V SO
DÉCIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0049371-69.2016.8.19.0000AGRAVANTE: ASSOCIAÇÃO DOS BENEFICIÁRIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL DO RIO DE JANEIRO – ABEPREV RIO
AGRAVADO: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RELATOR: DES. GABRIEL ZEFIRO
AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO QUE, EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA, DEFERIU O PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA FORMULADO PARA: PROIBIR A ABEPREV RIO DE REALIZAR A ADESÃO DE NOVOS ASSOCIADOS; SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DOS DÉBITOS DOS SEUS ASSOCIADOS REFERENTES À CONTRIBUIÇÃO MENSAL A TÍTULO DE MANUTENÇÃO, ORGANIZAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO DA ASSOCIAÇÃO, ALÉM DA TAXA DE ADMINISTRAÇÃO ANUAL; DETERMINAR A ABSTENÇÃO DE INCLUSÃO DO NOME DE SEUS ASSOCIADOS NOS CADASTROS RESTRITIVOS DE CRÉDITO E A IMEDIATA EXCLUSÃO DAQUELES QUE EVENTUALMENTE JÁ CONSTEM DOS MESMOS E
DETERMINAR O FORNECIMENTO DA LISTA
COMPLETA DOS SEUS ASSOCIADOS,
ADMINISTRADORES E/OU MEMBROS DA DIRETORIA. ACERTO DO DECISUM. PROBABILIDADE DO DIREITO QUE RESTOU CORROBORADA PELAS FARTAS PROVAS ADUNADAS À EXORDIAL DA AÇÃO COLETIVA, AO MENOS EM SEDE DE COGNIÇÃO SUMÁRIA. PERIGO DE DANO EVIDENTE. ARTIGO 300 DO CPC/15. ENVIO DE MALA DIRETA A DIVERSOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO INSS, INFORMANDO QUE TERIAM DIREITO A REAJUSTE DE SEU BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, COOPTANDO-OS A AJUIZAR AÇÃO REVISIONAL E A ASSINAR DIVERSOS PAPÉIS, SEM QUE TIVESSEM PLENA CIÊNCIA DE SEU CONTEÚDO,
CULMINANDO NA ASSOCIAÇÃO À ENTIDADE
AGRAVANTE E NA COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÕES RESPECTIVAS. FORTES INDÍCIOS DE DESVIO DE FINALIDADE E VIOLAÇÃO À LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO. ARTIGO 5º, XIX, DA CRFB, QUE
POSSIBILITA A SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES ASSOCIATIVAS POR MEIO DE DECISÃO JUDICIAL, SENDO PRESCINDÍVEL O TRÂNSITO EM JULGADO. AUSÊNCIA DE PERIGO DE DANO IRREVERSÍVEL. SÚMULA 59 DO TJRJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 0049371-69.2016.8.19.0000, em que é agravante ASSOCIAÇÃO DOS BENEFICIÁRIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DO RIO DE JANEIRO – ABEPREV RIO e agravado DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
ACORDAM, por unanimidade de votos, os Desembargadores que compõem a Décima Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento em face de decisão que, em sede de ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública em face da ABEPREV-RIO e LEANDRO VICENTE SILVA, deferiu a tutela de urgência para:
“I. proibir a Associação dos Beneficiários da Previdência Social do Rio de Janeiro (ABEPREV-RIO) de realizar a adesão de novos associados, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00
II. suspender a exigibilidade dos débitos dos associados da 1ª ré referentes à contribuição mensal a título de manutenção, organização e administração da associação, além da taxa de administração anual, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais);
III. determinar que a 1ª ré se abstenha de incluir o nome de seus associados nos cadastros restritivos de crédito, bem como determinar a imediata exclusão dos nomes dos associados que eventualmente já constem dos mesmos, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais);
IV. determinar que a 1ª ré traga aos autos a lista completa dos seus associados, administradores e/ou membros da diretoria.”
Sustenta a agravante, em suma, que a liminar causará prejuízos e danos irreparáveis em relação aos empregados, pois culminará com a demissão de pelo menos 70% do quadro de funcionários, acarretando o desemprego de inúmeras pessoas. Impugna a presença dos requisitos autorizadores da antecipação de tutela. Requer o deferimento do efeito suspensivo para cancelamento dos itens I e II da liminar deferida, com posterior confirmação no mérito.
Efeito suspensivo indeferido às fls. 15/16.
Contrarrazões às fls. 23/34, pelo desprovimento do recurso e condenação do agravante em honorários advocatícios.
Parecer ministerial às fls. 37/56, pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
O recurso é tempestivo e estão satisfeitos os demais requisitos de admissibilidade.
VOTO
A decisão agravada está correta e deve ser mantida, tendo em vista que os requisitos para a concessão da tutela de urgência restaram demonstrados na hipótese vertente, à luz do artigo 300 do CPC/15. Senão vejamos.
A ação civil pública da qual se origina o presente agravo decorre de procedimento administrativo instaurado pelo Núcleo Especial de Atendimento à Pessoa Idosa da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, no qual se apurou que a agravante enviava mala direta a diversos aposentados e pensionistas do INSS, informando que teriam direito a reajuste de seu benefício previdenciário.
Aduziu a autora coletiva que, ao comparecerem à sede da recorrente, os aposentados e pensionistas eram encorajados a ajuizar ação de reajuste de proventos e pensões, por meio de advogado da associação, ora segundo réu, com a promessa de ser “causa ganha”. Em seguida, induzidos em erro, assinavam sem ler diversos documentos, acabando por se tornarem associados da agravante e obrigados ao pagamento mensal de contribuição, além de taxa de administração anual.
Destaca ainda que as demandas judiciais foram julgadas improcedentes pela Justiça Federal e as vítimas passaram a ser ameaçadas de terem seus nomes negativados, além de sofrerem ações de execução, em razão de débitos junto à associação agravante, ameaças que, segundo a autora, se concretizaram contra dezenas de vítimas.
Em sede de cognição sumária, tem-se que a probabilidade do direito decorre da farta documentação adunada à exordial, contando com mais de oitenta depoimentos de vítimas idosas que afirmaram ignorar que estavam se associando, bem como que houve a promessa de que a ação seria “causa ganha”.
Quando a Constituição consagra a garantia da liberdade de associação, o faz com a ressalva de finalidade lícita, verbis:
XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar;
As denúncias que se apuram e que são objeto da Ação Penal nº 0402062-23.2012.8.19.0001, em curso na 25ª Vara Criminal da Comarca da Capital, são de que a associação teria sido criada com a finalidade de captação de clientela e arrecadação de valores pagos pelos aposentados e pensionistas, sem que tivessem plena ciência de que estavam se associando.
Há fundados indícios, portanto, de desvio de finalidade e violação ao princípio constitucional da liberdade de associação, o que justifica a adoção de medidas assecuratórias por parte do juiz, com esteio no artigo 139, IV, do CPC, até que haja a dilação probatória na instância a quo, possibilitando ao julgador decidir de forma segura acerca da pertinência dos pedidos formulados.
Por outro lado, o perigo de dano necessário à concessão da tutela de urgência é inequívoco, tendo em vista as diversas cobranças e execuções das contribuições associativas, ensejando inclusive a negativação do nome de diversos aposentados e pensionistas.
Com efeito, o artigo 230 da CRFB e o Estatuto do Idoso conferem especial proteção aos idosos, porquanto pertencentes a uma classe vulnerável da sociedade, suscetíveis ao engodo, em decorrência da idade avançada e estado de saúde comumente delicado.
Outrossim, ao contrário do que sustenta a agravante, é possível a suspensão de suas atividades por meio de decisão judicial. O trânsito em julgado só se faz imprescindível para a dissolução compulsória da associação, na esteira do disposto no artigo 5º, XIX, da CRFB:
XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado;
Frise-se, contudo, que o Juízo a quo não determinou a suspensão das atividades, mas tão somente a adesão de novos associados, o que se mostra razoável diante da gravidade dos fatos em análise e consentâneo com o escopo de impedir novas adesões viciadas.
Não há falar ainda em perigo de dano irreversível, ante a possibilidade de revogação a qualquer tempo da liminar concedida, com o amadurecimento da causa e surgimento de provas novas, além da possibilidade de retomada das ações de cobrança, inclusive retroativamente.
Certo é que a agravante não especificou quais atividades sociais são por ela prestadas, tampouco comprovou a inexorável demissão de 70% de seu quadro funcional com as
medidas impostas, o que enfraquece a verossimilhança da tese desenvolvida.
Por fim, aplica-se ao caso o disposto na súmula 59 desta Corte, segundo a qual: "Somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação da tutela, se teratológica, contrária à Lei ou à evidente prova dos autos".
Quanto aos honorários recursais pleiteados pela agravada em sede de contrarrazões, é de se destacar que esses encontram guarida em sede de recurso que desafie provimento jurisdicional que os tenha inicialmente fixado, o que não reflete a hipótese vertente.
Isso posto, VOTO no sentido de conhecer e negar provimento ao recurso.
Rio de Janeiro, 1º de fevereiro de 2017.
_______________________________RELATOR DES. GABRIEL DE OLIVEIRA ZEFIRO