• Nenhum resultado encontrado

A violação do protocolo do contrato comunicacional narrativo

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A violação do protocolo do contrato comunicacional narrativo"

Copied!
9
0
0

Texto

(1)

Embora o que eu vá dizer talvez ofenda e provoque irritação seja em quem for, mas paciência...

A violação do Protocolo do Contrato Comunicacional Narrativo A violação do Protocolo do Contrato Comunicacional NarrativoA violação do Protocolo do Contrato Comunicacional Narrativo A violação do Protocolo do Contrato Comunicacional Narrativo A violação do Protocolo do Contrato Comunicacional Narrativo

Armindo José Baptista de MORAIS (FCT) * Na interacção oral, a introdução de uma Narrativa obriga o futuro narrador a negociar com o interlocutor o Acto de Enunciação Narrativo que pretende realizar. Para além de anunciar a sua vontade de narrar algo, ele tem de motivar o outro a aceitar a narrativa, convencendo-o da sua relevância para a interacção, bem como prepará-lo para a sua realização.

Através do acto comunicativo que passaremos a denominar Resumo (Labov, 1972) o locutor: - promove a passagem entre duas situações de enunciação (a actual e a que vai resultar

da narração);

- estabelece um novo contrato comunicacional entre os interlocutores, atribuindo-lhes os papéis de Narrador e Narratário(s) (Bres, 1994);

- redistribui, de uma forma assimétrica, o espaço de enunciação;

- e procura ganhar o interlocutor para uma conceptualização individual do que vai ser narrado.

1. Objectivos

Em trabalhos anteriores procurámos definir, a partir de exemplos autênticos, o protocolo de negociação subjacente ao contrato comunicacional narrativo, descrevendo os movimentos da sua realização e caracterizando os actos comunicativos que lhe dão corpo.

No presente estudo vamos analisar, contrastivamente, um exemplo de Enunciado Narrativo em que o protocolo é respeitado e um segundo em que há uma violação explícita do mesmo. Pretende-se demonstrar:

- em que medida o locutor têm consciência dessa ruptura (e logo, da existência de regras e da sua infracção);

- quais as estratégias pragmático-discursivas a que recorre para atenuar o acto de ameaça de face que cometeu.

2. Breve enquadramento teórico

O estudo sistemático de narrativas produzidas em situação de interacção oral remonta aos trabalhos pioneiros de W. Labov (1972) e à sua proposta de uma caracterização funcional dos constituintes da narrativa no quadro de uma concepção enunciativa das unidades linguísticas. Caracterizando o Enunciado Narrativo (daqui para a frente referido como EN) enquanto discurso dialógico, Labov (1972) considera a sua organização em termos de módulos que constituem “respostas” a potenciais “perguntas” do interlocutor (ver quadro 1). Da eficácia das respostas depende a manutenção do interesse do ouvinte pela narrativa e a legitimação da apropriação do espaço comunicativo pelo narrador.

(2)

Quadro 1: Módulos do Enunciado Narrativo

Com o intuito de operacionalizar o modelo de análise proposto, Labov (1972) vai ainda separar os módulos que constituem o EN em Narrativos – responsáveis pela construção da sequência de acontecimentos (→ M3 e M5) e Avaliativos – que sustentam a inserção do EN na interacção ao mesmo tempo que promovem uma interpretação do narrado conforme à intenção do narrador (→ M1, M2, M4 e M6)1.

Sem perder a noção de unidade do EN, para o presente trabalho vamos concentrar a nossa atenção no primeiro dos módulos avaliativos – o Resumo – tendo em conta quer as suas funções interaccionais (ao nível da organização conversacional) quer as configuracionais (ao nível da orientação intencional do narrado e posterior interpretação).

Como demonstrámos em estudos anteriores (Morais, 2002) o Resumo:

- Abre um turno ou uma sequência de turnos introdutórios de um EN, ou reorienta um turno para um EN;

- Promove a passagem entre o mundo da situação enunciação actual e o mundo diegético da narrativa;

- Distingue-se da Orientação que inicia a narrativa propriamente dita;

- Revela a intenção do Acto de Enunciação Narrativo que prepara, podendo explicitar tema(s) e objectivo(s) do mesmo acto;

- Concorre para a conformidade da interpretação do narratário com a ordem configuracional do narrado, dando--lhe as primeiras pistas de leitura;

- Tem um cariz apelativo, promovendo o envolvimento do interlocutor no acto comunicativo que se seguee;

- Realiza um Contrato Comunicacional Narrativo entre os Co-enunciadores de uma Interacção, cedendo o domínio do Espaço da Interlocução, temporariamente, ao participante que é constituído em Narrador enquanto o(s) outro(s) se torna(m) Narratário(s);

Partindo da hipótese levantada por J. Bres sobre a existência de um contrato comunicacional narrativo vinculado a um protocolo de acordo2, é necessário identificar e caracterizar as actividades

comunicativas que lhe dão corpo. Para tal consideraram-se os trabalhos de W. Kallmeyer (1978, 1976), J. Rehbein (1981, 1984) e R. Meyer-Hermann (1978) sobre Actividades Preparatórias em interacção oral. Como realça W. Kallmeyer (1978) estas Actividades Preparatórias envolvem, simultaneamente, locutor e alocutário na medida em que orientam as actividades de ambos para o que vai ser construído na conversação:

- O locutor, orientando o alocutário quanto ao valor ilocutório, conteúdo proposicional e interesse da actividade comunicativa planeada, procura obter dele a atenção e a

M1 RESUMO Qual é o assunto?

M2 ORIENTAÇÃO O quê, quem, onde e quando?

M3 DESENVOLVIMENTO DA ACÇÃO O que é que aconteceu?

M4 AVALIAÇÃO E então? O que é que isso interessa?

M5 RESOLUÇÃO ou RESULTADO Como é que acabou? O que é que aconteceu no fim?

(3)

compreensão dos seus planos, bem como criar condições para a sua recepção (Rehbein, 1976: 60).

- Da parte do alocutário, as Actividades Preparatórias permitem-lhe preparar-se para a actividade anunciada activando os seus conhecimentos esquemáticos3. No caso do

anúncio de um turno narrativo, tal conhecimento permite-lhe a activação de um esquema de referência para a sua interpretação, recorrendo, para tal, à actualização de um modelo textual prototípico culturalmente adquirido (Adam [1984] 1991).

Na análise destas Actividades Preparatórias consideraram-se, também, todas as Estratégias de Atenuação utilizadas pelo futuro narrador para preservar a sua face e limitar ou neutralizar possíveis reacções desfavoráveis ou interpretações contrárias à sua intencionalidade. Na sua caracterização seguiram-se, de perto, os trabalhos para o Português do Brasil de M. Rosa (1992) e P. Galembeck (1997).

3. Os exemplos analisados

Dado que em estudos anteriores trabalhámos com um corpus de EN recolhido no Corpus de Referência do Português Contemporâneo do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa, para o presente optámos por dois exemplos retirados do Corpus Faria (Faria, 1983), acessível no volume II da dissertação de doutoramento4 da autora.

No primeiro, é estabelecido um Contrato Comunicacional entre as partes presentes, segundo um protocolo de acção que reitera o observado em outros exemplos estudados. (Apesar de já havermos apresentado este exemplo anteriormente, optámos por retomá-lo pela prototipicidade do seu desenvolvimento).

No segundo exemplo há uma violação, consciente e assumida, do referido protocolo.

4. O Contrato Comunicacional Narrativo

4.1 O Protocolo de Negociação do Enunciado Narrativo – Exemplo 1

Como foi referido anteriormente, o Contrato Comunicacional Narrativo é estabelecido segundo um protocolo que inclui, prototipicamente, os movimentos identificados no seguinte quadro (quadro 2).

Quadro 2: Protocolo de Negociação do Enunciado Narrativo M1 Movimento de Anúncio da Narrativa

M2 Movimento de Justificação da Narrativa M3

Movimento de Negociação do Acordo: (i) Pedido de Acordo Explícito (ii) Entrega da Decisão ao Interlocutor M4 Movimento de Aceitação do Interlocutor M5 Início da Narrativa: Orientação

(4)

Observe-se o funcionamento do protocolo no primeiro exemplo retirado do Corpus Faria, entrevista N2.1.16.

Na presente interacção, o entrevistado retoma o tópico proposto na pergunta que lhe é feita pela entrevistadora para introduzir uma história pessoal de cariz anedótico.

Uma análise breve do texto permite destacar, logo à partida, o Anúncio da Narrativa5

queria-lhe contar uma história que eu acho giríssima, giríssima - constituído pelos seguintes elementos:

- um predicador verbal composto pelo modificador modal com valor volitivo – queria – associado a um verbo declarativo típico do EN – contar.

- dois argumentos internos do referido predicador: o pronome dativo com valor apelativo – lhe –, que refere o interlocutor, e o sintagma nominal com valor de complemento directo – uma história – associado a uma relativa restritiva com dupla superlativização – que eu acho giríssima, giríssima.

Em termos pragmáticos, o Anúncio (Rehbein, 1981) realiza os dois primeiros movimentos do contrato comunicacional:

- [M1] – Movimento de Anúncio da Narrativa em que se revela a vontade de narrar de um dos interlocutores;

- [M2]– Movimento de Justificação da Narrativa em que se resume e avalia de forma genérica o que vai ser narrado, ao mesmo tempo que se promove a adesão e o envolvimento do alocutário em relação ao seu conteúdo. Neste caso específico realce-se a combinação de uma adjectivação superlativa, que reforça o interesse da referida história, com a expressão verbal de opinião – eu acho – que identifica claramente a instância de enunciação. A sua função é atenuar a força da avaliação realizada logo a seguir, precavendo uma possível decepção do interlocutor.

Segue-se um movimento de negociação claramente interaccional [M3] que tem por intuito obter o acordo explícito do interlocutor para o turno narrativo. Para tal, o locutor levanta a hipótese de não-relevância, para a interacção em curso, do acto comunicativo anunciado através de uma interrogativa indirecta – ah… isto até se não fosse… – que, pelo seu valor ilocutório de pedido, motiva a resposta de aceitação do interlocutor – não está tudo bem – [M4]. Destaque para o carácter ritual do procedimento, que preserva a face negativa – referente ao desejo de não imposição ou à salvaguarda do território individual – dos presentes. Ao anuir ao pedido, o interlocutor concorda, também, em participar numa nova situação de enunciação com diferentes regras de distribuição de tempo, espaço e papéis.

M1 ah… em relação à limpeza,

queria-lhe contar uma história Expressão de Vontade de Narrar

M2 que eu acho giríssima, giríssima! Avaliação Justificativa M3 ah… isto até se não fosse… Pedir Acordo

M4 Não está tudo bem. Acordo

M3’ ah não, mas se quiser cortar isto… Entrega da Decisão ao interlocutor M5 eu, quando vim para este gabinete Orientação → Início da narrativa

(5)

O enunciado seguinte [M3’] corresponde a um segundo trabalho de face por parte do futuro narrador: apesar da mudança de relações de poder na interacção, inerentes à introdução de um EN, o locutor reforça a autoridade do interlocutor e o seu poder de decisão quanto ao produto final da narração – mas se quiser cortar tudo isto…

Por parte do futuro narrador há, claramente, a noção de inversão dos papéis em relação à situação de entrevista: agora é ele a dirigir a conversação. Por esse motivo, relativiza o valor de todo o acto comunicativo posterior, afirmando a autoridade final do entrevistador sobre a interacção.

4.2 A violação do Protocolo – Exemplo 2

Um segundo exemplo de Contrato Comunicacional Narrativo, retirado da entrevista com o código 1.2 do Corpus Faria, permite testar a proposta de protocolo atrás avançada. Neste caso específico, a decisão de introdução do EN é tomada pela futura narradora à revelia da concordância do interlocutor. No entanto, ela vai ter a preocupação de justificar a narrativa e vinculá-la à interacção em curso.

Assim, respondendo à questão sobre o funcionamento do serviço de limpeza na faculdade, a entrevistada decide dar a sua opinião sobre as deficiências desse serviço. Dada a actualidade da questão e a posição crítica que defende, sente a necessidade de desenvolver uma série de actividades preparatórias que constroem um quadro cognitivo atenuador para a interpretação do que vai ser narrado posteriormente.

devo dizer-lhe em concreto que estive um pouco relacionada com esse assunto e que acho que a Faculdade tem algumas responsabilidades nisso.

embora o que eu vá dizer talvez ofenda e provoque irritação seja em quem for, mas paciência uma vez que quer fazer uma entrevista e me faz esta pergunta

eu falarei com sinceridade.

logo após a revolução de 1974 … o problema do pessoal da limpeza foi debatido num com… numa… então Comissão Directiva a que eu pertencia […]

Para facilitar a leitura, os enunciados em análise são repetidos logo a seguir à sua descrição. Os elementos sublinhados correspondem a estratégias de atenuação.

A locutora começa por referir a sua aptidão para responder à questão levantada através de uma frase completiva (i’) introduzida por um Pré-anúncio6 de cariz metadiscursivo (i) que associa

ao valor de obrigatoriedade do modal – dever – a “neutralidade” ilocutória do declarativo - dizer – seguido do pronome dativo com valor apelativo. Na frase completiva destaque para o atenuador quantitativo de imprecisão – um pouco.

(i) devo dizer - lhe em concreto

Atenuação: Marcador metadiscursivo Pré-anúncio

(i’) que estive um pouco relacionada com esse assunto Atenuação: Marcador de imprecisão

A seguir, a locutora avança com um resumo da sua posição perante o problema levantado pela entrevistadora através de uma segunda completiva (ii), mais uma vez prefaciada por um atenuador de cariz epistémico – e que acho. Destaque, também, para o atenuador quantitativo de imprecisão – algumas – que dilui a força da afirmação em que se insere.

(6)

(ii) e que acho que a Faculdade tem algumas responsabilidades nisso. Atenuação: expressão de opinião. Atenuação: Marcador de imprecisão

Avaliação Justificativa

A actividade preparatória seguinte corresponde a um primeiro Anúncio da Narrativa propriamente dita, composto por um movimento que refere a intenção de contar algo (iii) logo seguido pela avaliação dos possíveis efeitos desse mesmo relato sobre potenciais receptores (iv).

Ambos os movimentos estão ligados pelo conector discursivo concessivo – embora. (iii) embora o que eu vá dizer

Atenuação: Marcador metadiscursivo

(iv) talvez ofenda e provoque irritação seja em quem for, Atenuação: Marcador de imprecisão

Avaliação (v) mas paciência

Avaliação

Anúncio da narrativa (I)

Destaque para o atenuador metadiscursivo – o que eu vá dizer – onde a realização lexical do pronome sujeito marca a responsabilidade sobre o acto comunicativo anunciado.

Destaque, também, para a estratégia argumentativa de indefinição do objecto indirecto realizada através da unidade fraseológica – seja em quem for – que procura reforçar a sinceridade do locutor. A adversativa elíptica que se segue (v) confirma que a decisão unilateral de narrar está tomada – mas paciência.

No entanto, a locutora não passa de imediato para o turno narrativo. Aparentemente, ela sente a necessidade de justificar a decisão de narrar afirmando que resulta da situação de entrevista (vi) e, mais precisamente, da última pergunta feita pela entrevistadora (vii).

(vi) uma vez que quer fazer uma entrevista (vii)e me faz esta pergunta

A justificação corresponde a uma estratégia de atenuação que pretende controlar, por antecipação, possíveis reacções desfavoráveis ao acto comunicativo anunciado, comprometendo o interlocutor na decisão tomada. Nesta perspectiva, destaque para a realização do pronome dativo – me – enquanto estratégia argumentativa justificativa (vii), bem como a avaliação da intencionalidade do entrevistadora através de uma interrogativa indirecta (viii) que se contrapõe à avaliação da sua própria intencionalidade (ix). Mais uma vez, há uma referência, agora explícita, à sinceridade do enunciado que vai ser introduzido.

(viii)não sei com que intenção (ix) eu falarei com sinceridade.

Estratégia de atenuação

Anúncio da Narrativa (II)

O conjunto dos enunciados analisados (vi – vii –viii – ix) corresponde ao segundo Anúncio da narrativa, centrado na modalidade do acto comunicativo que antecede.

Após estas actividades preparatórias, o locutor passa para a macroproposição Orientação com a referência à localização temporal dos acontecimentos que vai narrar

(x) Logo após a revolução de 1974… o problema do pessoal da limpeza foi debatido num com… numa… então Comissão Directiva a que eu pertencia […].

(7)

Destaque-se a retoma do tópico (ver sublinhado) agora avaliado através da substituição do lexema – funcionamento – pelo lexema – problema.

Uma apreciação global deste Resumo permite concluir que a locutora sente a necessidade de desenvolver um conjunto de Actividades Preparatórias com que procura construir um quadro interpretativo atenuador para a leitura do que vai ser narrado posteriormente.

5. Conclusões

Comparando o último exemplo com o anterior, verifica-se que a locutora apenas realiza os movimentos de Anúncio da Narrativa [M1] e de Justificação da Narrativa [M2] do Protocolo do Contrato Comunicacional Narrativo, assumindo unilateralmente a decisão de narrar.

No que se refere ao Movimento de Negociação de Acordo [M3], a locutora tem a preocupação de referir a relação explícita entre o acto comunicativo que anuncia, a situação enunciativa de entrevista e a questão levantada pela interlocutora. O EN é apresentado como resultante da questão anteriormente colocada e, como tal, legitimado.

Além disso, a locutora sublinha a sinceridade do mesmo acto comunicativo, contrapondo-a à opcontrapondo-acidcontrapondo-ade dcontrapondo-a intenção dcontrapondo-a perguntcontrapondo-a dcontrapondo-a entrevistcontrapondo-adorcontrapondo-a.

Estas justificações apontam para a existência de consciência, por parte da locutora, de uma violação do protocolo negociação do turno narrativo, ao mesmo tempo que funcionam como estratégias de preservação da face em relação à recepção do acto comunicativo anunciado.

Ainda sobre o grau de fixidez do referido protocolo, uma última consideração: mesmo em situações em que a introdução de um EN seria natural e esperada, o locutor recorre a formas ritualizadas de Anúncio da Narrativa que revelam a sua vigência. Veja-se um terceiro exemplo recolhido no programa televisivo Por Outro Lado. O entrevistado, antes de iniciar o relato de um episódio pessoal, faz o seguinte Resumo – olhe, conto-lhe uma história se a quiser ouvir – realizando, ritualmente, o Movimento de Negociação do Acordo através da Entrega da Decisão ao Interlocutor.

(8)

Notas

* Doutorando da Universidade Aberta e Bolseiro da Fundação para a Ciência e a Tecnologia. 1 De acordo com Adam (1991 [1984]) M2, a Orientação, deveria, com M3 e M5, fazer parte do Núcleo Narrativo, uma vez que tem funções predominantemente textuais, contribuindo para a especificidade do género em análise. Bres (1994), por seu lado, realça a artificialidade da divisão, sublinhando o carácter transversal da Avaliação, que pode actuar em todos os módulos. Para uma leitura crítica mais alargada desta divisão e das suas implicações, ver Morais (2002).

2 Segundo este autor a negociação obedece a um protocolo constituído, numa versão mais elaborada, por cinco elementos: 1) anúncio da novidade (l’annonce de nouvelle); 2) questão sobre a participação do narrador (la question sur la participation); 3) pedido para narrar (la requête); 4) verificação da novidade para o narratário (la verification); 5) justificação (la justification).

3 Segundo Van Dijk (2002 [1992]: 74-98) a compreensão de enunciados envolve

conhecimentos gerais organizados em esquemas conceptuais. Esses esquemas (frames) são unidades de conhecimento de natureza mais ou menos convencional organizadas segundo um certo conceito que pode ser de cariz comportamental ou epistemológico. A activação destes esquemas, associada às informações derivadas de actos comunicativos imediatamente precedentes e à informação global sobre esse tipo de actos, permitem um processamento rápido e funcional da informação.

4 Fica aqui o nosso agradecimento à Professora Isabel Hub Faria por nos ter permitido aceder ao referido corpus da oralidade.

5 O Anúncio de um EN, enquanto Actividade Preparatória, caracteriza-se por: (I) Ter um carácter metacomunicativo;

(II) Surgir em posição anterior ao acto comunicativo anunciado;

(III) Revelar a vontade e/ou capacidade do locutor de concretizar o acto comunicativo seguinte;

(IV) Focalizar a atenção do interlocutor para esse mesmo acto; (V) Referir a história a narrar de uma forma genérica e avaliativa.

(VI) Ser caracterizável em termos de constituintes, elementos de ligação e respectivas relações:

Agente na Posição de Sujeito - futuro narrador;

Predicado Verbal Declarativo (frequentemente modalizado);

Referência Genérica e Avaliativa à História na posição de complemento; Elemento de Ruptura (não obrigatório).

6 Segundo Rehbein (1981) a função central do Pré-anúncio é focalizar a atenção do interlocutor para a relevância da unidade discursiva a introduzir. “A pre-annoucement therefore contains a demand for the hearer to give an explicit and positive point of view about the planned action, in this way, to enable the speaker to make his resolution of execution” (243). Na mesma linha Rodrigues (1998) contrapõe o Pré-anúncio ao Anúncio na medida em que, ao contrário deste último, não contém qualquer explicitação sobre ilocução, modalidade ou tema, concentrando-se no apelo à atenção e à vontade do interlocutor de receber o discurso que anuncia. (Rodrigues, 1998: 81).

(9)

Referências

ADAM, J.-M.

1991 [1984], Le Récit, Paris, PUF. BRES, J.

1994, La Narrativité, Louvin-la-Neuve, Éditions Duculot. GALEMBECK, P.

1997, “Preservação da face e manifestação de opiniões: um caso de jogo duplo”, in Preti, D. (org.) O Discurso Oral Culto, São Paulo, Publicações FFLCH/USP.

LABOV, W.

1972, Language in the Inner City, Philadelphia, University of Pennsylvania Press. MORAIS, A.

2002, O Género Narrativo em Interacções Orais Autênticas, Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Aberta, vol. I e II.

2003, “Um modelo de análise pragmático-discursivo de enunciados narrativos em interacções orais”, in Gärtner, E., Herhut, M. J., Sommer, N. (eds.), Contribuições para a Didáctica do Português Língua Estrangeira, Frankfurt am Main, Verlag TFM.

FARIA, M. I.

1983, Para a Análise da Variação Socio-Semântica, Dissertação de Doutoramento em Linguística Portuguesa apresentado à Faculdade de Letras de Lisboa, vol. I e II.

KALLMEYER, W.

1978,“Fokuswechsel und Fokussierungen als Aktivitäten der Gesprächskonstitution”, in Meyer-Hermann, R. (ed), Sprechen-Handeln- Interaktion, Tübingen, Max Niemeyer Verlag, 191-241. MEYER-HERMANN, R.

1978, “Aspekte der Analyse metakommunikativer Interaktionen”, in Meyer-Hermann, R. (ed), Sprechen-Handeln-Interaktion, Tübingen, Max Niemeyer Verlag, 103-141.

REHBEIN, J.

1976, “Announcing – On Formulating Plans”, in F. Coulmas (ed), Conversational Routine, The Hague, Moutin Publishers, 215-258.

RODRIGUES, I.

1998, Sinais Conversacionais de Alternância de Vez, Porto, Granito, Editores e Livreiros. ROSA, M.

1992, Marcadores de Atenuação, São Paulo, Contexto. VAN DIJK, T.

Referências

Documentos relacionados

B4 Identificação dos compostos presentes nas amostras de bio-óleo obtidos via pirólise catalítica da fibra de casca de coco utilizando carvão ativado (ABC) e

Não foi observada diferença signi- ficativa entre as diversas quantidades de pólen utilizadas na polinização para a maioria dos parâmetros de qualidade das sementes (P100,

Tendo em consideração que os valores de temperatura mensal média têm vindo a diminuir entre o ano 2005 e o ano 2016 (conforme visível no gráfico anterior), será razoável e

Finally,  we  can  conclude  several  findings  from  our  research.  First,  productivity  is  the  most  important  determinant  for  internationalization  that 

libras ou pedagogia com especialização e proficiência em libras 40h 3 Imediato 0821FLET03 FLET Curso de Letras - Língua e Literatura Portuguesa. Estudos literários

Após alguns testes realizados para a construção da maquete da cadeira Mesh, para ver como seria a melhor opção de construção da mesma, devido aos cortes que tinham de

A partir desse ponto de vista, consideramos que a análise e identificação do objeto tridimensional como documento arquivístico no contexto judiciário foi indispensável para

Não é tàmbem o da guerra, da invasão estrangei- ra, da perda da liberdade, da mutilação do território por seqüestro ou conquista: tal peri- go, se existe ou existir, será talvez