SÍNDROME D E GUILLAIN-BARRÉ-STROHL
F A T O R E S P R O G N Ó S T I C O S
ABELARDO DE QUEIROZ CAMPOS ARAÚJO * — ALEXANDRA PRUFER DE QUEIROZ CAMPOS ARAÚJO ** — JOSÉ LUIZ DE SÁ CAVALCANTI ***
R E S U M O — Os a u t o r e s a n a l i s a r a m r e t r o s p e c t i v a m e n t e 29 p a c i e n t e s i n t e r n a d o s com a s í n d r o m e d e G u i l l a i n - B a r r é - S t r o h l , o b j e t i v a n d o i d e n t i f i c a r í n d i c e s d e g r a v i d a d e d a d o e n ç a no q u e se r e f e r e ao d e s e n v o l v i m e n t o de complicações e ao ó b i t o . C o n c l u í r a m s e r e m índices d e g r a v i d a d e a p r e s e n ç a d e s i n a i s s e n s i t i v o s , d i s f u n ç ã o n e u r o v e g e t a t i v a , i n s u f i c i ê n c i a r e s p i r a t ó r i a , disfunção e s f i n c t e r i a n a e l o n g o t e m p o de p e r m a n ê n c i a h o s p i t a l a r . G u i l l a i n - B a r r é - S t r o h l s y n d r o m e : p r o g n o s t i c f a c t o r s . SUMMARY — T h e a u t h o r s a n a l y s e d r e t r o s p e c t i v e l y 29 i n - p a t i e n t s w i t h G u i l l a i n - B a r r é - S t r o h l s y n d r o m e i n t e n d i n g to r e c o g n i z e s e v e r i t y i n d e x e s a s f a r as t h e d e v e l o p m e n t of complications a n d d e a t h a r e c o n c e r n e d . S e n s o r y s i g n s , a u t o n o m i c d y s f u n c t i o n , r e s p i r a t o r y insuficiency, s p h i n e t e r i c d i s t u r b a n c e s a n d a l o n g e r t i m e in h o s p i t a l t u r n e d o u t to b e s e v e r i t y i n d e x e s , w h e n p r e s e n t i n t h e s e p a t i e n t s .
Em 1916, Guillain, Barre e Strohl, ao caracterizarem como entidade mórbida a
síndrome que hoje leva seus nomes, enfatizaram não só seus aspectos
clínico-labora-toriais, descrevendo a típica alteração do líquido cefalorraquidiano (LCR) —
disso-ciação albumino-citológica — como também chamaram a atenção para aspectos
evolu-tivos, especialmente para o prognóstico favorável na grande maioria dos casos 17.
Após vários anos de experiência no trato desses pacientes, sabe-se que esta afirmativa
não é tão verdadeira, pois o índice de mortalidade da doença varia de 2% a
22%
1,12,13,23,25,26,35,Reconhece-se, ainda, que 10 a 30% dos doentes requerem
venti-lação artificial em alguma fase da doença
10,14,33 0que contribui para aumentar o
índice de mortalidade, decorrente de infecções devidas ao longo período de assistência
respiratória. Assinale-se, também, a incidência de seqüelas neurológicas permanentes,
em torno de 16% 20.
Sendo enfermidade de curso evolutivo imprevisível, pelo menos nas primeiras
semanas 15, o estabelecimento de índices prognósticos de fácil identificação pelo clínico,
reveste-se de extrema importância prática. O presente estudo foi realizado
objeti-vando o reconhecimento de tais fatores.
P A C I E N T E S E M É T O D O S F o r a m a n a l i s a d o s , r e t r o s p e c t i v a m e n t e , os p r o n t u á r i o s d e 29 p a c i e n t e s i n t e r n a d o s n o H U C F F e n o I P P M G , a m b o s d a U F R J , no p e r í o d o c o m p r e e n d i d o e n t r e J a n e i r o d e 1978 e o u t u b r o d e 1985. S e l e c i o n a r a m s e a p e n a s os c a s o s que, e x a m i n a d o s por u m ou m a i s n e u r o -T r a b a l h o r e a l i z a d o n o H o s p i t a l U n i v e r s i t á r i o C l e m e n t i n o F r a g a F i l h o ( H U C F F ) e no I n s t i t u t o d e P u e r i c u l t u r a e P e d i a t r i a M a r t a g ã o G e s t e i r a ( I P P M G ) d a U n i v e r s i d a d e F e d e r a l d o R i o d e J a n e i r o ( U F R J ) : * Médico do I n s t i t u t o d e N e u r o l o g i a d a U F R J ; ** Médica do I P P M G d a U F R J ; *** P r o f e s s o r A d j u n t o d e N e u r o l o g i a d a U F R J .
Dr. Abelardo de Queiroz Campos Araújo — Praça Professor José B e r n a r d i n o 24/201 — 22621 Rio de Janeiro RJ — Brasil
l o g i s t a s , a p r e s e n t a r a m q u a d r o c l í n i c o - l a b o r a t o r i a l c o n d i z e n t e a o d i a g n ó s t i c o , d e a c o r d o com os c r i t é r i o s e s t a b e l e c i d o s p o r A s b u r y 3. N o s e n t i d o d e se a v a l i a r os p r i n c i p a i s f a t o r e s envolvidos n o p r o g n ó s t i c o d a d o e n ç a , foi feito p r o t o c o l o g e r a l q u e r e c o l h e u d a d o s clínicos, l a b o r a -t o r i a i s e evolu-tivos. A m a i o r i a d e s s e s d a d o s , v e r s a n d o a c e r c a d e a s p e c -t o s g e r a i s d a d o e n ç a , f o r a m s u p r i m i d o s d o p r e s e n t e e s t u d o p o r t e r e m s i d o o b j e t o d e m o n o g r a f i a a n t e r i o r m e n t e a p r e s e n t a d a 6. N o e s t u d o a t u a l , os p a c i e n t e s f o r a m d i v i d i d o s e m 4 g r u p o s , a s a b e r : 1) p a -c i e n t e s q u e o b t i v e r a m a l t a h o s p i t a l a r ; 2) p a -c i e n t e s f a l e -c i d o s d u r a n t e a i n t e r n a ç ã o ; 3) p a -c i e n t e s com complicações d u r a n t e a i n t e r n a ç ã o ; 4) p a c i e n t e s s e m complicações. C o n c e i t u o u - s e com-plicação como q u a l q u e r c o n d i ç ã o m ó r b i d a s u r g i d a n o d e c u r s o d a i n t e r n a ç ã o , e x c l u í d a s a s m a n i f e s t a ç õ e s r e c o n h e c i d a s como p a r t e d o q u a d r o clínico d a s í n d r o m e d e G u i l l a i n - B a r r é - S t r o h l (SGB). C o m p a r a r a m - s e os 4 g r u p o s n o q u e t a n g e a o s p a r â m e t r o s s e g u i n t e s : a ) i d a d e , sexo e r a ç a ; b) q u a d r o m o t o r e s e n s i t i v o ; c) p r e s e n ç a ou n ã o d e — a c o m e t i m e n t o d e n e r v o s c r a -n i a -n o s , s i -n a i s m e -n i -n g o - r a d i c u l a r e s , d i s t ú r b i o s e s f i -n c t e r i a -n o í , d i s t ú r b i o s -n e u r o v e g e t a t i v e s ; d) t e m p o d e i n t e r n a ç ã o . Os d e m a i s p a r â m e t r o s a n a l i s a d o s no p r o t o c o l o inicial, f o r a m e x c l u í d o s d e s t e e s t u d o e m v i r t u d e d e n ã o s e m o s t r a r e m s i g n i f i c a t i v o s p a r a o p r o g n ó s t i c o , e m a n á l i s e p r e l i m i n a r . R e s u l t a d o s d a s c o m p a r a ç õ e s e n t r e os g r u p o s f o r a m a n a l i s a d o s q u a n t o à s u a significância e s t a t í s t i c a pelo t e s t e d a p r o b a b i l i d a d e e x a t a d e F i s h e r , exceção f e i t a à m é d i a d e i d a d e e ao t e m p o m é d i o d e i n t e r n a ç ã o , a o s q u a i s foi a p l i c a d o o t e s t e d o t d e S t u d e n t 32. R E S U L T A D O S 1) P a c i e n t e s e m g e r a l ( T a b e l a 1) — F o r a m e n c o n t r a d a s a s s e g u i n t e s a l t e r a ç õ e s o b j e t i v a s d e s e n s i b i l i d a d e (iniciais d o s d o e n t e s e n t r e p a r ê n t e s e s ) : h i p o e s t e s i a s u p e r f i c i a l e p r o f u n d a com nível s e n s i t i v o em T12 ( M S ) ; h i p o e s t e s i a s u p e r f i c i a l e p r o f u n d a e m m e i a b i l a t e r a l m e n t e ( J B G ) ; h i p o e s t e s i a s u p e r f i c i a l e p r o f u n d a em m e i a e luva b i l a t e r a l m e n t e ( I S F ) ; a n e s t e s i a superficial e p r o f u n d a e m m e i a b i l a t e r a l m e n t e ( L P C B ) ; h i p o e s t e s i a s u p e r f i c i a l e m m e i a e l u v a b i l a t e r a l m e n t e ( S M Q F ) ; h i p o p a l e s t e s i a em m e m b r o s i n f e r i o r e s ( J M P ) ; h i p o e s t e s i a s u p e r -ficial em m e i a e l u v a b i l a t e r a l m e n t e ( E G R ) . Os n e r v o s c r a n i a n o s a c o m e t i d o s f o r a m : V I I (12 p a c i e n t e s ) ; I X - X (11 p a c i e n t e s ) ; I I I (4 p a c i e n t e s ) ; V (1 p a c i e n t e ) ; V I I I (1 p a c i e n t e ) . A l g u n s p a c i e n t e s t i v e r a m m a i s d e u m n e r v o c r a n i a n o a t i n g i d o , c o n c o m i t a n t e m e n t e . E m r e l a ç ã o às disfuncões n e u r o v e g e t a t i v a s e n c o n t r a m o s : t a q u i c a r d i a s i n u s a l (9 c a s o s ) , s u d o r e s e p r o f u s a (6 c a s o s ) , h i p e r t e n s ã o a r t e r i a l (3 c a s o s ) , b r a d i c a r d i a s i n u s a l (2 casos) e h i p o t e n s ã o a r t e r i a l (1 c a s o ) . N a m a i o r i a d o s casos o c o r r e u , s i m u l t a n e a m e n t e , m a i s d e u m t i p o d e d i s a u t o n o m i a . 2) C o m p a r a ç ã o e n t r e o g r u p o d e p a c i e n t e s q u e o b t e v e a l t a h o s p i t a l a r e o g r u p o d e p a c i e n t e s falecidos n o d e c u r s o d a i n t e r n a ç ã o ( T a b e l a 2) — O í n d i c e d e m o r t a l i d a d e d a n o s s a
a m o s t r a foi 17% (5 p a c i e n t e s ) , t e n d o 8 3 % (24 p a c i e n t e s ) o b t i d o a l t a h o s p i t a l a r . O óbito o c o r r e u , n a m a i o r i a d o s casos, em d e c o r r ê n c i a d e complicações infecciosas, n o t a d a m e n t e d e vias a é r e a s i n f e r i o r e s . Q u a n d o se c o m p a r a o g r u p o dos ó b i t o s com o g r u p o d a s a l t a s o b s e r v a - s e m a i o r f r e q ü ê n c i a , e s t a t i s t i c a m e n t e significativa, n o q u e t a n g e à p r e s e n ç a d e s i n a i s s e n s i t i v o s ( p = 0 , 0 1 3 ) , d i s f u n ç ã o n e u r o v e g e t a t i v e . ( p = 0 , 0 0 4 ) , i n s u f i c i ê n c i a r e s p i r a t ó r i a ( p = 0 , 0 0 1 ) e m a i o r t e m p o d e i n t e r n a ç ã o (p<^0,001), n o p r i m e i r o g r u p o . Os d e m a i s p a r â m e t r o s n ã o se m o s t r a r a m e s t a t i s t i c a m e n t e r e l e v a n t e s ( p > 0 , 0 5 ) . 3) C o m p a r a ç ã o e n t r e o g r u p o d e p a c i e n t e s q u e t e v e a l g u m t i p o d e complicação d u r a n t e o p e r í o d o de h o s p i t a l i z a ç ã o , e o g r u p o s e m c o m p l i c a ç õ e s ( T a b e l a 3) — C o m p l i c a ç õ e s o c o r r e r a m em 9 (31%) dos 29 p a c i e n t e s , a s a b e r : p n e u m o n i a (8 c a s o s ) , insuficiência r e s p i r a t ó r i a a g u d a (5 c a s o s ) , c h o q u e séptico (2 c a s o s ) , c o a g u l a ç ã o i n t r a v a s c u l a r d i s s e m i n a d a (2 c a s o s ) , s e p t i c e m i a (3 c a s o s ) , infecção u r i n a r i a (2 c a s o s ) , a t e l e c t a s i a (1 c a s o ) , t r o m b o f l e b i t e (1 c a s o ) , h e m o p n e u -m o t ó r a x ( l c a s o ) , s f n d r o -m e d a a n g ú s t i a r e s p i r a t ó r i a d o a d u l t o (1 c a s o ) , insuficiência r e n a l a g u d a (1 c a s o ) , ú l c e r a d e c ó r n e a (1 caso) e e s c a r a s d e d e c ú b i t o (1 c a s o ) . N a m a i o r i a dos p a c i e n t e s (7 n o t o t a l d e 9) c o e x i s t i r a m m a i s d e u m t i p o d e complicação. C o n f r o n t a n d o - s e o g r u p o d e p a c i e n t e s q u e t e v e complicações com o g r u p o sem, n o t a - s e , n o p r i m e i r o , freqüência m a i o r e e s t a t i s t i c a m e n t e s i g n i f i c a t i v a d e s i n a i s s e n s i t i v o s ( p = 0 , 0 3 2 ) , d i s f u n ç ã o n e u r o v e g e t a -tiva ( p = 0 , 0 0 3 ) , d i s f u n ç ã o e s f i n c t e r i a n a (p^=0,045) e m a i o r t e m p o d e i n t e r n a ç ã o ( p < 0 , 0 0 1 ) . A s d i f e r e n ç a s e n t r e os p a r â m e t r o s r e s t a n t e s n ã o a p r e s e n t a r a m s i g n i f i c â n c i a e s t a t í s t i c a ( p > 0 , 0 5 ) .
C O M E N T Á R I O S
Sabe-se, desde a década passada, que a corticoterapia não apresenta vantagens
no tratamento da SGB tendo, segundo alguns autores, o inconveniente de prolongar o
tempo de permanência hospitalar e predispor a formas recorrentes da doença
1 9-
2 3. Isto
fez com que se buscassem outras abordagens terapêuticas que pudessem se mostrar
eficazes. O papel teórico da plasmaférese na SGB surgiu, principalmente a partir da
demonstração, por Cook & Dawling 8, no soro desses pacientes, da existência de fatores
humorais mielinotóxicos. Este fato fez surgir na literatura inúmeros trabalhos, em
sua maioria não controlados, versando a eficácia de tal método. Finalmente, em 1985,
o üuillair.-Barré Study Group, formado por diversos centros neurológicos dos EUA,
realizou investigação prospectiva randomizada em 245 pacientes gravemente acometidos
pela doença. O trabalho concluiu pela eficácia da plasmaférese, especialmente se
utili-zada em pacientes graves, com menos de 7 dias de doença e dependentes de
repi-rador33 Tal conduta passou a ser recomendada, desde então, como o procedimento
terapêutico mais eficaz !6.
Uma vez que a maioria dos pacientes se recupera espontaneamente sem qualquer
seqüela, é óbvia a necessidade de se estabelecerem critérios de gravidade, capazes de
selecionar os enfermos com pior prognóstico, que se beneficiariam da plasmaférese.
Tai fato assume uma importância ainda maior em nosso meio pois, esta forma de
tratamento, além de envolver desconforto e riscos para o doente, necessita de
maqui-naria especial, suporte clínico intensivo, pessoal especializado e, conseqüentemente,
custos financeiros elevados. Poucos são os trabalhos na literatura que se propõem a
responder a essas questões de modo específico. Embora alguns artigos tenham tentado
correlacionar certos aspectos clínicos com o prognóstico, nenhum foi capaz de
identi-ficar de maneira definitiva o grupo de pior prognóstico nos estágios iniciais da doença.
Segundo Osler & Sidell 27, seriam fatores de bom prognóstico a presença de
neuro-patia exclusivamente motora e a ausência de distúrbios esfincterianos. Tal afirmativa
foi contestada por Marshall 24
0qual examinou 35 pacientes, alguns dos quais com
grave distúrbio sensitivo e disfunção esfincteriana. De acordo com outros autores 23,29
a presença de grave déficit motor, traria mau prognóstico quanto à ocorrência de
seqüelas. Trabalhos com populações pediátricas u.29 concluíram ser de valor
prognós-tico o tempo decorrido para o início da fase de recuperação. De acordo com Eberle
et al.
1 1, em avaliação retrospectiva de 47 crianças, intervalo de tempo superior a
18 dias, desde o déficit máximo e o início da recuperação, estaria associado a maior
incidência de seqüelas. Segundo outros autores, correlacionar-se-iam com pior
prog-nóstico a presença de amiotrofia 20,23
>ou de fibrilações profusas à eletroneuromiografia,
indicativas de degeneração axonal 26.
Não foi possível incluir, entre os parâmetros analisados no presente trabalho,
dados eletroneuromiográficos, dada à inconstância desses exames nos prontuários
con-sultados. Winer et al.ss, avaliando retrospectivamente 71 pacientes com SGB, os quais
haviam sido estudados em dois trabalhos anteriores 15,19, concluíram que nos estágios
iniciais da doença seriam fatores de mau prognóstico a presença de grave déficit
motor e a necessidade de ventilação artificial. Seu trabalho não é isento de críticas,
principalmente quando se leva em conta a inclusão apenas de pacientes seriamente
acometidos pela enfermidade. Trabalho interessante foi realizado por Gruener et al.
1 6:
estudaram 24 pacientes submetidos à plasmaférese, intencionando elucidar as
caracte-rísticas peculiares do grupo mais beneficiado pelo método. Concluíram serem índices
predizentes de boa resposta a idade mais jovem e a ausência de evidência de bloqueio
de condução nervosa distai à eletroneuromiografia.
A tabela 1 permite o conhecimento do perfil geral dos pacientes estudados no
presente trabalho: o fato do sexo masculino ser mais acometido é concordante com
outros autores 12,13,22
; em relação à média de idade, o grupo apresentou faixa etária
um pouco abaixo da descrita na literatura 5,7,31.
A
explicação para este dado está
em que uma das instituições envolvidas é centro de referência para atendimento
diferenciado de casos pediátricos (IPPMG-UFRJ), acarretando, com isto, maior peso
de representatividade na faixa infantil. Na maioria dos pacientes o quadro motor
caracterizou-se por tetraparesia simétrica, sem predomínio proximal ou distai. Não
foram observadas amiotrofias, o que pode ser atribuído à rapidez na progressão dos
sintomas. A hipo ou arreflexia profunda esteve presente como sinal marcante, em
todos os pacientes, nos 4 membros, mesmo nos não paréticos. Tal fato já é clássico,
sendo descrito em livros-texto da especialidade 1. Apenas 7(24%) pacientes
apresen-taram distúrbios sensitivos objetivos. Na maioria dos doentes, no entanto, o
acome-timento objetivo esteve ausente ou foi menos pronunciado que o subjetivo, o que está
de acordo com a literatura
2 1. Sabe-se que tais alterações, quando presentes, envolvem
principalmente a sensibilidade profunda. Alterações da sensibilidade superficial
impli-cam em destruição axonal e estão presentes em casos de evolução mais prolongada
2 1.
Isto explica a inclusão dos fenômenos sensitivos objetivos como um dos índices de
mau prognóstico, tanto no que diz respeito ao óbito quanto ao desenvolvimento de
complicações (Tabelas 2 e 3).
Dos 29 pacientes, 15 (52%) tiveram um ou mais nervos cranianos acometidos.
Outros autores referem percentagens que variam de 31% a 95%, máxima quando se
selecionam apenas os casos mais graves
2,4,5,7,13,18,26,30,31,34.Dos nervos acometidos,
os mais freqüentes foram o VII, seguido do IX-X. Na literatura, são díspares as
percentagens quanto ao acometimento de cada nervo craniano, havendo, entretanto,
concordância no que se refere ao maior comprometimento do VII 2,4,5,7,13,18,25,30,31,34.
Não houve, na amostra estudada, relevância estatística no que se refere a inclusão
de acometimento de nervos cranianos dentre os fatores de mau prognóstico, tanto
para o desenvolvimento de complicações, quanto para a evolução para o óbito. Isto
vai de encontro, parcialmente, à afirmativa de Palácios 28, o qual, estudando 339
pacien-tes com SGB, referiu como índices de mau prognóstico o acometimento do X nervo,
além da rapidez na instalação da sintomatologia e o comprometimento respiratório.
Os dados obtidos na presente casuística são semelhantes aos de Winer et al.35. Sinais
meningo-radiculares (rigidez de nuca e sinais de Lasègue, Kernig e Brudzinski) foram
observados em 15 (52%) pacientes. A presença de tais sinais evidencia o
compro-metimento inflamatório das raízes dos nervos não se relacionando, nos doentes
estu-dados, com a celularidade do LCR ou com o prognóstico final. Distúrbios
esfincte-rianos ocorreram, transitoriamente, em 3 (10%) dos pacientes. Tal acometimento é
considerado incomum pela maioria dos autores, estando presente em percentagens que
variam de 2%a 3 1 % ¾
2 2^ . Encontrou-se correlação, estatisticamente significativa,
entre a presença desses distúrbios e o desenvolvimento de complicações no decurso
da internação, sem associação de maior incidência de óbitos. Identificaram-se sinais
de acometimento neurovegetativo em 10 (34%) pacientes, sendo os mais freqüentes
a taquicardia sinusal e a sudorese profusa. É bem conhecida a presença de disfunção
autonômica em pacientes com SGB 1.21. Taquicardia sinusal, algumas vezes persistente,
ocorre em até 50% dos casos mais graves. Juntamente com a hipertensão arterial,
tem sido interpretada como decorrente da hiperatividade simpática, evidenciada pelo
aumento da excreção urinaria de catecolaminas 9. Tal explicação é perfeitamente
plau-sível também no que se refere à sudorese profusa. Houve nítida associação, na
amostra estudada, entre a presença de sintomas neurovegetatives e o prognóstico,
tendo sido, a disautonomia, mais freqüente em pacientes que evoluíram para o óbito
ou que apresentaram complicações (Tabelas 2 e 3).
Sabe-se que todo o paciente com SGB é candidato ao desenvolvimento de
insu-ficiência respiratória aguda. Destes, 10 a 30% requerem assistência ventilatória
mecâ-nica 10,14,33. Estudo retrospectivo da Clímecâ-nica Mayo 14 revelou freqüência de 17% de
insuficiência respiratória nesses casos. Já no Massachussetts General Hospital, 30%
dos doentes necessitaram de ventilação artificial, por tempo médio de 49 dias 33.
Insuficiência respiratória ocorreu em 5 (17%) dos pacientes estudados, dos quais
4 (80%) faleceram. Comparando-se os grupos óbitos x Altas (Tabela 2), nota-se
diferença, estatisticamente significativa, no que tange à presença de insuficiência
respi-ratória no primeiro grupo. Assim sendo, a insuficiência respirespi-ratória aguda é outro
fator de mau prognóstico, provavelmente pelas complicações advindas da entubação
e/ou traqueostomia prolongadas e pelo curso protraído da falência ventilatória na
SGB 14 Pelo fato de já ter sido incluída no grupo das complicações em geral, a
insuficiência respiratória não foi considerada como parâmetro isolado na tabela
com-parativa de complicações (Tabela 3). No Massachussetts General Hospital a média
de tempo de internação hospitalar nos casos de SGB, foi 61 dias 33. o tempo médio
de internação destes 29 pacientes situou-se em torno de 24 dias. No grupo dos óbitos,
este período atingiu 29 dias e no grupo das complicações, 37 dias. As diferenças
observadas foram estatisticamente significativas, isto é, maior tempo de internação se
relacionou com maior índice de complicações e óbitos (Tabelas 2 e 3).
Em resumo, após análise retrospectiva de 29 pacientes com SGB, não
selecio-nados quanto à gravidade, foram fatores de mau prognóstico quanto ao risco de
óbito e desenvolvimento de complicações a presença de sinais sensitivos, disfunção
neurovegetativa, insuficiência respiratória, maior tempo de internação e disfunção
esfincteriana (esta última apenas no que tange a propensão ao desenvolvimento de
complicações, não sendo significativamente mais freqüente no grupo que evoluiu para
óbito). Apesar dos cuidados que os Autores tiveram para evitar homogeneização do
modelo, os dados obtidos devem ser considerados dentro do contexto em que foram
produzidos, isto é, não devem ser generalizados, pois a amostra é relativamente
pe-quena e obtida em ambiente hospitalar de referência para casos graves. Tal fato não
invalida o estudo em si, pois o que se buscou foram índices de gravidade da doença
dentro de tal amostra. Acredita-se, portanto, que ao menos no que se refere à
popu-lação estudada, tais fatores de mau prognóstico indicam a necessidade de conduta
mais agressiva e precoce, tornando estes pacientes candidatos à plasmaférese,
ressal-vando-se as recomendações do Guillain-Barré Study Group 33.
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