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PLANOS DE SAÚDE E A RECUSA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO CONSUMIDOR INDIVIDUAL

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PLANOS DE SAÚDE E A RECUSA DE PRESTAÇÃO DE

SERVIÇOS AO CONSUMIDOR INDIVIDUAL

Paulo R. Roque A. Khouri

Coordenador da Pós-Graduação em Contratos e Responsabilidade Civil do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e Advogado. Mestre em Direito Privado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

15/07/2008

Alguns planos de saúde têm se limitado a trabalhar apenas com planos coletivos para pessoas jurídicas. Não ofertam planos de saúde para os consumidores individuais, pessoas físicas. Essa recusa ocorre em área tão sensível à concretização dos direitos fundamentais, no plano horizontal, entre particulares, no que diz respeito à dignidade humana do usuário; consumidor este que necessita recorrer à contratação de planos de saúde para satisfazer necessidade premente de proteção à própria existência, ante a ineficiência crônica dos serviços estatais. A questão que se coloca é se tal prática é compatível com o ordenamento jurídico brasileiro. Afinal, os fornecedores de planos de saúde são ou não obrigados a ofertar seus serviços para os consumidores pessoas físicas?

Os planos sustentam que não há qualquer lei que os obrigue a disponibilizar seus serviços para os consumidores, pessoas físicas. Não existiria na Lei nº 9.656/98, que regula essa contratação, qualquer obrigatoriedade neste sentido. Por outro lado, preferem trabalhar com os planos coletivos, sobretudo por conta de um motivo bem especial: ao final do prazo contratual poderiam rescindir unilateralmente o contrato se, v.g., a sua

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execução se revelar economicamente não interessante, ao passo que, na contratação do plano individual, não pode haver rescisão nem suspensão unilateral, sem justo motivo, e, mesmo nos casos de inadimplemento do consumidor, este ainda poderia purgar a mora, nos termos do art. 13 da Lei.1

O STJ,2 recentemente, entendeu como não abusiva a cláusula contratual, em planos coletivos, que previa a denúncia unilateral.

Parece-me que a conduta dos planos, ao contrário do que sustentam as administradoras, está em choque com o ordenamento jurídico brasileiro. Elas estariam obrigadas a trabalhar com planos coletivos e individuais. O plano recusa a contratação a um consumidor pessoa física, mas o admite (esse mesmo consumidor) em um plano dito coletivo, em que oficialmente o contratante é uma pessoa jurídica. Fazem isso tão-somente para fugir às exigências da Lei nº 9.656/98, sobretudo a da rescisão e/ou suspensão unilateral do plano. Na qualidade de profissionais que atuam no mercado com habitualidade e profissionalidade, não poderiam recusar o atendimento às demandas dos consumidores. Na qualidade de fornecedores, a partir do momento que se apresentam no mercado enquanto tal, não podem recusar-se a fornecer seus serviços a quem se disponha a pagar pelos mesmos.

Dois diplomas legais apontam para a ilicitude da conduta de alguns fornecedores dos planos de saúde. O primeiro desses diplomas é a Lei nº 1.521/51, a chamada Lei da Economia Popular, que trata da sonegação injustificada de qualquer bem, por parte de quem os comercializa habitualmente no mercado, como crime contra a economia. Diz em seu art. 2º que o fornecedor, enquanto tal, encontra-se em situação de oferta permanente e não pode se recusar a contratar com quem busca seus produtos ou serviços.3 O outro diploma é o próprio CDC, que, por meio do seu art. 39, II4 determina que os fornecedores não podem recusar o atendimento às demandas dos consumidores por seus produtos ou serviços.

O que está acontecendo, na realidade, é uma discriminação juridicamente injustificável em desfavor dos consumidores individuais.

Os planos têm o serviço que o consumidor deseja, mas não ofertam o serviço ao mercado indistintamente, como determina a Lei. Pelo contrário,

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conscientemente só ofertam o serviço ao seguimento dos consumidores pessoa jurídica, deixando de fora o consumidor individual, pessoa física. A própria Lei nº 9.656/98, em seu art. 18, I5 procura coibir toda e qualquer forma de discriminação entre usuários.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul,6 ao julgar questão envolvendo seleção de consumidores na oferta de serviços, decidiu que “sendo o estabelecimento comercial aberto ao público, não pode a ré selecionar os seus clientes nem proibir o acesso de quem procura os serviços que oferece, salvo motivo excepcional devidamente comprovado”.

Os direitos outorgados ao consumidor em qualquer relação não podem implicar concessão de privilégios.7 São direitos que visam equalizar relação de consumo naturalmente desigual por conta da reconhecida vulnerabilidade do consumidor. Há que existir sempre uma harmonia nessa relação, sem que se verifique vantagem exagerada, seja para o consumidor, seja para o fornecedor. Na questão colocada em debate, vê-se que o fornecedor, para fugir ao risco próprio de sua atividade econômica, busca driblar a proteção conferida pelo legislador, simplesmente deixando de ofertar seus serviços ao consumidor individual, que se dispõe a remunerar a administradora sem a obtenção de qualquer vantagem exagerada. Se a contratação do plano individual fosse sempre prejudicial às administradoras, seguramente não haveria no mercado fornecedores de planos de saúde ofertando seus serviços ao consumidor pessoa física.

Dentro da linha de pensamento aqui exposta, FÁBIO ULHOA COELHO8 defende que o CDC impõe o dever de contratar aos empresários.

Ao empresário não é lícito negar-se a fornecer os bens ou serviços próprios de sua atividade...

Evidente que a questão aqui debatida não pode ser confundida com a limitação indevida da livre iniciativa empresarial por parte do Estado. O que não pode é a intervenção estatal ferir os legítimos interesses econômicos dos fornecedores, como, v.g., obrigando-os a trabalhar com preços inferiores ao

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custo do próprio serviço. Para operar no mercado, é natural que busquem o lucro, devendo o preço dos serviços refletir seu legítimo interesse econômico. Entretanto, ao fugirem da contratação individual estão, na verdade, deixando de assumir riscos próprios da atividade econômica, riscos esses que devem ser levados em consideração quando alguém se dispõe a explorar economicamente qualquer atividade, inclusive aquela vin-culada a consumidores, na qual é crescente, em todo o mundo ocidental, a intervenção estatal em prol dos mesmos.

NOTAS

Esta coluna é de responsabilidade do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP).

1 Art.?13.??Os contratos de produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei têm renovação automática a partir do vencimento do prazo inicial de vigência, não cabendo a cobrança de taxas ou qualquer outro valor no ato da renovação.

Parágrafo?único.??Os produtos de que trata o caput, CONTRATADOS INDIVIDUALMENTE, terão vigência mínima de um ano, sendo vedadas: (…) II?–?a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato, salvo por fraude ou não-pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato, desde que o consumidor seja comprovadamente notificado até o qüinquagésimo dia de inadimplência; e Art.?35-E.??A partir de 5 de junho de 1998, fica estabelecido para os contratos celebrados anteriormente à data de vigência desta Lei que: (…) III?–?é vedada a suspensão ou a rescisão unilateral do CONTRATO INDIVIDUAL OU FAMILIAR de produtos de que tratam o inciso I e o §?1o do art. 1o desta Lei por parte da operadora, salvo o disposto no inciso II do parágrafo único do art. 13 desta Lei; 2 REsp nº 889.406-RJ, Relator Ministro MASSAMI UYEDA, DJ 17.03.08. SEGURO DE ASSISTÊNCIA À SAÚDE DE CONTRATAÇÃO COLETIVA – PACTUAÇÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.656/1998 – APLICAÇÃO, EM PRINCÍPIO, AFASTADA CLÁUSULA QUE

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PREVÊ A RESILIÇÃO UNILATERAL DO CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO, COM PRÉVIA NOTIFICAÇÃO – LEGALIDADE – A VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 13 DA LEI Nº 9.656/98 RESTRINGE-SE AOS PLANOS OU SEGUROS DE SAÚDE INDIVIDUAIS OU FAMILIARES – CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – VIOLAÇÃO – INOCORRÊNCIA – DIREITO DE DENÚNCIA UNILATERAL CONCEDIDA A AMBAS AS PARTES – RECURSO IMPROVIDO. 3 Art. 2º. São crimes desta natureza: I – recusar individualmente, em estabelecimento comercial, a prestação de serviços essenciais à subsistência; sonegar mercadoria ou recusar vendê-la a quem esteja em condições de comprar a pronto pagamento; II – favorecer ou preferir comprador ou freguês em detrimento de outro, ressalvados os sistemas de entrega ao consumo por intermédio de distribuidores ou revendedores; 4 É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentro de outras práticas abusivas... II – recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque e, ainda, de conformidade com os usos e costumes. 5 I – o consumidor de determinada operadora, em nenhuma hipótese e sob nenhum pretexto ou alegação, pode ser discriminado ou atendido de forma distinta daquela dispensada aos clientes vinculados a outra operadora ou plano; 6 TJRS – AC nº 5.524/92. IOB 3/9696. 7 Cf. KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do Consumidor, 3. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 33. 8 In Curso de Direito Comercial, Saraiva, v. 3, 2000, p. 192.

Referências

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