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Open Gêneros orais na produção textual do ensino médio

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Academic year: 2018

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

GÊNEROS ORAIS NA PRODUÇÃO TEXTUAL DO ENSINO MÉDIO

JULIENE PAIVA DE ARAÚJO OSIAS

JOÃO PESSOA – PB

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JULIENE PAIVA DE ARAÚJO OSIAS

GÊNEROS ORAIS NA PRODUÇÃO TEXTUAL DO ENSINO MÉDIO

Trabalho final apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras, área de concentração Linguagem e Ensino: Linguagem e Interação em Contexto de Ensino.

Orientadora: Profª Drª Ana Cristina de Sousa Aldrigue

JOÃO PESSOA – PB

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JULIENE PAIVA DE ARAÚJO OSIAS

GÊNEROS ORAIS NA PRODUÇÃO TEXTUAL DO ENSINO MÉDIO

Trabalho final apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Letras, área de concentração Linguagem e Ensino: Linguagem e Interação em Contexto de Ensino.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________ Ana Cristina de Sousa Aldrigue (Orientadora)

______________________________________________________ Regina Celi Pereira (Examinadora)

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AGRADECIMENTOS

Meus mais sinceros agradecimentos a Ana Cristina Aldrigue, minha orientadora, por sempre ter acreditado no meu trabalho, incentivando-me tanto.

Agradeço à professora Regina Celi Pereira, por tanto desprendimento e gentileza todas as vezes em que lhe solicitei atenção.

A Igor e Anísio, pela grande ajuda nos assuntos da informática.

Aos meus pais, João e Clênia, por terem acreditado em tudo e sempre, incondicionalmente.

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RESUMO

Os gêneros orais estão presentes, necessariamente, no cotidiano de qualquer falante de uma língua, de modo espontâneo, não havendo necessidade, portanto, no caso específico dos gêneros orais primários, de torná-los ‘ensináveis’. O fato é que os gêneros orais formais não apenas poderiam, mas deveriam compor os programas escolares lado a lado com a escrita. Assim, não haveria essa distinção de status entre a fala e a escrita, estando esta sempre constando como a forma correta e aceitável de comunicar-se - linha de pensamento que insiste em relegar a fala a um patamar de inferioridade e incorreção. Desta forma também os Livros Didáticos consideram a oralidade e, no Ensino Médio, há tão-somente uma continuidade a este tratamento.

Propomos, diante desta discussão, analisar, a partir de um Livro Didático de Língua Portuguesa (especificamente voltado para o ensino da produção textual) se este LD aborda a oralidade como objeto de ensino e de que forma o faz. Observaremos, assim, que o ensino do oral ainda se insinua, principalmente no Ensino Médio, uma vez que a escrita atua como protagonista.

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ABSTRACT

The oral genders are, necessarily, present in the daily routine of anyone who speaks any language, spontaneously. Therefore, in the case of primary genders, they are not taught. The fact is that the formal oral genders not only could but they also would have been side by side the writing, comprising school programs, instead of considering writing as the correct and acceptable form to comunicate – tendency which insists on relegating the oral language to a platform of inferiority and inaccuracy. Didactic Books do the same, and, in Secondary Education, there is a simple continuity of this mentality.

According to this discussion, we propose analysing, from a Portuguese Didactic Book , if this Didactic Book treats the oral genders as a teaching object and it does that. Then we will observe that the oral teaching is still in its beginning, specially in Secondary Education, when the writing acts as a protagonist.

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1: Tipos textuais X Gêneros textuais... 32

QUADRO 2: Dicotomias estritas ... 44

QUADRO 3: Visão culturalista ... 44

QUADRO 4: A perspectiva variacionista ... 45

QUADRO 5: A perspectiva sociointeracionista ... 45

QUADRO 6: Gêneros orais ‘não-ensináveis’/’ensináveis’ ... 58

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LISTA DE ABREVIAÇÕES

LD – Livro Didático

PNLD – Programa Nacional do Livro Didático

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO... 11

CAPÍTULO 1: DE SAUSSURE A BAKTHIN: CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM... 14

CAPÍTULO 2: OS GÊNEROS TEXTUAIS... 18

2.1. Bakhtin: Gêneros Primários e Secundários... 22

2.2. Tipologias Textuais x Gêneros Textuais... 24

CAPÍTULO 3: GÊNEROS ORAIS... 26

3.1. Os Gêneros Orais no Livro Didático... 35

CAPÍTULO 4: ANÁLISE DO MANUAL DIDÁTICO... 40

4.1. Programa Nacional do Livro do Ensino Médio/2006... 40

4.2. Inserindo os critérios do PNLD/2006 na análise do corpus... 46

CONSIDERAÇÕES FINAIS... 76

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INTRODUÇÃO

Novos conceitos e métodos foram descobertos no processo de ensino para o trabalho com produção de texto, centrados na visão sócio-interacionista da linguagem, a partir das duas últimas décadas do século XX. O aspecto principal dessa abordagem baseia-se nos gêneros do discurso, aqui tratados como gêneros textuais, colocados como a vertente ideal para a realização de uma produção textual escolar, uma vez que, desta forma, os alunos a fariam de um modo bem mais coerente, partindo de textos empíricos e de uma realidade social de interação.

Mediante tais questões, o presente trabalho organiza-se em torno do conceito sócio-interacionista da linguagem, para que se chegue aos gêneros textuais, em seus conceitos, subdivisões e funções, num enfoque mais voltado aos gêneros orais para um trabalho de produção textual. Partimos, a priori, de Bakhtin(1992) e, ainda, de Bronckart(2003), Dolz e Schneuwly(2004), que nos nortearão teoricamente. No Brasil, nossas fontes são Marcuschi(2003) e Rojo(2004).

Ancorado nas discussões teóricas propostas pelos estudiosos acima, nosso objetivo específico é observar, no livro didático (LD) do Ensino Médio – Oficina de Redação - de Leila Lauar Sarmento, Editora Moderna, dentro das propostas para a produção textual, como e quais gêneros orais estão sendo empregados – ou mesmo se estão sendo empregados. Ou seja, na análise do corpus (do LD), seguindo os critérios utilizados pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), descritos no item 4.1 do capítulo 4, em observância aos Parâmetros Curriculares Nacionais, observaremos se a suposta ocorrência de gêneros orais dá-se de forma sistemática, com objetivos definidos – e eficácia quanto à produção textual escolar – ou se os gêneros orais constam do LD apenas para, aparentemente, compô-lo, sem que haja um tratamento didático eficaz para uma produção textual coerente, empírica e sócio-interativa. Temos em Batista (2003, p. 25) uma breve definição do PNLD:

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O PNLD foi criado em 1996 e, desde então, desenvolve e executa um conjunto de medidas para avaliar, aprovar e indicar livros didáticos para a rede pública de ensino. Passou a ser, então, uma referência de qualidade no tocante aos livros didáticos que circulam na rede pública.

Os aspectos do LD – aqui, especificamente, os de Língua Portuguesa – que o PNLD submete a avaliações são:

• Natureza do material textual.

• Leitura e compreensão de textos.

• Produção de textos.

• Oralidade.

• Conhecimentos lingüísticos.

• Manual do professor.

• Aspectos editoriais.

Analisaremos, no entanto, apenas o aspecto “oralidade”, pois este é o foco principal do nosso trabalho, por constatarmos a suposta ausência de um trabalho sistemático e eficaz voltado para a tradição oral.

E é importante observar que toda esta análise refere-se ao Ensino Fundamental, não havendo, até então, um trabalho de crítica voltado, especificamente, para o Ensino Médio. Para sermos mais precisos, foi lançado, em 2004, o Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio (PNLEM/2006) – Língua Portuguesa. Como se vê, entrará em vigor ainda em 2006, trazendo 09 (nove) LDs devidamente analisados e indicados.

Diante de uma certa ‘carência’ no Ensino Médio em relação a um ‘controle de qualidade’ dos LDs quanto à presença – ou não – dos gêneros orais, vimos aqui um caminho muito interessante para análises e descobertas. Este é, então, o nosso direcionamento: a valorização dos gêneros orais como objeto de ensino e a presença deles no livro didático do Ensino Médio, num trabalho didático-pedagógico.

Para tanto, iniciaremos nossas reflexões no Capítulo 1, estabelecendo um paralelo teórico quanto às concepções de linguagem de Saussure e de Bakhtin.

No Capítulo 2, definimos gêneros textuais, apontando, inclusive, as diferenças e semelhanças entre os gêneros primários e secundários, além de outro paralelo, desta vez, traçado entre tipologias textuais e gêneros textuais.

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CAPÍTULO 1

DE SAUSURRE A BAKHTIN: CONCEPÇÕES DE LINGUAGEM

Na filosofia da linguagem e nas divisões metodológicas correspondentes da lingüística geral, encontramo-nos em presença de duas orientações principais no que concerne à resolução de nosso problema, que consiste em isolar e delimitar a linguagem como objeto de estudo específico. Isto acarreta, por suposto, uma distinção radical entre estas duas orientações para todas as demais questões que se colocam em lingüística. (BAKHTIN, 2003, p. 72).

A linguagem, como objeto de estudo científico, foi concebida inicialmente por duas grandes orientações, o Subjetivismo Idealista e o Objetivismo Abstrato.

Bakhtin, no entanto, em uma de suas mais importantes contribuições ao pensamento lingüístico contemporâneo, critica essas duas concepções de língua – é este posicionamento de Bakhtin que nos interessa neste paralelo que faremos entre as idéias sócio-históricas e as saussureanas no que diz respeito à língua e à enunciação, além de acrescentar as colocações do Subjetivismo Idealista.

Segundo o Subjetivismo Idealista, a língua é uma atividade mental criativa ininterrupta de construção – energeia – e os atos individuais de fala, a forma como ela se materializa. Sendo produto acabado – ergon – a língua apresenta-se como um depósito inerte. Para o Objetivismo Abstrato, a linguagem humana é uma abstração, é a capacidade de comunicação do homem com seus semelhantes, mediante signos verbais, e define-se não por um indivíduo, mas pelo grupo social a que ele pertence, constituindo-se de dois elementos, a langue – produto registrado passivamente pelo sujeito – e a parole, ato individual da langue, posto em ação por um falante em situações comunicativas concretas. Para esta corrente, a criação lingüística é comparada à criação artística, e as enunciações isoladas são a real substância da língua, estando a elas reservada sua função criativa.

As posições fundamentais da primeira tendência, quanto à língua, podem ser sintetizadas nas quatro seguintes proposições:

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2. As leis da criação lingüística são essencialmente as leis da psicologia individual.

3. A criação lingüística é uma criação significativa, análoga à criação artística. 4. A língua, enquanto produto acabado (“ergon”), enquanto sistema estável (léxico, gramática, fonética), apresenta-se como um depósito inerte, tal como a lava fria da criação lingüística, abstratamente construída pelos lingüistas com vistas à sua aquisição prática como instrumento pronto para ser usado (BAKHTIN/, 1995, p. 72-3).

Entretanto, Bakhtin aponta que o Subjetivismo Idealista ignora a natureza social da enunciação. Isto fica claro quando a enunciação é considerada a expressão do mundo interior do falante.

Vale ressaltar aqui a concepção de expressão no Subjetivismo Idealista: o exterior

constitui apenas o material passivo do que está no interior. Basicamente, a expressão se

constrói no interior; sua exteriorização não é senão a sua tradução (BAKHTIN, 1995). Esta teoria, segundo Bakhtin, é radicalmente falsa: é necessário que se elimine uma distinção entre o conteúdo interno e a expressão externa. Além do que não é a atividade mental que organiza a expressão, e sim a expressão que organiza a atividade mental. Toda expressão-enunciação é determinada pela situação social e é o produto, o resultado da interação de indivíduos inseridos neste contexto social.

Para o Objetivismo Abstrato, segunda orientação do pensamento filosófico-lingüístico, tendo Saussure como sua mais marcante expressão, a linguagem humana, que abrange fatores físicos, fisiológicos e psíquicos, é uma abstração, consistindo na capacidade de comunicação do homem com seus semelhantes, mediante signos verbais.

A língua, para Saussure, existe na consciência de cada um, no entanto, é um sistema supra-individual, definido não por um indivíduo, mas pelo grupo social a que ele pertence – portanto, é um conceito social.

São elementos constitutivos da langage (linguagem) a langue e a parole. A langue – língua, sistema de formas – não consiste numa função do sujeito falante; ela é, na verdade, um produto registrado passivamente pelo indivíduo. Já a parole – fala – é um ato individual da langue, posto em ação por um falante em situações comunicativas concretas. Le langage, la langue e la parole compreendem todas as manifestações – físicas, fisiológicas e psíquicas – da comunicação lingüística. Saussure não vê a fala como objeto da lingüística, por lhe faltarem leis autônomas e unidade interna e por não ser homogênea. Na teoria saussureana, tal objeto é a língua.

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1. A língua é um sistema estável, imutável, de formas lingüísticas submetidas a uma norma fornecida tal qual à consciência individual e peremptória para esta.

2. As leis da língua são essencialmente leis lingüísticas específicas, que estabelecem ligações entre os signos lingüísticos no interior de um sistema fechado. Estas leis são objetivas relativamente a toda consciência subjetiva.

3. As ligações lingüísticas específicas nada têm a ver com valores ideológicos (artísticos, cognitivos ou outros). Não se encontra, na base dos fatos lingüísticos, nenhum motor ideológico. Entre a palavra e seu sentido não existe vínculo natural e compreensível para a consciência, nem vínculo artístico.

4. Os atos individuais de fala constituem, do ponto de vista da língua, simples refrações ou variações fortuitas ou mesmo deformações das formas normativas. Mas são justamente estes atos individuais de fala que explicam a mudança histórica das formas da língua; enquanto tal, a mudança é, do ponto de vista do sistema, irracional e mesmo desprovida de sentido. Entre o sistema da língua e sua história não existe nem vínculo nem afinidade de motivos. Eles são estranhos entre si. (BAKHTIN, 1995, p. 82-83)

Bakhtin (1995) critica as colocações de Saussure, centrando-se no desdém com que este trata a parole, uma manifestação individual; para aquele, de natureza social, não individual. Todas essas questões culminam no entendimento da coerência da concepção de linguagem para Bakhtin, até que se chegue ao conceito de gêneros do discurso, formas de enunciados orais e escritos, totalmente vinculados à vida social dos falantes.

Na verdade, a visão de Bakhtin coincide com a de Saussure quando considera a língua como um fato social, cuja existência se funda nas necessidades da comunicação. Porém, não há concordância na visão de ambos quando se trata da parole – para Saussure, uma manifestação individual; para Bakhtin, de natureza social, não individual.

Na concepção bakhtiniana, a parole está indissoluvelmente ligada às condições comunicativas, e estas, por sua vez, ligadas às estruturas sociais, as quais refletem na ideologia. E, como já constatou Bakhtin, todo signo é ideológico – portanto, toda modificação que a ideologia sofrer acarretará modificações na língua, e esta evolução lingüística é perfeitamente positiva para o marxismo, ao contrário do ponto de vista do Objetivismo Abstrato.

Toda variação na língua é natural e reflete variações sociais. Não nos esqueçamos de que o signo bakhtiniano é vivo, dialético, e de que diálogo é a palavra-chave de uma concepção de linguagem sócio-interacionista.

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Bakhtin (1995) resume seu ponto de vista em Marxismo e Filosofia da Linguagem com as seguintes considerações:

1. A língua como sistema estável de formas normativamente idênticas é apenas uma abstração científica que só pode servir a certos fins teóricos e práticosparticulares. Essa abstração não dá conta de maneira adequada da realidade concreta da língua. 2. A língua constitui um processo de evolução ininterrupto, que se realiza através da interação verbal social dos locutores.

3. As leis da evolução lingüística não são de maneira alguma as leis da psicologia individual, mas também não podem ser divorciadas da atividade dos falantes. As leis da evolução lingüística são essencialmente leis sociológicas.

4. A criatividade da língua não coincide com a criatividade artística nem com qualquer outra forma de criatividade ideológica específica. Mas, ao mesmo tempo, a criatividade da língua não pode ser compreendida independentementedos conteúdos e valores ideológicos que a ela se ligam.

5. A evolução da língua, como toda evolução histórica, pode ser percebida como uma necessidade cega de tipo mecanicista, mas também pode tornar-se “uma necessidade de funcionamento livre”, uma vez que alcançou a posição de uma necessidade consciente e desejada.

6. A estrutura da enunciação é uma estrutura puramente social. A enunciação como tal só se torna efetiva entre falantes. O ato de fala individual (no sentido estrito do termo “individual”) é uma contradictio in adjecto”. (BAKHTIN, 1995, p. 127)

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CAPÍTULO 2

OS GÊNEROS TEXTUAIS

Dispomos de um rico repertório de gêneros de discurso orais (e escritos). Em termos práticos, nós os empregamos de forma segura e habilidosa, mas em termos teóricos podemos desconhecer inteiramente a sua existência. (...) Até mesmo no bate-papo mais descontraído e livre nós moldamos o nosso discurso por determinadas formas de gênero (...) (BAKHTIN, 2003, p. 282).

Segundo Bakhtin, toda a atividade humana está ligada ao uso da linguagem, sendo a natureza e as formas desse uso bastante diversificadas. E os integrantes de todos os campos da atividade humana empregam a língua em forma de enunciados (orais e escritos), a real unidade de comunicação humana, que lhes refletem as condições e as finalidades a partir de três elementos: o conteúdo temático, fator de acabamento específico; o estilo, seleção dos recursos de vocabulário, fraseológicos e gramaticais da língua, e a construção composicional, plano da expressão, da estrutura, da seqüência organizacional. Acerca desta caracterização dos gêneros, Brait e Rojo, (2004) citam Bakhtin:

Bakhtin (Marxismo e filosofia da linguagem, 1929) apresenta uma série de características do tema: ele é o sentido de um texto completo, por isso individual e não reiterável; expressa uma situação histórica concreta, a origem do texto (...). A segunda característica do gênero discursivo é a construção composicional, ou seja, a estrutura e organização dos textos. (...) ela é resultante de vários fatores, incluindo as necessidades da situação de interação e as cristalizações históricas – a tradição – que esses usos geraram. Por fim, (...) o estilo, isto é, a seleção e escolha que fazemos das formas da língua – das palavras que escolhemos às formas gramaticais -, responsáveis pelo acabamento do tema do texto [...]. (BRAIT, ROJO, 2004, p. 15)

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Eles foram aparecendo e expandindo-se à medida que as atividades de linguagem sofriam alterações diante das práticas sociais da nossa cultura, estando, portanto, emparelhados às necessidades e atividades sócio-culturais e às inovações tecnológicas também. Vejamos esta confirmação:

[...] as atividades (de linguagem) que desempenhamos são diretamente dependentes das práticas sociais da cultura a que pertencemos. Toda sociedade se organiza por práticas sociais que definem um conjunto de atividades a desempenhar, e essa organização social é diferente de lugar para lugar, de época histórica para época histórica, de cultura para cultura. (BRAIT, ROJO, 2004, p. 4)

Marcuschi (2005) fez um levantamento histórico do surgimento dos gêneros, e podemos organizá-lo em quatro fases:

1ª fase: momento de pouco desenvolvimento dos gêneros, havendo um conjunto limitado deles, devido à existência de povos de cultura essencialmente oral.

2ª fase: a escrita alfabética foi inventada por volta de VII a. C., o que proporcionou, além de uma multiplicação de novos gêneros, o surgimento de alguns típicos da escrita, ao contrário do que ocorreu na primeira fase.

3ª fase: a partir do século XV, tivemos uma ampliação no quadro dos gêneros existentes, uma vez que emergiu a cultura impressa, seguida, no século XVIII, da industrialização.

4ª fase: explosão de novos gêneros gerada pela cultura eletrônica e suas invenções, como o rádio, a televisão, o telefone e, entre outros, o computador.

Vê-se, então, o caráter maleável e dinâmico dos gêneros, fenômenos históricos e totalmente vinculados à vida cultural e social. Os gêneros discursivos, como temos em Bakhtin (2003), são elos transmissores que condicionam a história da linguagem à história da sociedade.

Há que se esclarecer, entretanto, que os novos gêneros não são inovações absolutas: possuem velhas bases e são assimilações de um gênero por outro, uma vez que a tecnologia não favorece o surgimento de formas novas, e sim inovadoras. Uma transmutação de gêneros, como temos em Bakhtin. É o que observamos com o telefonema, que apresenta semelhança com a conversação já existente antes dele, e o e-mail, cujos antecessores são as cartas e o bilhete.

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verdade, a partir do uso que se faz delas e do papel que elas desempenham nas atividades diárias de comunicação.

Bronckart também afirma que os textos estão relacionados às necessidades sociais, portanto, produtos da atividade humana e refere-se a espécies de textos, designando todo conjunto de textos que apresentem características comuns. O surgimento de um novo tipo deles estará vinculado a novas situações sociais.

São tão diversas as espécies de textos que sempre se tentou, desde a Antigüidade grega até hoje, dar-lhes nomes e delimitações – surgindo, daí, o gênero de texto (ou do discurso). Assim, Bronckart conclui que qualquer espécie de texto pode ser chamada de gênero.

No entanto, é ainda de Bronckart (2003) a colocação de que tantas terminologias divergentes entre si são incapazes de se tornar modelos de classificação, e esta dificuldade ocorre, em primeiro lugar, por causa dos muitos – e legítimos – critérios usados no sentido de definir os gêneros. Tais critérios referem-se, entre outros, à atividade humana em questão (ou seja, quando o gênero é literário, científico, jornalístico etc.); ao efeito comunicativo que se pretende (gênero poético, lírico, épico etc.); ao tamanho e/ou à natureza do suporte utilizado (crônica, novela, fábula, reportagem, entrevista etc.) e à temática abordada (manual, receita culinária, texto científico, romance policial etc.).

Além disso, muitos outros critérios são ainda possíveis. Essa dificuldade de classificação também decorre do caráter fundamentalmente histórico (e adaptativo) das produções textuais: alguns gêneros tendem a desaparecer (a narração épica), mas podem, às vezes, reaparecer sob formas parcialmente diferentes; alguns gêneros modificam-se (cf. a emergência do “romance polifônico” ou do “novo romance”); gêneros novos aparecem (cf. o folheto publicitário); em suma, os gêneros estão em perpétuo movimento. Enfim, essa mobilidade explica o fato de que as fronteiras entre os gêneros não podem ser sempre claramente estabelecidas (cf., por exemplo, o problema das fronteiras entre o romance e a novela, ou entre o artigo científico e o artigo didático, etc.) e o fato de que algumas novas espécies de textos podem não ter ainda recebido um nome consagrado, em termos de gênero. (BRONCKART, 2003, p.73).

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- os gêneros do discurso, gêneros do texto e/ou formas estáveis de enunciados de Bakhtin podem ser chamados de gêneros de texto; os enunciados, enunciações e/ou textos bakhtinianos podem ser chamados de textos, quando se trata de produções verbais acabadas, associadas a uma mesma e única ação de linguagem ou de enunciados, quando se trata de segmentos de produções verbais do nível da frase; [...]. (BRONCKART, 2003, p. 143)

Adam (1990), por sua vez, em sua obra Eléments de linguistique textuelle, baseia-se em Bakhtin e ressalta o quão importante é a dimensão textual/discursiva e delimita dois níveis de análise.

No primeiro nível, o qual se constitui dos discursos, distribuídos em gêneros e surgidos a partir da atividade das formações discursivas. Adam, no entanto, considera imprecisa a organização dos gêneros em um interdiscurso e observa a impossibilidade de os gêneros constituírem objeto de um estudo lingüístico puro, uma vez que são múltiplos os contextos sociais e históricos deles.

Assim, com o intuito de obter um objeto de estudo lingüístico, Adam nos mostra a seguinte fórmula: DISCURSO = Texto + Condições de produção; TEXTO = Discurso – Condições de produção.

Esta fórmula implica que, se o discurso é um objeto concreto que combina propriedades textuais e as características de um ato (ou de uma conduta de linguagem), realizado (a) em uma determinada situação, o texto, por sua vez, é um objeto abstrato resultante da subtração do contexto operada sobre o objetoconcreto. (ADAM, apud BRONCKART, 2003, p.23)

Assim, como comenta Bronckart, o método da lingüística textual de Adam consiste em eliminar a dependência com o contexto, num nível teórico que este identifica como algo próximo da ideologia do texto absoluto. No entanto, como isto pode ser possível, uma vez que ele só tem sentido se for interpretado por quem o ler? E tal interpretação lhe dá sentidos reconstruídos. Se o texto não receber este ‘tratamento’, perderá seu caráter de interação – por isso, Adam reconhece que os índices materiais presentes em um texto servem como instruções para que o leitor se oriente nesta sua interpretação. Esta lingüística textual, logo, é também pragmática.

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concordando com o fato de esta teoria reservar o termo texto a um objeto abstrato, e o discurs, a um emprego trivial.

Entre outros questionamentos, Bronckart acrescenta:

Os problemas da conceitualização de Adam, na essência, parecem decorrer do caráter heterogêneo das epistemologias subjacentes aos quadros teóricos em que se inspira. Se as proposições de Bakhtin, Culioli, Foucault, Rastier e Ricoeur, de fato, podem inscrever-se em uma concepção interacionista-social das relações entre ação, linguagem e pensamento; as de Kintsch, Van Dijk, Milner e dos outros cognitivistas e/ou gerativistas mobilizados decorrem de uma perspectiva radicalmetne oposta, que postula a existência de um sujeito psicológico, universal e autônomo, que dispõe de uma competência textual intrínseca e inata, semelhante à competência gramatical de que seria dotado (...). (BRONCKART, 2003, p. 148).

2.1. Bakhtin: Gêneros Primários e Secundários

Vejamos esta afirmação:

O estudo da natureza do enunciado e da diversidade de formas de gênero dos enunciados nos diversos campos da atividade humana é de enorme importância para quase todos os campos da lingüística e da filologia. Porque todo trabalho de investigação de um material lingüístico concreto [...] opera inevitavelmente com enunciados concretos (escritos e orais) relacionados a diferentes campos da atividade humana e da comunicação [..]. (BAKHTIN, 2003, p. 264)

Para o autor, é de especial importância observar a diferença entre os gêneros primários e os secundários, uma vez que a diferença não é funcional.

Os gêneros discursivos primários (simples) formaram-se nas condições da comunicação discursiva imediata, como, por exemplo, o diálogo íntimo de salão, de círculo, familiar-cotidiano; gêneros breves cotidianos de saudações, despedidas, votos; o relato do dia-a-dia; telefonema; cardápio; debate, entre outros.

Já os secundários (complexos) surgiram nas condições de um convívio cultural mais elaborado, mais desenvolvido e mais organizado, predominando a escrita, tais como romances, dramas, pesquisas científicas e, entre outros, os gêneros publicitários.

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Schneuwly (2004) propõe a definição das seguintes dimensões para os gêneros primários:

□ troca, interação, controle mútuo pela situação;

□ funcionamento imediato do gênero como entidade global controlando todo o processo, como uma só unidade;

□ nenhum ou pouco controle metalingüístico da ação lingüística em curso. (DOLZ, SCHNEUWLY, 2004, p. 29)

Esta definição, no entanto, não implica dizer que, em contrapartida, os gêneros secundários são descontextualizados (já que não são controlados de forma direta pela situação), mas que não apresentam contexto imediato.

O gênero primário é auto-suficiente e funciona como por automatismo, sendo, por exemplo, para a criança, o instrumento de ação para múltiplas práticas de linguagem, um ponto de partida para novas e mais complexas construções.

Retomando os gêneros secundários, vale ressaltar, com base em Schneuwly (2004), algumas características deles. A primeira é o fato de não serem espontâneos como os primários e, ainda, o fato de se desenvolverem pelas relações formais a partir da leitura e, especialmente, da escrita. Sobre suas características e condições de apropriação, Schneuwly (2004) acrescenta:

não estão mais ligados de maneira imediata a uma situação de comunicação; sua forma é freqüentemente uma construção complexa de vários gêneros cotidianos que, eles próprios, estão ligados a situações; resultam de uma disposição relativamente livre de gêneros, tratados como sendo relativamente independentes do contexto imediato; isso significa que sua apropriação não pode se fazer diretamente, partindo de situações de comunicação; o aprendiz é confrontado com gêneros numa situação que não está organicamente ligada ao gênero, assim como o gênero, ele próprio, não está mais organicamente ligado a um contexto preciso imediato. Além disso, essa situação não resultou direta e necessariamente da esfera de motivações já dadas do aprendiz, da esfera de suas experiências pessoais, mas de um mundo outro que tem motivações mais complexas, por construir, que não são mais necessariamente pessoais. (DOLZ, SCHNEUWLY, 2004, p. 33)

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gênero primário para o secundário consiste numa continuidade e, ao mesmo tempo, numa ruptura, uma vez que os princípios de aprendizagem e seus objetos são outros, e ocorre uma reconstrução num nível superior.

2.2. Tipologias Textuais X Gêneros Textuais

Bakhtin defende que o gênero textual/discursivo é o ponto de partida para qualquer comunicação verbal, e isto é um indicativo de que a língua é uma atividade, acima de tudo, social, que prioriza o caráter interativo, e não formal. Assim, os gêneros consistem em ações sócio-discursivas (MARCUSCHI, 2005, p.22).

Ocorre que, no contexto da sala de aula, nas produções textuais escolares, percebe-se, no mínimo, uma certa confusão entre um trabalho a partir de tipologias textuais ou de gêneros, sendo aquelas até mais presentes. No intuito de esclarecer a natureza de ambos, recorremos a algumas definições de Marcuschi (2005, p.23):

TIPOS TEXTUAIS GÊNEROS TEXTUAIS

1. constructos teóricos definidos por

propriedades lingüísticas intrínsecas; 1.

realizações lingüísticas concretas definidas por propriedades sócio-comunicativas;

2. constituem seqüências lingüísticas ou

seqüências de enunciados no interior dos gêneros e não são textos empíricos;

2. constituem textos empiricamente realizados

cumprindo funções em situações comunicativas;

3. sua nomeação abrange um conjunto

limitado de categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal;

3. sua nomeação abrange um conjunto aberto e

praticamente ilimitado de designações concretas determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função;

4. designações teóricas dos tipos: narração,

argumentação, descrição, injunção e

exposição.

4. exemplos de gêneros: telefonema, sermão,

carta comercial, carta pessoal, [...] receita culinária, bula [...] etc.

Dolz e Schneuwly (2004) questionam o uso das tipologias em detrimento dos gêneros, como podemos observar a seguir:

(25)

Para Bronckart (2003), os tipos lingüísticos são segmentos constitutivos de um gênero, ou seja:

formas específicas de semiotização ou de colocação em discurso. Elas são formas dependentes do leque dos recursos morfossintáticos de uma língua e, por isso, em número necessariamente limitado. São formas correlatas à (ou reveladoras da) construção das coordenadas de mundos virtuais, radicalmente diferenciadas do mundo empírico dos agentes (...). (BRONCKART, 2003, p. 174)

Os tipos textuais não podem ser considerados isoladamente, uma vez que eles são realizados nos gêneros, podendo até acontecer que um só gênero realize mais de um tipo. Em outras palavras, um gênero pode abrigar um tipo apenas ou mesmo ser tipologicamente variado.

(26)

CAPÍTULO 3

GÊNEROS ORAIS

[...] O ensino do oral na escola, em língua materna, pode se dar segundo um caminho – aliás, não o único – que implica a construção de uma relação nova com a linguagem (SCHNEUWLY, 2004, p. 129).

A questão a que se quer chegar mais adiante é a necessidade de se trabalhar de um modo mais sistemático a partir dos gêneros textuais (e, mais detidamente, dos orais) na produção textual escolar do Ensino Médio, levando em consideração, principalmente, o caráter empírico dos gêneros. Sim, pois eles se realizam empiricamente, cumprindo suas funções nas diversas situações comunicativas. Segundo Marcuschi (2005, p. 23 ), os gêneros são situados histórica e socialmente, definidos como de natureza sócio-comunicativa. Na produção textual escolar, eles se mostram mais coerentes, uma vez que a orientam em condições concretas de sócio-interação. Em contrapartida, as tipologias, como narração, descrição e dissertação, por exemplo, não antevêem o caráter sócio-interativo da escrita. Dolz e Schneuwly (2004) observam:

Na ótica do ensino, os gêneros constituem um ponto de referência concreto para os alunos. Em relação à extrema variedade das práticas de linguagem, os gêneros podem ser considerados entidades intermediárias, permitindo estabilizar os elementos formais e rituais das práticas. Assim, o trabalho sobre os gêneros dota os alunos de meios de análise das condições sociais efetivas de produção e de recepção dos textos. Fornece um quadro de análise dos conteúdos, da organização do conjunto do texto e das seqüências que o compõem, assim como das unidades lingüísticas e das características específicas da textualidade oral. (DOLZ, SCHNEUWLY, 2004, p. 172)

(27)

A rigor, no ensino, o oral não é nem mesmo aceito ou compreendido como objeto de abordagem escolar. E, quando o é, costuma não passar de ponte para o aprendizado da escrita, esta muito mais respeitada que a expressão oral, por uma série de fatores, em outras palavras, mal-entendidos.

O primeiro deles é o fator já mencionado: considerar a linguagem falada pobre, popular e mal estruturada, ao passo que a escrita representa a norma, o correto, o padrão, o aceito.

Outro mal-entendido é o que evidencia a distância estabelecida entre o oral e a escrita, considerando o caráter mais regular da embalagem gráfica.

Essas colocações tentam, forçosamente, simplificar aspectos impossíveis de serem uniformizados, porque o padrão de uma língua pode, perfeitamente, manifestar-se tanto na forma oral quanto na escrita. Além disso, é fato que muitos fenômenos gramaticais compartilham os dois aspectos, oral e escrito. Só poderíamos, então, considerar estes planos como duas línguas distintas – e uma melhor que a outra – se, simplesmente, elegêssemos um deles mais importante, superdimensionando-o.

Ampliando esta discussão acerca das especificidades da escrita e da fala, Stanley Aléong, citado por Barros (2005), esclarece a distinção entre normas explícitas e normas implícitas:

A norma explícita compreende o conjunto das formas lingüísticas que tenham sido objeto de uma tradição de elaboração, de codificação e de prescrição. Ela constitui-se segundo processos sócio-históricos (...). codificada e consagrada em um aparelho de referência, essa norma é socialmente dominante, no sentido de que ela se impõe como o ideal a respeitar nas circunstâncias que pedem um uso refletido ou controlado da língua, isto é, nos usos oficiais, na imprensa escrita e audiovisual, no sistema de ensino e na administração pública.

Quanto às normas implícitas, trata-se dessas formas que, mesmo sendo raramente objeto de uma reflexão consciente ou de um esforço de codificação, não deixam de representar os usos concretos por meio dos quais o indivíduo se apresenta na sociedade imediata. (BARROS, 2005, p. 213)

(28)

A questão a que Barros (2005) quer chegar é verificar se estes três aspectos citados também se aplicam à língua falada, se há uma norma explícita para a fala e se escrita e fala conduzem-se por uma mesma norma ou por normas diferentes.

Quanto a esta última possibilidade, Barros (2005) considera a existência de uma mesma norma que estabelece o que é ‘belo’ e ‘bom’ para a fala e a escrita e, ainda, aponta certas características da fala:

a) o discurso da norma aceita e mesmo prescreve para a fala um espaço maior de variação do que para a escrita: o falante culto é, em uma das definições possíveis, aquele que usa a língua adequadamente em diferentes situações de discurso e de interação verbal [...];

b) há limites para as variações prescritas e aceitas em todos os níveis de descrição lingüística. [...];

c) os falantes cultos têm consciência da existência de uma norma explícita da fala, que estabelece o bom e o mau, o belo e o feio, e também do papel dos diferentes registros que utilizam no espaço aceitável e possível de variação. (BARROS, 2005, p. 200)

Vê-se, então, que a oralidade também apresenta suas exigências e níveis de formalidade, havendo, portanto, a distinção culto/não-culto e, ainda, ‘ensinável’/ ‘não-ensinável’ .

O processo de comunicação oral dá-se de forma espontânea, improvisada, ou como escrita oralizada e consiste de elementos verbais e paraverbais – postura do orador, gestos, voz, entonação, imagens e notas de apoio.

A presença do oral, geralmente, quando se dá em sala de aula, ocorre atrelada à estrutura escrita da língua. Dolz e Schneuwly (2004) revelam alguns dados de uma pesquisa feita por De Pietro e Wirthner (1996), confirmando a tese de que o oral continua fora da compreensão dos professores:

• o oral é principalmente trabalhado como percurso de passagem para a aprendizagem da escrita;

• os professores analisam o oral a partir da escrita;

• o oral está bastante presente em sala de aula, mas nas variantes e “normas” escolares, a serviço da estrutura formal escrita da língua;

• a leitura em voz alta, isto é, a escrita oralizada, representa a atividade oral mais freqüente na prática (70% dos professores entrevistados). (DE PIETRO, WIRTHNER apud DOLZ, SCHNEUWLY, 1996, p. 132).

(29)

A partir dos anos 80, segundo nos informa Marcuschi em “Da fala para a escrita – atividades de retextualização” (2003), ocorreu uma mudança na forma como se tratavam as semelhanças e diferenças entre fala e escrita: hoje se tem um novo objeto de análise, a partir das práticas sociais. Assim, a fala conquistou um patamar de objeto ‘ensinável’, não mais vista como inferior à escrita:

[...] Considerava-se a relação oralidade e letramento como dicotômica, atribuindo-se à escrita valores cognitivos intrínatribuindo-secos no uso da língua, não atribuindo-se vendo nelas duas práticas sociais. Hoje (...) predomina a posição de que se pode conceber oralidade e letramento como atividades interativas e complementares no contexto das práticas sociais e culturais. (MARCUSCHI, 2003, p. 16).

Marcuschi analisa que os aspectos que devem ser priorizados são os usos da língua, e não as formas – estas é que se devem adaptar àqueles, e não o contrário.

O que queremos destacar aqui é a possibilidade – absolutamente real – de um letramento gerado também pela oralidade. O status e a eficácia da escrita como objeto de ensino já se conhecem e já estão mais do que comprovados. Mas essa supremacia da escrita é um mito que já não tem mais força. Marcuschi (2003, p. 17) afirma, inclusive, que ela chegou a simbolizar educação, desenvolvimento e poder. A oralidade, porém, ficou relegada, em matéria de ensino, à condição de caminho para a escrita.

É importante colocar que a fala e a escrita são práticas igualmente eficazes como objetos de ensino, ambas permitem a construção de textos coerentes e coesos. Quanto a isto, Marcuschi (2003) analisa:

[...] A escrita não pode ser tida como uma representação da fala [...]. Em parte, porque a escrita não consegue reproduzir muitos dos fenômenos da oralidade, tais como a prosódia, a gestualidade, os movimentos do corpo e dos olhos, entre outros. Em contrapartida, a escrita apresenta elementos significativos próprios, ausentes na fala, tais como o tamanho e tipo de letras, cores e formatos [...]. Oralidade e escrita são práticas e usos da língua com características próprias, mas não suficientemente opostas para caracterizar dois sistemas lingüísticos nem uma dicotomia. (MARCUSCHI, 2003, p. 17)

(30)

O letramento é um processo de aprendizagem social e histórica da leitura e da escrita em contextos informais e para usos utilitários, por isso é um conjunto de práticas, ou seja, letramentos [...]. Distribui-se em graus de domínio que vão de um patamar mínimo a um máximo. A alfabetização pode dar-se, como de fato se deu historicamente, à margem da instituição escolar, mas é sempre um aprendizado mediante ensino, e compreende o domínio ativo e sistemático das habilidades de ler e escrever. [...] A escolarização, por sua vez, é uma prática formal e institucional de ensino que visa a uma formação integral do indivíduo, sendo que a alfabetização é apenas uma das atribuições/atividades da escola [...]. (MARCUSCHI, 2003, p. 21-22)

Há pessoas profundamente letradas nas práticas da escrita, porém com um desempenho oral incipiente. Um letrado não é apenas aquele que tem domínio absoluto das práticas da escrita, mas aquele que tem um desempenho social razoável e suficiente, capaz de contar dinheiro, de identificar marcas, de saber que ônibus tomará, entre outras habilidades. Até um analfabeto pode participar ativamente de eventos de letramento. Portanto, letramento não envolve somente práticas escritas formais.

Assim, entendemos que o livro didático deve romper com os mitos da soberania da escrita e introduzir um trabalho sistemático de propostas para a produção de texto a partir da oralidade, paralelo ao trabalho que já se faz com a escrita, usando os gêneros orais como suporte, culminando em letramento.

Um trabalho com estas características vai de encontro à tradicional perspectiva das dicotomias estritas, representadas por Bernstein, Labov, Halliday e Ochs. Há, ainda, as de visão culturalista, variacionista e sociointeracionista. A partir de um resumo obtido da leitura de Marcuschi (2003), temos a dicotomia estrita como um modelo que separa forma e conteúdo e língua e uso, com rígida proposta de regras, desconsiderando efetivamente os fenômenos dialógicos e discursivos. É esta perspectiva que relega a fala ao patamar do erro, colocando a escrita como a norma, o bom uso da língua.

A tendência culturalista, pouco adequada para se tratar dos fatos da língua, trabalha a natureza da oralidade versus escrita, desenvolvida por antropólogos, psicólogos e sociólogos, como Walter Ong, Jack Good, Sylvia Scribner e David Olson. Aqui o sistema da escrita também é primordial.

(31)

Na perspectiva sociointeracionista, a fala e a escrita são tratadas dentro da perspectiva dialógica. Aqui, temos a língua como fenômeno interativo e um justo espaço para a oralidade como prática social e objeto de ensino.

Há que se acrescentar, ainda, que não há como estabelecer linearidade quanto às relações entre a fala e a escrita, como temos nesta observação de Marcuschi:

As relações entre fala e escrita não são óbvias nem lineares, pois elas refletem um constante dinamismo fundado no continuum que se manifesta entre essas duas modalidades de uso da língua. Também não se pode postular polaridades estritas e dicotomias estanques.(MARCUSCHI, 2003, p.34).

Vejamos, a título de resumo, os quadros comparativos dessas correntes (MARCUSCHI, 2003. p. 27, 29, 31 e 33, respectivamente):

Quadro 1. Dicotomias estritas

FALA descontextualizada dependente implícita redundante não-planejada imprecisa não-normatizada fragmentária ESCRITA contextualizada autônoma explícita condensada planejada precisa normatizada completa

Quadro 2. Visão culturalista

CULTURA ORAL Pensamento concreto raciocínio lógico atividade artesanal inovação constante analiticidade CULTURA LETRADA pensamento abstrato raciocínio prático atividade tecnológica

(32)

Quadro 4. Perspectiva sociointeracionista

FALA E ESCRITA APRESENTAM

dialogicidade usos estratégicos funções interacionais envolvimento negociação situacionalidade coerência dinamicidade

Quando nos preocupamos com o ensino do oral, referimo-nos ao oral formal, e não ao da vida privada cotidiana, pois este já dominamos.

E é interessante observar que os gêneros formais públicos encerram-se em si mesmos como objeto de ensino e aprendizagem, pois não são instrumentos usados para que se chegue ao aprendizado da escrita, por exemplo. Assim, são autônomos.

O oral formal tem características nascidas dos contextos relacionados aos gêneros. Tanto se refere às formas orais que servem à realidade escolar, por exemplo, exposição, entrevista, discussão em grupo e relatório, como também àqueles da vida pública propriamente dita, tais como negociação debate e, entre outros, gêneros de instâncias oficiais.

Vejamos mais alguns exemplos: canto oral, conferência, homilia, debate, entrevista profissional – alguns gêneros orais realizados em público, tendo, como lugares sociais de comunicação, entre outros, rádio, televisão, igreja, administração, universidade e escola. E é importante mencionar que cada lugar social de comunicação determina o grau de formalidade do gênero.

Quadro 3. A perspectiva variacionista

FALA E ESCRITA APRESENTAM

(33)

No âmbito do ensino, trabalhar com os gêneros orais é lançar mão dos instrumentos que viabilizam a ação lingüística e o aprendizado – a própria ação de falar consiste em uma apropriação dos gêneros.

Tomando Ramos (2002) como referência, quando nos referimos a uma produção textual nascida de um trabalho com gêneros orais, assumimos a noção de texto como espaço de interlocução, e isto inclui, igualmente, textos escritos e falados.

Ocorre, porém, que sempre foi notória uma negação da capacidade lingüística oral, e disto decorre a existência de modelos preestabelecidos por valores sociais privilegiados, como se isto fosse norma culta.

Assim, não é incomum o aluno fazer uso de marcas típicas de uma certa concepção de linguagem formal (embora forçosa), tais como presença de conectivos nunca ou raramente usados no dia-a-dia, vocabulário estranho à linguagem usual do estudante e outras formalidades que não condizem com o comportamento lingüístico dele.

Tomando Leme de Brito (1985) como referência, a partir desse diagnóstico, devem-se considerar quatro aspectos: a) posdevem-se por parte do aluno de uma imagem distorcida do que seja a norma culta; b) a negação da capacidade lingüística oral do aluno; c) o caráter repressivo da escola que impede o aprendiz de assumir o papel de sujeito na interlocução leitor/texto.

Atividades que põem o aluno em contato com a modalidade oral culta e também com outras modalidades deixam-no a par da diversidade lingüística da qual ele dispõe. Quanto mais consciente disto (não estando apenas voltado para o dialeto padrão), mais o aluno saberá diversificar seu uso lingüístico em qualquer produção textual.

Mas como levar o estudante a vivenciar este gênero oral culto ensinável? Vejamos alguns passos - baseados em Ramos (2002) – neste sentido:

• levar o aluno a situações reais de uso da modalidade culta por meio, por exemplo, de jornais, noticiários de TV etc;

• selecionar uma destas situações;

• apresentá-la e comentá-la em sala de aula;

• instaurar uma interlocução em dialeto culto a partir do texto da mídia.

Os alunos submetidos a uma abordagem escolar a partir deles possuem uma referência real no caminho do aprendizado, porque os gêneros são reconhecidos empiricamente e, por este motivo, fazem sentido.

(34)

O oral não existe; existem orais: atividades de linguagem realizadas oralmente; gêneros que se praticam essencialmente por meio da oralidade. Ou então atividades de linguagem que combinam o oral e o escrito. De fato, nada há em comum entre a performance de um orador e a conversação cotidiana; entre a tomada de turno num debate formal e numa discussão num grupo de trabalho; entre uma aula dada e uma explicação dada numa situação de interação imediata; entre a recontagem de um conto em sala de aula e a narrativa de uma aventura no pátio do recreio. Os meios lingüísticos diferem fundamentalmente; as estruturas sintáticas e textuais são diferentes; a utilização da voz, sempre presente, também se faz diferentemente; e também a relação com a escrita é específica em cada caso. (SCHNEUWLY, 1997, apud ROJO, 2001, p. 127)

O ato de aprender adequa-se às particularidades de cada gênero e a seus respectivos lugares sociais de produção. Vejamos um exemplo entre dois gêneros públicos orais distintos: um debate em ambiente escolar e uma aula de atividades manuais num programa de televisão.

Cada lugar social em questão determina contextos diferentes, proporcionando, no primeiro caso, uma interação direta, real, entre as pessoas e, no segundo, uma interação, digamos, indireta, uma vez que ela não ocorre frente a frente. As duas situações também têm objetivos diferentes: na sala de aula, promove-se o diálogo na coletividade, com o intuito de se discutir um dado tema, enquanto que, no programa de televisão, o emissor transmite informações, aparentemente, na forma de monólogo, uma vez que a resposta é indireta. No debate escolar, o vocabulário e as variantes lingüísticas oscilam, ao passo que, na televisão, há uma linearidade neste aspecto.

Um exemplo de gênero oral que pode ser tratado como objeto de ensino é a exposição oral, também chamada de seminário, uma das raras atividades orais freqüentes na sala de aula.

Trata-se de uma atividade muito tradicional, porém um instrumento privilegiado de transmissão de conteúdos. Aquele que expõe oralmente é o orador, também tido como o especialista, por, em tese, conhecer o assunto a ser exposto mais do que seu auditório conhece:

(35)

Para ampliar, no entanto, esta questão do gênero oral ensinável, uma vez que se trata ainda de uma questão relativamente, obscura, recorremos a Dolz e Schneuwly (2004):

[Os gêneros orais] (...) são instrumentos – ou melhor, megainstrumentos, visto que podemos considerá-los como a integração de um grande conjunto de instrumentos num todo único – que fazem a mediação da atividade de linguagem comunicativa. Falta-nos ainda escolher, dentre uma enorme variedade de gêneros, aqueles que podem, e talvez mesmo devam, tornar-se objeto de ensino. Já que o papel da escola é sobretudo o de instruir, mais do que o de educar, em vez de abordarmos os gêneros da vida privada cotidiana, é preciso que nos concentremos no ensino dos gêneros da comunicação pública formal. Por um lado, (...) exposição, relatório de experiência, entrevista, discussão em grupo etc (...) e, por outro lado, aqueles da vida pública no sentido lato do termo (debate, negociação, testemunho diante de uma instância oficial, teatro etc.). (Dolz & Schneuwly, 2004, p. 174).

3.1. Os Gêneros Orais no Livro Didático

Conscientes da importância – e mesmo da necessidade – de os gêneros orais estarem presentes na escola como objeto de ensino (não havendo, portanto, discriminação desta prática em relação à escrita), observaremos o que o PNLD tem constatado, em suas análises de LDs de Língua Portuguesa, quanto à prática didático-pedagógica com a expressão oral.

Veremos, a seguir, o que Rojo (2003) interpreta a esse respeito, a partir de uma análise sobre as conclusões do PNLD quanto à seleção de textos de LDs recomendados:

(36)

Rojo (2003) ainda reitera que as atividades que os LDs apresentam para a compreensão e produção de linguagem oral estão “abaixo da crítica” do PNLD. Isto vai de encontro ao que os PCN determinam e esperam de um LD. A propósito, há que se esclarecer quais aspectos do oral os PCN apontam como aqueles que devem ser objeto de reflexão nas práticas de ensino-aprendizagem:

Segundo os PCN (1997; 1998), tanto em produção como em compreensão, são aqueles relativos:

• aos gêneros orais primários e secundários;

• à relação entre a linguagem oral e a linguagem escrita, seja em situações cotidianas ou públicas;

• à variação lingüística (que tem relação com o primeiro e último aspectos); e • à modalidade oral (como dicção, entonação, pronúncia, prosódia e gestualidade)”. (SILVA E MORI-DE-ANGELIS, 2003. p. 206).

Entendemos que se faz necessário esclarecer: a última citação não contradiz o que já colocamos há pouco, ou seja, que nosso alvo de discussão – como objeto de ensino – é o oral formal, e não o espontâneo, pois este já dominamos. O trecho citado dos PCN refere-se ao oral primário como objeto de reflexão nas práticas de ensino-aprendizagem, e não propriamente como objeto de ensino.

Apenas 11% das coleções avaliadas pelo PNLD em questão reconhece os gêneros orais (formais e públicos) como objeto de ensino, e 14% exploram paralelos entre o oral e o escrito, despertando para as formas orais do discurso.

Por fim, não é de se desprezar o baixo índice de coleções que propõem alguma diversidade de gêneros orais a serem produzidos em sala de aula (38% apenas), o que novamente reflete a falta de sensibilidade da produção didática para os usos da oralidade. (ROJO, 2003, p. 93)

Um trabalho assim, que, em geral, ignora os gêneros orais como objetos de ensino, está terminantemente à margem do que os PCN consideram minimamente recomendável:

(37)

Livrar-se de alguns mitos, porém, não é o suficiente. Há que se iniciar um trabalho concreto no sentido de ampliar as possibilidades de um aprendizado baseado na valorização do oral – e no uso do oral como objeto de ensino. Não adianta que o LD até o insira em atividades se o objetivo final for sempre o texto escrito. Não adianta se até há uma consciência da importância e da coerência de um trabalho com o oral se, efetivamente, há o preconceito com esta prática. Seria eficaz um trabalho que considerasse o oral como o outro objeto de ensino, paralelo à escrita, tão importante quanto, sem comparações preconceituosas, reforçando o continuum entre oralidade e escrita.

Temos em Schneuwly comentários sobre um programa feito com professores-estudantes de Ciências da Educação, no qual foi lançada a pergunta “O que é oral para você?”. As respostas foram agrupadas em três grupos, cada um com um tema. Podemos dizer, em suma, que o que os professores entendem como específico do oral é o fato de ele não ser ensinável, ou, ainda, o que é ensinável não pertence ao oral e/ou depende da escrita. Schneuwly comenta:

Poderíamos parafrasear a opinião majoritária dizendo que o verdadeiro oral é, por um lado, aquele em que o aluno se exprime espontaneamente, no qual não existe escrita, no qual o aluno exprime seus sentimentos em relação ao mundo, e, por outro lado, o oral cotidiano através do qual se comunicam professores e alunos, em aulas diversas. Nem um nem outro parecem suscetíveis de se tornarem objetos de ensino: o oral “puro” escapa de qualquer intervenção sistemática; aprende-se naturalmente, na própria situação. O oral que se aprende é o oral da escrita; aquele que prepara a escrita, pois permite encontrar idéias, elaborar uma primeira formulação; aquele que, por meio de correspondências grafofonêmicas, permite passar ao código escrito; finalmente e principalmente, aquele que não é senão a oralização de um escrito. (SCHNEUWLY, 2004. p. 132-133).

Quando nos referimos a um oral ‘ensinável’, pensamos num ensino que o considere tão passível de reflexão, de discussão, de problematização – e até de avaliação – quanto a escrita.

Por exemplo, na dinâmica da sala de aula, o aluno, basicamente, só é avaliado pelo que escreve. As avaliações, geralmente, são escritas, e muito raramente uma apresentação oral existe paralelamente a um trabalho escrito, ou mesmo só existe em função de um resultado por escrito. Neste caso, entretanto, há que se observar que pesa muito a concepção de avaliação do professor em si, e não apenas do livro.

(38)

sócio-lingüística de fazer usos de várias linguagens, numa flexibilidade tal, condizente com sua interação social. Saber adequar o registro às diferentes situações de comunicação é o diferencial num uso sócio-interacionista da língua.

Fávero et al (1999) acrescentam-nos que, no que diz respeito à escola, a questão não é “ensinar a falar”, e sim mostrar aos alunos a grande variedade de usos da fala, o que mostra o quão homogênea e monolítica é a língua. A escola deve trabalhar com os alunos os diferentes níveis da língua escrita e da língua falada, tornando-os poliglotas no âmbito da própria língua.

Reafirmando, com Castilho (1998):

[...] não se acredita mais que a função da escola deve concentrar-se apenas no ensino da língua escrita, a pretexto de que o aluno já aprendeu a língua falada em casa. Ora, se essa disciplina se concentrasse mais na reflexão sobre a língua que falamos, deixando de lado a reprodução de esquemas classificatórios, logo se descobriria a importância da língua falada, mesmo para a aquisição da língua escrita. (CASTILHO, 1998, p. 13)

Outra questão, porém, queremos discutir: há quem possa questionar essa defesa por um ensino da língua falada, uma vez que um aluno termina o Ensino Médio, preparado para um concurso vestibular que o avaliará pelo bom uso que ele faça da norma da língua – norma escrita.

Esperamos, então, esclarecer que tomar o oral como objeto de ensino em sala de aula, sob hipótese alguma, diminuiria ou comprometeria de alguma outra forma o desempenho de um vestibulando nos exames. Ao contrário: fazendo uso da norma da língua, o aluno só estaria pondo em prática uma das habilidades lingüísticas que desenvolveu e aperfeiçoou. Ou seja, como já mencionamos, ele estaria tão-somente adequando um dos usos da língua de acordo com o contexto comunicativo em que se encontra.

(39)

Gêneros orais ‘não-ensináveis’

(espontâneos, cotidianos)

Gêneros orais ‘ensináveis’

(comunicação pública formal)

Diálogo íntimo de salão Seminários

Diálogo íntimo de círculo Debates

Diálogo familiar-cotidiano Entrevistas jornalística e profissional

Gêneros breves cotidianos de saudação Discursos

Despedidas Aulas

Votos Comunicação pública formal

Relatos cotidianos Relatório de experiência

Telefonemas Testemunho em instância formal

Piadas Conto oral

Avisos Pregação

Programa de rádio (a depender do estilo) Conferência

Outros Outros

Podemos, assim, observar que ‘ensinável’ é o oral mais elaborado, para o qual, conscientemente, articula-se a linguagem condizente com as particularidades de cada gênero e com seus respectivos lugares sociais – é o que torna o falante um “poliglota” no âmbito da própria língua.

(40)

CAPÍTULO 4

ANÁLISE DO MANUAL DIDÁTICO

A avaliação dos livros do ensino médio tem em comum com o ensino fundamental a visão de que, sendo o livro didático uma importante ferramenta para professores e alunos, ele deve ter características que permitam sua utilização em diferentes contextos e realidades (PNLEM, 2004, p. 8).

Neste capítulo, apresentaremos nossas categorias de análise, apoiadas na proposta do PNLD/PNLEM (e também nos PCN, como já esclarecemos em capítulo anterior), porém voltada, especificamente, para o LD do Ensino Médio, além da análise em si do Livro Didático.

4.1. Programa Nacional do Livro do Ensino Médio/20061

Nossa análise do LD se baseia nos critérios do PNLEM/2006, uma vez que estes são específicos para o Ensino Médio – o Programa Nacional do Livro Didático, até então, era voltado precisamente para o Ensino Fundamental.

Seguem trechos extraídos do Catálogo do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio – PNLEM/2006 – Língua Portuguesa, concernentes aos Critérios Relativos ao Ensino da Linguagem Oral (PNLEM/2006, p. 72 – 75, 77 – 81), para conhecimento da linha de análise adotada neste trabalho:

I - NORMA, VARIAÇÃO E MUDANÇA

1. O livro discute o conceito de norma lingüística? Sob que perspectiva? 2. Como são tratadas as noções de “certo” e “errado”?

(41)

* são relativizadas, tomando-se como referência um padrão de língua sócio- historicamente constituído

* são tidas como absolutas e definitivas * outras possibilidades

3. Quanto ao uso da língua:

• As formas lingüísticas estudadas correspondem à realidade atual do português brasileiro contemporâneo, falado e escrito?

• Insiste-se em fazer o aluno apreender usos pouco freqüentes ou francamente obsoletos?

• As exceções listadas são dignas de atenção ou constituem formas já desaparecidas do uso contemporâneo?

4. Quanto ao fenômeno da variação lingüística:

• A variação é vista como constitutiva da natureza das línguas humanas ou, ao contrário, como um “problema”?

• Evita-se a sinonímia equivocada variação = erro ou incorre-se na prática tradicional de mostrar as variantes apenas para reforçar a idéia de que só uma delas é a “certa”?

• O livro se limita às variantes prosódicas (“sotaque”) e lexicais (“aipim”, “mandioca”, “macaxeira”)?

• Como é tratada no livro a variação sintática?

5. Quanto ao fenômeno da mudança lingüística:

• Há no livro alguma tentativa de abordá-lo? Caso afirmativo, sob que perspectiva?

• Mostra-se de algum modo que o estado atual da língua é resultante de um longo processo de transformações e que este processo não se interrompeu, mas prossegue vivo na língua atual?

• Procura-se mostrar que a mudança não é para “pior” nem para “melhor”, mas que é simplesmente mudança?

(42)

1. Há algum reconhecimento das interpretações de fala e escrita?

2. Recorre-se à dicotomia tradicional, que considera fala e escrita isoladamente, com uma supervalorização da escrita mais monitorada e uma desvalorização da língua falada?

3. Há alguma contribuição para o desenvolvimento da linguagem oral pelo usuário do livro?

Exercícios e atividades

1. Permitem uma compreensão clara do fenômeno lingüístico estudado?

2. Permitem a apropriação adequada das regularidades em jogo?

3. Recorrem às práticas tradicionais de puro reconhecimento e classificação de classes e/ou funções de palavras, preenchimento de lacunas, substituição de palavras por seus “sinônimos” etc.?

4. Propõem algum tipo de prática investigativa, de pesquisa, capaz de levar o aprendiz a verificar a situação real, na língua contemporânea, do fenômeno estudado?

5. Visam à apreensão da regularidade gramatical analisada (reflexão lingüística) ou à apropriação dos termos técnicos usados para descrevê-la (transmissão de conteúdos gramaticais)?

6. Como se faz a abordagem das regularidades da língua?

• com recurso a textos autênticos em que os fenômenos ocorrem

• por meio de uma apresentação categórica, exemplificada em frases descontextualizadas

(43)

7. As atividades:

• mobilizam e/ou explicitam corretamente os conceitos?

• Apresentam variedade e diversidade de propostas?

• são formuladas com clareza?

• contribuem para a construção da cidadania, evitando preconceitos, estereótipos e formas de doutrinação religiosa e/ou ideológica?

[...]

III – CRITÉRIOS RELATIVOS AO ENSINO DA PRODUÇÃO DE TEXTOS

Proposta geral do livro

1. O que o livro propõe, como apoio didático para o ensino de produção de textos?

• nada de específico?

• Um conjunto de temas, com pouca ou nenhuma orientação para o aluno?

• Uma seleção de propostas de diferentes concursos vestibulares (com ou sem algum tipo de comentário e/ou orientação para o aluno?

[...]

2. No caso de o livro não apresentar uma proposta específica, como a escrita é tratada nas principais seções em que a obra se divide?

→ uma proficiência já suficientemente desenvolvida pelo aluno, a que atividades de outra natureza eventualmente recorrem?

Referências

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