Coleção PhilosoPhiCa
coordenada por RaChel Gazolla
• A ciência e o mundo moderno Alfred North Whitehead
• Introdução à filosofia antiga: Premissas filológicas e outras “ferramentas de trabalho” Livio Rossetti
• Busca do conhecimento: Ensaios de filosofia medieval no Islã Rosalie Helena S. Pereira (org.)
• Cosmologias: Cinco ensaios sobre Filosofia da Natureza Rachel Gazolla (org.)
• As ambiguidades do prazer: Ensaio sobre o prazer na filosofia de Platão Francisco Bravo
• Sofista Giovanni Casertano
• Platão e Aristóteles na doutrina do Nous de Plotino Thomas Alexander Szlezák
• A arte e o pensamento de Heráclito:
Uma edição dos fragmentos com tradução e comentário Charles Kahn
• Espinosa e Vermeer: Imanência na filosofia e na pintura Sara Hornäk
• A sabedoria grega (I) Giorgio Colli • O pensamento de Gadamer
Jean Grondin (org.)
• Estrutura e significado da Metafísica de Aristóteles Enrico Berti
• Teoria das ideias de Platão: Uma introdução ao idealismo (2 Vols.) Paul Natorp
• Hieros Logos: Poesia órfica sobre os deuses, a alma e o além Alberto Bernabé
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ontradição
e
d
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nos
antigos
e
nos
modernos
© PAULUS – 2013
Rua Francisco Cruz, 229 • 04117-091 • São Paulo (Brasil) Fax (11) 5579-3627 • Tel. (11) 5087-3700
www.paulus.com.br • editorial@paulus.com.br ISBN 978-85-349-3592-0
Título original: Contraddizione e dialettica negli antichi e nei moderni © 1987, L’EPOS Società Editrice s.a.s., Palermo, Itália ISBN 9788883020445
Tradução: José Bortolini
Direção editorial: Claudiano Avelino dos Santos Assistente editorial: Jacqueline Mendes Fontes Revisão técnica: Janaína Mafra
Revisão: Tiago José Risi Leme
Diagramação: Dirlene França Nobre da Silva Capa: Marcelo Campanhã
Impressão e acabamento: PAULUS
1ª edição, 2013
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Berti, Enrico
Contradição e dialética nos antigos e nos modernos / Enrico Berti; [tradução José Bortolini]. — São Paulo: Paulus, 2013. — (Coleção philosophica)
Título original: Contraddizione e dialettica negli antichi e nei moderni Bibliografia.
ISBN 978-85-349-3592-0
1. Contradição 2. Dialética 3. Filosofia 4. Filósofos 5. Lógica I. Título. II. Série. 12-14994 CDD-160 Índices para catálogo sistemático:
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ÍNDICE
7 INTroDução
17 I
contradIção e dIalétIca nos antIgos
19 CapÍtulo I
A contradição exorcizada, ou a dialética da identidade, no eleatismo e em seus epígonos
59 CapÍtulo II
A contradição absolutizada, ou a dialética impotente, no heraclitismo e em seus epígonos
101 CapÍtulo III
A contradição em ação, ou a dialética como estrutura da filosofia em Sócrates e em Platão
155 CapÍtulo IV
o princípio de não contradição, a teoria dos tipos de oposição e os diferentes usos da dialética em Aristóteles
215 II
contradIção e dIalétIca nos Modernos
217 CapÍtulo I
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267 CapÍtulo II
Necessidade da contradição e fundação da nova dialética em Hegel
341 CapÍtulo III
Transposição da contradição e “reviravolta” da dialética hegeliana em Marx e no marxismo 393 CapÍtulo IV
redescoberta da dialética antiga mediante o debate sobre a contradição na lógica hodierna
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I
NtroDução
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Por que esse interesse? Porque a atual crise da filo-sofia, tão propalada e, não obstante, inegável, em minha opinião, é essencialmente uma crise de estrutura lógica. Não pretendo tomar este último termo num sentido ex-cessivamente técnico: de fato, não estou me referindo à lógica simbólica e às relativas técnicas de formalização. Por estrutura lógica entendo um procedimento argumen-tador suscetível de ser controlado ou, melhor dizendo, de “ser posto à prova”, “provado” em sua consistência, que é condição imprescindível para a verdade, segundo aquele tipo de exame (peîra) já praticado por Sócrates. Ela per-mite avaliar quando uma asserção qualquer é suficiente-mente fundada, justificada, a ponto de poder ser conside-rada aceitável também fora da situação subjetiva peculiar na qual seu autor se encontra. A crise da filosofia hoje se deve em grande parte à persuasão de que esta não possui mais qualquer estrutura lógica, pois se assume preconcei-tuosamente que os únicos procedimentos argumentativos aceitáveis são aqueles usados pelas ciências, matemáticas, naturais ou humanas, mas de qualquer forma “positivas”, e que a filosofia, para se distinguir delas, deve renunciar a qualquer estrutura e, portanto, a qualquer forma de argu-mentação, reduzindo-se a um discurso substancialmente arbitrário, embora interessante e sugestivo.
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valor dos outros discursos ou a possibilidade de transfor-mação de si próprios e do mundo. Consequentemente, não basta dispor de estrutura lógica, é necessário saber usá-la, a fim de realizar pesquisas e desenvolver discur-sos efetivamente importantes, que permitam compreen-der ou ver como se encontram as coisas e, portanto, so-lucionem realmente os problemas. Também tenho plena consciência do risco que corremos ao querer tematizar o problema da estrutura lógica da filosofia como se ela fosse separável desta última, isto é, do processo concre-to da pesquisa, e preliminarmente determinável em abs-trato, sem saber ainda qual é a efetiva consistência dos problemas enfrentados. Tenho lido Hegel e conheço os inconvenientes com os quais nos deparamos quando fa-lamos de um método do saber como coisa diferente do próprio saber. Portanto, não pretendo afirmar a possibili-dade de separação entre o método e a filosofia ou assumir posturas metodológicas puramente formais ou neutras. O discurso sobre a estrutura lógica da filosofia é ipso facto discurso sobre a filosofia e, portanto, ele próprio é filoso-fia – pois a filosofiloso-fia não tolera discursos sobre si que não fazem parte de si. Portanto, dentro dos limites permitidos pelas circunstâncias, também o meu discurso será discur-so filosófico. Ele abordará, porém, discur-sobretudo o aspecto lógico, isto é, estrutural, argumentativo, da filosofia, com o objetivo de indicar um critério à luz do qual os discur-sos filosóficos em geral e, portanto, também este discurso, possam ser julgados, conforme os casos, corretos ou com erros e, se for possível, até verdadeiros ou falsos.
Declaro logo que o meu objetivo é ver se, na his-tória da filosofia, havia uma estrutura lógica da filosofia que lhe era peculiar, ou seja, diferente da estrutura lógica
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da ciência ou das outras ciências e que, no entanto, não fosse menos lógica, isto é, menos rigorosa que a estrutura lógica da ciência. Se a expressão “lógica diferente” cria dificuldades, no sentido em que, embora existindo siste-mas axiomáticos diferentes, eles todos estão, no entanto, sempre sujeitos às mesmas regras inferentes, segundo as quais funciona a razão, posso falar de “procedimento” ou modo de proceder: de fato, admitir-se-á que pode haver procedimentos diversos para as diferentes ciências, e se quisermos negá-lo, o ônus de tal negação caberá a quem é fautor de um procedimento único, cuja unicidade não deverá, portanto, ser dada como descontada ou admitida como pressuposto. Em vez disso, não gosto de falar de “método”, por causa do significado que esta palavra as-sumiu no pensamento moderno, onde não significa mais “caminho” ou “percurso da pesquisa”, ou também “abor-dagem” e “disciplina”, como para os gregos, mas discurso preliminar, isto é, separado e formal, ou seja, neutro, em relação aos conteúdos do saber (como no conhecido livro de Gadamer, Verdade e método).
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(dýnamis toû dialégesthai) mediante perguntas, respostas e refutações (élenkhoi), que, segundo Platão, como vere-mos, distingue a filosofia, isto é, a ciência, especialmente das matemáticas.
Os inconvenientes com os quais esta hipótese se de-para são dois. O primeiro é constituído pela concepção de Aristóteles, que foi justamente o maior discípulo de Pla-tão, segundo a qual a dialética por si só não nos faz conhe-cer coisa alguma, ou seja, não é “cognoscitiva” (gnoristiké), mas é simplesmente “apta a submeter à prova”
(peirasti-ké), ou seja, a “submeter a exame” (exetastiké) os
argumenta-| 12 argumenta-| | Enrico BErti |
dor. Por isso o significado de dialética predominante no tempo de Kant não foi de modo algum resgatado, pelo contrário, acabou coincidindo – como veremos – com o deteriorado de sofística ou erística (“arte sofística de dar às próprias ilusões a aparência de verdade”).
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por Popper, e as que Colletti dirige ao materialismo dia-lético, embora não tenham faltado alguns especialistas de lógica que, como veremos, tentaram defender a dialética do ponto de vista da lógica formal.
Apesar desses inconvenientes, confio poder mos-trar que a dialética, no sentido platônico do termo, não foi rejeitada, pelo contrário, foi adotada por Aristóteles como estrutura lógica da filosofia (porque em determi-nados casos, e justamente em filosofia, ela não se opõe à apodítica, mas coincide com ela) e, portanto, a sua des-valorização medieval e moderna não tem qualquer razão de ser. Quanto à dialética moderna, no sentido de Hegel e de Marx, tentarei demonstrar que, na medida em que ela não rejeita o princípio de não contradição, mas, pelo contrário, permite o resgate de sua formulação mais an-tiga mediante a justa crítica de suas deformações, é inte-grada à dialética aristotélica, confirmando a possibilidade de adotá-la como estrutura lógica da filosofia.
| 14 | | Enrico BErti |
Quanto à contradição, que não por acaso acompa-nha a dialética no próprio título deste livro, pelo menos à primeira vista, é admitida como realmente existente por todos aqueles que negam ou ignoram o princípio de não contradição, mas é negada ou relegada exclusivamente no pensamento, com o efeito de falsificá-lo, por todos aque-les que, pelo contrário, admitem o princípio de não con-tradição, considerando-o inviolável. A essas duas atitudes opostas correspondem, grosso modo, o sentido antigo e o sentido moderno da dialética: contradição, princípio de não contradição e dialética aparecem assim estreitamente conexos. Todavia, como veremos, mais além dessa contra-posição bastante simples, mais ainda simplória, há senti-dos diferentes nos quais a contradição pode ser entendi-da e efetivamente foi entendientendi-da na história, alguns dos quais são claramente incompatíveis com o princípio de não contradição, ao passo que outros não o são. O próprio princípio de não contradição pode ser entendido, e efeti-vamente foi entendido, em sentidos diferentes, de acordo com os quais ele pode ser ou não ser incompatível com a existência real da contradição. Portanto, será necessário ver quais são esses sentidos tanto da contradição como do princípio que a nega.
con-| 15 con-| | introdução |
sequência do fato de que já foi demonstrada uma con-clusão como verdadeira, ou então pode ela própria ser demonstrada como conclusão no intuito de argumentar a falsidade desta última ou das premissas das quais ela de-riva. Mas em vários autores ela foi sempre excluída como impossível, sempre admitida como necessária ou, enfim, admitida como necessária para excluir a verdade das po-sições que a contêm. Tudo isso deve ser discutido e escla-recido, assim como deve ser examinada a relação na qual essas considerações se encontram com a lógica atual: é o problema da assim chamada formalização da dialética.