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ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUCSP

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Academic year: 2021

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COORDENAÇÃO GERAL Celso Fernandes Campilongo

Alvaro de Azevedo Gonzaga André Luiz Freire

ENCICLOPÉDIA JURÍDICA DA PUCSP

TOMO 6

DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS

COORDENAÇÃO DO TOMO 6 Nelson Nery Jr. Georges Abboud André Luiz Freire

Editora PUCSP São Paulo

(2)

1

ENCICLOPÉDIAJURÍDICADAPUCSP | ISBN978-85-60453-35-1 <https://enciclopediajuridica.pucsp.br>

CONSELHO EDITORIAL

Celso Antônio Bandeira de Mello Elizabeth Nazar Carrazza

Fábio Ulhoa Coelho Fernando Menezes de Almeida

Guilherme Nucci José Manoel de Arruda Alvim

Luiz Alberto David Araújo Luiz Edson Fachin Marco Antonio Marques da Silva

Maria Helena Diniz

Nelson Nery Júnior Oswaldo Duek Marques Paulo de Barros Carvalho

Raffaele De Giorgi Ronaldo Porto Macedo Júnior

Roque Antonio Carrazza Rosa Maria de Andrade Nery

Rui da Cunha Martins Tercio Sampaio Ferraz Junior Teresa Celina de Arruda Alvim

Wagner Balera

TOMO DE DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS |ISBN 978-85-60453-49-8 A Enciclopédia Jurídica é editada pela PUCSP

Enciclopédia Jurídica da PUCSP, tomo VI (recurso eletrônico)

: direitos difusos e coletivos / coords. Nelson Nery Jr., Georges Abboud, André Luiz Freire- São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2020

Recurso eletrônico World Wide Web Bibliografia.

O Projeto Enciclopédia Jurídica da PUCSP propõe a elaboração de dez tomos.

1.Direito - Enciclopédia. I. Campilongo, Celso Fernandes. II. Gonzaga, Alvaro. III. Freire, André Luiz. IV. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

FACULDADE DE DIREITO

DIRETOR

Pedro Paulo Teixeira Manus DIRETOR ADJUNTO

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2 ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL

Édis Milaré e Lucas Tamer Milaré

INTRODUÇÃO

A implantação de qualquer atividade ou obra efetiva ou potencialmente degradadora do ambiente deve submeter-se a uma análise e controle prévios. Tal análise se faz necessária para se antever os riscos e eventuais impactos ambientais a serem prevenidos, corrigidos, mitigados e/ou compensados quando da sua instalação, da sua operação e, em casos específicos, do encerramento das atividades.

A Lei Maior, ao insculpir, no art. 225, inciso IV, a obrigação de o poder público “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”, atribuiu à expressão “estudo prévio de impacto ambiental” sentido amplo, não restringindo ou fazendo coincidir as avaliações de impacto ao EIA/RIMA, que, em verdade, trata-se, como dito de espécie do gênero Avaliação de Impacto Ambiental - AIA.

O objeto deste verbete consiste no Estudo de Impacto Ambiental – EIA, que é um um documento de natureza técnico-científica, com a finalidade de avaliar os impactos ambientais capazes de serem gerados por atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores ou daqueles que, sob qualquer forma possam causar degradação ambiental, de modo a permitir a verificação da sua viabilidade ambiental.

SUMÁRIO

Introdução ... 2

1. Processos para a avaliação de impactos ambientais ... 4

2. A avaliação de impactos ambientais no direito brasileiro ... 5

3. Passos da normatização ... 7

(4)

3

4.1. Segundo a Resolução CONAMA 01/1986... 9

4.1.1.Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) ... 10

4.1.2.Conceito ... 11

4.1.3.Objetivo ... 12

4.1.4.Base legal... 13

4.1.5.Pressuposto do EIA: significativa degradação ... 15

4.1.5.1. O cunho exemplificativo do art. 2º da Resolução CONAMA 1/1986 ... 16

4.1.5.2. O caráter de presunção da gravidade do impacto ... 18

4.1.6.Momento de preparação ... 21

4.1.7.Iniciativa da exigência ... 23

4.1.8.Elaboração ... 23

4.1.8.1. Independência da equipe ... 24

4.1.8.2. Responsabilidade do empreendedor e da equipe ... 27

4.1.9.Custeio ... 29

4.1.10. Diretrizes gerais ... 29

4.1.11. Conteúdo mínimo do EIA ... 31

4.1.12. Conteúdo mínimo do RIMA ... 33

4.1.13. Publicidade e participação pública ... 34

4.1.13.1. Publicidade ... 35

4.1.13.2. Participação popular ... 36

4.1.14. Mecanismos de controle ... 41

4.1.15. Mecanismos de controle ... 42

4.2. Segundo a Resolução CONAMA 237/1997... 43

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4

5. A Avaliação Ambiental Integrada - AAI ... 46 Referências ... 47

1. PROCESSOS PARA A AVALIAÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS

Antes de nos centrarmos na Avaliação de Impacto Ambiental - AIA, importa atentar para noções claras dos diferentes processos avaliativos que ocorrem na Gestão Ambiental, à luz do direito do ambiente e no âmbito da Política Nacional de Meio Ambiente.

Avaliar significa, em termos genéricos, examinar determinado objeto – um estudo, procedimentos, eficácia de resultados, relação custo-benefício e outros –, a fim de verificar a sua necessidade, validade ou utilidade. Em última análise, a avaliação é uma etapa decisiva no processo de planejamento e para a tomada de decisão. Desde logo, há inúmeras modalidades de avaliação que variam segundo diferentes objetivos e métodos que as caracterizam.

Ao falar de processos para a avaliação de impactos ambientais, referimo-nos à qualidade do ambiente e ao equilíbrio ecológico apontados pela Constituição Federal de 1988. E nesse procedimento podemos distinguir, basicamente, dois objetivos principais: o planejamento ambiental e o licenciamento ambiental, ambas as modalidades como subsídios legais à gestão do meio ambiente. Avaliação e planejamento estão compreendidos (explícita ou implicitamente) entre os instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente.

No caso de licenciamento ambiental figura, como requisito de absoluta necessidade, a Avaliação de Impacto Ambiental - AIA, isto é, uma avaliação técnica e prévia (vale dizer, a priori e não a posteriori) dos riscos e danos potenciais que determinado empreendimento ou ação pode causar às características essenciais do meio, seus recursos e seu equilíbrio ecológico. É excusado dizer que posteriormente (a posteriori) se poderá aferir os resultados positivos ou negativos que o empreendimento ou a ação tiverem deixado no meio ambiente.

Então, a AIA, como gênero, pode desdobrar-se em diferentes modelos, ou tipos, por exemplo: Estudo de Impacto Ambiental - EIA, Estudo de Impacto de Vizinhança-

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5

EIV, Relatório Ambiental Preliminar - RAP e outros. Esse tipo de avaliação prévia é disciplinado pela Lei Federal 6.938/1981 e por outros instrumentos legais e infralegais, como se poderá conferir mais abaixo.

No caso do planejamento ambiental, o processo avaliativo se encerra na Avaliação Ambiental Estratégica - AAE. Esta não se ocupa de impactos ou efeitos nocivos a um determinado ambiente, mas, sim, de uma escolha ou decisão necessária à formulação de uma política de governo que se preocupe em determinar, com acerto, área geográfica e tempo para implantar um programa ou projeto de desenvolvimento, como estratégia política, econômica e social. Essa avaliação considera a viabilidade “macro” ou a oportunidade do intento, levando em conta a natureza dos ecossistemas ou do bioma como alvos da intervenção. Nesse caso predominam critérios geoeconômicos, socioeconômicos, geográficos, culturais e políticos. Um dos modelos possíveis de aplicar é o Zoneamento Ecológico-Econômico - ZEE. Evidentemente, a metodologia da AAE é bem diversa daquela empregada nos tipos de AIA e trabalhará intensamente com estatísticas.

Em síntese, a AIA encontra-se na esfera do Licenciamento Ambiental, ao passo que a AAE está na seara do Planejamento Ambiental.

2. A AVALIAÇÃO DE IMPACTOS AMBIENTAIS NO DIREITO BRASILEIRO

A implantação de qualquer atividade ou obra efetiva ou potencialmente degradadora do ambiente deve submeter-se a uma análise e controle prévios. Tal análise se faz necessária para se antever os riscos e eventuais impactos ambientais a serem prevenidos, corrigidos, mitigados e/ou compensados quando da sua instalação, da sua operação e, em casos específicos, do encerramento das atividades.

Partindo de um corpo de diplomas legais, a ação protetiva e de controle exercida pelo poder público se conduz por um sistema de gestão ambiental, que nada mais é do que uma forma legítima, orgânica e racional de praticar a tutela do ambiente através de instrumentos técnicos e, muitas vezes, da participação popular.

Uma vez sabido que todo e qualquer projeto de desenvolvimento interfere no meio ambiente, e, da mesma forma, certo que o crescimento socioeconômico é um imperativo, insta, pois, discutir os instrumentos e mecanismos que os conciliem,

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6

minimizando, quanto possível, os impactos ecológicos negativos e, consequentemente, os custos econômicos e sociais.

Dentre os instrumentos de gestão ambiental, a Política Nacional de Meio Ambiente, instituída pela Lei Federal 6.938/1981, elegeu como ações preventivas afetas ao Estado a avaliação de impactos ambientais e o licenciamento para a instalação de obras ou atividades potencialmente poluidoras.1

Resumidamente falando, a AIA, no ordenamento jurídico brasileiro, encerra um: “Instrumento de política ambiental, formado por um conjunto de procedimentos capaz de assegurar, desde o início do processo, que se faça um exame sistemático dos impactos ambientais de uma ação proposta (projeto, programa, plano ou política) e de suas alternativas, e que os resultados sejam apresentados de forma adequada ao público e aos responsáveis pela tomada de decisão, e por eles considerados. Além disso, os procedimentos devem garantir a adoção das medidas de proteção do meio ambiente determinadas, no caso de decisão sobre a implantação do projeto”.2

Esse importante instrumento de planejamento e controle decorre do princípio da consideração do meio ambiente na tomada de decisões, e diz com a elementar obrigação de se levar em conta o fator ambiental em qualquer ação ou decisão que possa sobre ele causar qualquer efeito negativo.

Destaca-se a abrangência da AIA, que pode ser implementada tanto para projetos que envolvam execução física de obras e processos de transformação, como para políticas e planos que contemplem diretrizes programáticas, limitadas ao campo das ideias, neste caso denominada Avaliação Ambiental Estratégica.

Nunca é demais insistir neste ponto, pois “existe uma certa tendência entre os ambientalistas, inclusive autoridades ambientais, de confundir o instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente ‘Avaliação de Impactos Ambientais’ (AIA) com uma ferramenta do licenciamento ambiental denominada ‘Estudo de Impacto Ambiental’ (EIA), que vem prejudicando bastante que se extraia do instrumental representado pelas técnicas e metodologias de AIA todas as úteis consequências possíveis”.3

1 Art. 9º, incisos III e IV, da Lei Federal 6.938/1981.

2 MOREIRA, Iara Verocai Dias. Vocabulário básico de meio ambiente, p. 33. 3 OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. Revista de direito ambiental, p. 141.

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7

3. PASSOS DA NORMATIZAÇÃO

A bem ver, a AIA, enquanto pressuposto do processo decisório de licenciamento, espelha o complexo de estudos técnicos informadores do processo decisório do licenciamento de atividades ou empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, constituindo-se, por isso mesmo, gênero, do qual seriam espécies cada uma das modalidades de estudos relativos a aspectos ambientais postas à disposição do licenciador para subsidiar, em cada caso concreto, a análise da licença requerida (p. ex., EIA/RIMA, segundo a Resolução CONAMA 01/1986; Relatório Ambiental Preliminar, Plano e Projeto de Controle Ambiental, Plano de Manejo, Diagnóstico Ambiental, Plano de Recuperação de Área Degradada, Análise Preliminar de Risco, segundo a Resolução CONAMA 237/1997).

A Avaliação de Impacto Ambiental incorporou-se ao ordenamento jurídico pátrio por meio da Lei Federal 6.803/1980, tendo por influência o direito norte-americano,4 a qual considerou a AIA obrigatória na aprovação de limites e autorizações

de implantação de zonas industriais nas áreas críticas de poluição, tais como instalações nucleares e polos petroquímicos.

Com a transformação da mentalidade e preocupações pelas quais passou o mundo relativamente à questão ambiental, em especial o Brasil, este instrumento ganhou força e relevância em nossa sociedade, sendo efetivamente enraizado pela Lei Federal 6.938/1981, que o elevou à categoria de instrumento da política nacional do meio ambiente.5

4 NEPA- National Environmental Policy Act, que introduziu a AIA- Avaliação de Impacto Ambiental nos

Estados Unidos.

5 Note-se que, na Lei Federal 6.938/1981, a AIA e o Licenciamento constam como instrumentos distintos,

não necessariamente vinculados. “Isso denota o caráter amplo da avaliação de impactos, que supera os procedimentos de licenciamento ambiental, podendo, portanto, ser aplicada na esfera de planejamento de políticas, planos e programas que afetem o meio ambiente. A AIA é compreendida também como um processo que deve possibilitar ampla articulação entre setores governamentais, e destes com a sociedade, ou seja, como uma prática democrática de planejamento e execução de políticas públicas que deve abrir os processos decisórios à participação social. Entretanto, a AIA se efetivou, no Brasil, apenas no processo de licenciamento ambiental, por força da Resolução CONAMA 001/1986 - segundo a qual a condução do procedimento de licenciamento requer, quando a obra ou atividade for potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, a elaboração de Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo Relatório (EIA/RIMA). Posteriormente, essa exigência ficou estabelecida na Constituição federal de 1988” (Deficiências em estudos de impacto ambiental: síntese de uma experiência, p. 10). Vale anotar, a título de ilustração, que “em alguns países, a exemplo do Brasil, os procedimentos administrativos de análise e aprovação de projetos tiveram que ser adaptados à AIA (por exemplo, a concessão de licença para

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8

Por sua vez, o Decreto 88.351/1983, que inicialmente regulamentou a Lei Federal 6.938/1981, estabeleceu um liame entre a AIA e os sistemas de licenciamento, atribuindo ao CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente competência para definir as diretrizes segundo as quais os estudos, objetivando o licenciamento, seriam exigidos, com poderes, inclusive, de baixar as resoluções que julgasse necessárias. Referido Decreto foi substituído pelo de número 99.274/1990, ainda em vigor.

Forte nessas diretrizes legais, importa registrar que o primeiro passo encetado pelo CONAMA para o disciplinamento da AIA como pressuposto do licenciamento ambiental coincidiu com a Resolução CONAMA 01, de 23.1.1986, editada sob o regime constitucional anterior, quando não havia ainda nenhuma disposição constitucional que pudesse ser nomeada como de “proteção ambiental”. Pecou, no entanto, por regulamentar apenas a figura do EIA/RIMA – apesar de sua advertência quanto “a necessidade de se estabelecerem as definições, as responsabilidades, os critérios básicos e as diretrizes gerais para uso e implementação da Avaliação de Impacto Ambiental como um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente”6 –, levando muitos a considerar

que a AIA se confundisse com o EIA/RIMA.

Em 05.10.1988, com a promulgação da vigente Constituição Federal, impôs-se ao Poder Público, para assegurar a efetividade do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, de estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”7 (art. 225, caput e § 1º).

Por fim, editou o CONAMA a Resolução 237/1997, que deu maior organicidade ao sistema de licenciamento ambiental do País, e deixou claro que a AIA- Avaliação de Impacto Ambiental, que ela chama de estudos ambientais (art. 1º, III), é gênero, de que são espécies todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais apresentados como subsídio para a análise da licença ambiental. Vale dizer, consagrou-se, com base na

explotação de recursos minerais ou aproveitamentos hidroelétricos), enquanto que em outros, como a França, a AIA foi simplesmente adicionada aos procedimentos preexistentes – neste país, onde já existia um mecanismo de licenciamento, o estudo de impacto incorporado como uma das exigências do licenciamento”. (SÁNCHEZ, Luís Enrique. Revista de direito ambiental, p. 139).

6 Preâmbulo, com grifos nossos. 7 Grifos nossos.

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experiência e práticas acumuladas, que a AIA não pode ser reduzida a uma de suas modalidades, isto é, ao EIA/RIMA.

4. MODALIDADES DE AIA INFORMADORAS DO PROCESSO DECISÓRIO DO LICENCIAMENTO

A Lei Maior, ao insculpir, no art. 225, inciso IV, a obrigação de o poder público “exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade”, atribuiu à expressão “estudo prévio de impacto ambiental” sentido amplo, não restringindo ou fazendo coincidir as avaliações de impacto ao EIA/RIMA, que, em verdade, trata-se, como dito de espécie do gênero Avaliação de Impacto Ambiental - AIA.

Deveras, não faz mal repetir, a Lei criou uma tipologia de estudos ambientais destinados a prever e a resguardar o meio ambiente contra interferências que possam causar-lhe qualquer tipo de degradação. De lege lata, ditos estudos, podem ser resumidos, como a seguir.

4.1. Segundo a Resolução CONAMA 01/1986

A Resolução Conama 01, de 23.1.1986, elegeu como modalidade de avaliação de impacto ambiental, para as obras ou atividades modificadoras do meio ambiente, o Estudo de Impacto Ambiental - EIA e respectivo Relatório de Impacto Ambiental - RIMA.

O Estudo de Impacto Ambiental - EIA constitui-se em um documento de natureza técnico-científica, com a finalidade de avaliar os impactos ambientais capazes de serem gerados por atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores ou daqueles que, sob qualquer forma possam causar degradação ambiental, de modo a permitir a verificação da sua viabilidade ambiental.

As informações técnicas geradas no Estudo de Impacto Ambiental - EIA deverão ser apresentadas em um documento, com linguagem acessível ao entendimento do público, que é o Relatório de Impacto Ambiental - RIMA. A linguagem utilizada neste

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10

documento deverá conter características e simbologias adequadas ao entendimento das comunidades interessadas, bem como ilustrações didáticas, como mapas, quadros, gráficos e demais técnicas de comunicação visual, e expor de modo simples e claro as consequências ambientais do projeto e suas alternativas, comparando as vantagens e desvantagens de cada uma delas.

Numa palavra: “[o] EIA é o todo, complexo, detalhado, muitas vezes com linguagem, dados e apresentação incompreensíveis para o leigo. O RIMA é a parte mais visível (ou compreensível) do procedimento, verdadeiro instrumento de comunicação do EIA ao administrador e ao público”.8

É o mais completo dos estudos de avaliação de impactos, destinado a prever (e, a partir daí, prevenir) o dano antes de sua manifestação. É utilizado, segundo a lei brasileira, para os projetos mais importantes, capazes de provocar uma significativa degradação do meio ambiente.9

4.1.1. Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) As expressões Estudo de Impacto Ambiental - EIA e Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, tidas, vulgarmente, como sinônimas, representam, na verdade, documentos distintos, quais faces diversas de uma mesma moeda. “O estudo é de maior abrangência que o relatório e o engloba em si mesmo. O EIA compreende o levantamento da literatura científica e legal pertinente, trabalhos de campo, análises de laboratório e a própria redação do relatório”.10 O Relatório de Impacto Ambiental, destinando-se

especificamente ao esclarecimento das vantagens e consequências ambientais do empreendimento, refletirá as conclusões daquele. Ou, como anota Herman Benjamin, “o EIA é o todo: complexo, detalhado, muitas vezes com linguagem, dados e apresentação incompreensíveis para o leigo. O RIMA é a parte mais visível (ou compreensível) do procedimento, verdadeiro instrumento de comunicação do EIA ao administrador e ao

8 BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da

discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 33.

9 CF, art. 225, § 1º, IV; Lei Federal 6.938/1981, art. 8º, II; Decreto 99.274/1990, art. 7º, II, com a redação

determinada pelo Decreto 3.942/2001; e Resolução CONAMA 237/1997, art. 3º.

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11

público”.11

4.1.2. Conceito

Impacto (do latim impactus) significa “choque” ou “colisão”;12 vem do

particípio passado do verbo impingere, com o sentido de impingir ou forçar contra. Na terminologia do direito ambiental, a palavra aparece também com esse sentido de “choque” ou “colisão” de substâncias (sólidas, líquidas ou gasosas), de radiações ou de formas diversas de energia, decorrentes da realização de obras ou atividades, com danosa alteração do ambiente natural, artificial, cultural ou social.13 É o

que se impinge à natureza, forçando ou contrariando suas leis.

Para a lei, impacto ambiental é “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam:

I – a saúde, a segurança e o bem-estar da população; II – as atividades sociais e econômicas;

III – a biota;

IV – as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente; V – a qualidade dos recursos ambientais”.14

Qualificar e, quanto possível, quantificar antecipadamente o impacto ambiental é o papel reservado ao EIA, como suporte para um adequado planejamento de obras ou atividades que interferem no ambiente. É certo que, muitas vezes, a previsão dos efeitos nefastos de um projeto pode ser muito delicada, pois algumas modificações do equilíbrio ecológico só aparecem bem mais tarde. Daí a correta consideração do EIA como “procedimento administrativo de prevenção e de monitoramento dos danos ambientais”.15

O EIA, em síntese, nada mais é que “um estudo das prováveis modificações nas

11 BENJAMIN, Antonio Herman V. Op. cit.., p. 33.

12 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário da língua portuguesa.;

AULETE, Caldas. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa..

13 CUSTÓDIO, Helita Barreira. A avaliação de impacto ambiental no direito brasileiro. Revista de direito

civil, vol. 45, p. 72.

14 Art. 1º da Resolução CONAMA 1, de 23.1.1986.

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12

diversas características socioeconômicas e biofísicas do meio ambiente que podem resultar de um projeto proposto”.16

4.1.3. Objetivo

Nenhum outro instrumento jurídico melhor encarna a vocação preventiva do direito ambiental do que o EIA. “Foi exatamente para prever (e, a partir daí, prevenir) o dano, antes de sua manifestação, que se criou o EIA. Daí a necessidade de que o EIA seja elaborado no momento certo: antes do início da execução, ou mesmo de atos preparatórios, do projeto”.17

Numa palavra: através desse revolucionário instrumento, procura-se reverter arraigado e peculiar hábito de nosso povo de apenas correr atrás dos fatos, não se antecipando a eles – a tranca só é colocada na porta depois de arrombada!

Para bem cumprir seu desiderato básico – a prevenção da danosidade ambiental –, sujeita-se o EIA a três condicionantes básicos: a transparência administrativa, a consulta aos interessados e a motivação da decisão ambiental.

A transparência administrativa considera os efeitos ambientais de um determinado projeto, alcançada no momento em que o órgão público e o proponente liberam todas as informações de que dispõem, respeitado apenas o sigilo industrial.

A consulta aos interessados consiste na efetiva participação e fiscalização da atividade administrativa por parte da comunidade, a ponto de poder exprimir suas dúvidas e preocupações antes que seja muito tarde.18 De fato, não basta que o procedimento do

EIA seja transparente. Há que ser, de igual forma, participativo, pois uma decisão ambiental arbitrária, mesmo que absolutamente transparente, não atende ao interesse público.

A motivação da decisão ambiental baseia-se no princípio de que “existe uma obrigação de motivar todo ato criador de situações desfavoráveis para o administrado”.19

De tal arte, quando a Administração opta por uma das alternativas apontadas pelo EIA

16 JAIN, R. K. et al. Environmental impact analysis, p. 3.

17 BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da

discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 30.

18 PRIEUR, Michel. Droit de l’ environnement, pp. 90-91.

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13

que não seja, ambientalmente falando, a melhor, ou quando deixa de determinar a elaboração do EIA por reconhecer a inexistência de “significativa degradação”,20 deve

fundamentar sua decisão, inclusive para possibilitar seu questionamento futuro pelo Poder Judiciário.21

4.1.4. Base legal

No Brasil, o EIA não nasceu com a moldura que hoje tem. Surgiu em pleno regime ditatorial, quase que à sorrelfa, como se os responsáveis pela sua introdução no ordenamento desejassem escondê-lo dos grupos de pressão da época.

O tratamento legal do EIA foi dado pela Resolução CONAMA 1, de 23.1.1986, que o elegeu como modalidade de avaliação de impacto ambiental para as obras elencadas no seu art. 2º, com os seguintes termos:

“Art. 2º Dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental- RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA em caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente, tais como22:

I – estradas de rodagem com duas ou mais faixas de rolamento; II – ferrovias;

III – portos e terminais de minério, petróleo e produtos químicos;

IV – aeroportos, conforme definidos pelo inc. I do art. 48 do Decreto-lei 32, de 18.11.1966;

V – oleodutos, gasodutos, minerodutos, troncos coletores e emissários de esgotos sanitários;

VI – linhas de transmissão de energia elétrica, acima de 230 kV;

VII – obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como:23

barragem para fins hidrelétricos, acima de 10 mW, de saneamento ou de irrigação, abertura de canais para a navegação, drenagem e irrigação, retificação de cursos d’água, abertura de barras e embocaduras, transposição

20 Art. 225, § 1º, IV, da CF.

21 BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da

discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, pp. 29-32.

22 Grifos nossos. 23 Grifamos.

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14

de bacias, diques;

VIII – extração de combustível fóssil (petróleo, xisto, carvão);

IX – extração de minério, inclusive os da classe II, definidos no Código de Mineração;24

X – aterros sanitários, processamento e destino final de resíduos tóxicos ou perigosos;

XI – usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10 mW;

XII – complexo e unidades industriais e agroindustriais (petroquímicos, siderúrgicos, cloroquímicos, destilarias de álcool, hulha, extração e cultivo de recursos hídricos);

XIII – distritos industriais e zonas estritamente industriais- ZEI;

XIV – exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 ha ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental;

XV – projetos urbanísticos, acima de 100 ha, ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério do IBAMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes;

XVI – qualquer atividade que utilizar carvão vegetal, derivados ou produtos similares, em quantidade superior a dez toneladas por dia;25

XVII – projetos agropecuários que contemplem áreas acima de 1.000 ha ou menores, neste caso, quando se tratar de áreas significativas em termos percentuais – ou de importância do ponto de vista ambiental, inclusive nas áreas de proteção ambiental;26

XVIII – nos casos de empreendimentos potencialmente lesivos ao patrimônio espeleológico nacional”.27

Pois bem. Para que se possa analisar corretamente a questão referente à exigibilidade e aos limites de aplicação da Resolução CONAMA 1/1986, cumpre enfatizar novamente que ela foi editada sob o anterior regime constitucional, o da Emenda

24 O art. 5º do Decreto-lei 227, de 28.02.1967 (Código de Mineração), que estabelecia as classes de jazidas,

foi revogado pelo art. 3º da Lei Federal 9.314, de 14.11.1996.

25 Redação determinada pela Resolução CONAMA 11, de 18.3.1986. 26 Inciso acrescentado pela Resolução CONAMA 11, de 18.3.1986.

27 Inciso acrescentado pela Resolução CONAMA 5, de 6.8.1987. Esta Resolução foi revogada pela

(16)

15

Constitucional 1/1969, época em que não havia nenhuma disposição nomeada como “proteção ambiental” ou algo que o valha.

As matérias que compõem essa nova designação eram tratadas sob a forma de competência legislativa da União para dispor sobre “defesa e proteção da saúde”; “jazidas, minas e outros recursos minerais”; “metalurgia, florestas, caça e pesca” e “águas”.

Nesse contexto, amenizado com uma pitada dos novos ventos que indicavam já a necessidade de uma melhor disciplina das atividades que pudessem causar algum dano ao meio ambiente, é que veio a ser editada a Resolução CONAMA 1/1986, que atendia aos então objetivos perseguidos pela Lei Federal 6.938/1981.

Nos termos, pois, dessa Resolução, todas as “atividades modificadoras do meio ambiente”, nela exemplificativamente listadas, dependiam da elaboração de “estudo de impacto e respectivo relatório de impacto ambiental”, sem o que não poderiam ser licenciadas.

Ocorre, no entanto, que essa Emenda é página virada na história republicana do Brasil.

Desde o dia 5.10.1988 o País vive sob novo regime constitucional, no qual, entre outras inovações, somente é exigível EIA/RIMA “para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente” (art. 225, § 1º, IV, da CF).

Ou seja, nos termos da nova ordem constitucional, somente quando houver significativa degradação do meio ambiente poderá ser exigido o EIA/RIMA. Isso, e apenas dessa forma, está na Constituição. Qualquer outra disposição que houver na legislação infraconstitucional deve se conformar e assim ser interpretada.

Assim é que, dessa aplicação da lei no tempo, alcança-se a conclusão de que os casos exemplificativamente listados na Resolução CONAMA 1/1986 só são passíveis de apresentação de EIA/RIMA se e quando houver significativa degradação ambiental. 4.1.5. Pressuposto do EIA: significativa degradação

Como espécie de um instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente, não pode o EIA erigir-se em entrave à liberdade de empreender, contrariando um dos mais

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sensíveis objetivos dessa política, que diz com a incessante busca da possível “compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico”.28

Por seu alto custo e complexidade, deve ser usado com parcimônia e prudência, de preferência para os projetos mais importantes sob a ótica ambiental.

Este o sentido da lei brasileira, ao fazer depender o seu desencadeamento apenas ante o vislumbre de significativa degradação que o empreendimento possa causar ao ambiente.29

Não constitui tarefa fácil, entretanto, precisar o conceito de significativa degradação, dado que na implantação de um projeto sempre haverá “alteração adversa das características do meio ambiente”.30 Muitas vezes o insignificante se reveste da maior

significância, como ocorre, por exemplo, quando “um determinado projeto tenha exatamente o condão de romper o ponto de saturação ambiental de uma certa área. Neste caso, evidentemente, seu impacto não pode ser considerado insignificante por menor que seja”.31

Como saber, então, se uma obra ou atividade será potencialmente causadora de significativa degradação sem ter antes um estudo de impacto ambiental?

Para fugir à incômoda situação referida, o critério engendrado pelo legislador brasileiro foi o de e/laborar uma lista positiva enumerando as obras e atividades capazes de produzir efeitos ambientais indesejáveis. Fê-lo, basicamente, por meio do art. 2º da Resolução CONAMA1/1986.

4.1.5.1. O cunho exemplificativo do art. 2º da Resolução CONAMA 1/1986

Nada obstante o intento do legislador em clarear os limites de incidência do EIA, a dúvida remanesce, na exata medida em que o art. 2º da Resolução CONAMA

28 Art. 4º, inciso I, da Lei Federal 6.938/1981.

29 Art. 225, § 1º, inciso IV, da CF; art. 8º, inciso II, da Lei Federal 6.938/1981; art. 7º, II, do Decreto

99.274/1990, com a redação determinada pelo Decreto 3.942/2001, e art. 3º da Resolução CONAMA 237/1997.

30 Art. 3º, II, da Lei Federal 6.938/1981.

31 BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da

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1/1986 apresentou um elenco meramente exemplificativo das obras e atividades que, presumidas de maior potencial ofensivo, estariam a demandar a realização de prévio estudo de impacto ambiental. Vale dizer, esse elenco não é numerus clausus. É o que se depreende da expressão “tais como”, que precede a enunciação do referido art. 2º.

Nessa ordem de ideias, nada obsta que o órgão ambiental, defrontando-se com atividade não constante do rol mencionado, mas capaz de sensível degeneração do ambiente, determine a realização do EIA. É o que ocorre, por exemplo, com a instalação de incineradores de lixo doméstico ou industrial, não citados pela resolução, apesar de seu grande potencial poluidor, com emissão de dioxinas, metais pesados e organoclorados de maneira geral.32 Foi o que também ocorreu com o plantio de sementes geneticamente

modificadas, não previsto no rol do citado art. 2º, mas cujo EIA/RIMA foi exigido por determinação judicial, em razão de ainda não se saber, com segurança, se o resultado da prática será para o bem ou para o mal. A questão foi discutida em relação à soja Roundup Ready, patenteada pela multinacional Monsanto, que teve o seu plantio em nosso País suspenso por liminar concedida em ação civil pública ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor- IDEC, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis- IBAMA e pela ONG Greenpeace, até que, por regular estudo prévio de impacto ambiental, se pudesse aferir a segurança do produto para o consumo humano e o meio ambiente.33 Este precedente, aliás, ensejou a edição da

Resolução CONAMA 305, de 12.6.2002, dispondo sobre Licenciamento Ambiental, Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto no Meio Ambiente para atividades e empreendimentos com organismos geneticamente modificados e seus derivados.

Destarte, além do órgão administrativo licenciador, também o Judiciário pode suprir o vácuo legal e determinar a realização de EIA/RIMA sempre que a obra ou atividade for capaz de desencadear dano sensível ao ambiente, ou, na linguagem da Lei

32 Neste aspecto, vale lembrar caso em que o Ministério Público paulista obteve liminar em ação civil

pública promovida em face da Municipalidade de São Paulo, obstando celebração de contratos e o início de obras para instalação de quatro usinas incineradoras e de compostagem de lixo urbano, nos bairros de Sapopemba e Santo Amaro. O argumento central residia exatamente na ausência de prévio estudo de impacto ambiental para o licenciamento de atividades tão agressivas ao meio ambiente, dado que a queima daqueles resíduos poderia produzir complexos de compostos orgânicos clorados, genericamente denominados policloro-dibenzo-dioxinas - PCDD e policloro-dibenzo-furanos - PCDF, dentre os quais se contam algumas das substâncias mais tóxicas conhecidas pelo homem.

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Maior, uma significativa degradação ambiental.

4.1.5.2. O caráter de presunção da gravidade do impacto

Duas situações, portanto, despontam para a aferição da gravidade do impacto. A primeira, que apresenta um rol de atividades nas quais a significância é presumida, vinculando o administrador, que, preso à lei, não pode transigir. A segunda, que engloba os casos rebeldes à previsão legal específica, cuja apreciação, seja para exigir o estudo, seja para dispensá-lo, fica entregue ao poder discricionário – mas não arbitrário – do órgão de gestão ambiental.

Posta assim a questão, novo complicador surge, entretanto, quando se questiona o caráter de presunção absoluta (juris et de jure) que se empresta às hipóteses da Resolução CONAMA 1/1986, pregando-se que a forma expressa e impositiva do art. 2º (“dependerá de elaboração de estudo”)34 deve ser lida e entendida mais brandamente,

como “poderá depender de elaboração de estudo”.

Na doutrina tem prevalecido o entendimento de que as hipóteses de atividades estabelecidas pela Resolução 1/1986 estão regidas pelo princípio da obrigatoriedade, segundo o qual a Administração deve, e não simplesmente pode, determinar a elaboração do EIA. Ou seja, o elenco constante do art. 2º somente é exemplificativo para possibilitar o acréscimo de atividades, sendo, porém, obrigatório quanto àquelas relacionadas. Há nesses casos, por assim dizer, uma presunção absoluta de necessidade, que retira o EIA do âmbito do poder discricionário da Administração.35

34 Grifo nosso.

35 Assim, BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da

discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, pp. 40-41; Paulo Affonso Leme Machado, para quem “a vantagem de se arrolarem algumas atividades no art. 2º obriga também a própria Administração Pública, que não pode transigir, outorgando a licença e/ou autorização sem o EPIA” (Direitoi ambiental brasileiro, p. 274); Sílvia Cappelli, mais incisiva, assevera: “[a] vantagem do rol exemplificativo constante da Resolução do CONAMA é retirar a discricionariedade da Administração Pública para licenciar tais empreendimentos. Constem eles daquele rol, o órgão licenciador não poderá dispensar o EIA/RIMA, sob pena de nulificar o procedimento administrativo, eis que se trata de ato vinculado” (O estudo de impacto ambiental na realidade brasileira, Revista do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, nº 27, p. 54). ÁVILA, Elna Leite; ALMEIDA, Ione Monteiro de, de seu turno, sustentam que o licenciamento de qualquer atividade listada na Resolução 001/1986, sem o EIA, pode ensejar a prática do crime de prevaricação, sem prejuízo da responsabilidade civil e administrativa do agente público (O estudo de impacto ambiental – Licenciamento – Responsabilidade criminal. Revista do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, pp. 179-180); MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental. Aspectos da legislação brasileira, pp. 54-63.

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Desse sentir não comunga Yara Maria G. Gouvêa, ex-advogada da CETESB – a agência ambiental paulista –, para quem a enumeração constante do art. 2º da Resolução é exemplificativa para mais e para menos, de sorte a se poder exigir o EIA/RIMA de atividade nele não prevista, se potencialmente tiver significativo impacto ambiental, como também dispensar-se tal estudo quando, apesar de prevista no citado art. 2º, seu impacto potencial não for significativo. É claro, diz, que “tais decisões devem ser sempre justificadas e fundamentadas, seja quando o EIA/RIMA é exigido para atividade não elencada, seja quando o deixa de ser para aquelas constantes da enumeração. Com isto, evita-se a adoção de medidas arbitrárias ou mesmo possíveis alegações de falta de cuidado e de critério no trato do meio ambiente”.36

Baseia a ilustre advogada sua conclusão na obscura redação do art. 2º sob análise, onde, no rol das obras ou atividades tidas como impactantes, ao lado de algumas clara e minudentemente descritas, outras aparecem referidas muito superficialmente, e outras, ainda, remetem sua definição à autoridade administrativa. E exemplifica:

(a) O inciso VII se refere a “obras hidráulicas para exploração de recursos hídricos, tais como: barragem para fins hidrelétricos, acima de 10 mW, de saneamento ou de irrigação [...]”.

No mesmo art. 2.º, como se vê, é repetida a expressão “tais como”, seguida de uma lista de obras que, habitualmente, são de grande porte e causadoras de significativo impacto ambiental. Ocorre que, a prevalecer o entendimento de que a relação deve ser obedecida in totum, sem a utilização de qualquer critério, teremos, por exemplo, no caso de barragens para fins hidrelétricos, que apenas as concebidas para gerar mais de 10 mW estariam obrigatoriamente sujeitas à elaboração do EIA/RIMA (abaixo não). Já obras hidráulicas de iguais características, porém de volume e impacto muito menores (equivalentes, por exemplo, a 5 mW), se para fins de irrigação ou saneamento, estariam sempre sujeitas à elaboração daquele Estudo. Assim, não se admitindo o uso de critério do órgão ambiental no julgamento da matéria, até mesmo uma pequena barragem num córrego, para irrigação de uma horta familiar, dependeria do EIA/RIMA;

36 Esse posicionamento encontra-se estampado no Parecer PJ 130, de 03.07.1989, aprovado pelo Conselho

Estadual do Meio Ambiente de São Paulo, por meio da Deliberação CONSEMA 20, de 27.7.1990, e posteriormente ratificado pelo Parecer PJ 241, de 16.11.1989, ambos publicados no documento Avaliação de Impacto Ambiental, pp. 11-23.

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(b) O inciso XIV se reporta à “exploração econômica de madeira ou de lenha, em áreas acima de 100 ha ou menores, quando atingir áreas significativas em termos percentuais ou de importância do ponto de vista ambiental”.37

Neste caso, o que se constitui em “área significativa em termos percentuais”? 50%, 75%, 80%? E “área de importância do ponto de vista ambiental”, o que vem a ser? Como se vê, também este dispositivo pressupõe a utilização de critério pelo órgão ambiental no exame de cada caso concreto para a exigência ou não do EIA/RIMA;

(c) O inciso XV, à sua vez, faz menção a “projetos urbanísticos, acima de 100 ha, ou em áreas consideradas de relevante interesse ambiental a critério do IBAMA e dos órgãos municipais e estaduais competentes”.38

À evidência, não pode ser tida como absoluta uma listagem que deixa decisões e definições a critério do órgão de controle. As áreas de “relevante interesse ambiental” (não definidas legalmente), se não integrantes de uma unidade de conservação ou se já não tiverem sido assim previamente consideradas, deverão ser identificadas, em cada caso concreto, à vista de suas características, e de acordo com o julgamento feito pelo órgão ambiental...

Ora, arremata a autora, para que um elenco possa ser considerado “obrigatório em todos os seus termos, não admitindo o uso de critério pelo aplicador da norma, deve ser preciso, exato, não podendo dar margem a dúvidas ou a interpretações casuísticas”.39

Parece-nos, então, que a maneira de contornar a divergência e atender ao comando impositivo da norma será considerar como relativa a presunção de gravidade do impacto nos casos enumerados no art. 2º da Resolução CONAMA 1/1986.

A presunção relativa (juris tantum), como se sabe, tem o condão de inverter o ônus da prova, de sorte que o Administrador, à vista de um caso listado, determinará a elaboração do EIA. O empreendedor, querendo, poderá produzir prova no sentido de que a obra ou atividade pretendida não provocará impacto ambiental significativo. Portanto, em vez de o agente público ter de provar a significância do impacto, é o empreendedor quem deve provar sua insignificância.

No entanto, a consagração definitiva da tese da presunção relativa veio com a

37 Grifos nossos. 38 Grifos nossos.

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Resolução CONAMA 237/1997, que, ao disciplinar a incorporação do sistema de licenciamento aos instrumentos de gestão ambiental, assentou, em seu art. 3º:

“Art. 3º A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação.

Parágrafo único. O órgão ambiental competente, verificando que a atividade ou empreendimento não é potencialmente causador de significativa degradação do meio ambiente, definirá os estudos ambientais pertinentes ao respectivo processo de licenciamento”. (Grifos acrescidos).

Destarte, com base em todos esses atos normativos e ideias que referendam a tese da relatividade da presunção de significativo impacto ambiental das atividades relacionadas no art. 2º da Resolução CONAMA 1/1986, é possível concluir que o órgão de controle mantém certa dose de liberdade para avaliar dito pressuposto do EIA/RIMA, isto é, o significativo impacto ambiental. Evidenciada, porém, por regular prova técnica, a insignificância do impacto, torna-se inviável a exigência do estudo.

Com isso, obvia-se a transformação de um instrumento tão importante como o EIA em mera exigência formal, imposta sem critério, e que, muitas vezes, pode inviabilizar obras necessárias – pense-se, por exemplo, num pequeno aterro sanitário, em área desprovida de especial interesse para o meio ambiente –, em razão dos altos custos a serem incorridos com a sua contratação.

4.1.6. Momento de preparação

Dado o seu papel de instrumento preventivo de danos, é claro que, para cumprir sua missão, deve ser elaborado antes da decisão administrativa de outorga da licença para a implementação de obras ou atividades com efeito ambiental no meio considerado. Daí o nomen juris que lhe dá a Constituição: “estudo prévio de impacto ambiental”.40

Integrando o processo de licenciamento, o EIA não pode ser enxergado como

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um documento cartorial, burocrático apenas, mas um estudo sério, completo e exaustivo, que permita o conhecimento das condições ambientais preexistentes ao empreendimento, a real dimensão dos danos que o mesmo pode causar e a eficácia das medidas preventivas e mitigadoras propostas, para que seja possível aprovar-se, com segurança, o seu licenciamento. Seu objetivo maior visa, assim, a “influir no mérito da decisão administrativa de concessão da licença. Se esta já foi expedida ou mesmo se a decisão já está tomada, o EIA perde a sua ratio, não tendo qualquer valor”.41

E se, malgrado a necessária anterioridade do estudo, a obra ou atividade sujeita à sua disciplina já estiver em andamento ou em franco funcionamento?

Aí, evidentemente, não mais terá cabimento o EIA, com a liturgia desenhada na Resolução CONAMA 1/1986, certo que, segundo a Constituição, é sempre prévio, mas sim outras espécies de estudos de avaliação destinados a acompanhar ou controlar os possíveis impactos ambientais.

Neste sentido, vale lembrar que a Resolução CONAMA 6/1987, ao disciplinar o licenciamento ambiental de obras de grande porte, especialmente do setor de geração de energia elétrica, se preocupou com a questão, engendrando interessante fórmula que pode servir de modelo para a regularização de obras que, por razões intertemporais, ficaram imunes à prévia avaliação de seus impactos sobre o meio ambiente.42

Dessa forma, como bem pondera Antonio Inagê de Assis Oliveira,

“ainda nos casos em que não seja obrigatória a apresentação de um estudo de avaliação de impacto ambiental complexo e integrado (o legalmente denominado de estudo de impacto ambiental), nem do respectivo Rima,

41 BENJAMIN, Antonio Herman V. Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da

discricionariedade administrativa. Revista forense, vol. 317, p. 30. Neste aspecto, Sílvia Cappelli sustenta que “o licenciamento ambiental deferido antes do julgamento do EIA/RIMA determina responsabilidade objetiva da Administração pelos danos advindos ao meio ambiente, nos termos do art. 37, § 6º, da CF” (O estudo de impacto ambiental na realidade brasileira, Revista do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, nº 27, p. 57).

42 Cf. art. 12, §§ 1º a 5º, da Resolução CONAMA 6/1987. Lembre-se, a propósito, de avaliação de impacto

ambiental encetada 11 anos após o início das obras da Usina Hidroelétrica de Três Irmãos, localizada no baixo curso do Rio Tietê, em Pereira Barreto/SP, em razão de se ter detectado impactos ambientais e socioeconômicos de vulto, não equacionados pela empreendedora. A liminar prontamente concedida pelo Poder Judiciário, a pedido do Ministério Público, em 1990, impediu o fechamento das adufas da barragem até a aprovação dos estudos referente à obra (Proc. 16/1990). No Estado de São Paulo, a Secretaria do Meio Ambiente, pela Resolução SMA 1, de 02.01.1990, visando ao controle mais eficaz das condições ambientais, criou a possibilidade de se exigir estudos ambientais para atividades iniciadas, mesmo que já tenham alguma licença.

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tem o empreendedor que atender a pedidos de esclarecimentos do órgão ambiental, mesmo que isso o obrigue a custear a realização de estudos sob aspectos particulares do projeto e suas consequências sobre o meio ambiente”.43

A conclusão inelutável a que se chega, portanto, independentemente da questão da validade ou não da licença já expedida, é que sempre poderá ser exigido um estudo de avaliação de impacto ambiental, desde que possível obviar ou remediar uma situação crítica ao ambiente, e que a sua não elaboração no momento azado rende ensejo ao acertamento da responsabilidade – administrativa, civil e penal – de quem se omitir do dever de exigi-lo.

4.1.7. Iniciativa da exigência

Como procedimento público que é, e coerente com o princípio da distribuição de competências em matéria de gestão ambiental subministrada pela Lei Complementar 140/2011, a coordenação do processo de exigência do EIA foi entregue aos órgãos ambientais dos três níveis de Poder, em obediência à responsabilidade comum que lhes é inerente e segundo o disposto nos arts. 7º a 10 da referida Lei.

É claro que, omitindo-se o órgão público do seu poder-dever de exigir o Estudo quando presente o risco de deterioração significativa da qualidade ambiental, cabe ao Ministério Público (ou a qualquer outro legitimado por lei), como tutor dos interesses sociais e individuais indisponíveis, atuar no sentido de garantir a sua realização, inclusive pela via judicial.44

4.1.8. Elaboração

Como documento científico complexo, envolvendo área de conhecimento de setores diversos da técnica e da ciência, não poderia o EIA ficar a cargo de uma única pessoa, de um superprofissional.

Daí a opção do legislador brasileiro por deixá-lo em mãos de diferentes

43 OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. O licenciamento ambiental, p. 129. 44 Arts. 127, caput, e 129, III, da CF.

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especialistas, ou, como queiram, de uma equipe multidisciplinar habilitada. De fato, segundo reza o art. 11 da Resolução CONAMA 237/1997, “os estudos necessários ao processo de licenciamento deverão ser realizados por profissionais legalmente habilitados”. Ao falar em profissionais habilitados, no plural, em sintonia, aliás, com o disposto no art. 17, § 2º, do Decreto 99.274/1990, que se refere a “técnicos habilitados”, dúvida inexiste de que a intenção foi manter o caráter multidisciplinar da equipe (lex minus dixit quam voluit).45

“Multidisciplinar é a característica que se atribui a um tema, objeto ou abordagem para cuja exposição concorrem duas ou mais disciplinas”. No trato multidisciplinar de uma questão, os especialistas nas várias disciplinas envolvidas no estudo não se reúnem necessariamente em função de um nexo ou compromisso entre si, posto que cada qual vê e trata o seu objeto unicamente com seus próprios critérios.46

Destarte, conquanto se busque no EIA um roteiro com nexo perfeito entre os vários aspectos da temática discutida, é possível o surgimento de divergências entre os membros da equipe, as quais, expressadas no RIMA, serão objeto de superior consideração por parte do órgão licenciador.

A habilitação da equipe multidisciplinar se dá com a inscrição de seus membros no Cadastro Técnico Federal de Atividades, sob a administração do IBAMA,47 conforme

definido pela Resolução CONAMA 1/1988. Segundo essa Resolução, somente serão aceitos, para fins de análise, estudos de impacto ambiental cujos elaboradores sejam profissionais, empresas ou sociedades civis regularmente registrados nesse cadastro.48

4.1.8.1. Independência da equipe

No afã de conjurar qualquer suspeita de parcialidade da equipe técnica, a Resolução CONAMA 1/1986 exigiu, em seu art. 7º, fosse ela independente do proponente do projeto.

45 Neste sentido: MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Impacto ambiental. Aspectos da legislação brasileira, p.

87; BUGALHO, Nelson R. Estudo prévio de impacto ambiental. Revista de direito ambiental, vol. 15, p. 22.

46 COIMBRA, José de Ávila Aguiar. O outro lado do meio ambiente, pp. 292-294. 47 Arts. 9º, VIII e 17, I, da Lei Federal 6.938/1981.

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Hoje essa exigência não mais prevalece, ante a expressa revogação do referido dispositivo pelo art. 21 da Resolução CONAMA 237/1997.

Aliás, na prática, tal independência era mesmo ilusória, na medida em que, por falta de norma regulamentar, as consultorias vinham sendo contratadas pelo empreendedor, por conta de quem também corriam todas as despesas e custos referentes à realização do EIA.49

Sempre duvidamos da pertinência de tal desígnio, tendo mesmo escrito, ainda sob o império do comando legislativo anterior, que a contratação para a elaboração de um estudo de impacto ambiental estabelece, de imediato, um forte vínculo de dependência econômica e jurídica entre contratante e contratado, circunstância que a Resolução quis impedir.

Realmente, a fórmula legislativa então insculpida no art. 7º da Resolução CONAMA1/1986, proclamando a independência da equipe, foi além do que queria o legislador (lex plus dixit quam voluit), gerando indisfarçável contradição.

Em primeiro lugar, por ter extravasado o conteúdo de normas de superior hierarquia, visto que nem a Constituição Federal,50 nem a legislação federal

regulamentadora do assunto contêm a condição limitativa prevista no revogado art. 7º da citada Resolução. O art. 17, § 2º, do Decreto 99.274/1990, que regulamentou a Lei Federal 6.938/1981, dispõe expressamente que “o estudo de impacto ambiental será realizado por técnicos habilitados e constituirá o Relatório de Impacto Ambiental- RIMA, correndo as despesas à conta do proponente do projeto”. Nenhuma alusão, como se vê, à independência da equipe.

Em segundo lugar, por ensejar o florescimento da chamada “indústria do EIA/RIMA” pelos escritórios de consultoria privada,51 marginalizando os técnicos

vinculados ao empreendedor (público ou privado), muitas vezes os mais competentes e bem informados a respeito da situação objeto do estudo.

49 Art. 8º da Resolução CONAMA 1/1986. 50 Art. 225, § 1º, IV, da CF.

51 Há registros de estudos estandardizados, elaborados em série, “ao gosto do freguês”, apenas com espaço

em branco para a inserção do nome do empreendedor. Lembra, com efeito, Paulo Nogueira Neto, um dos pioneiros da causa ambientalista no Brasil, de certa consultora contratada para elaborar estudo de impacto ambiental sobre um projeto de exploração de jazida mineral para a produção de pedregulho, e que, por engano, fez constar do documento argumentação dirigida ao licenciamento de uma padaria! (EIA/RIMA – O conflito e a solução. Bio – Revista da associação brasileira de engenharia sanitária e ambiental, p. 21).

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Por isso, advogava-se, com boa dose de razão, a plausibilidade da elaboração do EIA/RIMA por equipe técnica vinculada ao proponente do projeto, com o que se asseguraria, a um só tempo, “a necessária responsabilidade técnica e jurídica em relação à execução substantiva do referido estudo e a minimização dos custos a serem incorridos, com expressiva vantagem não só para o interessado, bem como para os que indiretamente possam dele se beneficiar. Essa questão torna-se sobremaneira expressiva no caso dos projetos de interesse público, para os quais as empresas ou entidades públicas já mantêm profissionais técnicos de grande valor em seus respectivos quadros, dispensando-se as contratações custosas e nem sempre confiáveis”.52

Há também os que propugnam pelo envolvimento direto do órgão público ambiental na elaboração do EIA, uma vez que, com tal procedimento, “o empreendedor queimaria etapas e ficaria ciente de todas as regulamentações e normas afetas ao seu empreendimento pelos planos oficiais”.53

Cremos difícil, sem profunda alteração legislativa, a adoção desse sistema entre nós, uma vez que é o órgão público ambiental quem determina a realização do estudo; fixa suas diretrizes; estabelece os prazos para conclusão e análise,54 bem como para o

recebimento dos comentários feitos por outros órgãos públicos e demais interessados; realiza audiência pública55 e se manifesta de forma conclusiva sobre o estudo

apresentado.56 Seria então o órgão público fiscal de si mesmo?

A seriedade com que a matéria merece ser tratada recomenda permaneça o órgão público ambiental fora do processo executório do EIA, articulado com pessoal técnico especializado, precisamente para fazer a contraface das equipes elaboradoras do EIA/RIMA, custeadas pelos empreendedores. Dessa forma – pondera Alaor Caffé Alves –, “a neutralidade dos estudos de impacto ambiental será garantida não por uma eventual (e até mesmo impossível) independência da equipe elaboradora do estudo em face do

52 ALVES, Alaor Caffé. Elaboração de EIA/RIMA diretamente pelo proponente. Parecer CJ 73, de

22.2.1990, emitido em razão de consulta da Companhia Energética de São Paulo- CESP, a respeito da possibilidade de aceitação, pela Secretaria do Meio Ambiente de São Paulo, de estudo de impacto ambiental elaborado por sua equipe técnica, pp. 3 e 4 (inédito).

53 CLAUDIO, Celina F. Bragança Rosa. Implicações da avaliação de impacto ambiental. Revista CETESB

de tecnologia, p. 162.

54 Art. 5º, par. único, da Resolução CONAMA 1/1986. 55 Art. 11, § 2º, da Resolução CONAMA 1/1986. 56 Art. 10, caput, da Resolução CONAMA1/1986.

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proponente, mas sim precisamente pela existência de uma contraequipe técnica governamental que examinará o EIA/RIMA, do ponto de vista do interesse público envolvido”,57 verificando se foi elaborado com base em boas técnicas e em aderência às

normas e regulamentos pertinentes.

Isto posto, pensamos, andou bem o CONAMA ao referendar aquilo que a prática já apontava como mais sensato – a vinculação da equipe técnica ao proponente do projeto –, até porque não se pode perder de vista que é o empreendedor o maior interessado na qualidade do EIA, a qual sempre poderá ser questionada por qualquer do povo, via ação popular,58 ou pelos legitimados para a tutela jurisdicional do meio ambiente, via ação civil

pública.

4.1.8.2. Responsabilidade do empreendedor e da equipe

Diz a Resolução CONAMA 237/1997 que o empreendedor e os profissionais que subscreverem os estudos necessários ao processo de licenciamento serão responsáveis pelas informações apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais.59

Configuremos um exemplo, para melhor explicitação.

Como se sabe, dentre outros, depende de elaboração de EIA/RIMA o licenciamento de “usinas de geração de eletricidade, qualquer que seja a fonte de energia primária, acima de 10 mW”.60 Pois bem. Imagine-se um EIA que tenha instruído o

processo licenciatório de uma usina hidroelétrica que, na fase de funcionamento, passou a comprometer, de forma irreversível, o clima e o ecossistema da região, por falha técnica ocorrida na fase do projeto.

57 ALVES, Alaor Caffé. Op. cit., p. 7. Permanece, é certo, a dificuldade hoje enfrentada por alguns órgãos

ambientais de Estados menos desenvolvidos, não estruturados com equipes preparadas para atender tal atribuição com a desejável eficiência. Pertinente, nessa conjuntura, a recomendação de Michel Prieur no sentido de que o controle do conteúdo dos estudos pelos poderes públicos seja feito em colaboração com institutos científicos independentes. Um verdadeiro estudo de impacto – completa o renomado jurista francês – implica pesquisas pluridisciplinares que levam a disciplinas científicas diferentes. É por isso que os institutos de pesquisa e principalmente as universidades parecem ser os órgãos mais importantes e competentes, capazes de reunir equipes pluridisciplinares, oferecendo o máximo de garantia, objetividade e seriedade (PRIEUR, Michel. Droit de l’ environnement, pp. 104 e 105).

58 Art. 5º, LXXIII, da CF.

59 Art. 11, par. único, da Resolução CONAMA 237/1997. 60 Art. 2º, XI, da Resolução CONAMA1/1986.

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Como o empreendedor e os profissionais que participaram do estudo responderão pelo dano ao meio ambiente?

Como bem pondera Antonio Inagê de Assis Oliveira,

“a responsabilidade técnica referida na Resolução CONAMA 237/1997 não abrange os pareceres, opiniões, ainda que discutíveis tecnicamente, mas apenas os erros derivados de imperícia, negligência ou imprudência, ou o dolo de introduzir dados ou informações incorretas para justificar conclusões distorcidas. O fato da Resolução CONAMA 237/1997 haver imputado também ao empreendedor a corresponsabilidade pelos estudos reforça o ponto de vista de que a punição visa a coibir sejam introduzidos nos estudos de impacto ambiental dados inexatos ou manipulados com a intenção de facilitar o licenciamento do empreendimento”.61

Na esfera administrativa, sujeita-se o empreendedor às sanções estabelecidas no art. 72 da Lei Federal 9.605/1998, enquanto os técnicos, através de procedimentos próprios de sanção, respondem aos Conselhos Profissionais de sua respectiva categoria e ao IBAMA, já que para realizar e subscrever estudo de impacto ambiental, além de registro no órgão de classe correspondente, carecem também de inscrição no Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental, regulamentado pela Resolução CONAMA 1, de 13.06.1988.

No âmbito da responsabilidade civil, é preciso não olvidar que, nos casos de dano ao meio ambiente, a responsabilidade é objetiva,62 informada pela teoria do risco,

sendo suficiente que o prejuízo tenha sido resultado do exercício de determinada atividade e não do comportamento do agente. O empreendedor é quem recolhe os benefícios de sua atividade. Logo, há de ser ele, de preferência, o indicado a suportar os riscos imanentes à referida atividade, cabendo-lhe, de consequência, o dever ressarcitório, pela simples verificação do nexo causal. Indiretamente, o próprio Estado, que, através de órgão seu, tem o poder-dever de coarctar a danosidade ambiental. Não há cogitar de responsabilidade objetiva da empresa de consultoria ou dos profissionais que, por falha humana ou técnica, tenham colaborado no desencadeamento do evento danoso, mesmo porque isso implicaria investigação de conduta culposa, circunstância que não se afeiçoa ao fundamento da

61 OLIVEIRA, Antonio Inagê de Assis. O licenciamento ambiental, p. 206. 62 Art. 14, § 1º, da Lei Federla 6.938/1981.

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responsabilidade objetiva, que rege a matéria ambiental.63 Fica ressalvado ao

empreendedor, é claro, voltar-se regressivamente contra o causador do dano, alcançando, inclusive, o profissional que eventualmente tenha se excedido ou omitido no cumprimento da tarefa a ele cometida.

Por derradeiro, sob o aspecto criminal responderão tanto as pessoas físicas quanto as jurídicas que, de qualquer modo, por culpa em sentido lato, tenham concorrido para a verificação do dano, já que o Direito Penal brasileiro, pela Lei 9.605/1998, superou o exclusivo caráter individual da responsabilidade penal, possibilitando alcançar-se também a pessoa jurídica como sujeito ativo do crime ecológico.64 Assim, considerando

que o estudo de impacto ambiental, apesar de realizado por particulares, é documento público, integrante de um processo oficial de licenciamento, as afirmações falsas ou enganosas, a omissão da verdade, a sonegação de informações ou dados técnico-científicos em relação a ele poderão afrontar o disposto no art. 66 da Lei 9.605/1998 (Lei dos Crimes Ambientais), na medida em que os profissionais técnicos desempenham funções ou atribuições típicas de funcionário público.65

4.1.9. Custeio

Todas as despesas e custos referentes à realização do estudo de impacto ambiental correrão por conta do proponente do projeto, diz a lei.66 O mesmo se diga em

relação ao custo de análise para a obtenção da licença ambiental.67 Realmente, não teria

sentido carregar-se tal responsabilidade a outrem que não o direto interessado no projeto, que é quem, no mais das vezes, irá lucrar com a atividade.

4.1.10. Diretrizes gerais

63 O TJSP, por acórdão da 3ª Câm. Civ., na Ap 80.345-1, da Comarca de Santos, Rel. Des. Toledo César,

votação unânime, de 07.04.1987, encampou esse entendimento ao repudiar discussão de conduta culposa de terceiro nos mesmos autos de processo que apurava responsabilidade civil por danos ao meio ambiente.

64 Art. 3º da Lei Federal 9.605/1998.

65 BUGALHO, Nelson R. Estudo prévio de impacto ambiental. Revista de direito ambiental, vol. 15, p. 26. 66 Art. 17, § 2º, do Decreto 99.274/1990; art. 8º da Resolução CONAMA 1/1986; art. 11 da Resolução

CONAMA237/1997.

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