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Rotulagem de produtos alimentícios integrais no Brasil e a publicidade enganosa: desrespeito à boa-fé objetiva dos consumidores e do direito à informação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO

PROGRAMA DE GRADUAÇÃO

ELAINE LIMA DA SILVA

ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS

INTEGRAIS NO BRASIL E A PUBLICIDADE

ENGANOSA: DESRESPEITO À BOA-FÉ OBJETIVA DOS

CONSUMIDORES E DO DIREITO À INFORMAÇÃO

Salvador

2018

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ELAINE LIMA DA SILVA

ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS

INTEGRAIS NO BRASIL E A PUBLICIDADE

ENGANOSA: DESRESPEITO À BOA-FÉ OBJETIVA DOS

CONSUMIDORES E DO DIREITO À INFORMAÇÃO

Trabalho de conclusão de curso de graduação em Direito, Faculdade de Direito, Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientadora: Prof. Dra. Joseane Suzart Lopes da Silva.

Salvador

2018

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ELAINE LIMA DA SILVA

ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS INTEGRAIS NO

BRASIL E A PUBLICIDADE ENGANOSA: DESRESPEITO À

BOA-FÉ OBJETIVA DOS CONSUMIDORES E DO DIREITO À

INFORMAÇÃO

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Programa Graduação em Direito, Faculdade de Direito, Universidade Federal da Bahia, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

BANCA EXAMINADORA

Joseane Suzart Lopes da Silva – Orientadora _________________________

Doutora em Direito pela Universidade Federal da Bahia, UFBA, Brasil. Universidade Federal da Bahia – UFBA.

Mônica Neves Aguiar da Silva _____________________________________ Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC, Brasil. Universidade Federal da Bahia – UFBA.

Jonhson Meira Santos ____________________________________________

Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo, USP, Brasil

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RESUMO

A presente monografia busca investigar a rotulagem de produtos alimentícios integrais e a sua clareza na informação que se refere à composição dos alimentos, observando se os fornecedores estão atuando de acordo com as normas do Código de Defesa do Consumidor, pautando suas ações conforme o princípio constitucional da transparência, da boa fé objetiva, princípios éticos e o respeito ao direito básico do consumidor à informação clara e adequada, com a especificação correta das características, composição e qualidade do produto que se propõe a entregar. A produção textual ocorrerá a partir de uma análise bibliográfica acerca do direito à informação e a rotulagem de gêneros alimentícios brasileiros, bem como sobre a questão da publicidade enganosa e a dissimulação de informações essenciais para a escolha realizada pelo consumidor, e a vulnerabilidade daquele frente às práticas da indústria alimentícia.

PALAVRAS-CHAVES: DIREITO À INFORMAÇÃO; VULNERABILIDADE; INDÚSTRIA ALMENTÍCIA; CONSUMIDOR; ROTULAGEM.

(5)

ABSTRACT

This paper intends to investigate the labeling of whole foods and their clarity in the information that refers to the composition of foods, observing if the suppliers are acting in accordance with the norms of the brazillian Code of Consumer Protection, guiding their actions to the constitutional principle of transparency, objective good faith, ethical principles and respect to the basic right of the consumer to clear and adequate information, with the correct characteristics specification and the composition and quality of the product it is proposed to deliver. The textual production will be based on a bibliographical analysis about the right to information and the labeling of brazilian foodstuffs, as well as on the issue of misleading advertising and the hiding of essential information to the choice made by the consumer and his vulnerability in the front of the practices of the food industry.

KEYWORDS: RIGHT TO INFORMATION; VULNERABILITY; FOOD

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Sumário

1 INTRODUÇÃO ... 6

2 NORMAS REFERENTES À ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS INTEGRAIS ... 9

2.1 BREVE ESCORÇO HISTÓRICO ... 10

2.2 DEFINIÇÃO DE ALIMENTO INTEGRAL ... 12

2.3 PARÂMETROS PARA ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS INTEGRAIS ... 13

3 ANÁLISE ECONÔMICA NO ORÇAMENTO DO CONSUMIDOR ... 15

3.1 ESTUDO DE CASO 01 ... 15

3.2 ANÁLISE DE RÓTULOS DE PRODUTOS INTEGRAIS E PRODUTOS 19 COMUNS ... 19

3.3 REGULAMENTAÇÃO LEGAL... 24

3.4 PUBLICIDADE E ÉTICA ... 27

3.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR PUBLICIDADE ENGANOSA... 28

4. A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL DO CONSUMIDOR EM FACE DA VULNERABILIDADE PERANTE O MERCADO ... 30

4.1 A TUTELA CONSTITUCIONAL DO CONSUMIDOR ... 32

4.2 A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR ... 35

4.2.1 A vulnerabilidade técnica, jurídica, fática e a informação ao consumidor ... 38

4.2.2 A potencialização da vulnerabilidade do consumidor frente às práticas de rotulagem ... 40

4.3 OUTROS PRINCÍPIOS NORTEADORES ... 41

5. PUBLICIDADE ENGANOSA NA ROTULAGEM DOS ALIMENTOS INTEGRAIS: VIOLAÇÃO À BOA FÉ-OBJETIVA ... 43

5.1 DISSIMULAÇÃO NO RÓTULO DE ALIMENTOS... 45

5.2 O DIREITO BÁSICO À INFORMAÇÃO ... 46

5.2.1 Amplitude e importância do direito à informação ... 49

5.2.2 O direito à informação e as práticas de comissão e/ou omissão na rotulagem de alimentos integrais ... 51

5.3 O PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA ... 53

5.4 DESDOBRAMENTOS DA BOA-FÉ NAS RELAÇÕES CONSUMERISTAS ... 53

6. CONCLUSÃO ... 57

REFERÊNCIAS ... 60

(7)

Aos meus familiares, em especial à minha irmã Eliane, que como um anjo me acompanhou durante a produção do trabalho.

Aos meus amigos, companhia “Fundamental” em toda jornada, singularmente ao casal Leonardo e Iala pela “co-orientação” e acolhimento.

Aos meus mestres, por toda sapiência, em especial a Joseane Suzart, fonte de inspiração e. orientadora no sentido genuíno do vocábulo

(8)
(9)

1 INTRODUÇÃO

A oferta de gêneros alimentícios integrais no mercado brasileiro, atualmente, é abundante. Tal fenômeno reflete a resposta da indústria à demanda da sociedade que busca, cada vez mais, uma alimentação saudável e equilibrada, seja por opção pessoal ou recomendação médica. No entanto, muitos produtos são fraudulentamente rotulados, por meio de práticas de publicidade enganosa que desrespeitam a boa-fé objetiva e o direito à informação do consumidor.

O presente trabalho monográfico investigará as práticas de rotulagem de produtos integrais da indústria brasileira. Tratar-se–á de um exame doutrinário da Lei 8.078/90 que assegura a proteção da vida, saúde e segurança, a informação adequada e clara e a defesa contra a publicidade enganosa. Nesta senda, será analisada a violação do direito à informação, o desrespeito à boa-fé objetiva, além de cerceamento da liberdade de escolha do consumidor, o que evidencia sua vulnerabilidade frente às práticas recorrentes de enganosidade publicitária na rotulagem.

A hipótese, a ser apresentada, se concentrará na investigação da violação da boa-fé objetiva, do direito básico do consumidor à informação e a utilização de práticas de publicidade enganosa na rotulagem de produtos integrais, capazes de induzir o consumidor a erro, gerando a expansão da margem de lucro em detrimento da perda econômica do indivíduo, e, consequentemente, a ampliação do mercado de produtos fraudulentamente rotulados pelos fornecedores da indústria brasileira, bem como buscar-se-á evidenciar a vulnerabilidade do agente frente a essas práticas.

A relevância social e jurídica justifica-se pela proteção constitucional dada às relações de consumo e sua disparidade entre o preconizado pelo Código de Defesa do Consumidor e as práticas dos fornecedores na indústria alimentícia brasileira. Isto porque, a transgressão do direito à informação, dependendo da situação, poderá desencadear a violação de outros direitos, como por exemplo, o direito à saúde. O CDC busca equilibrar as relações de consumo a partir da proteção da parte mais frágil, uma vez que o agente não detém e desconhece os meios de produção do alimento, restando-lhe apenas a confiança na atuação de acordo com o princípio da boa-fé na disponibilização

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de informações pelo produtor que busca, primordialmente, a obtenção de lucro.

O objetivo geral consistirá em demonstrar a vulnerabilidade do consumidor frente às práticas de rotulagem da indústria alimentícia brasileira e evidenciar o desrespeito ao direito básico à informação e à boa-fé objetiva preconizados no CDC, por meio da publicidade enganosa, especialmente no que se refere à composição dos alimentos integrais. Neste sentido, o CDC será analisado como microssistema, sob o prisma de sê-lo uma lei de ordem pública econômica e de interesse social, capaz de promover a proteção à saúde pública alimentar. Buscar-se-á estudar, à luz dos vetores do Código das Relações de consumo, a aplicação do direito básico à informação na rotulagem de alimentos.

Quanto aos métodos, adotar-se-ao os clássicos, o hermenêutico e o argumentativo, valendo-se da linha crítico-metodológica. Em relação ao objeto, as pesquisa jurídico-exploratória e as jurídico-projetivo serão manejadas. A pesquisa inaugural será efetuada com enfoque em obras e artigos, que apresentarem pertinência temática. Ademais, serão manipuladas as pesquisas qualitativa e quantitativa, bem como os demais instrumentos investigativos, que venham a se revelarem necessários. No âmbito da técnica, será desenvolvida a análise documental indireta por meio da pesquisa bibliográfica e documental. Registra-se, ainda, que se deverá proceder à análise comparativa de preço dos produtos e da lista de ingredientes dos rótulos de gêneros alimentícios ofertados pela indústria brasileira.

No segundo capítulo, serão abordadas as normas referentes à rotulagem de produtos alimentícios integrais apresentando-se um breve escorço histórico acerca da definição de alimento integral, e dos parâmetros para sua rotulagem. O terceiro capítulo consignará a análise econômica no orçamento do consumidor através da verificação comparativa de preço dos pares de produtos integrais e refinados. Serão demonstradas as práticas de publicidade enganosa perpetradas pelos fabricantes através do confronto de rótulos e da lista de ingredientes de gêneros refinados e integrais, bem como versará sobre publicidade e ética e a responsabilidade objetiva por publicidade enganosa.

(11)

No quarto capítulo, será exposto um panorama do Código de Defesa do Consumidor, com ênfase na proteção constitucional e legal do agente em face da vulnerabilidade perante o mercado, explicará a vulnerabilidade técnica, jurídica, fática e a informação ao indivíduo e a potencialização da vulnerabilidade frente às práticas de rotulagem, além de outros princípios norteadores.

O quinto capítulo versará sobre publicidade enganosa na rotulagem dos alimentos integrais e a violação à boa-fé objetiva; discorrerá sobre dissimulação no rótulo, direito básico à informação e sua amplitude, assim como práticas de comissão e/ou omissão na rotulagem de integrais, o princípio da transparência e o desdobramento da boa-fé nas relações consumeristas.

(12)

2 NORMAS REFERENTES À ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS INTEGRAIS

A rotulagem de alimentos, mais do que um instrumento primordial de comunicação entre o produtor e o consumidor, configura-se como uma garantia de efetivação do direito à informação clara, verídica e objetiva sobre as características do item adquirido. A autenticidade dos dados informados é uma preocupação recorrente, uma vez que a introdução de bens, fraudulentamente rotulados e de qualidade inferior às ostentadas, é abundante e refletem negativamente tanto no âmbito econômico quanto na esfera da saúde pública.1

Há concordância unânime de que o consumidor deverá ter acesso a informações precisas sobre o teor nutricional dos itens ofertados no mercado, entretanto a rotulagem costuma gerar muitas controvérsias. A natureza precisa do que deve ser incluído nos rótulos alimentícios é o foco de negociações internacionais na comissão do Codex Alimentarius, organismo conjunto da Organização de Agricultura e Alimentação e da Organização Mundial de Saúde responsável por obter acordo comum sobre demandas fundamentais de segurança alimentar2.

No CDC brasileiro, há determinação obrigatória para o fornecedor informar claramente ao consumidor o tipo e a composição do alimento, bem como as possíveis limitações à sua ingestão, evitando assim prováveis induções a erro que possam comprometer a saúde pública ou a escolha do agente. No Mercosul, houve discussão e revisão sobre rotulagem nutricional, a pedido do Brasil, com o intuito de atender às diretrizes da Política Nacional de

1

BRANQUINHO, Maria Regina et all. Soja geneticamente modificada em alimentos contendo farinha e preparados à base de farinha de trigo. Detecção e adequação à legislação de rotulagem. Braz. J. Food Technol., v. 12, n. 3, p. 241-248, jul./set. 2009

2

VIEIRA, Adriana Carvalho; CORNÉLIO, Adriana Régia. Produtos light e diet: o direito à informação do consumidor. p. 310 e 311. Revista de Direito do Consumidor – RDC 54/2005 – abr.-jun./2005 In: NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Mª de Andrade (Orgs.). Responsabilidade Civil, v. 8 – Direito à informação. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. versa sobre o tema também VIANA, Flávia Batista. Transgênicos: alguns aspectos p. 1311. Revista de Direito Privado – RDPriv. 38/120 –abr.-jun./2009 In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno. Direito do Consumidor: proteção da confiança e práticas comerciais, v.3 – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

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Alimentação e Nutrição. A Anvisa publicou Resoluções e Regulamentos3 sobre rotulagem de alimentos embalados em conformidade com as normas aprovadas no Mercosul e com o ordenamento jurídico pátrio4.

2.1 BREVE ESCORÇO HISTÓRICO

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em ofício acostado aos autos do processo N° 0337522-63.2012.8.19.0001 referente à ação civil pública motivada por denúncia de consumidores, movida pelo promotor Pedro Rubim da Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva e do Consumidor do Ministério Público do Rio de Janeiro para condenar as empresas de panificação Wickbold Nosso Pão Indústrias Alimentícias LTDA e a Bimbo do Brasil de se abster de praticar publicidade enganosa na comercialização de produtos com a informação de “integral”, explica que não existe definição de “alimento integral” nos Regulamentos Técnicos da Anvisa por se tratar de um quesito referente à identidade do comestível e não é objeto de prescrição específica porque sua caraterização em mantimento integral não está relacionada a risco à saúde5.

De fato, não há, no ordenamento brasileiro, legislação específica pertinente à regulação de alimentos integrais. Existem Resoluções da Diretoria Colegiada da Anvisa que estabelecem parâmetros que devem ser respeitados na manipulação e comercialização de gêneros alimentícios. A Resolução-RDC n° 906, de 18 de outubro de 2000, define como pão integral “o produto preparado, obrigatoriamente, com farinha de trigo e farinha integral e/ou fibra de trigo e/ou farelo de trigo” .Porém, por causa da falta de estabelecimento de quantidades mínimas de farinha integral, qualquer porcentagem, mesmo que

3

Resolução RDC Nº 90; Resolução RDC Nº 263; Resolução RDC Nº 259 4

VIEIRA; CORNÉLIO op. cit, p. 311. 5

RIO DE JANEIRO, Tribunal de Justiça. Apelação Cível n.º 0337522-63.2012.8.19.0001. Relator: Des. Carlos Santos de Oliveira. DJ:11/02/2014 JusBrasil, 2014. Disponível em: https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/116637017/apelacao-apl-3375226320128190001-rj-0337522-6320128190001?ref=juris-tabs. Acesso em: 10 jan. 2018

6

BRASIL. Resolução RDC Nº 90, de 27 de dezembro de 2007. Dispõe sobre o registro de dados cadastrais dos produtos fumígenos derivados do tabaco. Órgão Emissor: ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. DOU nº 60, de 28 março de 2008. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2718376/RDC_90_2007_COMP.pdf/fdfaa6d6-7e87-4fca-b972-1d02bf6c6dd5 Acesso: 10 jan. 2018

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mínima, a rotulagem exibirá o ingrediente em sua composição. A indústria alimentícia usa a mesma determinação na produção de biscoitos e salgados7.

A Resolução 263/ 20058, que regulamenta gêneros alimentícios à base de cereais, amidos e farinhas, não estabelece quantias mínimas para a afirmação de que o produto é integral. No entanto, a Resolução-RDC n° 2599, de setembro de 2002, que estabelece o Regulamento sobre Rotulagem de Alimentos Embalados determina que “todos os ingredientes devem constar em ordem decrescente, da respectiva proporção”. Nesta perspectiva, para se denominar integral, é preciso que o alimento contenha a farinha integral como primeiro item na sua composição. Como a Resolução-RDC n° 90 tambémnão estabelece a porcentagem mínima de farinha para que o item seja qualificado como integral, a ordem decrescente de elementos listados no rótulo é a única baliza que o consumidor tem para escolher qual bem de consumo atende às suas necessidades nutricionais10.

O projeto de lei 5081/201311, que dispõe sobre normas de comercialização de pão integral, é da autoria do deputado Onofre Santos Agostini (PSDC/SC) e estabelece o percentual de mais de 51% de grãos integrais para o alimento ser considerado de tal espécie. Após análise da Comissão de Desenvolvimento Econômico e Comércio da Câmara dos Deputados, obteve parecer favorável e recebeu um substitutivo, com acréscimos sugeridos pela ANVISA. A ampliação dos parâmetros a outros produtos integrais, como bolos, biscoitos, macarrão e até às própria farinhas e

7

GALLAN, Carin Weirich; THEODORO, Heloísa; SILVA, Vadete Carla Pissaia da. Avaliação das rotulagens e informações nutricionais dos pães integrais: fibras, sódio e adequação com a legislação vigente p. 987. In: Demetria: Alimentação, Nutrição e Saúde, 2014. Disponível em: file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-

%20referências/21.adequação%20integral%20e%20legislação%20em%20vigor-pag%20989.pdf Acesso em: 10 fev.2018 8

BRASIL. Resolução RDC Nº 263, de 22 de setembro de 2005. Aprova o regulamento técnico para produtos cereais, amidos, farinhas e farelos. Órgão Emissor: ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. DOU nº 184, de 22 de setembro de 2005. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/RDC_263_2005.pdf/d6f557da-7c1a-4bc1-bb84-fddf9cb846c3 Acesso em: 10 jan.2018

9

BRASIL. Resolução RDC Nº 259, de 20 de setembro de 2005. Órgão Emissor: ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. DOU nº 184, de 23 de setembro de 2005. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/RDC_259_2002.pdf/e40c2ecb-6be6-4a3d-83ad-f3cf7c332ae2 . Acesso: 10 jan. 2018

10

GALLAN, op. cit. p. 987 11

SANTA CATARINA, Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 5081/2013. Dispõe sobre normas de comercialização de pão integral. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1061396&filename=P L+5081/2013. Acesso em: 10 jan 2018.

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uma punição por descumprimento, estão entre as adições sugeridas pela reguladora. No momento, o projeto encontra-se na Comissão de Defesa do Consumidor e a expectativa é que seja votado, ainda este ano, pelo Senado Federal, esperando que seja aprovado, já que representa uma grande proteção à saúde pública e respeito às necessidades nutricionais dos agentes econômicos12.

2.2 DEFINIÇÃO DE ALIMENTO INTEGRAL

Para ser considerado integral, o alimento deve ter composição similar à de quando é encontrado na natureza; desta forma, não pode apresentar redução em seu teor nutricional13. Em 1999, a American Association of Cereal Chemists International (AACCI) cunhou a seguinte definição para os grãos integrais “consistem da cariopse intacta, quebrada, moída ou em flocos, cujos componentes botânicos principais encontram-se relativamente nas mesmas proporções que se encontrariam na cariopse intacta”. Assim, são aqueles que não passaram por processos de beneficiamento ou refinamento, mantendo, em sua estrutra, o germe e o farelo intactos14.

12

CASEMIRO, Luciana. Pães terão que dizer o quanto são integrais. Nutrição na mídia, 12 fev. 2014. Disponível em: http://www.cfn.org.br/index.php/legacy-1830/ Acesso em: 10 jan. 2018 Versam sobre o tema também: ZORZANELLO, Bruna Muniz; Wenschenfelder, Simone. Pães produzidos em escala industrial e comercializados com a denominação de “integral”: análise de rotulagem e identificação dos ingredientes integrais e aditivos. C&D-Revista Eletrônica da FAINOR, Vitória da Conquista, v.10, n.3, p. 407-423, set./dez. 2017 Disponível em: file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-%20referências/2.%20pão%20integral.pdf Acesso em: 10 jan 2018

13

ANTON, Alex Amorin; FRANCISCO, Alicia de; HAAS, Patrícia. Análise Físico-química de pães da cidade de Florianópolis e a situação dos alimentos integrais no Brasil. Alim. Nutr, Araraquara v.17, n.4, p.381-386 out./dez. 2006. Disponível em:

file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-%20referências/1.pão%20integral%20no%20brasil.pdf. Acesso em 10 jan. 2018 Versam sobre o tema: NEGRINI, Juliana de Almeida Egas. Impacto do consumo de pães integrais na resposta glicêmica de voluntários saudáveis. Tese de Mestrado. Faculdade de Ciências Farmacêuticas - Universidade de São Paulo. São Paulo, p. 24, 2015. Disponível em:

file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-%20referências/9.%20CONCEITOintegral%20USAR.pdf Acesso em: 10 fev. 2018 14

SARTORI, Aderley Serenita; et all. Possíveis mecanismos de ação dos grãos integrais na prevenção do câncer colorretal. P. 113. Estud. Biol., v. 28, n. 65, p. 113-119, out./dez. 2006 Disponível em: file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-%20referências/5.CONCEITO%20DE%20INTEGRAL.pdf Acesso: 10 jan 2018

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O glossário temático do Ministério da Saúde15 define o alimento integral como aquele não processado, ou pouco processado, e que mantém, em condições impecáveis, seu conteúdo de fibras e nutrientes16. Quando se trata de cereais, no decorrer do procedimento de industrialização, é comum a perda de vitaminas e fibras alimentares presentes em abundância no farelo, germe e casca dos grãos, descartados geralmente. Na farinha integral, e nos alimentos produzidos a partir dela, a constituição é de grãos em quase sua totalidade, com o germe, o farelo e o endosperma preservados, enquanto que na farinha refinada as partículas são tratadas e a maioria das vitaminas do complexo B, determinados minerais e fibras alimentares são excluídos17.

2.3 PARÂMETROS PARA ROTULAGEM DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS INTEGRAIS

Os produtos à base de cereais são regulamentados pela Resolução RDC n° 263/200518 que se refere ao “Regulamento técnico para produtos de cereais, amidos, farinhas e farelos”. Em 2004, essa RDC revogou a norma anterior, e assim como as outras revisões nos regulamentos técnicos sobre padrões de identidade e qualidade ocorridas, foi priorizada a manutenção apenas dos requisitos sanitários. Havia a inclusão, na Agenda Regulatória da Anvisa,19 do biênio 2015-2016, de proposta de revisão da RDC n° 269/200520

15

Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Secretaria de Atenção à Saúde. Glossário temático: alimentação e nutrição. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2008. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ publicacoes/glossario_alimenta.pdf Acesso em: 10 jan. 2018 16

LEMOS, André Luís Alves de; LEMOS JUNIOR, Hernani Pinto de. Alimentos Integrais. Diagnóstico e Tratamento. 2013;18(2):72-4 Disponível em:

file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-%20referências/20.%20definição%20alimento%20integral.pdf Acesso em: 10 jan. 2018 17

ANTON, op.cit., p. 381, versam sobre o tema: NEGRINI, Juliana de Almeida Egas. Impacto do consumo de pães integrais na resposta glicêmica de voluntários saudáveis. Tese de Mestrado. Faculdade de Ciências Farmacêuticas - Universidade de São Paulo. São Paulo, p. 24, 2015. Disponível em: file:///C:/Users/ellai/Documents/CAPÍTULO%20FINAL%20-%20referências/9.%20CONCEITOintegral%20USAR.pdf Acesso em: 10 fev. 2018

18

BRASIL. Resolução RDC Nº 263, de 22 de setembro de 2005. Aprova o regulamento técnico para produtos cereais, amidos, farinhas e farelos. Órgão Emissor: ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. DOU nº 184, de 22 de setembro de 2005. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/2568070/RDC_263_2005.pdf/d6f557da-7c1a-4bc1-bb84-fddf9cb846c3 Acesso em: 10 jan.2018

19

A Agenda Regulatória é um instrumento de gestão, que seleciona quais temas são prioritários e merecem ser pauta de regulamentação num determinado período, promovendo a transparência e a previsibilidade tanto para os setores envolvidos quanto para os cidadãos. No entanto, não há referência específica a alimentos integrais na lista com 15 itens sobre

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com a intenção de estabelecer critérios mínimos para que os alimentos possam usar a declaração “integral”.Em seguida, a proposta de iniciativa seria submetida à aprovação pela Diretoria Colegiada, em conformidade com os trâmites das Boas Práticas Regulatórias21.

A assessoria de impressa da ANVISA declara que, embora não existam critérios na legislação sanitária para produtos “integrais”, há a possibilidade de informação nutricional complementar na rotulagem e em materiais publicitários referentes à fibras. Tais informações complementares são voluntárias e devem atender aos requisitos estabelecidos na RDC n°54/2012 sobre o Regulamento Técnico sobre Informação Nutricional Complementar22.

alimentos da Agenda Regulatória (AR) para os próximos anos (quadriênio 2017-2020). ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Agenda Regulatória – Ciclo Quadrienal 2013-2016

– Biênio 2015-2016. Disponível em:

http://portal.anvisa.gov.br/documents/33880/460876/Lista+de+Temas+da+Agenda+regulatória+ 2015-2016/6b9f3a07-1be3-47df-bca2-9fc969849a23. Acesso em 10 jan. 2018

20

BRASIL. Resolução RDC Nº 269, de 22 de setembro de 2005. Aprova o regulamento técnico sobra a ingestão diária recomendada (IDR) de proteína, vitamina e sais minerais. Órgão Emissor: ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. DOU 22 de setembro 2005. Disponível em: http://coffito.gov.br/nsite/wp-content/uploads/2016/08/resoluo-rdc-n-269-2005-ingesto-diria-recomendada-idr-de-protenas-vitaminas-e-minerais.pdf Acesso em: 10 jan.2018 21

ANVISA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Produtos Diet e Light. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br. Acesso em: 10 jan. 2018

22

BRASIL. Resolução RDC Nº 54, de 12 de novembro de 2012. Dispõe sobre o Regulamento Técnico sobre Informação Nutricional Complementar. Órgão Emissor: ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/%2033880/2568070/rdc0054_12_11_2012.pdf/c5ac23fd-974e-4f2c-9fbc-48f7e0a31864 Acesso em: 10 jan. 2018

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3 ANÁLISE ECONÔMICA NO ORÇAMENTO DO CONSUMIDOR

A enganosidade publicitária, perpetrada nos rótulos de gêneros alimentícios integrais da indústria brasileira, gera um lucro ilícito que onera injustamente o orçamento do consumidor. A função precípua da publicidade na embalagem dos alimentos é informar as características do produto ofertado, no entanto, o desvirtuamento desta atribuição gera perda econômica para o indíviduo que se torna refém das técnicas de marketing23, utilizadas nesta área para ludibriar o indivíduo, já que não entregam o bem apresentado nos rótulos.

3.1 ESTUDO DE CASO 01

Foram adquiridos, em Salvador, capital da Bahia, vinte quatro produtos alimentícios fabricados pela indústria brasileira, no dia 13 de janeiro e 19 de fevereiro de 2018, em três supermercados, localizados nos bairros de Itapuã e São Cristóvão, conforme notas fiscais apresentadas nas figura 1, figura 2 e imagem anexada no final do trabalho. Nesta amostra, foram selecionados vinte produtos, sendo dez comercializados como integrais e dez refinados, para realizar a análise comparativa de preços e o cotejo dos ingredientes utilizados na composição de cada um deles. Objetiva-se aferir o impacto econômico no orçamento do consumidor e a adequação da rotulagem de alimentos integrais às normas do arcabouço legislativo brasileiro.

.

23

seria qualquer modalidade de informação ou oferta associada à circulação de bens de consumo , ou seja, produtos e serviços. In BENJAMIN, Antonio Herman V. A repressão penal aos desvios de “marketing”. – p. 524. In: NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade (Orgs.). Responsabilidade Civil, v. 8 – Direito à informação. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

(19)
(20)

A análise comparativa de preços e dos ingredientes foi realizada entre pares comercializados pela mesmo Fabricante e adquiridos no mesmo estabelecimento comercial (exceto o biscoito salgado “Águia” que foi comprado em supermercado diferente), sendo um produto integral e o outro refinado, ambos com o mesmo peso. Desta forma, selecionou-se dois pacotes de biscoito salgado da “Águia”, dois biscoitos Cream Cracker “Vitarella” , dois Torradas “Bauducco”, dois salgadinhos Fandangos da “Elma Chips”, dois biscoitos salgados Pit Stop “Marilan”, dois embalagens de Pão de Hot Dog “Limiar”, dois pacotes de Pão de forma “Limiar”, dois Cookies “Marilan”, dois biscoitos maizena “Marilan” e dois biscoitos salgados recheados “Club Social”.

A tabela comparativa apresentada na figura 3, evidencia uma diferença de preço entre produtos refinados e integrais que varia entre 5.10% a quase quarenta por cento . Dos dez pares confrontados, seis apresentaram diferença de preço, todos os integrais são mais caros. três pares são comercializados pelo mesmo valor, são eles: Torradas “Bauducco”, o Cookies “Marilan” e o Biscoito salgado recheado “Club Social”. Apenas o Biscoito Salt Cracker integral “Águia” ostentou um valor menor do que o refinado, no entanto, a compra foi realizada em mercados diferentes, o que pode ter ocasionado a dissonância com os demais resultados.

Produtos Refinado Integral Diferença Porcentagem

1.Biscoito salgado "Águia" R$5,38 R$4,88 -R$0,50 -10,245901 2. Biscoito Cr. Cracker "Vitarella" R$2,58 R$4,28 R$1,70 39,72

3.Torrada "Bauducco" R$3,68 R$3,68 R$0,00 0,00

4. Salgadinho "Elma Chips" R$2,48 R$2,84 R$0,36 12,68 5. Biscoito Pit Stop "Marilan" R$2,98 R$3,14 R$0,16 5,10

6. Pão hot dog "Limiar" R$3,98 R$4,98 R$1,00 20,08

7. Pão de Forma "Limiar" R$3,84 R$5,24 R$1,40 26,72

8. Cookies "Marilan" R$2,54 R$2,54 R$0,00 0,00

9. Biscoito recheado "Club Social" R$3,64 R$3,64 R$0,00 0,00 10. Biscoito maizena "Marilan" R$4,04 R$4,68 R$0,64 13,68

Total R$35,14 R$39,90 4,76 11,93

Figura 3. Tabela Comparativa de Preço

No que se refere à comparação dos elementos utilizados na composição dos alimentos, o cotejo das embalagens e das listas de

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ingredientes comprova que nenhum dos dez produtos, que ostentam no rótulo a identificação integral, apresenta a farinha de trigo intergral como o primeiro ingrediente da sua lista, conforme determina a Resolução RDC n° 259/2012 da Anvisa, segundo a qual “todos os ingredientes devem constar em ordem decrescente, da respectiva proporção”; ou seja, não são, de fato alimentos íntegros, apenas possuem em sua receita a farinha integral em quantidades insignificantes que não justificam a cobrança de valor diferenciado e nem sequer a rotulagem como integral

Embora haja omissão nas resoluções da Anvisa n° 263/ 2005 e n° 90/ 2000, que regulamentam gêneros alimentícios à base de cereais, amidos e farinhas, quanto ao estabelecimento de quantia mínima para que o produto seja considerado integral, o CDC estabelece, no inciso III, do artigo 6°, a determinação legal para que os fabricantes informem “com especificação correta de quantidade” a composição dos produtos, sendo que tal preceito é desrespeitado pelos fornecedores dos alimentos. Em nenhuma lista de ingredientes dos itens confrontados, há a indicação da porcentagem de cada ingrediente utilizado na receita, ou seja, a informação adequada e clara não é prestada ao consumidor.

Esta conduta representa um ilícito publicitário que lesa o agente, uma vez que os fabricantes desrespeitam a boa-fé objetiva e o direito à informação, o que só evidencia a vulnerabilidade do consumidor frente às práticas enganosas do fornecedor que conhece e detém a cadeia produtiva do alimento. Mais do que isso, representa uma ameaça à saúde pública e um desrespeito à autonomia da vontade e à liberdade de escolha do sujeito. Ademais, fere a dignidade da pessoa humana, posto que tanto a alimentação24 quanto a nutrição25 estão intrinsecamente ligadas à vida digna do indivíduo, não apenas em virtude da escolha do alimento e tipo de alimentação, mas sim considerando a intangibilidade da vida, saúde e segurança, institutos jurídicos protegidos nos dispositivos legislativos nacional e internacional26.

24

ato voluntário de ingestão de alimentos.

25

aproveitamento corporal humano por processos fisiológicos dos compostos químicos contidos nos alimentos ingeridos

26

MARTINS. Fernando Rodrigues. Confiança alimentar e nutricional: cuidar e legitimar. 12 abr 2017. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-abr-12/garantias-consumo-confianca-alimentar-nutricional-cuidar-legitimar. Acesso em 10 jan 2018.

(22)

O artigo 6°, da Constituição Federal de 1988, prescreve o direito humano à alimentação adequada como um direito fundamental social, contíguo ao mínimo existencial. Aquele amolda-se como direito básico do consumidor, adstrito do dever de qualidade e segurança e compõe o sistema estratégico de segurança formado pelos princípios da universalidade, respeito à dignidade, transparência e participação social da Lei Federal 11.346/062728.

3.2 ANÁLISE DE RÓTULOS DE PRODUTOS INTEGRAIS E PRODUTOS COMUNS

Foram analisados vinte e quatro rótulos de produtos integrais e refinados(comuns), (todos seguem anexados no final do trabalho). De maneira geral, as embalagens dos integrais apresentam um aspecto bem diferente dos refinados. Destacam-se nas prateleiras, pela aparência mais suave, tons terrosos ou esverdeados que remetem à natureza, realçando a característica íntegra do alimento, conforme constata-se no cotejo entre os rótulos dos Cookies da “Marilan” e dos salgadinhos da “Elma Chips”, apresentados nas figuras 3 e 4. A palavra “Integral” é apresenta em caracteres maiores, cores claras ou verde, sobressaindo-se em relação a outros dados do alimento. O rótulo do pão de “hot dog” “Limiar” ilustra este tratamento dado ao termo; observa-se na figura 5 que o nome do item é diminuído para destacar o vocábulo, o que não ocorre na outra mercadoria. A mesma estratégia publicitária de realce ao termo e distinção entre os itens pode ser observada entre os diversos fabricantes de biscoitos e pães, conforme evidenciado nas figuras 6 e 7.

27

A lei nº 11.346, DE 15 DE SETEMBRO DE 2006 cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação adequada e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11346.htm. Acesso em 10/01/2018.

28

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Figura 4. Cookies “Marilan”

(24)

Figura 6. Pão para “hotdog” “Limiar”

(25)

Figura 8. Biscoito salgado “Pit Stop”

A fraude na rotulagem de alimentos integrais torna-se transparente quando se verifica a lista de ingredientes utilizados na receita de cada um. O ilícito publicitário ganha contornos mais graves, uma vez que o consumidor é lesado ao adquirir determinados produtos que são vendidos com o valor até 40% maior que os refinados. Além da diferença no preço, o gênero alimentício adquirido não corresponde às características de um alimento integral, já que descumpre a Resolução-RDC n° 2598, de setembro de 2002, que estabelece o Regulamento sobre Rotulagem de Alimentos Embalados e determina que “todos os ingredientes devem constar em ordem decrescente, da respectiva proporção”.

Nenhuma lista de ingredientes dos doze produtos analisados traz a farinha de trigo, ou qualquer outro item integral, como primeiro elemento, ou seja, em nenhuma receita houve a utilização de componente integral em maior proporção. Em todas as embalagens, o primeiro ingrediente é a farinha de trigo enriquecida de ferro e ácido fólico, exceto na de salgadinho “Elma Chips” e na de cookies “Marilan”, que apresentam a farinha de milho enriquecida de ferro e ácido fólico e flocos de aveia, respectivamente. A farinha de trigo integral aparece como segunda, terceira, quarta e até sétima, substância utilizada na

(26)

composição. Logo, nenhum dos alimentos são, de fato, integrais, apenas possuem matéria íntegra em sua constituição, em quantidades insignificantes, incapazes de lhes conferir o atributo de integral, conforme ilustra-se no rótulo do Cookies “Bauducco”, no qual a farinha integral aparece em 7° lugar, e do biscoito salgado “Pilar”, que apresenta o farelo de trigo em 4°, conforme observa-se nas figuras 8 e 9.

Figura 8. Cookies integral “Bauducco”

(27)

3.3 REGULAMENTAÇÃO LEGAL

O direito à informação do consumidor opõe-se ao dever de comunicar do fornecedor, encargo esse que é capaz de instituir uma obrigação anexa, ou instrumental e uma principal. Enquanto incumbência anexa ou instrumental, a informação transcorre diretamente do princípio da boa-fé objetiva, que se exprime na cooperação, lealdade, transparência, correção, probidade e na confiança que devem subsistir nas relações de consumo, afirma Sérgio Cavalieri Filho. A mensagem recebida pelo agente deve preencher três requisitos principais para que o dever de informar seja cumprido. São eles a adequação- o canal de comunicação precisam ser compatível com os riscos inerentes aos produtos ou serviços e seu destinatário; suficiência – os dados devem ser absolutos e totais; veracidade- elementos reais e verdadeiros. O principal escopo é dotar o cidadão de referências objetivas da realidade que lhe permitam conhecer o produto e exercer escolhas conscientes29.

É possivel constatar, na análise de vinte e quatro rótulos de produtos alimentícios da indústria brasileira, que os fornecedores desrespeitam a boa-fé objetiva dos consumidores e o seu direito à informação. Utilizam–se, ostensivamente, da palavra integral e outras correlatas, como leve, fonte de fibras, cereais integrais, por exemplo, para atrair a clientela que busca uma alimentação mais saudável seja por orientação médica ou escolha de vida. Tais itens são mais caros. Entretanto, ao comparar a tabela nutricional, observa-se que a composição é idêntica ao comestível comum; não há índices precisos da porcentagem do componente integral utilizado na fabricação do alimento e, quando há o componente farinha integral, aquela não é usada em maior quantidade na receita. Assim, resta claro o desrespeito ao inciso III, do artigo 6°, do CDC, no que se refere à especificação da quantidade correta utilizada na composição do alimento.

O dever de informar atribuído ao fornecedor pretende compensar o que Cláudia Lima Marques denomina de “vulnerabilidade informacional”. Assim, o consumidor deve ser informado sem erros ou margens a dúvidas sobre a

29 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de direito do consumidor. – 3ed. – São Paulo: Atlas, 2011.

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composição do produto alimentício. A liberdade de escolha assegura ao agente a faculdade de sustentar decisões de acordo com sua verdadeira vontade. A veracidade e clareza dos dados sobre o bem é imperiosa para a autonomia do exercício desse direito, visto que a omissão ou manipulação de determinados elementos essenciais tem grande influência no processo decisório, pois o comprador opta por adquirir um gênero alimentício em decorrência de ideia errônea, formada pela insuficiência ou manipulação das informações, que, se fossem claras, verídicas e objetivas, acarretaria em outra decisão30.

A manipulação e a omissão de informações, praticadas pelas indústria alimentícia na rotulagem de produtos integrais, através de práticas publicitárias enganosas, contribuem para prejudicar bens jurídicos, como o patrimônio do consumidor e o direito à escolha. Outra faceta do dever de informar diz respeito à garantia da segurança e da saúde da população, uma vez que uma falha neste dever pode afetar o bem- estar do cidadão, tendo em vista que o consumo do alimento integral, muitas vezes, faz parte da dieta por recomendação médica. Pode ser exigido como forma de controle ou cura de determinadas doenças que acometem o indivíduo, como a obesidade ou colesterol alto, por exemplo, que suscitam uma alimentação adequada e restrita e determinados tipos específicos de comestíveis31.

A ausência de regulamentação específica da ANVISA para a fabricação de alimentos integrais, em especial, a quantidade mínima de farinha integral que deve compor os produtos, não legitima a conduta de fabricantes que trazem, em sua receita, maior quantidade de farinha de trigo tradicional ou enriquecida de ferro e ácido fólico em comparação à integral. Trata-se do dever de prestar informações adequadas ao consumidor, preceito garantido no Código de Defesa do Consumidor, artigos 6º, III, 31 e 37, pois vigora, na seara consumerista, o princípio da “transparência máxima”, do qual é consectário lógico o dever de informação, neste sentido, a disponibilização no mercado de gêneros alimentícios, que se regem sob a égide do Direito Consumerista,

30

AZEVEDO, Marta Britto de. O Consumidor consciente: liberdade de escolha e segurança. – p. 224 - 225. In: NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade (Orgs.). Responsabilidade Civil, v. 8 – Direito à informação. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

31

(29)

necessita observar os princípios da transparência,da cooperação e da boa-fé objetiva32.

A boa-fé impõe, ainda, que novos deveres de conduta sejam observados, cujos teores conferem eticidade à relação e são aptos a possibilitar o adimplemento contratual. Ao fornecedor, cabe a obrigação de cientificar, de forma adequada, suficiente e veraz, todos os elementos que constituem o produto, inclusive aqueles dados não delineados, taxativamente em lei, como é o caso da definição da porcentagem de farinha integral. Caso o dado seja importante para a decisão do consumidor, o produtor, em atenção à honestidade, à lealdade e outros valores corolários da boa-fé, deve disponibilizá-lo, não sendo permitido omitir tal informação, com o fim de efetivar a avença. O dever de não ocultar, ou omitir elementos, cuja comunicação seja importante, embora não haja obrigação de divulgá-los, torna-se um dever do agente econômico erigido pelo princípio da transparência.335

Apenas o acesso ilimitado à informação permite o desempenho do consumo esclarecido com o fomento da liberdade de escolha assegurado pelo artigo 6°, II do Código de Defesa do Consumidor e a redução das frustações de expectativas, já que o agente, que conhece bem as características do item negociado é capaz de optar por aquele , dentre uma infinidade de produtos semelhantes, que detém a aptidão de viabilizar os resultados aspirados. São as necessidades nutricionais dos cidadãos que norteiam sua atuação no mercado, aquelas são projetadas nas prateleiras e perante a compreensão dos dados inseridos nos rótulos, realiza-se um método de predileção ou rejeição de produtos decorrente do atendimento ou não de suas carências nutrícias34.

32

foi neste sentido o voto do Desembargador Carlos Santos de Oliveira na apelação cívil número 0337522-63.2012.8.19.0001 da vigésima segunda vara cível. Folhas 6 e 7.

33

SILVA, Érica Fraga Cunha. Testes em animais não humanos e o consumo ético: uma análise da ampliação do direito do consumidor à informação p. 206 - 207. In: SOUZA, Bruno Moitinho Andrade de; SILVA, Joseane Suzart Lopes de; TEIXEIRA, Rafael Carneiro d’Ávila (Orgs.). O direito do consumidor sob uma ótica filosófica, sociológica e econômica: o intercâmbio entre as ciências humanas. Salvador: Paginae, 2016.

34

(30)

3.4 PUBLICIDADE E ÉTICA

As técnicas publicitárias, utilizadas na comercialização de gêneros alimentícios integrais, são em regra, enganosas, o que gera um sério questionamento ético. Há o reconhecimento, pelos próprios publicitários, da necessidade de autorregular o exercício da atividade criando códigos de ética profissional. Nessa perspectiva, o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária nasceu de uma ameaça de censura prévia à propaganda no final dos anos 70. Posteriormente, inspirado no modelo inglês, fundou-se, em 1978, o (Conar)35 Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, uma ONG encarregada da “autorregulamentação sintetizada num Código, que teria a função de zelar pela liberdade de expressão comercial e defender os interesses das partes envolvidas no mercado publicitário, inclusive os do consumidor”36

. O Conselho de Ética atende a denúncias de consumidores, autoridades e de seus associados. Dentreos preceitos básicos, que definem a ética publicitária, está a obrigação de todo anúncio ser honesto, verdadeiro e respeitar as leis da nação.

A publicidade busca “entorpecer ou mesmo suprimir a vontade real, que é o elemento real da autonomia privada em vista de seu indisfarçavel intento persuasivo”, afirma Adalberto Pasqualotto em sua obra “Os efeitos obrigacionais da publicidade no Código de Defesa do Consumidor”. Neste jogo de sedução, ela utiliza-se de recursos plásticos, cênicos, atrativos capazes de enredar o consumidor e interferir em sua liberdade de escolha e aquisição do produto adequado às suas necessidades nutricionais. A repercussão das técnicas publicitárias no direito são importantes, por conseguinte, é preciso controlá-la37.

Na publicidade de gêneros alimentícios integrais, é perceptível a superposição da função persuasiva daquela sobre a sua finalidade

35

O Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) é uma instituição criada por entidades ligadas à atividade publicitária (agências, anunciantes e veículos de comunicação) com o objetivo de regulamentar o setor, criando regras para a realização e veiculação de publicidade. A atuação do Conar é pautada por um Código de Auto-Regulamentação, elaborado pelo próprio conselho, que contém todas as regras que devem ser seguidas pelas agências publicitárias.

https://idec.org.br/consultas/dicas-e-direitos/o-que-e-o-conar. Acesso em 09 fev 2018.

36

http://www.conar.org.br/. Acesso em 09 fev 2018. 37

PASQUALOTTO, Adalberto. Os efeitos obrigacionais da publicidade no código de defesa do consumidor. – p. 35. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997

(31)

informacional, os dois propósitos publicitários não convivem de maneira equilibrada, proporcional e harmônica na rotulagem. Diversas vezes, as informações reais são preteridas em detrimento da forma, moldura ou maneira como o produto é apresentado. Enquanto o consumidor, vulnerável em sua essência, nem sequer dispõe de dados reais ou completos do que lhe é disponibilizado, posto que a preocupação do fornecedor consiste, essencialmente, em estimular a aquisição do bem ofertado. As práticas enganosas ocasionam uma hipertrofia da vulnerabilidade do consumidor. Com o intuito de auferir maiores quantias monetárias, a informação, muitas vezes, não é veiculada da forma mais límpida ou compreensível, isso porque a majoração da margem de lucro torna-se o principal objetivo publicitário38.

A principal estratégia da publicidade enganosa é carrear o consumidor a uma visão errônea com relação a um aspecto essencial do produto; no caso específico, a qualidade de integral do alimento. Note-se que não é qualquer detalhe, mas sim, um aspecto crucial do bem adquirido. Desta maneira, a tomada de decisão e o julgamento do agente são influenciados por algo que não condiz com a realidade. A informação publicitária deve prezar pela ética e fidedignidade dos dados, abstendo-se da utilização de referências falsas destinadas à indução do cidadão a uma aquisição equivocada39.

3.5 RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR PUBLICIDADE ENGANOSA

A publicidade ilícita, ou a caracterização de infração menos grave ao deveres decorrentes da boa-fé, gera ao fornecedor a obrigação de indenizar os danos morais ou materiais, ainda que inexista prejuízo direto. Essa responsabilidade é objetiva, tendo em vista que a análise não depende exclusivamente de sua conduta, mas interessa constatar se encontra-se presente algum tipo de proibição cominado em lei. A indução em erro, que caracteriza a enganosidade, é aferida precisamente no consumidor iludido

38

SANTOS, Dandara do Lago Guimarães. Publicidade de produtos e serviços e o princípio da vinculação contratual: o necessário respeito a boa-fé objetiva dos consumidores – p. 167 – 220. In: SILVA, Joseane Suzart Lopes da; MELO, Ravena Seida Tavares de (Orgs.). Publicidades dos bens de consumo – Salvador: Paginae, 2015.

39

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pela mensagem. Não se leva em conta a intenção de enganar, mas sim o resultado da ação, o que justifica a responsabilização40.

Na elaboração do CDC, foi dada à publicidade a relevância que, de fato, tem na dinâmica do mercado. Assim, o legislador inovou, uma vez que, no sistema anterior, praticamente não havia controle legítimo da publicidade enganosa. A enganosidade publicitária pode ser analisada sob três ângulos díspares e interligados: o civil (caráter reparatório), o administrativo (caráter repressivo) e o penal (eminentemente repressivo). O juízo de enganosidade é apartado da existência de dano real sofrido por consumidores individualizados, o crime é de perigo abstrato conforme o conceito estatuído pelo artigo 37 da Lei 8.078 de 1990 que orienta o tipo penal do artigo 6741.

É incontroverso que alguns fornecedores deformam abastadamente a verdade ao ponto que se faz necessário o combate voraz ao abuso. Muitos, na ânsia de ressaltar as características dos alimentos buscados pela população, acabam distorcendo a realidade. Tal conduta enganosa mostra-se muito lucrativa para os fabricantes; no entanto, é um lucro ilícito, obtido às custas do desrespeito à boa-fé objetiva e o direito à infomação do consumidor42.

40

Ibidem p. 170 e 171 41

BENJAMIN, Antonio Herman. A repressão penal aos desvios de “marketing”. – p. 523 e 524. In: NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade (Orgs.). Responsabilidade Civil, v. 8 – Direito à informação. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. Acerca do tema consultar COELHO, Fábio Ulhoa. A publicidade enganosa no código de defesa do consumidor. – p. 556. In: NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade (Orgs.). Responsabilidade Civil, v. 8 – Direito à informação. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

42

(33)

4. A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL E LEGAL DO CONSUMIDOR EM FACE DA VULNERABILIDADE PERANTE O MERCADO

A edição de normas específicas de proteção ao consumidor surge a partir da constatação da vulnerabilidade deste sujeito no mercado, especialmente a partir da década de 70, tal reconhecimento ensejou a Resolução 39/42 da Organização das Nações Unidas – ONU, editada em 1985, e reflete a existência de certo consenso na necessidade de proteção ao destes indivíduos pelo Estado43.

A aludida Resolução recomenda que os governos atingissem determinados propósitos, como a preservação da saúde e segurança, fomento e defesa dos interesses econômicos do consumidor, fornecimento de informações adequadas para possibilitar escolhas acertadas, entre outras determinações necessárias à proteção das relações firmadas com os fornecedores, através do desenvolvimento e reforço de uma política firme de proteção.44

O reconhecimento do direito e da vulnerabilidade do consumidor reflete as transformações, históricas que resignificaram as relações contratuais vivenciadas pelas partes e as sensíveis transformações sofridas pela força e o protagonismo do princípio do pacta sunt servandia no final do século XIX e no decorrer do século XX. O desenvolvimento da doutrina do abuso do direito, na França, com o reconhecimento de limites ao exercício das garantias da propriedade, e gradativamente o asseguramento em diversos ordenamentos jurídicos europeus, de uma finalidade social às liberdades subjetivas, atuando simultaneamente como limite da vontade individual no exercício destas prerrogativas, são exemplos destas alterações45.

A I Guerra Mundial gerou consequências que ocasionaram a impossibilidade do cumprimento das prestações assumidadas pelas partes nos

43

ZABAN, Breno. BESSA, Leonardo Roscoe. Vulnerabilidade do Consumidor – Estudo empírico sobre a capacidade de tomada de decisões financeiras por interessados na compra de imóveis. Revista de Direito do Consumidor. Vol. 101 ano 24 p. 214. São Paulo: Ed. RT, set - out 2015.

44

Idem, p. 214

45 MIRAGEM, Bruno. Curso de Direito do Consumidor. – 5 ed. ver., atual. Ed. ampl. – São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2014.

(34)

contratos que se fizeram sentir em todo continente europeu. Assim, surgiu a

teoria da imprevisão, como resposta ao inadimplemento das prestações,

sobretudo por circunstâncias supervenientes e posteriores à celebração do acordo, designada a corrigir o desequilíbrio das prestações em contrato, perante a alteração das circunstâncias, fundamentando, a partir do ressurgimento da cláusula rebus sic stantibus46 para reestabelecer o equilíbrio, através da revisão do intrumento contratual. Ademais, as crises econômicas em fins da década de 1910 e durante grande parte de 1920, a quebra da Bolsa de valores em New York, em 1929, fizeram o mundo passar por crises econômicas que tornaram necessária a alternativa da revisão do contrato47.

Os países capitalistas sofreram fortes modificações na sua estrutura econômica e em seus modelos de negócios após a II Guerra Mundial, impulsionados pelo término do conflito e os avanços tecnológicos da área militar. Consolida-se uma crescente indústria dos bens de consumo de massa, bem como a progressiva massificação do crédito e da atividade publicitária. Assim, houve alteração no próprio modelo de contrato que inspirou as codificações do século XIX, e o Código Civil de 1916, inspirado nos novos elementos do cenário econômico mundial48.

O fenômeno da massificação dos contratos, surgiu dessas circunstâncias históricas, que traziam, em seu bojo, práticas agressivas de negociação e a sensível liberdade de contratar de uma das partes; o que assinalava a debilidade destes sujeitos na relação contratual, indicando, assim, a necessidade do reconhecimento desta situação pelo direito e a promoção da proteção do vulnerável49.

A figura do consumidor recebeu, no cerne da constitucionalização da economia, um tratamento específico, sendo-lhe conferida indiscutível superioridade jurídica para compensar a sua inferioridade de fato, enquanto agente econômico mais vulnerável nas relações de consumo. Isto porque, na transição do Estado Liberal para o Estado Social, as relações jurídicas, em geral, tornaram-se injustas, pela quebra do equilíbrio entre os sujeitos de direito e, assim, os vínculos de consumo reclamavam uma nova postura do

46 “ enquanto as coisas permanecerem as mesmas”. 47

MIRAGEM, op. Cit. p. 40 48

Idem, p. 41 49

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legislador, a fim de absorver ou racionalizar, o que Gaston Morin50 denominou de a revolta dos fatos contra os códigos, que se traduzia na ausência de harmonia “entre os modelos jurídicos herdados do liberalismo em suas múltiplas facetas e realidade socioeconômica gerada pela Revolução Industrial e pela consequente constituição do operariado como classe social.”51

.

4.1 A TUTELA CONSTITUCIONAL DO CONSUMIDOR

O discurso do presidente norte-americano John F. Kennedy, em 1962, é considerado o princípio da reflexão jurídica mais profunda sobre o direito consumerista. No referido pronunciamento, o presidente enumerou os direitos do consumidor e os considerou como desafio necessário para o mercado. A novidade surgiu da consideração que, em algum momento da vida, tem-se o status deste sujeito, “somos todos consumidores”, “este papel social e econômico, estes direitos e interesses legítimos, que são individuais, mas também são os mesmos nos grupos identificável (coletivos) ou não (difuso),”52

é o que se define como consumidor na contemporaneidade.53*

Desde então, surgiram outras iniciativas que contribuíram para o desenvolvimento da regulamentação das relações consumerista. Destaca-se a Resolução n° 2.542 da ONU que buscava fomentar o progresso e o desenvolvimento social através da disciplina de tais relações. Em 1973, em Genebra, a Comissão de Direitos Humanos da ONU realizou uma sessão, na qual enunciou os direitos fundamentais e universais do consumidor, direitos estes que são assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor Brasileiro, condensados em seu artigo 6°. As “Diretrizes para a Proteção do Consumidor” correspondem à Resolução n° 39/248, editada durante a realização da

50

MORIN, Edgar. A cabeça bem feita. 18. ed. Trad. Eloá Jacobina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.___. Cultura de massas no século XX o espirito do tempo – I neurose. 4. ed. Rio de Janeiro Forense, 1977.

51

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. p.1364. 3. ed. rev. e atual. São Paulo, SP : Saraiva, 2008.

52

MARQUES, Claudia Lima. Introdução ao Direito do Consumidor p. 32 In: BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor – 5 ed. rev., atual. E ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013. 53

PAZ, Leonardo Silva. A indenização por danos morais prevista no código de defesa do consumidor: análise crítica acerca das funções punitivas e inibitória. Monografia. Faculdade de Direito – Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2017, p. 49

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assembleia, em 16 de abril de 1985, que visava oferecer aos governos um conteúdo programático com o objetivo de solucionar conflitos, advindos das relações consumeristas, ainda que não tivesse função imperativa54.

O Constituinte brasileiro, com esteio na teoria de Robert Alexy, segundo a qual “os direitos humanos só podem desenvolver seu pleno vigor quando garantidos por normas de direito positivo, isto é, transformados em direito positivo”,55

cuidou de garantir os direitos do consumidor como direito e princípio fundamental, bem como determinou ao legislador a realização do Código de Defesa do Consumidor, um sistema normativo que fosse capaz de garantir a proteção estabelecida pela Constituição. Consagrando, assim, um novo microssistema de direitos e deveres imanentes às relações de consumo, “aproxima de modo mais efetivo suas proposições normativas dos fatos da vida que regula”56

Nesse novo contexto, a proteção jurídica do consumidor pelo Estado se legitima em razão de sua fragilidade frente ao mercado; este, em sua atual conformação massificada ocasiona, sob diversos aspectos, potencial e constante ofensa a interesses materiais e existenciais do consumidor57. As mudanças profundas na nossa sociedade e a conscientização da extrema massificação da produção, da distribuição e do consumo em geral que se vive atualmente na terceira revolução industrial, com a globalização proporcionaram tais transformações. Entende-se, pois, que estas mudanças da economia e da sociedade eleveram “exponencialmente a vulnerabilidade dos consumidores e levaram o direito a preocupar-se de forma tão profunda com sua tutela especial, criando um novo direito de consumidor”58

.

A Constituição Federal de 1988 reconhece a vulnerabilidade do consumidor, e, nas oportunidades em que determina que o Estado regule as relações consumeristas ou quando coloca limites a parâmetros para a atividade econômica, o texto maior prevê a sua defesa, o que evidencia que

54

Idem, p. 49. 55

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais - p. 93 São Paulo: Malheiros Editores, 2008

56

MIRAGEM, op. cit. p. 47 57

ZABAN, Breno. BESSA, Leonardo Roscoe. Vulnerabilidade do Consumidor – Estudo empírico sobre a capacidade de tomada de decisões financeiras por interessados na compra de imóveis. P. 212. Revista de Direito do Consumidor. Vol. 101 ano 24 p. 209 - 237. São Paulo: Ed. RT, set - out 2015

58

(37)

este precisa mesmo de proteção59. A especificidade do regime de defesa do consumidor, individual e coletivamente, encontra-se atualmente cercado de mecanismos próprios de tutela, nos quais se consagram conquistas já obtidas no direito comparado em países desenvolvidos. A Carta de 1998 imprimiu esta organicidade e institucionalizou a matéria, “no âmbito constutucional, os direitos coletivos e as garantias correpondentes”60

.

Desta forma, surge o CDC de expressa determinação constitucional61, objetivando a proteção do consumidor, sujeito específico, titular de um direito subjetivo constitucional- “um novo sujeito pós- moderno de direito” como definiu Claudia Lima Marques. A referência à relação de consumo, realizada pela Lei 8.078/ 90 apresenta-se como uma estratégia legislativa, cujo objetivo é identificar a partir desta um de seus sujeitos e determinar-lhe proteção, a começar da consagração do direito do consumidor como direito fundamental (artigo 5°, XXXII); seu estabelecimento como princípio de ordem econômica (artigo 170, V); e previsão expressa da competência legislativa da União para legislar sobre sobre responsabilidade por danos causados62.

O reconhecimento dos direitos editados no CDC e a instituição do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor surgem da ruptura da ordem tradicional que se esmerava na defesa de interesses privados. Tais parâmetros representam uma nova era para as relações de consumo, proporcionando ao indivíduo a satisfação real de seus interresses, concebida a partir do assentamento da referida ruptura na Constituição de 198863.

Se realizada uma digressão cronológica na legislação, é possível observar que, em vários campos, extensa regulamentação tem complementado o regime referente à proteção das relações consumeristas. Entre tantas leis, colacionadas cuidadosamente por Carlos Alberto Bittar em sua obra “Direito do Consumidor”64 ,

à qual remete-se o leitor para uma análise mais detalhada, pode-se observar tentativas esparsas de proteção ao

59

NUNES. Luis Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. P.74 – 6 ed. rev. E atual. – São Paulo: Saraiva, 2011.

60

BITTAR, Carlos Alberto. Direitos do Consumidor: código de defesa do consumidor. P. 7.- 3ª Ed. - Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991

61

artigo 48 do ADCT. 62

MIRAGEM, op. cit p. 48 63

BITTAR, op. cit. p. 15 64

(38)

consumidor, desde 1933, no âmbito penal, que definiam crimes contra a economia popular; a repressão ao abuso de poder econômico; criação de órgão próprio para o julgamento de questões, a nível administrativo, o CADE. Em 1962, houve regulamentação da distribuição gratuita de prêmios, mediante sorteio, vale- brindes. Entre outras normas pertinentes à seara penal, passando por legislações setoriais, como as de locação, mensalidades escolares entre outras, surgiram, em 1971, preceitos cujo objetivo era coibir as práticas de dominação do mercado, por meio de concentrações empresariais que eliminem ou dificultem a concorrência e indiretamente, amparavam os interesses dos consumidores. No plano contratual, houve a edição, em 1987, de norma que protegia os interesses dos usuários na transferência de tecnologia e no uso de software e regulava o conteúdo dos contratos, vedando certas cláusulas65.

Assim, surge o CDC, muito mais como uma filosofia de ação, segundo José Geraldo Filomeno Brito, do que um conjunto de normas inovadoras, em diversos aspectos legais; isto porque delineia uma política ou um conjunto de diretrizes que devem ser efetivadas para a proteção efetiva do consumidor, conforme emana a Constituição de 198866.

4.2 A VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR

É o principio da igualdade consagrado no artigo 5°, caput da Constituição Federal de 1988, que viabiliza o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, a “parte fraca da relação, decorrendo tal ‘fraqueza’ real e concreta de vários aspectos, dentre eles os de ordem econômica e técnica.”67

O fator relacionado à ordem técnica diz respeito aos meios de produção, cujo conhecimento é monopólio do fornecedor e concernente à ordem econômica temos o fato de que, por via de regra, o

65

Ibidem p. 19. 66

FILOMENO, José Geraldo Brito. Curso Fundamental de Direito do Consumidor. p. 15 - 2. ed. – São Paulo: Atlas, 2008

67

BAGGIO, Andreza Cristina. Publicidade de medicamentos e a (hiper) vulnerabilidade do consumidor idoso. P. 157- Revista de Direito do Consumidor. Vol. 112 ano 26 p. 149-176. São Paulo: Ed. RT, jul – ago 2017.

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