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Namoro e violência: um estudo sobre amor, namoro e violência para jovens de grupos populares e camadas médias

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Academic year: 2021

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(1)NAMORO E VIOLÊNCIA: um estudo sobre amor, namoro e violência entre jovens de grupos populares e camadas médias.

(2) Fernanda Sardelich Nascimento. NAMORO E VIOLÊNCIA: um estudo sobre amor, namoro e violência entre jovens de grupos populares e camadas médias. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Psicologia.. Orientadora: Rosineide de Lourdes Meira Cordeiro. RECIFE 2009.

(3) Nascimento, Fernanda Sardelich Namoro e violência: um estudo sobre amor, namoro e violência para jovens de grupos populares e camadas médias. – Recife: O Autor, 2009. 144 folhas. Dissertação (mestrado) – Universidade Pernambuco. CFCH. Psicologia, 2009.. Federal. de. Inclui: apêndices. 1. Psicologia. 2. Psicologia social. 3. Violência. 4. Namoro. 5. Jovens - Comportamento. I. Título. 159.9 150. ed.). CDU. (2.. CDD (22. ed.). UFPE BCFCH2009/10.

(4) UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA. NAMORO E VIOLÊNCIA: um estudo sobre amor, namoro e violência entre jovens de grupos populares e camadas médias. RECIFE, 04 de fevereiro de 2009.

(5) AGRADECIMENTO Agradeço a Deus pelo direcionamento, amor, cuidado e por sempre estar ao meu lado; A Prof.ª Dr.ª Rosineide Cordeiro, que construiu comigo esta dissertação. Pela dedicação, escuta acolhedora, amizade, e disponibilidade durante esses dois anos de trabalho. Pela orientação próxima, por sempre acreditar em meu potencial e me incentivar na busca do conhecimento. Ao Prof. Dr. Russel Parry Scott e à Prof.ª Dr.ª Jaileila Menezes, pelas contribuições importantes no Exame de Qualificação do Projeto, e pela participação neste momento. A minha amada mãe, Vera Lúcia, por sempre me apoiar, pela mulher batalhadora e mãe zelosa, modelo inspirador para minha vida. Bem como, pela compreensão pelas ausências e momentos de isolamento para a construção desse trabalho. A minha tia, Maria Emilia, pelo apoio durante todo esse processo, desde a seleção do Mestrado, até a conclusão do mesmo. Pelas leituras atentas, pelas críticas importantes e sempre pertinentes, e por não permitir que me acomodasse, instigando sempre o desejo pelo conhecer. Ao meu irmão, Daniel, porque mesmo com as suas limitações, me apoiou e compreendeu minhas ausências. Ao Leonardo, pelo companheirismo, amizade, amor e por dividir comigo as angústia, alegrias e sonhos. Pela ajuda e compreensão, principalmente nos momentos de maior stress. Que possamos juntos colher os frutos desse trabalho. Aos amigos do Mestrado, que durante essa caminhada se fizeram presentes, seja na leitura atenta do meu trabalho, nas discussões sobre o tema, nas indicações de bibliografia, nos empréstimos de livros, seja nos encontros extra-acadêmicos, nos.

(6) “tradicionais” encontros de quinta. Em especial à Cíntia, Paloma, Laís, Michele, Kátia, Thalita, Emília, Alcione e ao Epitácio. As amigas e ao novo amigo do Grupo de Estudos sobre Poder, Cultura e Práticas Coletivas – Gepcol, pelo espaço de reflexão e crescimento a partir das leituras realizadas e discussões do projeto e dissertação. Em especial à Dêlaine, Giselle e Cíntia. Aos professores do Mestrado, pela competência e compromisso com que ministraram as disciplinas cursadas. Pelas reflexões em sala de aula, indicações de leitura, trabalhos solicitados, que foram fundamentais para meu crescimento acadêmico. Em especial, a Prof.ª Dr.ª Fátima Santos pela disponibilidade em ler meu projeto de pesquisa e as contribuições realizadas, ao Prof. Dr. Luís Felipe Rios pelo apoio e empréstimo de livros, ao Prof. Dr. Benedito Medrado pelo compromisso com que ministrou as disciplinas de Seminário de Pesquisa e Tópicos Especiais: Práticas Discursivas e Produção de Sentidos. À Prof.ª Dr.ª Maria Isabel Pedrosa, coordenadora do Programa, pela atenção dispensada a todos(as) os(as) alunos(as), pelo compromisso com a ética, pela dedicação com que ministrou as disciplinas, e por sempre instigar a busca pelo conhecimento. À Alda, pela atenção, cuidado e principalmente pela responsabilidade e disponibilidade com que conduz a secretaria do programa. Aos interlocutores da pesquisa que dividiram comigo suas histórias..

(7) Ciúme de Você Roberto Carlos Composição: Luiz Ayrão Se você demora mais um pouco Eu fico louco esperando por você E digo que não me preocupa Procuro uma desculpa Mas que todo mundo vê Que é ciúme, ciúme de você Ciúme de você, ciúme de você Se você põe aquele seu vestido Lindo e alguém olha pra você Eu digo que já não gosto dele Que você não vê que ele está ficando démodé Mas é ciúme, ciúme de você Ciúme de você, ciúme de você Este telefone que não para de tocar Está sempre ocupado quanto eu penso em lhe falar Quero então saber logo quem lhe telefonou O que disse, o que queria e o que você falou Só de ciúme, ciúme de você Ciúme de você, ciúme de você Se você me diz que vai sair Sozinha eu não deixo você ir Entenda que o meu coração Tem amor demais meu bem e essa é a razão Do meu ciúme, ciúme de você Ciúme de você, ciúme de você..

(8) RESUMO. NASCIMENTO, Fernanda Sardelich. Namoro e violência: um estudo sobre amor, namoro e violência entre jovens de grupos populares e camadas médias. Dissertação (Mestrado em Psicologia) — Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Universidade Federal de Pernambuco, Recife-PE, 2009. Essa dissertação tem como objetivo geral analisar os significados da violência para os jovens namorados entrevistados, e como específicos: 1) compreender o que os jovens entendiam por relações violentas; 2) identificar os tipos de violência mais comuns nas relações entre os namorados entrevistados; 3) investigar os contextos em que a violência era aceita entre namorados. Insere-se no campo da Psicologia Social, tendo como perspectiva teórica as Práticas Discursivas e Produção de Sentidos filiada ao Construcionismo. O argumento defendido é o de que a violência não é do namorado ou da namorada, e sim da relação, apresentando significados para a mesma. Foram realizadas vinte e duas entrevistas, semi-estruturadas — gravadas e transcritas —, com jovens entre 18 e 29 anos, que consideravam seus relacionamentos como namoro, divididos em dois grupos: onze jovens de grupos populares, sete mulheres e cinco homens, e onze jovens de camadas médias, sete mulheres e cinco homens. Também foram utilizadas as anotações realizadas no diário de campo e as reportagens sobre casos de violência entre namorados, disponíveis na mídia impressa e televisiva. A partir deste material observamos que a violência entre namorados tem, aparentemente, como principal motivação, a crença de que o outro é uma posse, sendo assim, existe o direito de controle sobre esse outro. Embora os jovens tenham apresentado concepções abrangentes sobre o fenômeno da violência na relação, é como se este não estivesse presente no cotidiano de seus namoros. Entretanto, a violência evidenciou-se, na relação dos jovens entrevistados na forma de: insultos; tapas; empurrões; proibições em relação a sair com os(as) amigos(as), ter amizades com pessoas do sexo oposto; “comprar” o outro com presentes; impedir que o outro faça algumas atividades, como, por exemplo, dançar; controle do outro através de ligações e do orkut. Os jovens entrevistados não compreendem como violência as vivências de desrespeito, controle, insultos, agressões físicas, psicológicas, morais, ameaças de término, do namoro. Entre os motivos para a invisibilidade da violência na relação, destaco: 1) a concepção amorosa dos jovens; 2) a compreensão de alguns desses jovens de que a violência é restrita apenas ao âmbito físico; 3) a compreensão sobre as normas presentes no namoro. Na relação, a violência é exercida por homens e mulheres, sendo utilizada como forma de: controle do outro; garantia de fidelidade; dar a palavra final. Palavras-chave: violência, namoro, relações afetivas, práticas discursivas..

(9) ABSTRACT. The overall purpose of this dissertation is to analyze the meaning of violence among a group of young people who are dating with the following focus questions: 1) comprehend what the participants consider violent relationships; 2) identify the most common types of violence among participating young dating couples; 3) investigate the context in which violence is acceptable among participating dating couples. This study related to the field of Social Psychology, based on the theoretical perspective as Discursive Practice and Production of Senses affiliated with Constructionism. The thesis is that violence is not originated from the boyfriend or the girlfriend, but rather from the relationship and its meaning. Twenty two interviews were conducted, semi-structured taped and transcribed -, with young people between the ages of 18 and 29 years, who described their relationships as dating. The participants were divided in two groups: eleven low-income youth, seven females, five males, and eleven middle class youth, seven females and five males. In addition to interviews, field-notes and journals were taken daily as from news related to cases of violence among youth, made available by the media, both print and television. It was concluded from the data that the violence among dating youth, appear to have as the main motivation, the belief that the other person is a possession, consequently giving one the right to control over the other. Although the young’s bring their own perceptions of the phenomenon of violence in relationships, it is as if this perception did not exist in the daily dating interactions. Nevertheless, violence was evident in the youth interviewed in different forms: insults; slaps; pushing; prohibiting relationships with friends, or friendships with people from the opposite sex; “buying” the other with gifts; preventing the other from participating in certain activities, such as dancing; controlling the other person through the phone calls and internet social websites. The young participants did not consider control, insults, physical, psychological and moral aggression, threat of breaking up as violence. Among the reasons for the invisibility of violence in the relationship were: 1) the conception of love by the youth; 2) the understanding of some of the youth that violence is restricted only in the physical realm; 3) the understanding about some of the present norms of dating. In the relationship, violence is exercised by males and females, being utilized as a form of control: control of the other person; guarantee of fidelity; having the last word.. Key-words: violence, dating, affective relationships, discursive practices..

(10) SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................... 11 1. Trajetória do tema ........................................................................ 12 2. Situando a dissertação: postura epistemológica ....................... 17 3. Organização da dissertação ........................................................ 21. CAPÍTULO 1: DO AMOR E DAS RELAÇÕES DE VIOLÊNCIA ........ 24 1.1. O que é o amor? ........................................................................ 25 1.2. Breve histórico sobre as transformações amorosas no Ocidente ..................................................................................... 26 1.3. O amor na contemporaneidade ................................................ 29 1.4. As configurações afetivo-sexuais contemporâneas: ficar ou namorar? ...................................................................... 41 1.5. A violência nas relações amorosas ......................................... 45. CAPÍTULO 2: PESQUISANDO AS PRÁTICAS DISCURSIVAS: OS PROCEDIMENTOS E O REFERNECIAL TEÓRICO METODOLÓGICO .............................................................................. 59 2.1. Procedimentos metodológicos ................................................. 59 2.1.1. Instrumentos ........................................................................... 61 2.1.2. Interlocutores da pesquisa .................................................... 62 2.2. Referencial teórico-metodológico e procedimentos de análise ........................................................................................ 67 2.2.1. A análise .................................................................................. 72.

(11) CAPÍTULO 3: AMOR, NAMORO E VIOLÊNCIA ............................... 76 3.1. O ficar e o namorar..................................................................... 77 3.2. O amor nas relações de namoro ............................................... 87 3.3. Motivos de briga ........................................................................ 90 3.4. Regras do namoro ...................................................................... 98 3.5. A violência no namoro ............................................................... 103 3.6. A narrativa e a cena de violência .............................................. 108. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................ 116. REFERÊNCIAS .................................................................................. 124. APÊNDICES ...................................................................................... 132 APÊNDICE A - QUADRO 1: NOTÍCIAS DE CRIMES ........................ 133 APÊNDICE B – ROTEIRO DA ENTREVISTA..................................... 136 APÊNDICE C – IDENTIFICAÇÃO DOS INTERLOCUTORES ........... 137 APÊNDICE D – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE ESCLARECIDO ...................................................... 138 APÊNDICE E – QUADRO 3: ELEMENTOS DO REPERTÓRIO LINGUÍSTICO FICAR ............................................. 139 APÊNDICE F – QUADRO 4: ELEMENTOS DO REPERTÓRIO LINGUÍSTICO NAMORO ........................................ 140 APÊNDICE G – QUADRO 5: ELEMENTOS DO REPERTÓRIO LINGUÍSTICO AMOR .............................................. 141.

(12) APÊNDICE H – QUADRO 6: MOTIVOS DE BRIGA........................... 143 APÊNDICE I – QUADRO 7: VIOLÊNCIA ........................................... 144.

(13) INTRODUÇÃO. Essa dissertação tem como objetivo geral analisar os significados da violência para os jovens namorados entrevistados, e como específicos: compreender o que os jovens entendiam por relações violentas; identificar os tipos de violência mais comuns nas relações entre os namorados entrevistados; investigar os contextos em que a violência era aceita entre namorados. O argumento defendido é o de que a violência não é do namorado ou da namorada e sim da relação, apresentando significados para a mesma. Esta dissertação circunscreve-se no campo da Psicologia Social, tendo como perspectiva teórica as Práticas Discursivas e a Produção de Sentidos que dialogam com as posturas construcionistas. Foi desenvolvida durante o Curso de Mestrado da PósGraduação em Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco — UFPE, na linha de pesquisa de Processos Psicossociais, Poder e Práticas Coletivas..

(14) 12. 1. Trajetória do tema. Ao ingressar no Mestrado, minha intenção inicial era estudar o tema da violência doméstica contra as mulheres, correlacionando-a com os mitos familiares. O interesse pelo fenômeno da violência contra a mulher foi despertado pelo contato cotidiano com o tema, por meio das notícias veiculadas nos jornais, nas quais as condições de desigualdade e desvalorização da mulher estavam presentes. Como a temática da violência contra a mulher era algo novo para mim, iniciei o levantamento bibliográfico como forma de aproximação, e me deparei com a complexidade envolvida nos estudos sobre o assunto, bem como a divergência de opiniões em relação à mulher, ora vista como vítima (SAFFIOTI, 1999; 2004), ora como participante da violência (CHAUÍ, 1985; GROSSI, 1998; GREGORI, 1993). O contato inicial com a literatura levantou uma série de indagações que dirigiram o meu interesse, não mais para a influência dos mitos familiares, mas para os motivos que levavam as mulheres a permanecer em relações conjugais violentas. Neste momento, o meu desejo era compreender a violência para além da dicotomia vítima / algoz, na busca dos seus significados para a relação. Ao me debruçar na literatura sobre este fenômeno, percebi que as pesquisas focavam as relações conjugais (SAFFIOTI, 1999, 2004; GROSSI, 1998; GREGORI, 1993), existindo uma lacuna quanto às relações entre namorados, embora pesquisas como a da Fundação Perseu Abramo, de 2001, apontem sua presença nas cenas de violência, com variações de 2 a 12% 1. Falei à minha orientadora sobre meu desejo em não focar apenas as relações conjugais, mas também outros tipos de relações, momento em que ela lançou a pergunta: “Você não se interessaria em estudar apenas os namorados?”.. 1. Pesquisa “A mulher brasileira nos espaços público e privado”, na qual foram entrevistadas 2.502 mulheres, distribuídas em 187 municípios de 24 estados das 5 macrorregiões do país (N, S, SE, NE e CO), disponível no site da Fundação Perseu Abramo, na página http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/index.php?storytopic=732.

(15) 13. Isso me motivou a realizar um levantamento no Banco de Teses da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) 2, no período compreendido entre 1987 e 2007. Esse levantamento revelou a inexistência de pesquisas com este recorte, em âmbito nacional, seja em dissertações de mestrado ou em teses de doutorado. Após essa pesquisa na base de dados da Capes, iniciei um levantamento nos jornais de circulação nacional — tanto nas versões on line3, quanto impressa4 — e nos bancos de dados da world wide web, referentes ao período de 2000 a 2007, procurando casos de violência entre namorados. Inicialmente foi difícil encontrar esses casos, porém, durante uma conversa sobre o tema me foi sugerido usar a expressão crimes passionais, ao invés de crimes entre namorados. Foi assim que tive acesso aos casos veiculados na mídia sobre violência entre namorados. Na leitura das reportagens sobre a violência entre namorados chamou minha atenção a presença das mulheres como autoras de violência, embora em menor número do que os homens. Durante todo o Mestrado realizei pesquisas, na internet, sobre casos de violência entre namorados. Essas constantes buscas no banco de dados da world wide web me permitiram perceber as transformações que o tema foi sofrendo durante o ano de 2008. Foi possível modificar as palavras-chave de “crimes passionais” para “violência” ou “crimes entre namorados”. Os resultados dessas pesquisas estão disponíveis no Quadro 1 (Apêndice A). Aparentemente, a violência entre namorados ganhou destaque após a Lei Maria da Penha, surgindo discussões sobre a violência cometida por ex-namorados, a qual, ao contrário do que acontece com o ex-cônjuge, não é contemplada pela lei, conforme destacado em matéria publicada no site do Supremo Tribunal de Justiça 5. No Brasil, os estudos sobre a violência entre namorados e ex-namorados ainda são incipientes, o que não pode ser dito a respeito de países como Estados Unidos, México, Portugal e Espanha, por exemplo, nos quais encontramos programas de. 2 3 4 5. Disponível em: http://servicos.capes.gov.br/capesdw/ Acesso em: 29 de Julho de 2007, às 20h30. Folha Online, Estadão, Diário da Manhã, Radiobrás. Diário de Pernambuco. Disponível em: http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=448&tmp.texto=89558&tmp.area_anter ior=44&tmp.argumento_pesquisa=lei%20maria%20da%20penha Acesso em: 26 de outubro de 2008..

(16) 14. prevenção contra a violência no namoro, conhecidos como dating violence, courtship violence ou violencia en el noviazgo. No youtube 6, estão disponíveis campanhas de prevenção desenvolvidas em alguns desses países, nas quais há, além de textos e imagens sobre as principais características da violência no namoro (como forma de ajudar o jovem a reconhecer a violência), depoimentos de jovens que vivenciaram a violência em suas relações e telefones de locais especializados em ajudar esses jovens. Ao falar da minha pesquisa para os amigos, me deparei com várias reações ao tema. Alguns me contaram histórias, outros demonstraram estranhamento, outros ainda falaram de cenas que presenciaram. Todas as histórias contadas a partir das provocações causadas pelo tema foram anotadas em meu diário de campo. Entre essas histórias e reações destaco algumas que propiciam uma aproximação com o tema abordado nessa pesquisa. Inicio com o relato de Patrícia, uma amiga casada que mora com o marido em outro país. Nas férias dela aqui no Brasil nos encontramos e ela perguntou como estava o meu Curso de Mestrado. Falei sobre minha pesquisa e ela me contou a seguinte história 7: Nossa, Fernanda, esse é um tema bem polêmico. Acho que é importante estudar isso, eu mesmo tenho um exemplo disso em minha família. Meu primo e a namorada dele, agora eles estão novamente brigados, vivem brigando feio. Ele já tentou matá-la duas vezes, na primeira tentou estrangulá-la, e na segunda, enquanto brigavam ele jogou o carro que estava dirigindo contra outro carro, do lado do passageiro (lado em que a namorava estava). Acredita que depois disso eles ainda voltaram? (...) até tentei conversar com ela uma vez, mas ainda fui acusada de querer destruir a relação, por isso parei de falar. (...) acho que ela sempre volta porque tem um filho com ele (...) ela também age errado com ele, o controla, o provoca, fica vigiando ele, e no fim sempre volta. Agora eles estão separados de novo. (Diário de Campo, 03/01/2008).. Casos como o relatado por Patrícia não foram incomuns; quando alguém que sabia de minha pesquisa via alguma notícia sobre brigas entre namorados, ou. 6 7. Disponível em: www.youtube.com.br Todos os nomes que aparecem nessa dissertação são fictícios, para garantir o anonimato..

(17) 15. presenciava alguma cena, me falava a respeito. Alda é um desses exemplos: ela me contou sobre uma situação que uma amiga relatou para ela. No carnaval, sua amiga encontrou um amigo e foi cumprimentá-lo; nesse momento, a namorada do rapaz chegou e perguntou quem era aquela mulher, num tom agressivo, e deu um tapa no rosto do namorado. Assim como nas entrevistas destacadas no Quadro 1, nesses dois casos relatados a mulher também aparece como autora da violência. Recordo-me de uma cena que me foi relatada dez anos atrás por uma amiga, que na época vivenciava um namoro conturbado: entre um dos inúmeros rompimentos vividos por eles, antes do término da relação, Lia relatou a cena na qual, após uma discussão, ela foi procurar o namorado no prédio dele. Com medo da reação dela — que já o havia agredido uma vez com tapas, e, em uma das discussões, arrancado o espelho retrovisor do carro dele —, o namorado não quis abrir o portão do prédio para que eles conversassem, alegando que ela estava descontrolada. Lia ficou ainda mais nervosa, segundo me contou, e não teve dúvidas: colocou a mão entre as grades do portão e o puxou contra a grade duas vezes, fazendo com que ele batesse o rosto. Só então ele conseguiu reagir, se desvencilhando e saindo. Depois dessa cena ainda reataram o namoro e tiveram outras brigas, até terminarem definitivamente. Também me deparei com certa surpresa das pessoas: “(...) namoro e violência? Parece que são duas coisas que não combinam na mesma frase”, comentário feito por uma das professoras do Programa do Mestrado, antes da minha qualificação, em conversa pelos corredores da Universidade. Infelizmente, são duas palavras que, embora não devessem, coabitam na mesma frase. No mês de outubro de 2008 foi estampado em todos os jornais impressos e televisivos o “Caso Eloá”. 8. , jovem de 15 anos que namorou Lindemberg, rapaz de 22. anos, durante aproximadamente três anos. Após esse período, Lindenberg, por ciúmes, terminou o namoro com Eloá, porém se arrependeu e tentou reatar, mas ela recusou. No dia 13 de outubro, inconformado com o fim do namoro, Lindemberg invadiu a casa de Eloá e a manteve refém por 100 horas, durante as quais a agrediu fisicamente com 8. Para maiores informações sobre o caso consultar a Folha Online: http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u457514.shtml.

(18) 16. tapas, pontapés, puxões de cabelo e ameaças constantes de morte, bem como à sua amiga, que ficou a maior parte do cativeiro junto com Eloá. Em vários momentos do cárcere, Lindemberg justificava aos policiais com os quais negociava a liberdade de Eloá que suas ações eram motivadas pelo amor que sentia por ela. Em pleno século XXI, com todos os avanços alcançados através das lutas feministas, ainda encontramos a crença de que o amor justifica tudo, inclusive privar o outro de todos os seus direitos. Talvez a justificativa do sentimento seja mais bem aceita do que a utilizada pela defesa de Raul Fernando do Amaral Street (Doca Street), de legitima defesa da honra, como justificativa pelo crime cometido contra sua namorada Ângela Diniz, em 1976. A justificativa de que Lindemberg não estava em busca de benefícios financeiros e, sim, do amor foi utilizada por seu então advogado, Eduardo Lopes, o qual, conforme publicado no dia 17/10/2008, defendeu que seu cliente não ficaria preso, pois entre outros motivos alegados, tudo o que ele fez foi em nome do amor 9. O final trágico de Eloá desencadeou uma série de reportagens sobre a violência entre namorados, as quais apontaram para a existência do amor patológico, tema que já vem sendo debatido na área psiquiátrica. 10. . Esse caso mobilizou todo o país, e também. outros países como Portugal, em que a ação da polícia brasileira foi criticada pelos jornais. Mesmo estudando sobre a violência entre namorados, e já tendo entrado em contato com inúmeras reportagens de assassinatos cometidos por ex-namorados(as), não pude deixar de ficar mobilizada pelo caso da Eloá. Essa mobilização interna que inicialmente me paralisou, posteriormente me motivou a investir ainda mais na elaboração dessa dissertação, acreditando que possa constituir um espaço para reflexão acerca da importância de desenvolver estudos sobre o tema e motivar a implementação de campanhas que alertem para a violência nas relações entre namorados. 9. Notícia disponível em http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u457301.shtml . Sob o título: “Rapaz que mantém ex-namorada refém não deve ir para a cadeia, diz advogado”, no jornal Folha online. 10 Aqui não é intenção debater os estudos desenvolvidos sobre o tema do amor patológico, mas, para maiores informações, consultar: http://www.rbpbrasil.org.br/portal/artigos-no-prelo/texto-integral/amorpatologico-um-novo-transtorno-psiquiatrico/ ou http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?art=388&sec=35 ..

(19) 17. Anterior ao caso Eloá, em 14 de julho de 2008, o programa “Lavanderia”, exibido na MTV, teve como tema “Namoro Iô-iô”. O formato do programa é o de um sofá, no qual fica o(a) entrevistado(a) e a entrevistadora, e seis poltronas distribuídas três à direita e três à esquerda, sendo que de um lado ficam as pessoas que defendem o(a) entrevistado(a) e do outro as que são contra. No lado das pessoas que defendiam a entrevistada estavam dois amigos e a mãe da jovem e, do outro, o namorado e dois amigos. Nesse programa uma jovem de 20 anos relata sobre seu namoro. Segundo ela, são constantes as brigas, os xingamentos e o desrespeito, porém eles sempre voltam, pois se gostam. Também nesse caso o ideal de que o amor supera tudo se faz presente na relação, a qual, em nenhum momento da entrevista, é compreendida pelos jovens como violenta. No processo de construção dessa dissertação travei vários diálogos não só com a literatura sobre o tema, reportagens de jornais e revistas, mas também com os programas de televisão que assisti e conversas com diferentes pessoas que relataram vários casos presentes na dissertação. Dentre esses diálogos incluem-se também as discussões com os(as) orientandos(as) do Grupo de Estudos sobre Poder, Cultura e Práticas Coletivas – Gepcol, os encontros com a minha orientadora, as discussões em sala de aula, as observações da banca de qualificação. Tudo isto foi compondo o meu campo-tema.. 2. Situando a dissertação: postura epistemológica.. A perspectiva adotada nesta dissertação, conforme dito anteriormente, insere-se no âmbito da Psicologia Social de cunho Construcionista. Tem como foco dos estudos a linguagem em uso, compreendida, segundo Mary Jane Spink (2004, p. 39), como prática social, em sua interface entre:.

(20) 18. (...) os aspectos performáticos da linguagem (quando, em que condições, de que modo) e as condições de produção (entendidas tanto como contexto social e interacional, quanto no sentido foucaultiano de construções históricas).. Segundo Kenneth Gergen (1985), para o Construcionismo Social. 11. o contexto. histórico e cultural é fundamental, uma vez que os sentidos construídos, bem como seus discursos, variam e sofrem transformações através do tempo e da cultura na qual a pessoa está inserida. Para ele, os problemas clássicos da Psicologia e da Filosofia são os linguísticos. As posturas construcionistas inserem-se no âmbito da pós-modernidade, ou Modernidade Tardia, caracterizada pela crítica às concepções da ciência moderna — dicotomia entre sujeito-objeto e crença na neutralidade, existência de verdades universais e de uma realidade independente do sujeito —, tendo como traço marcante a reflexividade. Histórica e culturalmente, essas posturas surgem no bojo das críticas à visão da ciência como “descrevendo objetiva e apuradamente a realidade, na qual a linguagem é sustentadora da verdade” (RASERA; JAPUR, 2007). Entre as críticas que influenciaram as posturas construcionistas estão: 1) Crítica social, a qual considera que o conhecimento está histórica e culturalmente situado, não existindo, assim, “a” verdade, havendo entre os discursos um constante jogo de poder e resistência. Entre os autores que influenciaram a crítica social incluem-se: Marx, Weber, Scheler, Karla Manheim e Michel Foucault. 2) Crítica ideológica, identificada como Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, tendo entre seus representantes Max Horkhiemer, Theodor Adorno, Hebert Marcuse e Walter Benjamin. Essa teoria nega a neutralidade na ciência, a possibilidade de descrições objetivas, e critica as noções de ciência tradicionais, principalmente o positivismo. 3) Crítica retórico-literária, a qual explicita as regras de apresentação literária que determinam as explicações científicas (NOGUEIRA, 2001a, 2001b; RASERA; JAPUR, 2007). Além dessas, outra influência marcante é a do giro linguístico. Este giro aponta para a centralidade da linguagem nas ciências sociais, critica a idéia de que a 11. Embora o autor utilize o termo construcionismo social, entendo que esse é datado, e hoje falamos de posturas construcionistas..

(21) 19. linguagem é a mediadora entre o conhecimento e o mundo, considerando que essa é produtora (ação) desse mundo e critica a concepção representacionalista da linguagem — de que existe uma verdade que pode ser representada. Há um consenso no que tange à questão da impossibilidade de falarmos de “um construcionismo” com elementos sine qua non que o determinem, mas há algumas questões centrais, um conjunto de preocupações e formulações ao redor das quais se articula o movimento (IBÁÑEZ, 1994, 2003; IÑIGUEZ, 2007; LÓPES; MOYA, 2003; NOGUEIRA, 2001a; RASERA; JAPUR, 2007). Assim, para falar da história do surgimento destas posturas, teríamos que retomar a história desses movimentos, teorias, e os fenômenos de transformação da linguagem e da sociedade. Ibáñez (1994, p. 259) destaca que existe uma “galáxia construcionista”, heterogênea, mas com elementos comuns a todos os que integram essa galáxia. Como forma de nos localizarmos dentro dessa galáxia José Enrique López e Juan Moya (2003) destacam, entre os movimentos do construcionismo inseridos na Psicologia Social: “o socioconstrucionismo com recorte foucaultiano de Ibáñez; o construcionismo conversacional de Shotter”. Dentro das posturas construcionistas da atualidade podemos incluir: “a psicologia social crítica (Ibáñez, Iñiguez, Prilleltensky); a psicologia social retórica de Billing; a psicologia discursiva (Edwards, Harré, Parker, Potter, Wetherell, entre outros); a psicologia (social) feminista (Burnam, Gergen, HareMustin e Marecck, entre outros)” (LÓPES; MOYA, 2003, p. 8) 12. Contudo, existem questões centrais, elementos que são compartilhados pelos autores (GERGEN, 1985; IBÁÑEZ, 1994, 2003; IÑIGUEZ, 2003; 2007; LÓPES; MOYA, 2003; NOGUEIRA, 2001a, 2001b; RASERA; JAPUR, 2007; SPINK, 2004a). Entre esses elementos estão: 1) Antiessencialismo. Compreende que tanto as pessoas quanto o mundo são resultado, produto de processos sociais específicos. Ou seja, são construções sociais, assim, nem as pessoas nem o mundo possuem uma natureza determinada. Contrapõese, dessa forma, à visão de que existe uma essência, uma natureza humana e das coisas. 12. Tradução livre realizada pela autora da pesquisa..

(22) 20. 2) Relativismo / anti-realismo. Uma vez que se rejeita a idéia de que o conhecimento pode ser uma tradução direta da realidade, independente do conhecimento produzido sobre ela, os construcionistas consideram que a realidade não existe, independentemente da forma como nós a acessamos. “(...) só apreendemos os objetos que se nos apresentam a partir de nossas categorias, convenções, práticas, linguagem: enfim, de nossos processos de objetivação” (SPINK; FREZZA, 2004, p, 28). 3) Crítica à retórica da verdade. Postura crítica em relação à crença de que existe um conhecimento absoluto. O construcionismo defende que não existe uma verdade absoluta, pois a verdade é a verdade de nossas concepções. Não significa dizer que vivemos num mundo sem verdades, mas a compreensão de que essas são sempre localizadas, específicas e construídas a partir de convenções sociais. As convenções sociais e a cultura são construções históricas. “Afirmar que ‘o social’ é histórico significa que as práticas sociais produzem conhecimento e constroem a realidade social” (IÑIGUEZ, 2003, p. 6). Assim, não existe “a” verdade absoluta, e sim verdades, ou seja, versões. 4) Linguagem em ação. A realidade é uma construção social e o instrumento para esta construção é a linguagem (não só falada). Assim, a linguagem não é passiva, pois, na medida em que “descrevemos determinadas situações usando um vocabulário e uma forma específica, daí decorrem diferentes ações e construções do real” (RASERA; JAPUR, 2007, p. 24). 5) Foco nas interações e nas práticas sociais. O conhecimento se dá na interação social, tendo o relacionamento entre as pessoas como foco de investigação “(...) resulta numa socialização do conhecimento que passa a ser algo que construímos por meio de nossas práticas sociais e não algo que apreendemos do mundo” (SPINK, 2004a, p. 20). 6) Foco no processo de construção do conhecimento e do mundo. “A pesquisa construcionista não descreve o que as coisas são, mas o processo pelo qual elas são ativa e continuamente construídas entre as pessoas” (RASERA; JAPUR, 2007, p. 24). Diferencia-se da epistemologia tradicional, ao transferir as explicações dos processos de conhecimento, do interior da mente para o exterior, para os processos de.

(23) 21. interação, a relação com o outro e com o mundo. Assim, o embate ocorre entre os posicionamentos realista e anti-realista adotados pelas posturas construcionistas, que defendem que a realidade não independe do nosso modo de acessá-la, sendo sujeito e objeto de construções sócio-históricas (SPINK; MENEGON, 2004). Conforme destacado por Gergen (1985), as posturas construcionistas partem da dúvida radical em relação ao mundo, ao que é familiar e socialmente instituído e tomado como determinado, realizando assim uma crítica social e ao fazer da ciência clássica. Adotar essa perspectiva é um convite a considerar as regras como situadas histórica e culturalmente, não as aceitando como fundamentais, podendo sempre ser contestadas, e, neste sentido, apresenta uma tendência relativista. Desse modo, a partir dessa postura algumas concepções são assumidas. Em relação ao amor compreendo que este é uma construção social, o que possibilita escolhas a partir de diferentes influências. Assim, sempre que falamos a respeito do amor, o fazemos a partir do nosso referencial. O namoro é compreendido como uma relação entre duas pessoas, na qual existe o desejo de ficarem juntas, que tem início a partir do momento em que o casal aceita as regras existentes nessa relação. Entre essas regras, destaco como uma das primeiras, “assumir publicamente” o namoro, denominando o outro como seu/sua namorado(a). Quanto à violência, essa não é compreendida como pertencendo ao homem ou à mulher, e sim como parte da relação, apresentando significados para a mesma.. 3. Organização da dissertação. A dissertação está organizada em quatro capítulos, assim divididos: O capítulo um é de revisão bibliográfica, tendo sido subdividido em três partes: 1) o amor, suas versões e formas de existir na sociedade; 2) a relação de namoro e sua transformação ao longo da história; 3) a violência nas relações afetivo-sexuais entre namorados..

(24) 22. Sobre a construção do amor ao longo da história, foquei o amor no Ocidente e as particularidades dessa construção histórica no Brasil, tomando como base os estudos de Rougemont (2003) e Del Priore (2006). Para abordar o amor na contemporaneidade me apoiei em três autores: 1) Giddens (1993), para compreender a construção do amor romântico, fruto da modernidade, e o amor confluente, fruto da modernidade tardia; 2) Costa (1998), que me ajudou a entender as versões existentes sobre o amor — versão idealista/romântica e versão realista/pragmática; 3) Bauman (2004), o qual aborda o reflexo da sociedade na forma como as relações amorosas são estabelecidas na modernidade líquida (que outros autores chamam de modernidade tardia ou pósmodernidade). Em comum, os autores apontam o fato de que o amor não é um sentimento natural e universal, e sim uma construção social, a qual possibilita escolhas, embora acreditem que essas escolhas decorrem de diferentes influências. Na sociedade atual, novas formas de estabelecer as relações são vivenciadas, como o ficar, o qual, conforme a literatura especializada, apresenta maior fluidez, e a relação de namoro vai ganhando novos contornos, conforme consta na segunda parte do capítulo um. Para essa discussão me apoiei em autores como: Messeder (2002), Abramovay, Castro e Silva (2004), Stengel (1997) e Azevedo (1986). A parte final do capítulo um aborda as discussões sobre a violência contra a mulher, com base nos estudos de Gregori (1993), Grossi (1994; 1998), Saffioti (1999; 2004), entre outros. E especificamente sobre a violência nas relações de namoro, em nível internacional. Tomando como base autores como: De La Rosa (2005), Straus (2004), Matos (2006), Caridade e Machado (2006) e Méndez e Hernández (2001), entre outros. O capítulo dois foi dividido em duas partes. Na primeira, aponto as escolhas metodológicas realizadas, tendo como preocupação não apenas a ética em pesquisa, mas principalmente a realização de uma pesquisa ética. Na segunda parte do capítulo dois discuti sobre o referencial adotado na pesquisa das Práticas Discursivas e Produção de Sentidos, filiada ao Construcionismo Social, principalmente os conceitos de interanimação dialógica, os tempos presentes na interanimação (longo, vivido e curto), o enunciado, as vozes, além dos conceitos de.

(25) 23. posicionamento e repertórios linguísticos. Os principais autores utilizados foram: Bakhtin (1979), Ibáñez (1994; 2003; 2004; 2007), Gergen (1985; 1989), Nogueira (2001a), Spink (2004a; 2004b), Iñiguez (2003; 2004; 2004b; 2007), Davies e Harré (1990), Potter et al. (1990). Os dois últimos capítulos abordam, respectivamente, a análise das entrevistas com os jovens namorados e as considerações finais. A análise das entrevistas foi feita a partir das transcrições das gravações, com base na perspectiva adotada das Práticas Discursivas e Produção de Sentidos. Todos os nomes utilizados na pesquisa são fictícios e o cuidado ético com o resguardo do anonimato foi respeitado, bem como o direito de os jovens desistirem de participar da pesquisa, mesmo após sua concessão e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. No último capítulo, as considerações finais, a partir da análise realizada, discuto a dificuldade dos jovens entrevistados em reconhecerem a violência existente em seus namoros, bem como a necessidade de um olhar mais atento para este fenômeno. Espero que as questões abordadas nesta dissertação propiciem reflexões sobre as características da violência cometida neste tipo de relação, na tentativa de compreender as particularidades da violência entre namorados. A relevância da pesquisa incide também no fato de quase inexistirem estudos nacionais sobre o tema, e os poucos existentes, dentre os quais o de Matos et al. (2006), apontarem para o fato de que, em geral, os casamentos abusivos são precedidos de namoro violento. Portanto, este estudo também apresenta um caráter preventivo, permitindo, a partir de uma compreensão do tema, um pensar sobre possíveis estratégias de prevenção primária da violência nas relações afetivo-sexuais de jovens. A postura assumida não é a de busca da verdade sobre a violência nas relações afetivo-sexuais entre namorados. E, sim, a de que esta versão é uma entre outras possíveis, localizada e construída entre a pesquisadora e seus interlocutores — os quais não se limitaram aos jovens entrevistados —, conforme destaquei ao longo do texto..

(26) CAPÍTULO 1. DO AMOR E DAS RELAÇÕES DE VIOLÊNCIA. Ao pensar nas relações afetivo-sexuais entre namorados é importante entender as concepções de amor existentes nessa relação, uma vez que o namoro é permeado por versões sobre o amor. A palavra namorar, conforme assinala Aurélio Ferreira (1993, p. 378), apresenta essa ligação, uma vez que significa “procurar inspirar amor a; cortejar; enamorar-se”. A literatura sobre o tema da violência nas relações entre namorados aponta para a estreita relação entre as concepções de amor e a violência. Muitas vezes, algumas práticas de violência aparecem disfarçadas de amor e justificadas por esse sentimento, possibilitando assim a vivência de relações asfixiantes, provenientes do desejo de controlar o outro (MÉNDEZ; HERNÁNDEZ, 2001). A partir dessa reflexão, dividi o capítulo em quatro partes: 1) concepções sobre o amor, retomando a partir de uma perspectiva história as transformações ocorridas na forma de compreender esse sentimento — utilizando para isso dois autores de base: Mary Del Priore (2006) e Denis Rougemont (2003) —, e o amor na contemporaneidade — tomando como base três autores: Anthony Giddens (1993), Zygmunt Bauman (2004) e Jurandir Freire Costa (1998). 2) as novas configurações afetivo-sexuais na contemporaneidade — o ficar e o namoro —, possíveis a partir das transformações da sexualidade, do amor e do erotismo, ou seja, da intimidade, ocorridas nas sociedades modernas. Os autores tomados com referências para essa discussão foram: Suely.

(27) 25. Messeder (2002), Miriam Abramovay, Mary Castro e Lorena Silva (2004), Márcia Stegal (1997), Thales de Azevedo (1986) e Tânia Aldrighi (2004). 3) a violência nas relações, tomando como base os estudos de Maria Filomena Gregori (1993), Roland Barthes (2003) e Georges Bataille (1987). 4) a violência nas relações de namoro, tendo como base os estudos desenvolvidos por: Sónia Caridade, Carla Machado, Marlene Matos e Maria Silva (2006), Rosaura Méndez e Juana Hernández (2001), Ofélia Alvarez (s/d), Esther de La Rosa (2005), Murray Straus (2004).. 1.1. O que é o amor?. Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer; É um não querer mais que bem querer; É solitário andar por entre a gente; É nunca contentar-se de contente; É cuidar que se ganha em se perder; É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos amizade, Se tão contrário a si é o mesmo Amor? Luís de Camões (1524-1580). Essa pergunta não possui uma única resposta. Encontramos diferentes significados em diferentes campos do saber, nas artes, na literatura, na religião, na cultura, na biologia, etc. Essa polissemia de concepções permite afirmar que não existe o amor universal ao qual todos estão submetidos. Mas, se não existe uma concepção única, torna-se importante destacar qual a postura assumida neste trabalho, no que tange à questão do amor. Assumo que o amor, ao contrário de um sentimento natural e universal, é compreendido como uma construção social, a qual possibilita escolhas sob diferentes influências. Assim, quando falamos a respeito do amor o fazemos a partir do nosso.

(28) 26. referencial sobre o tema, impregnado de valores e concepções construídas na interação com o outro e com o mundo, mudanças sociais e transformações na intimidade.. 1.2. Breve histórico sobre as transformações amorosas no Ocidente. O coração, dono e senhor que tem mais poder, passou com ela [para o quarto] e os olhos ficaram do lado de fora, cheios de lágrimas, com o corpo. Chrétien de Troyes (1135-1191).. O amor, na Idade Média, devido ao poder da Igreja Católica, era voltado para o espiritual, o amor a Deus. Del Priore (2006) aponta que no fim do século XI são introduzidas, pelos trovadores, novas relações entre homens e mulheres, nas quais o amor puro é cantado. Esse sentimento, marcado não apenas pelo amor cristão, ganha contornos carnais, em nível idealizado mais do que concreto. Conhecido como o amor cortês, o perfeito amante tinha que ser fiel, servir sua dama, agradá-la, ser discreto, não sendo o ato sexual permitido entre eles. As concepções morais vigentes neste período eram as da sociedade cristã que levava ao casamento, e a da cortesia herética que acirrava um conjunto de valores que condenavam o casamento. Impregnada por essas duas concepções morais, a paixão, na Idade Média, sofria a contradição, pois, ao mesmo tempo em que era desejável que todo homem se apaixonasse, devido à concepção da cortesia herética, esse sentimento era inconcebível no âmbito conjugal, o que levava a uma prática da paixão fora do casamento. Nesse período, os casamentos eram mantidos não pelo afeto, mas, sim, por sistemas de coerções sociais e religiosas. Rougemont (2003, p. 375) destaca que, na Idade Moderna, ocorreu uma diminuição dessas coerções, sendo o casamento baseado nas decisões individuais, o alicerce passa a ser “uma idéia individual da felicidade”. O amor nesse período é considerado algo nobre, moral e socialmente aceito. O indivíduo da Idade Moderna é o da paixão, que busca ser possuído pelo amor considerado místico e revelador de si mesmo. A felicidade é compreendida como algo que “nós perdemos a partir do.

(29) 27. momento em que pretendemos alcançá-la. (...) só pode existir na aceitação; quando a reivindicamos, ela deixa de existir, porque depende do ser e não do ter” (p. 376). A busca passa a ser pelo amor infinito que, contrariando os amores possíveis, que nos prendem a laços temporais, supera obstáculos, ao mesmo tempo em que é impossível de ser alcançado, por ser infinito e apresentar um caráter místico. O amor recíproco aparece como sentimento arrebatador, porém condenado à infelicidade. A paixão equivalia a sofrimento, e os amantes tinham contra si diversos obstáculos, os quais alimentavam a paixão ainda mais. O amor era fundamental para a relação. Del Priore (2006) destaca que, no Brasil Colonial, estavam presentes as marcas da colonização portuguesa, fortemente impregnada dos valores das cruzadas espirituais, que pretendiam regular o cotidiano das pessoas, através da educação espiritual, da confissão e da orientação ética. Eram cruzadas morais contra a relação entre amor e sexo e entre corpo e alma, que atuavam de forma ativa no campo da organização familiar e no controle da sexualidade. O modelo escravocrata, presente no século XVI, era reproduzido nas relações conjugais, na qual a mulher deveria ser submissa e obediente ao seu marido. Até o século XVIII ainda existiam, no Brasil, dois modelos afetivos: o amor no casamento, que deveria ser casto; e o amor-paixão, que deveria ser vivido fora do matrimônio. As regras do casamento tinham a função de controlar o instinto sexual, buscando-se a domesticação do amor-paixão. Contudo, apenas ao homem era permitido o desejo sexual, e apenas fora do casamento, ficando a esposa restrita ao papel de fiel, virtuosa e submissa, destituída de desejo sexual. As uniões não aconteciam por amor, e sim pelo dever de procriar, lutar contra a tentação e como controle do desejo. O matrimônio era considerado indissolúvel pela Igreja Católica, por esse motivo justificava-se uma escolha cuidadosa. Os casamentos deveriam acontecer entre iguais — pessoas pertencentes à mesma classe social —, uma vez que era considerado um contrato de continuidade dos bens, transmissão do patrimônio, que acontecia por acordos familiares e não por escolhas pessoais. As escolhas pessoais ficavam restritas às pessoas de classe social não abastada. Para as pessoas de classe abastada, o matrimônio não tinha relação com o amor, sendo esse sentimento compreendido como bondade, caridade e destituído de lascívia, não.

(30) 28. existindo espaço para o amor erotizado, sendo a paixão considerada desordem, que condenava a pessoa ao inferno (DEL PRIORE, 2006). Para a autora, apenas no século XIX paulatinamente acontecem mudanças no que tange à diferenciação entre o amor vivido fora e dentro do casamento. Dentre essas mudanças, o erotismo, antes vivido no âmbito extraconjugal, é agregado ao casamento e o ideal de amor fundiu-se ao amor-paixão, inebriado de sentimento e sexualidade. Na passagem do século XIX para o XX — com a consolidação da República, marcada pela busca de libertação da influência da religião —, tem início a ruptura nas relações entre homens e mulheres, as quais começam a se libertar, a dizer não, mudando assim a estrutura cristalizada dos casamentos, que deixam de acontecer por interesse, passando a ser alicerçados no amor. Os avanços tecnológicos do final do século XIX e início do século XX facilitaram o dia-a-dia da mulher. A vulgarização do rádio, da televisão e do cinema influenciou o cotidiano das pessoas, trazendo novos hábitos. Outra influência significativa, no Brasil, foi a chegada dos imigrantes, vindos de todos os lugares, o que levou a cultura local a transformar-se, modificando, entre outras coisas, as visões sobre o amor e o casamento (DEL PRIORE, 2006). Observa-se que, embora no Ocidente a vivência das pessoas na Idade Moderna fosse voltada para a idéia individual de felicidade, com a valorização do amor e a diminuição das coerções sagradas, sociais e religiosas, no Brasil Colonial, pela influência da colonização portuguesa, o modelo vivido ainda era o da Idade Média, impregnado dos valores das cruzadas espirituais. Com base nos estudos de Del Priore (2006) e Rougemont (2003) é possível afirmar que, mesmo com a influência européia sobre os hábitos amorosos, no Brasil, essa transformação não ocorreu paralela, devido ao modelo vivido durante a colonização — escravocrata. A República modifica a relação da Igreja com o amor, o qual se liberta da influência desta e modifica a forma como os casamentos se realizam, agora guiados pelo amor. Hoje em dia, no mundo ocidental, conforme destaca Rougemont (2003), o amor é algo que circula em vários espaços entre as pessoas, na mídia, nos livros e nos filmes, os quais vendem a imagem do amor como aquele que supera todos os.

(31) 29. obstáculos, romântico. Contudo, o autor aponta para a existência de uma contradição, pois os mesmos obstáculos que o amor deve superar são os que alimentam o romance, fruto do amor. Nessa perspectiva, para que o amor aconteça, os obstáculos devem ser superados, mas, a partir do momento em que isso acontece, o romance perde sua fonte alimentadora. Enquanto “o romance alimenta-se de obstáculos, de separações, o casamento é feito de hábitos, de convívio cotidiano”, destarte viveríamos na eterna busca do amor, o qual implica em um casamento, e cada relação seria a promessa de felicidade, mas a concretização (casamento) levaria à perda do amor (ROUGEMONT, 2003, p. 393). O autor aponta, com isso, as ambivalências vividas atualmente em relação ao amor. A busca pela felicidade e a idéia de que, para que esta seja plena, é necessário o amor que se concretizaria no casamento que, em contrapartida, levaria à diminuição do romance e à perda do amor, sendo necessário iniciar novamente a busca.. 1.3. O amor na contemporaneidade. Conforme destacado no início do capítulo, a abordagem desta temática será realizada com base em três autores: Giddens (1993), Bauman (2004) e Costa (1998)..

(32) 30. O amor romântico, o relacionamento puro e o amor confluente, para Anthony Giddens. De tudo, ao meu amor serei atento. Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto que mesmo em face do maior encanto dele se encante mais meu pensamento. Quero vivê-lo em cada vão momento e em seu louvor hei de espalhar meu canto e rir meu riso e derramar meu pranto ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure quem sabe a morte, angústia de quem vive quem sabe a solidão, fim de quem ama. Eu possa dizer do amor (que tive): que não seja imortal, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure. Vinícius de Moraes (1913 -1980). Giddens (1993), em sua obra “A transformação da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas”, argumenta que a vivência do que ele denominou de. relacionamento puro só se tornou possível pelas transformações ocorridas na. intimidade. Essas mudanças da intimidade propiciaram um mundo que caminha para a igualdade sexual, modificando, assim, pontos de vista e comportamentos em relação ao outro. Por estarmos vivenciando um processo de transformação, nos situamos na fase de transição de antigos comportamentos, que coabitam com novos comportamentos, em nossa sociedade. Giddens (1993) exemplifica essa transição ao apontar a divisão que existia antigamente entre mulheres respeitáveis, que se mantinham na ética da virgindade, e mulheres não respeitáveis, que transgrediam os princípios morais impostos socialmente. Enquanto que, para o homem, o padrão desejável era o da conquista e da vivência sexual antes do casamento. O autor destaca que, ainda hoje, esses velhos padrões morais estão presentes em nossa sociedade. Junto a esses velhos padrões coabitam novos modelos, em que homens e mulheres chegam ao casamento com uma bagagem sexual. Essas experiências anteriores ao casamento fazem com que sejam maiores as expectativas de homens e mulheres em relação ao matrimônio..

(33) 31. O autor defende que as transformações amorosas não são apenas reflexos da modernidade, mas também de questões relacionadas com a reflexividade — contínua incorporação reflexiva do conhecimento, que acontece de forma aberta, que propicia constante questionamento do passado, do presente e do futuro —, e a auto-identidade. Segundo Giddens (1993), a construção do amor romântico começa a partir do final do século XVIII, de forma distinta do amor paixão — embora tenha incorporado elementos deste —, introduzindo os ideais de liberdade e auto-realização. No amor romântico há o rompimento com a sexualidade, a virtude assume o sentido de qualidade e é por meio dela que se distingue o outro como especial. Para o autor, o amor romântico, com frequência, implica em amor à primeira vista, atração instantânea, porém essa atração, por estar inserida no amor romântico, separa-se das compulsões sexuais/ eróticas do amor. Essa atração pelo outro é um processo que possibilita a completude da vida de ambos. Destaca que o surgimento do amor romântico — essencialmente um amor feminino —, estava diretamente envolvido com importantes transições que afetaram tanto contextos de vida pessoais quanto o casamento, subordinando as mulheres aos lares e a sua sexualidade ao casamento, para ser considerada “respeitável”. Aponta como fatores que influenciaram as mulheres: 1) “criação do lar”; 2) “modificação nas relações entre pais e filhos”; 3) “invenção da maternidade”. Essas modificações levaram ao deslocamento da “autoridade patriarcal para a afeição maternal” (GIDDENS, 1993, p.53). Contudo, havia tensões entre o amor romântico e o amor paixão que, para os homens, era vivido através da separação entre o ambiente doméstico e o da sexualidade da amante ou prostituta. O amor romântico, segundo o autor, pressupõe o estabelecimento de um vínculo emocional durável, profundamente ligado à questão da intimidade, sendo incompatível com a luxúria. Implica em uma ligação para além do físico, é “uma comunicação psíquica, um encontro de almas que tem um caráter reparador” (GIDDENS, 1993, p.56). No amor romântico existe a idéia de transformação do outro, uma vez que a mulher (heroína) produz o amor e através deste consegue transformar o outro em sua rispidez e inabilidade para amar, para que, juntos, possam viver uma vida em comum, com afeição. Entretanto, o autor aponta que não apenas as mulheres foram tocadas e.

(34) 32. influenciadas pelos ideais do amor romântico, os homens também, porém de forma diferente das mulheres. Os homens, influenciados por esses ideais, sofreram um isolamento e foram considerados “românticos”. Embora eles tenham sucumbido ao poder feminino, não significa, conforme destaca o autor, que tratem as mulheres de forma igualitária. O autor acredita que o homem torna-se “escravo de uma mulher particular e constrói sua vida em torno dela” (GIDDENS, 1993, p.70). Contudo, de forma geral, aponta para o fato de que há um conflito entre o amor romântico e as regras de sedução do homem. Segundo Giddens (1993), o amor romântico trouxe profundas transformações no casamento e em outros contextos da vida pessoal. Para as mulheres, foi a forma de mantê-las sob controle, associando o amor ao casamento e à maternidade. O autor considera que o amor romântico é o precursor do relacionamento puro, embora estabeleça tensões com ele. É importante que as projeções — responsáveis pela sensação que o indivíduo tem de totalidade com o outro — vividas no amor romântico diminuam, para que o relacionamento puro possa se estabelecer. Por relacionamento puro, o autor entende aquele em que a relação acontece por si e não pela busca de algo eterno. Assim, o relacionamento perdura enquanto ambos se sentirem felizes e satisfeitos. Tanto o amor confluente quanto o relacionamento puro são frutos das transformações ocorridas na intimidade e na sociedade moderna. O relacionamento puro tende a ser a forma de convívio humano na qual cada um permanece na relação por aquilo que pode ganhar nela, assumindo os riscos de sofrer. Segundo Giddens (1993), o relacionamento puro é um “vínculo emocional próximo e continuado com outra pessoa”, que é possível devido à reestruturação ocorrida na intimidade (p.68). O relacionamento puro requer uma história compartilhada na qual uma pessoa deve se doar à outra. Pode ser terminado, de forma mais ou menos à vontade, em qualquer momento, por qualquer um dos parceiros. Sua existência depende do compromisso firmado entre os parceiros e da entrega para a relação, ou seja, em assumir os riscos de um sofrimento futuro caso o relacionamento termine. A confiança não se dá por fatores externos, mas, sim, se baseia na intimidade. “Confiar é ter fé no outro e também na capacidade do laço mútuo para resistir a traumas futuros (...) é.

(35) 33. também apostar na capacidade do indivíduo realmente poder agir com integridade” (GIDDENS, 1993, p. 153). Esse relacionamento associa-se à auto-identidade, pois, ao abrir-se para o outro é necessário também impor limites a esse outro e, para isso, é necessário determinar seus próprios, pessoais, incluindo aqueles no campo da sexualidade. Na mobilidade da auto-identidade, a confiança no outro é aquela permitida, que significa a renúncia de controlar o outro. Além da auto-identidade, o relacionamento puro também está associado à autonomia pessoal, uma vez que proporciona “um ambiente favorável ao projeto reflexivo do eu” (GIDDENS, 1993, p. 154). Assim, vivenciar um relacionamento puro requer confiar no outro, compartilhar de uma história comum e de um vínculo emocional próximo, porém abrindo mão do controle do outro, e assumindo a responsabilidade de que a relação não é um projeto de fidelidade e de eternidade. Para tanto, é importante assumir um projeto reflexivo do eu. Giddens (1993) acredita que, atualmente, com a emancipação da mulher e sua liberação sexual, os ideais de amor romântico tendem a assumir outras formas, caminhando em direção oposta às projeções românticas e seus ideais de eternidade e exclusividade. A essa nova forma de amor que caminha para um sentimento ativo e contingente que rompe com os ideais românticos, embora sofra influências deste, Giddens (1993) dá o nome de amor confluente. À medida que o amor confluente se consolida o foco muda, da busca da pessoa especial para a do relacionamento especial, uma vez que, para o amor confluente, a continuação do relacionamento depende da intimidade e não da identificação projetiva, como no amor romântico. O amor confluente — em oposição ao amor romântico —, pressupõe igualdade na doação e no recebimento emocional, e se desenvolve “até o ponto em que (...) cada parceiro está preparado para manifestar preocupação e necessidades em relação ao outro e está vulnerável a esse outro”. À proporção que aumenta a igualdade de sentimentos, o laço amoroso “aproxima-se muito mais do protótipo de relacionamento puro” (GIDDENS, 1993, p. 73). Neste amor, a ars erótica está presente e a realização do prazer sexual recíproco é o elemento-chave para manutenção, ou não, da relação..

(36) 34. Esta realização do prazer sexual vai além da heterossexualidade ou da exclusividade sexual, que só tem sentido enquanto os parceiros a desejem. O amor confluente, na visão do autor, estaria mais de acordo com a época atual e com o processo de transformação da intimidade. Desenvolve-se como “um ideal em uma sociedade onde quase todos têm a oportunidade de tornarem-se sexualmente realizados” (GIDDENS, 1993, p. 73-74). Os relacionamentos, nesse ideal de amor, se mantêm na medida em que cada pessoa envolvida na relação tenha benefícios que justifiquem a continuidade da mesma. Ao estudar as transformações ocorridas na intimidade, o autor ressalta que, atualmente, o sexo circunscreve-se no domínio público, e a intimidade “implica uma total democratização do domínio interpessoal, de uma maneira plenamente compatível com a democracia na esfera pública” (GIDDENS, 1993, p. 11). Defende que, embora ainda longe de ser completa, há atualmente uma crescente busca por igualdade sexual, na qual ambos os sexos são levados a realizar mudanças em seus comportamentos, em relação a si mesmos e ao outro. Entre essas mudanças, destaca a “revolução sexual” que fez com que jovens homens e mulheres tenham experiências sexuais antes do casamento. A revolução sexual caracterizou-se, segundo o autor, por duas mudanças principalmente, a autonomia sexual feminina e o florescimento da homossexualidade feminina e masculina.. O amor ambivalente, segundo Zygmunt Bauman. Outro autor que se dedica ao estudo da experiência do amor na sociedade atual, que denomina de “modernidade líquida”, é Bauman (2004). Em sua obra “Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos”, concentra-se em explicar a influência dos padrões da sociedade líquida, de consumo, na maneira pelas quais as relações se estabelecem. Defende que a forma como se estabelecem os laços humanos na atualidade refletem diretamente os traços da modernidade líquida, demarcada pelas relações fluidas, breves, com o objetivo do prazer instantâneo, dificultando assim o.

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