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40º ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS SIMPÓSIO TEMÁTICO 29 RELIGIÃO, POLÍTICA E DIREITOS NA CONTEMPORANEIDADE

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SIMPÓSIO TEMÁTICO 29 – RELIGIÃO, POLÍTICA E DIREITOS NA CONTEMPORANEIDADE

SOBRE A RELAÇÃO ENTRE RELIGIÃO E DEMOCRACIA EM TRÊS PERSPECTIVAS: UMA REVISÃO DAS CONSIDERAÇÕES DE CHARLES TAYLOR, JURGEN HABERMAS E TALAL ASAD

Eduardo Henrique Araújo de Gusmão (UFCG) Roberta Bivar Carneiro Campos (UFPE) Cleonardo Gil de Barros Maurício Júnior (UFPE)

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1 - CONSIDERAÇÕES INICIAIS

No século XXI, discussões e debates que tomam a religião como problema parecem ocupar todos os lugares. Artigos de jornais, documentários, grupos de discussão on line, blogs, cada um destes espaços e veículos de comunicação, na sua específica esfera de atuação, busca transmitir a história ou narrativa mais envolvente e atual sobre a questão religiosa. São frequentes, por exemplo, relatos que associam a religião com atos de violência ou exploração. No tocante a este aspecto, a consideração de que atitudes motivadas religiosamente precisam ser levadas mais a sério, pelo fato da sua possível associação com ideologias e ações extremistas, é uma das expressões mais repetidas atualmente, seja em universidades ou em redações de jornais.

Compreensivelmente, os episódios relacionados ao 11/09 deram voz e destaque a argumentos desta natureza. Nomes da ciência e da cultura como Richard Dawkins, Sam Harris, Christopher Hitchens, entre outros, estão entre aqueles cujas considerações denunciaram os riscos para o estilo de vida das sociedades ocidentais advindos de comunidades religiosas e defenderam a mecânica relação entre religião e arcaísmo, fé e sectarismo, crença e violência.

Pares, portanto, que compõem as pautas de inúmeros programas e debates no mundo contemporâneo. Como já colocado, uma tendência bastante compreensível. No entanto, um olhar mais atento sobre estas questões revela o quão estreito e seletivo é o foco, seja midiático ou acadêmico, muitas vezes dirigido ao fenômeno religioso e temas correlatos. De um ponto de vista metodológico, não se costuma reconhecer, ou perceber, a diversidade intrínseca às manifestações de um fenômeno social como a religião. Ora, se as expectativas acerca da modernização e do consequente desaparecimento da religião revelaram-se ingênuas, é por que o referido fenômeno, em diferentes fases da modernidade, adquiriu complexidade e relevância. Logo, se há talvez algum consenso no que diz respeito à religião, é que ela está em todos os lugares.

E neste momento do século XXI, as ciências sociais reconhecem que não faz sentido algum omitir a presença deste fenômeno do repertório das explicações da vida em sociedade, sendo muito mais honesto a elaboração de uma compreensão clara das formas através das quais a religião atua como uma das muitas forças que formam, e são formadas, por este, cada vez mais globalizado e conflituoso mundo. Estas considerações

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ensejam portanto a reflexão sobre um tema que é de fundamental importância para este artigo: a relação entre religião e democracia.

São diversos os cenários culturais que atualmente colocam em evidência as implicações surgidas desta relação. Entre várias temáticas, as controvérsias concernem tanto às modificações ocorridas sobre a natureza do fenômeno religioso, como também a crescente complexidade do espaço público das sociedades contemporâneas. Como muito bem mostrou José Casanova, nas sociedades europeias ocidentais, no seio das quais o moderno processo de secularização se desenrolou, a religião não foi mantida nos limites da esfera privada, muito pelo contrário, conseguiu ir além dos tradicionais marcos impostos pelo cuidado pastoral, e hoje alcança a vida pública e apresenta-se como um ator cultural capaz de desafiar forças políticas e sociais dominantes.

Esta circunstância é geradora de uma importante consequência metodológica: o reconhecimento do quanto o campo das reflexões, no âmbito das ciências sociais, é enriquecido pela observação dos conflitos e das configurações nas quais atores religiosos e seculares participam. Esta problemática envolvendo as implicações relacionadas à vida em sociedades democráticas, seculares e religiosamente plurais, bem como as contribuições interpretativas que lhes são dirigidas, define, portanto, o escopo das considerações que virão a seguir.

Estas giram em torno das análises desenvolvidas por três autores: Charles Taylor, Jurgen Habermas e Talal Asad. Seus escritos propõem reavaliações da modernidade que vão ao encontro da proposta deste artigo. Seja no minucioso e extenso estudo desenvolvido por Taylor sobre os sentidos e o alcance da modernidade secular em sociedades ocidentais, nas distintas fases da reflexão de Habermas sobre a questão religiosa, ou na crítica genealógica de Asad dirigida ao universalismo das categorias formadoras do secularismo moderno, estes três autores, em síntese, compartilham a preocupação com a presença da religião na esfera pública de sociedades marcadas pelo pluralismo religioso e cultural. Portanto, com o objetivo de compreender estas três perspectivas, a estrutura deste artigo dedica uma seção a cada um dos referidos autores para, ao final, retornar ao tema principal, isto é, a relação entre religião e democracia, e

apresentar considerações finais.

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2 - TAYLOR E A MORAL SECULAR COMO CONDIÇÃO DO PLURALISMO

A leitura dos trabalhos de Charles Taylor, especialmente os livros As Fontes do Self (1997) e Uma Era Secular (2010) possibilita a compreensão das questões e problemas que definem os rumos e a natureza das relações entre religião e democracia. Imprescindível ao alcance deste entendimento é a identificação das contribuições do autor ao debate sobre os processos de secularização, que se desenvolvem durante a modernidade. Neste tocante, a perspectiva de análise de Taylor, nos dois livros, é filosófica e histórica. Em termos gerais, poderíamos dizer que a sua preocupação é a de erguer um painel interpretativo cujo alcance seja capaz de compreender a modernidade secular como um mundo moral ou uma ontologia moral.

Este ponto é importante porque, ao assumir o propósito de articular e elaborar uma história da identidade moderna, situada no intervalo temporal que segue do século XVI em diante, Taylor problematiza as mudanças ocorridas não como processos que teriam se desenvolvido em bases epistêmicas ou institucionais neutras, mas como experiências com fundamentos morais e espirituais. A análise que os dois livros mencionados acima desenvolvem sobre os processos e transformações, geralmente cobertos pelo conceito de secularização, ressalta este cuidado.

Nestes trabalhos, Charles Taylor problematiza dois significados geralmente associados à noção de secularização, ambos possuidores de uma natureza negativa. O primeiro seria aquele que a concebe como o declínio das crenças e práticas religiosas; o segundo, o que leva em consideração a saída da religião do espaço público. Às duas concepções correspondem explicações sobre a forma como o processo de secularização se desenrola na modernidade. De um lado, teríamos a tese de que o declínio da fé seria o motor que dá força à secularização. Tem-se, portanto, como consequência imediata deste processo, o desaparecimento da religião dos espaços públicos. Outra possibilidade explicativa reverte esta relação: a marginalização da religião na vida social seria o fator que ampliaria o ocaso da fé individual. Se ao lado da primeira explicação teríamos a ciência como a principal força a tornar a crença religiosa problemática, a segunda perspectiva, ao enfatizar a saída da religião do espaço público, traria como causa principal da secularização as mudanças institucionais provocadas pela modernidade.

Ora, Charles Taylor diverge de ambos os entendimentos. E ao fazê-lo, afasta-se das relações causais que tomam o avanço da ciência como o único e exclusivo recurso explicativo para a compreensão da dinâmica histórica da secularização. Para Taylor, é

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imprescindível reconhecer as contribuições advindas da própria religião e o quanto de natureza religiosa os movimentos de laicização ocorridos no Ocidente possuem. Este aspecto é salientado no momento em que o autor considera a Reforma e a feição pessoal assumida pelo Cristianismo do século XVI em diante, quando mediações externas passam a ser rejeitadas e o compromisso interior do crente ganha relevância, tornando-se o espaço da relação individual com Deus (Taylor 2010).

A sua perspectiva, portanto, descortina outros elementos, ao destacar que a passagem para uma época de descrença ocorreu em razão, também, de um apelo moral incontornável que determinadas configurações passaram a ter sobre as pessoas. No que diz respeito ao papel exercido pela ciência neste cenário, os argumentos do autor salientam a sua capacidade de, na companhia de outras fontes morais alternativas, ter transformado a fé numa esfera problemática, sujeita a questionamentos. Nos termos do autor, as perguntas lançadas à modernidade necessitam ser interpretativas, isto é, capazes de fornecer uma definição dessa identidade moderna. Seria necessário, diz ele,

dar uma definição da nova identidade que deixe claro qual era seu atrativo. O que atraiu as pessoas a ela? Na verdade, o que as atrai hoje? O que lhe deu seu poder espiritual? Nós articulamos as visões do bem envolvidas nela. O que essa pergunta requer é uma interpretação da identidade (ou de qualquer fenômeno cultural que nos interesse) que

mostre por que as pessoas acharam-na (ou acham-na)

convincente/inspiradora/motivadora, que identifique o que pode ser chamado de idées-forces que ela contém (Taylor 1997, p.264).

Em relação à consolidação da razão científica como modelo de compreensão do mundo, é preciso entender no que consiste a força de suas ideias e da identidade que lhe diz respeito. Esta repousa sobre configurações que compartilham uma nova perspectiva moral, cujo sentido, nas palavras de Taylor, firma-se sobre uma ética da crença, que recomenda cautela e dúvida diante da realidade de experiências e eventos carentes de evidências. (Taylor, op.cit. p. 518). Ao comentar este processo, Taylor salienta que uma de suas consequências foi a obtenção de certo ganho epistêmico (Taylor, op.cit. p.405), obtido a partir do advento de fontes morais de um tipo diferente, o que colocou princípios éticos até então inquestionáveis, como o de que a razão deve reger as paixões, em contato com uma situação de pluralismo e abertura à outras possibilidades de posicionamento no mundo.

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A referência à esfera definida como fontes morais é importante para este debate, uma vez que destaca as formas de expressão de bens que Taylor define como constitutivos. Neste ponto, é possível dizer que, para Taylor, uma época secular é aquela na qual o enriquecimento moral individual se desenvolve para além dos limites impostos por fronteiras religiosas ou teístas. O século XVIII teria sido uma época fecunda neste sentido, criadora de uma individuação nova e mais completa, definida por Taylor como expressiva, base da ideia de que cada indivíduo é diferente e original, essa originalidade determinando as formas como alguém deve viver (Taylor, op.cit. p. 481).

O livro Uma Era Secular analisa este processo de individuação considerando os seus efeitos sobre esferas distintas como ciência, política, arte e religião. No que se refere a esta última, o intuito é o de compreender as condições sob as quais a crença em Deus passa a se dar, uma vez que, muito embora esta não tenha desaparecido, o seu ambiente é bastante modificado no intervalo entre os séculos XVIII e XXI. Neste sentido, ao divergir das explicações institucionais da secularização, as quais a situam nos limites impostos por termos como laicismo e ateísmo, Taylor busca examinar as mudanças advindas sobre as ideias e experiências geradoras de completude e plenitude, em decorrência do fortalecimento, na modernidade, de narrativas e práticas que confrontam as possibilidades únicas de realização espiritual, definidas em termos eclesiais.

É esta a perspectiva compreensiva lançada sobre o processo de secularização pelo autor, encontrada nas últimas páginas d´As Fontes do Self, quando Taylor se pergunta sobre as possibilidades espirituais (Taylor op.cit. p.627) da cultura contemporânea. Esta concepção é aprofundada em considerações sobre as ampliações ocorridas no âmbito da ideia de transcendência em diversas sociedades democráticas do Ocidente, em cenários culturais cada vez mais marcados pela presença de uma ética da autenticidade (Taylor 2010).

Ao situar sua análise no século XX, Taylor identifica, como já salientado anteriormente, tendências culturais que, em momentos distintos radicalizam, principalmente nas sociedades do chamado atlântico norte, posicionamentos sobre o modo como alguém deve realizar-se e expressar-se individualmente. Uma expressão distinta do individualismo clássico e em oposição a discursos que prescrevem adaptações a recomendações externas ao indivíduo ou em conformidade com modelos de comportamento inspirados em discursos religiosos ou políticos. São movimentos de natureza democrática que irão dar força a uma ética da auto orientação, a qual, por sua

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vez, facilitará o reconhecimento, da parte de diversas sociedades ocidentais, da importância de agendas políticas multiculturais. Neste cenário, o destaque que o multiculturalismo irá obter a partir da segunda metade do século XX, bem como a ampliação do alcance de um individualismo que não leva em consideração objetivos que ultrapassem os limites da realização humana, serão dois desdobramentos da modernidade secular. Multiculturalismo e individualismo que serão responsáveis, por um lado, pela impossibilidade irreversível de qualquer projeto de fusão da fé cristã com uma sociedade específica e por outro, pela disseminação de um tipo de individualidade que tornará bastante difícil a permanência, no Ocidente, do cristianismo como uma religião com moldes exclusivamente institucionais.

Se as religiões e principalmente o cristianismo precisam traduzir suas mensagens numa linguagem que ultrapasse os limites litúrgicos e formais, Taylor reconhece que isto se dá em decorrência da época atual ser marcada por dinâmicas e imagens como religião mínima, crença sem pertencimento, busca, espiritualidade, entre outras práticas que compartilham uma mudança de imaginário social (Taylor 2010, p. 210). Trata-se de transformações que ocorrem na maneira como as pessoas imaginam sua existência, no modo como se relacionam, na maneira de compreender como as coisas acontecem entre si e seus pares, nas expectativas geralmente aceitas e também nas noções e imagens normativas mais profundas subordinadas a essas expectativas.

Modificações que recaem sobre o lugar ocupado pelo sagrado no imaginário de sociedades cujas disposições são, cada vez mais, pós-durkheimianas, visto que a experiência ou o vínculo com o sagrado deixam de ser construídos em contato exclusivo com instituições religiosas, e passam a ser definidos pelas preferências individuais em torno de experiências que fazem ou não sentido num determinado desenvolvimento espiritual. Com esta horizontalização da vida social (Taylor 2010, p. 55), torna-se possível a passagem de uma ordem hierárquica de relações personalizadas para uma ordem igualitária impessoal. Em outras palavras, afirma Taylor, um mundo vertical de acesso mediado é substituído por sociedades horizontais de acesso direto.

A explanação de Taylor nos ajuda, portanto a pensar a questão fundante deste texto: como deve ser o debate público entre cidadãos religiosos e seculares em um ambiente democrático? Taylor entende que a coesão de uma sociedade depende de fatores como uma política baseada na ética, na democracia e nos direitos humanos. Fatores estes “extraídos basicamente”, segundo ele, “da Ordem Moral Moderna, à qual aderem diferentes comunidades confessionais e não-confessionais, cada um delas por

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motivos diferentes” (Taylor, 2010, p. 532). Em outras palavras, os atributos indispensáveis a um debate democrático são decorrentes justamente do ganho epistêmico engendrado pelo processo de secularização. A ética da crença e da auto-orientação, a horizontalização da vida social, a espiritualidade de busca, ao possibilitarem a crítica dos pontos de vista últimos, sustentam o debate democrático entre diferentes e fortalecem as ferramentas do reconhecimento mútuo. A nova ordem moral teria possibilitado enfim, que vivêssemos no mundo do overlaping consensus rawlsiano, no qual diferentes grupos estão aptos a concretizar acordos sobre temas públicos a partir, cada um, de seu próprio ponto de vista.

Mas como se daria este debate na prática? Como deve ser o processo de construção de um consenso entre diferentes? Se Taylor elenca as potencialidades surgidas para tal em meio a uma nova ordem moral, ele não parece dar respostas concretas sobre como se deve proceder com esta deliberação democrática entre diferentes. Jürgen Habermas, filósofo da Escola de Frankfurt, por outro lado, tem tentado responder esta questão mais diretamente. No entendimento de Habermas, o próprio processo de deliberação democrática seria responsável por aguçar as sensibilidades necessárias à busca de consensos. O que Habermas recomenda é o engajamento de cidadãos religiosos e seculares em um “processo de aprendizagem duplo”, a fim de que seja possível o diálogo e o alcance de objetivos comuns.

Antes, porém, de nos determos na explanação deste processo propriamente dito, recordaremos as mudanças no entendimento de Habermas quanto à secularização e o papel das tradições religiosas na esfera pública, que vai desde a afirmação do ocaso inevitável da religião, por conta da secularização, até uma virada nesta compreensão com a declaração de que vivemos em um mundo pós-secular.

3 - HABERMAS E O PROCESSO DE APRENDIZAGEM DUPLO

Nos trabalhos que publica até o início dos anos de 1980, Jurgen Habermas se

apresenta como um filósofo convicto de que a tendência da religião nas sociedades ocidentais é a do seu desaparecimento. Entusiasta da teoria do agir comunicativo e influenciado pelo marxismo da Escola de Frankfurt, Habermas, neste primeiro momento, concebe o religioso como uma atitude que justifica uma realidade alienante e impede o homem de alcançar a liberdade. Esta, para ser obtida, precisaria ter a sua busca desvencilhada do controle da metafísica, o que ocorreria a partir do momento em

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que as sociedades recorressem aos meios oferecidos pela racionalidade comunicacional, uma esfera cujos limites seriam marcadamente seculares e eticamente responsáveis (Habermas 1987).

Já ao final da década de 1980, porém, Habermas modifica a sua compreensão diante do fenômeno religioso, passando a reconhecê-lo como uma necessidade da existência, nos termos do que coloca em seu livro Pensamento pós-metafísico, de 1988:

Enquanto a linguagem religiosa trouxer consigo conteúdos semânticos inspiradores que não podem ser jogados fora, que escapam (por ora?) à força de expressão de uma linguagem filosófica e que continuam à espera de uma tradução para discursos fundamentadores, a filosofia, mesmo em sua figura pós-metafísica não poderá desalojar ou substituir a religião (Habermas 1990, p. 61)

Neste momento de sua trajetória intelectual, Habermas evita falar em desaparecimento da religião, e opta por reconhecer um processo de privatização da questão religiosa, salientando a importância dos recursos explicativos oferecidos por dimensões como a fé diante de experiências marcadas pela impossibilidade de compreensão. A década de 1990, com os seus impactos decorrentes da expansão do capitalismo e do avanço da ciência, o leva ao reconhecimento de que as questões relacionadas à vida em sociedade já não podem ser resolvidas com a mediação exclusiva das razões seculares. Sua inquietação, portanto, é de natureza axiológica, e esta, nos termos de William Meyer (1995, p. 385), teria fortalecido a compreensão, da parte de Habermas, de que tratar de religião implica lidar com um interesse cognitivo fundamental em confrontar questões metafísicas e existenciais.

É o início do século XXI que apresenta uma virada em seu pensamento acerca do lugar da religião na esfera pública. O novo século enseja uma reflexão renovada e traz consigo um desafio metodológico abraçado por Habermas: reconhecer a crescente relevância pública da religião e não se limitar a uma mera aceitação da importância da dimensão da fé. Vivemos, agora, ele afirma, em um mundo pós-secular (Habermas 2002). Com isto, Habermas não quer dizer apenas que a religião conseguiu manter-se viva em meio a um ambiente cada vez mais secularizado. Nem somente que se deva dar um reconhecimento público (tardio) à sua contribuição quanto à reprodução de motivos e atitudes. Para Habermas, na verdade, a expressão “pós-secular” diria respeito

a uma convicção normativa que traz consequências para as relações políticas dos cidadãos não crentes com os crentes. Começa a prevalecer

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na sociedade pós-secular a ideia de que a modernização da consciência pública afeta de maneira defasada tanto as mentalidades religiosas quanto as seculares, modificando-as de forma reflexiva. Entendendo a secularização da sociedade como um processo comum de aprendizagem complementar , ambos os lados estarão em condições de levar a sério em público, por razões cognitivas, as respectivas contribuições para temas controversos (Habermas 2007b, p. 52).

E como seria este “processo de aprendizagem complementar” nos momentos de debate público quanto a temas controversos? Antes de responder esta pergunta é necessário mostrar a posição de Habermas quanto ao papel da religião no quadro de uma ordem liberal. Ele parte das explanações clássicas de John Rawls quanto ao tema para, como veremos, fazer um adendo ao liberalismo rawlsiano com relação à questão da tradução das opiniões sustentadas nas tradições religiosas nos termos de uma razão pública.

Um dos princípios fundantes do Estado liberal democrático é o de que todas as decisões implementadas pelo Estado devem submeter-se ao crivo da neutralidade do poder político. Em outras palavras, as decisões estabelecidas nesta esfera devem ser formuladas e justificadas numa linguagem acessível a todos os cidadãos, sem que se dê prioridades a visões de mundo específicas. Parte-se, então, do pressuposto que todo debate público deve ser embasado em argumentos acessíveis da mesma maneira a todas as pessoas (razão natural). Há ainda um princípio complementar, o “dever de civilidade”, no qual se atribui ao cidadão a obrigação, moral e não legal,

de ser capaz, nessas questões fundamentais, de explicar uns aos outros como os princípios e normas de conduta propostos e votados são compatíveis com os valores da razão pública”... esse dever envolve a disposição de prestar atenção aos outros e uma compreensão eqüitativa quando se trata de chegar a uma acomodação razoável de seus pontos de vista. (Habermas 2007a, p. 137, 138)

Estes fundamentos do Estado liberal democrático são compartilhados por Habermas e Rawls sem maiores desacordos, até um ponto específico. Baseado nestes paradigmas norteadores do procedimento democrático, Rawls estabelece uma exigência (proviso) quanto ao uso público de argumentos não-públicos: as doutrinas totalizantes (religiosas ou não) precisariam apresentar, na discussão pública, argumentos políticos apropriados e não razões exclusivamente oriundas de suas visões de mundo. Habermas, por sua vez, considera que o proviso rawlsiano repercute de maneira assimétrica nas

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vidas dos cidadãos religiosos e seculares. Não se pode esperar, diz Habermas, que todos os crentes fundamentem seus posicionamentos políticos deixando de lado suas convicções religiosas. Sendo o Estado liberal democrático considerado o protetor, de igual modo, de todas as formas religiosas de vida, não pode, portanto, obrigar “os cidadãos religiosos a levarem a cabo, na esfera pública política, uma separação estrita entre argumentos religiosos e não-religiosos quando, aos olhos deles, esta tarefa pode constituir um ataque à sua identidade pessoal” (Habermas, op. cit, p.147). O que fazer, então? São duas as soluções de Habermas para este dilema: primeiro, mesmo reconhecendo que o Estado democrático liberal não pode exigir uma “sobrecarga mental e psicológica insuportável para seus cidadãos religiosos” (idem), Habermas não anula o proviso rawlsiano, mas o desloca para o âmbito institucional. Em outras palavras, as opiniões religiosas poderiam ser colocadas sem a necessidade de tradução na esfera pública informal. A partir desta nova orientação, a barreira da tradução surgiria somente diante do limiar institucional. É somente nos parlamentos, tribunais, ministérios, administrações, enfim, nas corporaçoes estatais, que contam exclusivamente argumentos seculares.

A segunda solução habermasiana para anular a assimetria presente na relação entre cidadãos religiosos e seculares na esfera liberal democrática seria entender este trabalho de tradução como uma tarefa cooperativa. Caberia aos cidadãos seculares, portanto, uma participação ativa neste processo de tradução do religioso para a razão pública. Se aos cidadãos religiosos impõe-se o fardo da tradução de seus argumentos a fim de que se viabilize sua participação na esfera institucional, tal carga seria compensada, afirma Habermas, “pela expectativa normativa segundo a qual os cidadãos seculares se abrem a um possível conteúdo de verdade de contribuições religiosas”. Esta abertura possibilitaria, assim, um diálogo no qual “as razões religiosas podem, eventualmente, aparecer como argumentos acessíveis em geral” (Habermas, op. cit, p. 149, 150).

4 - ASAD E O SECULARISMO COMO IDEOLOGIA

Se Taylor e Habermas, como vimos até agora, parecem confiar nos princípios do Estado liberal democrático para promover um diálogo entre diferentes visões de mundo, Talal Asad, por sua vez - como já disse Fennella Cannell (2010) em sua primorosa revisão sobre o tema do secularismo - é bem menos esperançoso quanto à possibilidade

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de resultados benéficos advindos da esfera pública liberal. Antropólogo signatário do pensamento pós-colonial (ver Asad 1973), e mais uma vez diferentemente de Taylor e Habermas, Asad não se preocupa em apresentar algum tipo de vir-a-ser em sua análise. Não há uma instância normativa no que ele nos apresenta. Algo comum nos trabalhos antropológicos, em contraposição à forma como os campos da filosofia e ciência política tratam deste assunto. Sendo assim, seu expediente, podemos dizer, é o da denúncia; e em Formations of the Secular: Christianity, Islam, Modernity (2003, doravante Formations), o alvo é a relação intrincada entre o secularismo e o capitalismo liberal democrático dos estados-nação, de cujas políticas e retóricas, lembra mais uma vez Cannell (2010), Asad é um crítico incisivo.

O objetivo principal de Formations é, portanto questionar a relação entre o secular como categoria epistêmica e o secularismo como instituição política, com foco na questão do Islã em território europeu. Cada uma das partes do livro é dedicada ao trio de conceitos que resume o tema da relação entre religião e modernidade:

secular-secularismo-secularização1. Podemos afirmar, não obstante, que dentre esta trinca de

conceitos a maior preocupação de Asad é com o secularismo, o qual considera como uma doutrina política surgida na euro-américa. Sua premissa básica é apresentar esta doutrina como bem mais do que uma simples exigência de separação entre a religião e as instituições do Estado. Exemplos desta separação, afirma Asad, poderiam ser encontrados já na cristandade medieval e nos impérios islâmicos. O que haveria de verdadeiramente peculiar no secularismo ocidental, Asad continua, é como ele serve, juntamente com outras instituições (como o consumismo, a indústria, os direitos humanos, entre outros), para sustentar o projeto de modernidade, ou como ele prefere dizer, sustentar “uma série de projetos interligados que certas pessoas no poder visam colocar em prática” (Asad, 2003, p. 13, tradução nossa). E para isto, o secularismo procede construindo novos pressupostos sobre os conceitos de religião, ética e cidadania política, bem como novas sensibilidades morais associadas a estes conceitos.

No que diz respeito ao objetivo principal deste texto, qual seja, o debate acerca de questões de interesse nacional em uma esfera pública plural, Asad o aborda logo na introdução de Formations. Ali, dialoga diretamente com as considerações de Taylor acerca de como a nova ordem moral possibilitou que vivêssemos no mundo do

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O secular entendido como uma categoria epistêmica e, ao mesmo tempo, um regime de sensibilidades. O secularismo, como doutrina política de aplicação e sustentação do secular e a secularização, por sua vez, como um processo histórico e contextualizado do estabelecimento da lógica do secular (Para mais detalhes ver Casanova, 2011).

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overlaping consensus rawlsiano, onde diferentes grupos, diante de questões que dizem respeito ao bem comum, estariam aptos a deixarem para trás suas razões privadas alinhando-se em torno de uma razão pública, ou ética secular, transcendente. No entanto, um dilema acompanha o debate na esfera pública, e o próprio Taylor reconhece, lembra Asad, que as disputas em torno do que deve ser definido como razão pública e não-pública não cessarão em uma democracia liberal plural. A aposta de Taylor para a resolução destas contendas inevitáveis estaria na persuasão e na negociação. Quanto a isto, Asad diverge:

Há certamente um impulso generoso por trás dessa resposta, mas o Estado-nação não é um agente generoso e sua lei não funciona através da persuasão. Considere o que acontece quando as partes em litígio não estão dispostas a abrir mão do que para elas é uma questão de princípios (um princípio que articula o agir e o ser, e não um princípio que venha à tona somente nos momentos em que se verbaliza os componentes de um credo). Se os cidadãos não alcançam consensos razoáveis de uma forma considerada importante a nível nacional pelo governo e a maioria que o apoia, a ameaça de ação legal (e a violência que isto implica) pode ser usada. (Asad, 2003, p. 06, tradução nossa).

A diferenciação entre razão pública e razão privada, portanto, e é isto o que Asad quer dizer, é arbitrária, sendo posta em prática pelo Estado e suas instâncias jurídicas a partir de uma situação de constante ameaça do uso iminente da violência. Enquanto o que podemos chamar de mito de orgiem do secularismo o coloca como responsável pelo fim da violência resultante das guerras religiosas, Asad aponta o que de fato aconteceu: uma mera substituição das guerras religiosas pela violência das guerras nacionais e coloniais. Apesar disto, a narrativa que deposita sobre as ideologias religiosas os motivos dos atos de violência e intolerância continua embasando os discursos visando prevenir a entrada da religião na esfera pública.

São as sensibilidades que Asad nomeia de seculares as encarregadas pela perpetuação e sustentação do discurso que imputa às ideologias religiosas a responsabilidade pelos atos de violência e intolerância na esfera pública. Para refutar esta narrativa que iguala religião a violência, ele afirma, bastaria lembrar dos inúmeros

agentes „seculares que tem perpetrado atos de grande crueldade (Asad, op.cit. p. 12,

tradução nossa). No entanto, para Asad, o mais interessante, ao invés de comparar a crueldade dos regimes seculares e religiosos, é “analisar como as sensibilidades morais relativas à inflição deliberada de dor têm sido formadas na sociedade secular moderna”

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(Asad, 2011, p. 164). Em outras palavras, Asad está interessado em como as sensibilidades relativas à dor e à crueldade contribuiriam para o estabelecimento de uma narrativa de superação da religião e consolidação de regimes seculares e, ao mesmo tempo, capitalistas liberais modernos.

E como agem estas sensibilidades? Enquanto, por exemplo, um dos paradigmas da ideologia secularista consiste na narrativa da eliminação da dor “gratuita” promovida pela religião contra os corpos das pessoas, as dores inflingidas nas populações das colônias do sistema imperialista eram consideradas “necessárias”. Este sofrimento fazia parte do inevitável processo de “humanização” de certas populações. Condená-los por seus costumes bárbaros e cruéis, portanto, estaria na pauta das dores aceitáveis pelas sensibilidades seculares, ao passo que as dores “desnecessárias”, como o auto-flagelo praticado em rituais religiosos dos nativos, seriam cruéis e desumanas. Enfim, as sensibilidades morais seculares aprovam certas dores, as que são geradas no processo de se tornar plenamente humano (de acordo com os padrões morais ocidentais) e repudiam outras, colocando as dores repudiadas sob a rubrica do fanatismo religioso, portanto desnecessárias e desumanas.

Diante das colocações de Asad, poderíamos concluir que secularismo e esfera pública constituem mecanismos através dos quais o Estado busca manter os símbolos e sensibilidades próprios à sua “personalidade”. A própria noção de esfera pública, devedora do secularismo, não escapa de sua crítica: ao invés de consistir em um espaço de debate político, esta se revela como uma rede de conexões emocionais que sustenta a

imagem do cidadão ideal (daquele estado-nação específico, Asad 2005, p. 50)2. Sendo

assim, ainda que Asad não revele minuciosamente os mecanismos que constroem as sensibilidades seculares nos mesmos moldes com que expõe os modos de produção de

discursos autoritários na religião (ver Asad 2010)3, ele nos oferece um instrumental para

apontarmos as contradições inerentes ao secularismo, iluminando as sensibilidades que o sustentam, possibilitando o desenvolvimento de uma crítica profunda dos binarismos (público-privado, secular-religioso, etc) que pautam a relação entre religião, esfera pública e democracia liberal.

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Para o caso da França, Asad mostra o papel do sentimento de vergonha dos franceses em relação à participação de seus compatriotas nas atrocidades cometidas contra os judeus na segunda guerra mundial. Um forte sentimento público nacional contra o anti-semitismo operaria no sentido de expurgar esta sensação de vergonha. A tentativa de colocar toda a culpa do anti-semitismo na conta do Islã seria, para Asad, uma forma de não chamar atenção para o preconceito histórico contra judeus na França. (Asad, 2005).

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5 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

A passagem por Taylor, Habermas e Asad permite reconhecer o quanto os termos em análise estão marcados por ambiguidades e tensões. Neste sentido, uma recomendação de natureza metodológica compartilhada por cada autor é a de que categorias como religião e democracia não devem ter as suas manifestações compreendidas como uma espécie de conjunto rígido e indivisível.

Como visto anteriormente, a análise de Charles Taylor apresenta considerações que ajudam a compreender os distintos direcionamentos assumidos pela religião na contemporaneidade. Em suas análises, a época atual é apresentada como cenário de um processo de secularização o qual, muito embora tenha suas etapas intensificadas, não anula por completo a relação humana com experiências de busca pela plenitude ou de preenchimento espiritual. Este traço seria um marcador de importantes características da fase atual da modernidade, principalmente nas relações e embates travados com a religião e suas expressões.

Na era definida por Taylor como secular, fenômenos como a experiência religiosa e a crença assumiriam contornos distintos daqueles prescritos pelo cristianismo institucional. Expressões de individualização do crer e buscas pela espiritualidade, ambos orientados por uma ética da autenticidade constituiriam registros cuja compreensão precisaria se dar a partir de uma chave analítica nova, capaz de situar os atuais significados que definem os rumos da secularização moderna, processo que já não se desenrola como um simples esvaziamento da religião nos espaços públicos ou como inevitável declínio das crenças e práticas religiosas. Para Taylor, seria necessário perguntar-se sobre o lugar que o sentido da vida humana ocuparia neste mundo que se seculariza de maneira tão rápida.

Esta reflexão o faz buscar um entendimento sobre o que significa viver em uma época secular, tendo como propósito evidenciar as expressões contemporâneas da crença e da descrença, compreendendo-as, não simplesmente como formas de justificação individual da existência, mas como modos distintos de trajetória moral ou espiritual, cuja realização ocorreria nos limites de uma estrutura imanente erguida sobre uma modernidade responsável pela erosão da certeza imediata e pelo eclipse da fé religiosa.

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Com este cuidado, Taylor faz companhia às perspectivas que divergem de tradições que colocam o religioso em tutela ou que o veem em estrita oposição ao secular. É esta a razão de, por exemplo, o referido autor defender uma noção de secularidade distinta das elaborações justificadas por Habermas e Rawls, principalmente. Muito embora o filósofo canadense saliente que a época contemporânea estaria condenada a viver sob a condição de um consenso sobreposto ao modo do modelo defendido por John Rawls, sua análise diverge da maneira como, tanto Habermas como Rawls situam a religião na ordem moral moderna. Em síntese, da parte de Taylor o desacordo se daria em relação a certa singularidade atribúida à religião pelo liberalismo político, principalmente quando este insere a doutrina secular na narrativa “mítica” do esclarecimento, apresentando-a como mudança absoluta ou passagem, de uma situação orientada pela revelação divina para outra, já não religiosamente orientada, racional em sua natureza. Para Charles Taylor (2011, p.328) esta distinção entre razão e religião em termos da credibilidade racional de discursos laicos e religiosos não se sustentaria.

Divergências à parte, nos termos de Jurgen Habermas a época atual vincularia as religiões à urgente necessidade de transmitirem suas ideias e convicções no mundo da vida, logo, em situações que se desenrolam na esfera das interações discursivas, nas quais, como diria Paula Monteiro (2009), diferenças irredutíveis são comunicadas. Ao problematizar esta circunstância, e enfatizar o seu traço pós-secular, que diria respeito à radicalização contemporânea das tensões entre princípios laicos e religiosos, Habermas compartilha preocupações em torno das seguintes questões: como aqueles que confessam uma doutrina que se baseia na autoridade religiosa da Igreja ou da Bíblia, poderiam também estar de acordo e ratificar ideias políticas razoáveis, capazes de oferecer sustentação a regimes democráticos? Que contribuições políticas os diferentes

Estados poderiam fornecer para a resolução das dificuldades advindas deste cenário? Questões compreendidas de modo bastante cético por Talal Asad a partir de

inquietações desenvolvidas no âmbito de uma “antropologia do secularismo”, com forte inspiração foucaultiana e bastante crítica da modernidade. Com um estilo que se afasta do tom moderado próprio às reflexões de Taylor e Habermas, Asad explora as implicações políticas e ideológicas dos usos da razão secular. Sobre a relação entre religião e democracia, Asad salienta que no tocante à primeira, a antropologia precisaria rever sua dependência epistemológica de esforços que buscam definir a religião. Para Asad, considerar a religião como uma categoria e defini-la de um modo ou de outro

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constituem movimentações eminentemente políticas, logo, de fundamental importância seria o entendimento das situações nas quais, nos espaços públicos de sociedades democráticas, o secular e o religioso entram em confronto.

Por último, é importante salientar que este traço conflituoso constituiria hoje uma dimensão cujo entendimento revela-se bastante necessário para a problematização de cenários contemporâneos específicos, no Brasil e em diversas partes do mundo. Em âmbito nacional, por exemplo, se as chamadas Jornadas de Junho ou anteriormente, os debates acerca da tipificação penal do crime de homofobia entre outras frentes de confronto e articulação política demonstram, que ao se falar em religião e democracia, estaríamos nos referindo, à maneira de Taylor, às formas como as pessoas elaboram e disputam “fontes morais” distintas, contudo, é igualmente necessário reconhecer e identificar, na companhia de Asad e Habermas, as assimetrias e acidentes que constituem estes processos e que atingem, diretamente, a capacidade de comunicação de interesses e demandas identitárias da parte de grupos sociais específicos.

6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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