação da Comissão de 12 de março de 2014 sobre uma nova abordagem em matéria de falência e insolvência de empresas3,

em que se recomenda aos Estados Membros que tomem medidas para reduzir os efeitos negativos da insolvência sobre os empresários, aprovando disposições que permitam uma remissão total das dívidas após um período máximo de tempo de três anos. Embora não se concorde com a redução do prazo de cessão de rendimento disponível pelos efeitos que pode ter em matéria de contração do crédito, afi gura-se que a questão deveria ter sido devidamente equacionada no âmbito de qualquer alteração legislativa ao CIRE. Parece, pois, discutível a oportunidade de uma alteração à legislação insolvencial vigente, quando se pre-param, a nível europeu, alterações profundas no âmbito de uma harmonização material do Direito da Insolvência.

2. Análise das alterações em especial: assembleia de apreciação do relatório e exoneração do passivo restante

Em primeiro lugar, afi gura-se de salientar que a alínea n) do artigo 36.º/1 do CIRE, na redação da Lei n.º 16/2012, tem de ser lida em conjugação com o n.ºs 2 e 3 deste artigo, resultando dessa articulação o seguinte:

1 António Frada de Sousa, Exoneração do passivo restante e forum shopping na insolvência de pessoas

singulares na União Europeia, em Estudos em Memória do Prof. Doutor J.L. Saldanha Sanches, vol. II,

Coimbra, 2011, 62: com efeito, há diferenças assinaláveis em relação aos diferentes ordenamentos jurídicos quanto ao prazo de exoneração (6 anos na Alemanha previsto no § 287, II da

Insolven-zordnung, 5 anos em Portugal previsto no artigo 235.º do CIRE, e 18 meses na França).

2 Gonçalo Gama Lobo, Exoneração do passivo restante e causas de indeferimento liminar, em I Colóquio

de Direito da Insolvência de Santo Tirso (coord. Catarina Serra), Coimbra, 2014, 269.

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i) A realização da assembleia de apreciação do relatório prevista no artigo 156.º continua a ser obrigatória sempre que se verifi que alguma das situações enumeradas no n.º 2 (exoneração do passivo restante, plano de pagamentos e administração da massa pelo devedor);

ii) Nos demais casos, o juiz tem a faculdade de dela prescindir, desde que considere a dispensa fundamentada e esclareça as razões da decisão na própria sentença;

iii) Tendo o tribunal exercido esse poder, a assembleia deve, ainda assim, ser convocada se algum interessado a requerer em conformidade com o n.º 34.

Atendendo à nova redação do n.º 2 do artigo 36.º do projeto de decreto--lei, que elimina a exoneração do passivo restante requerida pelo devedor das situações em que a realização da assembleia prevista no artigo 156.º é obriga-tória, a audiência de apreciação do relatório passa a ser facultativa no domínio da exoneração do passivo restante5. Esta solução corrobora a menção feita na

exposição de motivos no sentido da implementação de recomendações resul-tantes da avaliação do funcionamento de diversos institutos, designadamente em áreas como a assembleia de credores nos processos de insolvência de pessoas singulares. O caráter facultativo da assembleia de apreciação do relatório justi-fi ca-se assim em função de preocupações de celeridade transversais ao CIRE6.

No regime em vigor a assembleia de apreciação do relatório pronuncia-se sobre o pedido de exoneração do passivo restante formulado pelo devedor pes-soa singular, ainda que a sua decisão fi nal caiba ao juiz7. Alguma doutrina tem

vindo, porém, a defender ser errado submeter à votação dos credores o pedido

4 Luís Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de

Empre-sas Anotado, 3.ª ed, Lisboa, 2015, anotação ao artigo 36.º, 259. Com efeito, como refere Maria

do Rosário Epifânio, Manual de Direito da Insolvência, 6.ª ed, Coimbra, 2016, 76, a dispensa da realização da assembleia de apreciação do relatório não tem carácter defi nitivo, uma vez que qual-quer interessado pode requal-querer a sua convocação no prazo para a reclamação de créditos (artigo 36.º/3). De forma idêntica, Catarina Serra, O Regime Português da Insolvência, Coimbra, 2012, 5.ª ed, Coimbra, 2012, 134.

5 De referir que o texto do anteprojeto da Lei n.º 16/2012, de 20 de abril, apenas se referia à

exo-neração do pedido restante como caso de não dispensa de assembleia de apreciação do relatório segundo Maria do Rosário Epifânio, Manual de Direito da Insolvência cit., 75-75.

6 Luís Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas

Anotado cit., anotação ao artigo 36.º, 260. A transformação de certas fases em facultativas justifi ca-se

do ponto de vista da celeridade processual almejada, Adelaide Menezes Leitão, Insolvência de

Pessoas Singulares: a exoneração do passivo restante e o plano de pagamentos. As alterações da Lei n.º 16/2012, de 20 de Abril, em Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Lebre de Freitas, Coimbra, 2013, 516-517.

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de concessão de exoneração do passivo restante, dado essa votação ser inútil, na medida em que jamais poderia confi gurar qualquer deliberação, por versar sobre matéria que cabe exclusivamente ao juiz8. Assim, a solução do projeto

de decreto-lei de prescindir da realização da assembleia de credores justifi ca-se igualmente em resultado da inutilidade desta votação.

No que concerne à redação proposta no projeto de decreto-lei relativa-mente ao artigo 236.º/1 explica-se atendendo ao facto de que a assembleia de apreciação do relatório se tornou facultativa, o que faz com que se preveja agora um novo prazo de rejeição do pedido, no caso de dispensa da realização da assembleia de apreciação do relatório, de 60 dias após a sentença que declara a insolvência, mantendo-se a decisão livre do juiz sobre a sua admissão ou rejei-ção no período intermédio, ou seja, no período posterior à petirejei-ção inicial de apresentação à insolvência ou ao prazo de dez dias posterior à citação.

A presente alteração limita-se a prever um prazo novo em razão da possibi-lidade de dispensa da assembleia de apreciação do relatório, tendo o legislador fi xado o prazo de 60 dias após a prolação da sentença que declara a insolvência, sendo que no regime vigente no CIRE em situações de dispensa de assembleia de apreciação do relatório se aplica o artigo 36.º/4, o que aponta para um prazo de 45 dias9.

De forma idêntica ao verifi cado no n.º 1 do artigo 236.º do projeto de decreto-lei, o n.º 4 do mesmo artigo prevê um novo prazo de 10 dias contados a partir do prazo de 60 dias para que os credores e o administrador de insol-vência se possam pronunciar sobre o requerimento, o que resulta da eventual dispensa da assembleia de apreciação do relatório. Esta possibilidade de pronun-cia dos credores e do administrador ainda que, com a assembleia dispensada, denota a relevância da sua intervenção no regime da exoneração do passivo restante.

Em articulação com o novo prazo do n.º 4 do artigo 236.º do projeto, o n.º 2 do artigo 238.º determina que o despacho de indeferimento liminar é profe-rido após a audição dos credores e o administrador de insolvência no prazo dos 10 dias após os 60 dias da prolação da sentença que declara a insolvência, tendo, mais uma vez, sido suprimida a menção à assembleia de apreciação do relatório, que pode ser dispensada.

Do mesmo modo, prevê-se para o despacho inicial de cessão de rendi-mento disponível (artigo 239.º/1) seja proferido na assembleia de apreciação

8 Gonçalo Gama Lobo, Exoneração do passivo restante e causas de indeferimento liminar cit., 259. 9 Luís Carvalho Fernandes/João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas

Anotado cit., anotação ao artigo 236.º, 850. Neste sentido, quanto ao regime vigente, igualmente,

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do relatório, nos dez dias subsequentes à realização da assembleia, ou no prazo de dez dias após o decurso do prazo do artigo 236.º/4, em caso de dispensa de assembleia de apreciação do relatório. Com efeito, o atual CIRE prevê ape-nas que se não houver fundamento para indeferimento liminar, o juiz profere despacho inicial na assembleia de apreciação do relatório ou nos 10 dias subse-quentes (239.º/1).10 Atendendo à nova possibilidade de dispensa da assembleia

de apreciação do relatório impõe-se que este despacho tenha o prazo contado com referência ao novo prazo do artigo 236.º/4.

3. A extinção do Cofre Geral dos Tribunais

O artigo 241.º/1, b) do projeto atualiza a referência existente ao Cofre Geral dos Tribunais que foi extinto pelo artigo 133.º/1 da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro, e substituído pelo Instituto de Gestão Financeira e Patri-monial do Ministério da Justiça (artigo 133.º/2)11. Parece-nos adequada a

referência ao “organismo responsável pela gestão fi nanceira e patrimonial do Ministério da Justiça” para evitar futuras desatualizações. Idêntica atualização surge no artigo 248.º/1. Assim sendo, ambas as alterações, apesar de formais, são necessárias.

Professora Doutora Adelaide Menezes Leitão, Investigadora do CIDP

10 Adelaide Menezes Leitão, Insolvência de Pessoas Singulares cit., 523-524. 11 Alexandre Soveral Martins, Um Curso de Direito da Insolvência cit., 604.

Referências

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