Sumário
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Os níveis de significado das obras de arte segundo
Panofsky: o natural (pré-iconográfico), o
convencional (iconográfico) e o intrínseco
(iconológico).
ERWIN PANOFSKY
ERWIN PANOFSKY
PANOFSKY
Os 3 níveis de significado:
• Significado primário ou natural. Nível pré-iconográfico.
– Identificação básica (factual) de formas e figuras (seres humanos, animais, etc.) e de atitudes expressionais (triste, contente, etc.).
• Significado secundário ou convencional. Nível iconográfico.
– Identificação de temas, histórias e alegorias.
• Significado intrínseco ou simbólico. Nível iconológico.
– Interpretação do sentido de uma imagem enquanto manifestação visual (consciente ou inconsciente) dos princípios fundamentais de uma cultura, época ou filosofia. A obra de arte como sintoma cultural. Teoria esboçada pela primeira vez na introdução ao livro Herkules am
Scheideweg (1930), mas apenas desenvolvida e estruturada em 1939 (Studies in Iconology). Teve ligeiras modificações em 1955 (Meaning in the Visual Arts).
PANOFSKY
Fundamentos e contrapesos dos 3 níveis de significado:
• Significado primário ou natural. Nível pré-iconográfico.
– descrição pré-iconográfica (equipamento interpretativo: experiência prática, senso comum. Princípio corretivo: história dos estilos).
• Significado secundário ou convencional. Nível iconográfico.
– análise iconográfica (equipamento interpretativo: fontes literárias. Princípio corretivo: história dos tipos [iconográficos]).
• Significado intrínseco ou simbólico. Nível iconológico.
– interpretação iconológica (equipamento interpretativo: «intuição sintética». Princípio corretivo: história dos «sintomas culturais»).
PANOFSKY
• Exemplo 1: o homem que levanta o chapéu para cumprimentar.
• Significado primário ou natural. Nível pré-iconográfico.
– Homem levanta o chapéu na rua atendendo à minha presença.
• Significado secundário ou convencional. Nível iconográfico.
– Interpreto o gesto como um cumprimento (herdado do hábito medieval de tirar o elmo para mostrar intenções pacíficas).
• Significado intrínseco ou simbólico. Nível iconológico.
– Percebo o estado de espírito do homem que levanta o chapéu e faço um «diagnóstico» da sua personalidade («condicionada pelo seu fundo
nacional, social e educativo e pela história da sua vida (…) uma maneira individual de ver as coisas e de reagir ao mundo». )
Exemplo 2: Última Ceia de Leonardo (Milão).
• Significado primário ou natural. Nível pré-iconográfico.
– Um grupo de 13 indivíduos sentados à mesa.
• Significado secundário ou convencional. Nível iconográfico.
– Reconheço essa composição como a Última Ceia (pelo estudo dos Evangelhos e/ou pelo estudo da tradição visual).
• Significado intrínseco ou simbólico. Nível iconológico.
– Interpreto a Última Ceia de Leonardo como um documento da
personalidade de Leonardo ou da civilização do Renascimento italiano. («tratamos a obra de arte como sintoma de outra coisa que se exprime
numa inumerável variedade de outros sintomas, e interpretamos os seus traços composicionais e iconográficos como uma evidência particular dessa “outra coisa”. A descoberta e interpretação desses valores
“simbólicos” (…) é o objecto daquilo que podemos chamar “iconologia” enquanto oposta à “iconografia”»).
Princípios correctivos:
• Significado primário ou natural. Nível pré-iconográfico.
– Conhecer a história dos estilos para não aplicar princípios contemporâneos a obras anteriores (realismo do séc. XV vs. simbolismo otoniano).
• Significado secundário ou convencional. Nível iconográfico.
– Mulher com espada e cabeça de homem: Salomé e S. João Baptista ou Judite e Holofernes? Ver se existem exemplos iconográficos anteriores de Judites com bandejas (sim) ou Salomés com espadas (não). Porquê a bandeja e não o saco? Pela popularização da imagem devocional da cabeça decapitada de S. João (Norte de Itália e Alemanha).
• Significado intrínseco ou simbólico. Nível iconológico.
– Não são dados exemplos, mas diz respeito a um domínio sólido da História da Cultura. Implica verificar se as nossas conclusões acerca do significado
intrínseco da obra estão em linha com o significado intrínseco de outras
produtos da época relacionados com a obra que estudamos (perigo: circularidade do raciocínio).
Princípios correctivos:
• Significado primário ou natural. Nível pré-iconográfico.
– «História dos estilos (visão compreensiva do modo como, sob condições históricas variáveis, objectos e eventos são representados por formas).»
Formas objectos e eventos
• Significado secundário ou convencional. Nível iconográfico.
– «História dos tipos (visão compreensiva do modo como, sob condições
históricas variáveis, temas e conceitos específicos são expressos por objectos e
eventos».
Objectos e eventos temas e conceitos
• Significado intrínseco ou simbólico. Nível iconológico.
– «História dos sintomas culturais ou “símbolos” (visão compreensiva do modo como, sob condições históricas variáveis, tendências essenciais do espírito
humano foram expressas por temas e conceitos específicos».
PANOFSKY
«A interpretação iconológica:
• quanto mais subjectiva e irracional é esta fonte de interpretação ( […] sempre
condicionada pela psicologia e mundividência do intérprete), tanto mais necessária é a aplicação de princípios correctivos.
• tem de ser corrigida por uma visão compreensiva do modo como […] as
tendências gerais e essenciais do espírito humano foram expressas por assuntos e conceitos específicos. […] O historiador da arte terá de conferir aquilo que ele pensa ser o significado intrínseco da obra com aquilo que ele pensa ser o
significado intrínseco de outros tantos documentos civilizacionais historicamente relacionados com aquela obra [i.e., testemunhos das tendências políticas,
poéticas, religiosas, filosóficas, e sociais da personalidade, época ou país investigado]»
PANOFSKY
Exemplos da interpretação iconológica:
• 1930 (Hércules na Encruzilhada). O interesse renascentista por este
tema mitológico (em que o herói tem de optar entre o caminho fácil
e o difícil) servia de alegoria moral à própria Renascença.
• 1939 (Studies in Iconology). Explica as diferenças entre o estilo de
Ticiano (Veneza) e Miguel Ângelo (Florença/Roma) como sinais da
interpretação diferenciada do neoplatonismo nesses dois locais.
• 1951. (Arq. Gótica e Pens. Escolástico). Explica a evolução da Arq.
Gótica em paralelo com o desenvolvimento do método escolástico.
Justiça de Cambises
(Sisamnés é esfolado vivo)
Gerard David, 1498