• Nenhum resultado encontrado

Violência obstétrica: quando o parto se transforma em pesadelo

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Violência obstétrica: quando o parto se transforma em pesadelo"

Copied!
6
0
0

Texto

(1)

Violência obstétrica: quando

o parto se transforma em

pesadelo

(Foto:Reprodução/Créditos: Carla Raiter)-Agressões, desrespeito e humilhação causam traumas em mulheres “Eu defino meu primeiro parto como um trauma, foi um dos piores dias da minha vida”. Como a engenheira florestal Kássia Aguiar, de 29 anos, muitas mulheres têm lembranças dolorosas de um momento que deveria ser marcante, de conexão, intimidade, primeiro contato, reconhecimento entre mãe e filho: o parto. Para muitas, essa etapa tão importante, às vezes tão sonhada, esperada, se transforma em uma memória traumática de dor, desrespeito, agressão verbal e física, humilhação. Os relatos de violência obstétrica são lamentavelmente cada vez mais presentes na vida das mulheres brasileiras.

O termo violência obstétrica está relacionado atos físicos e psicologicamente violentos no contexto de trabalho de parto e nascimento do bebê. Segundo estudo realizado pela Fundação Perseu Abramo em parceira com Serviço Social do Comércio (Sesc), sofrer algum tipo de violência obstétrica é uma realidade para uma em cada quatro mulheres. Para agravar a condição das mulheres grávidas diante desse cenário aterrador, o Ministério da Saúde emitiu um despacho, no mês passado, defendendo a abolição do termo das normas médicas brasileiras. A expressão é considerada “imprópria” pelo Ministério, pois acredita que, nos momentos de atendimento à mulher, “tanto o profissional de saúde quanto os de outras áreas, não têm a intencionalidade de prejudicar ou causar dano”. Entretanto, o posicionamento polêmico da instituição de saúde parece não levar em conta o aumento do número de denúncias de violência obstétricas registradas nos primeiros meses deste ano. De

(2)

acordo com a Central de Atendimento à Mulher, do governo Federal, pelo número 180, cresceu dez vezes do ano passado para este. De janeiro a abril de 2018, foram registradas 26 denúncias. No mesmo período deste ano, foram contabilizadas 260 queixas. Os dados, no entanto, possivelmente apresentam ainda subnotificação, pois grande parte das mulheres que vivenciaram episódios de agressões físicas e psicológicas nas maternidades e hospitais não sabem que foram vítimas de violência, de tão naturalizada e forte é a cultura do parto desumanizante.

DOR E TRAUMA

Todo mundo já ouviu narrativas aterrorizantes de mães que viveram experiências dolorosas na hora de parir: cortes indevidos que deixaram cicatrizes torturantes para o resto da vida; cesáreas sem indicação clínica e contra a vontade da mulher; negação de anestesia para alívio de dor; ofensas verbais; profissionais que subiram na barriga da mulher para agilizar o parto; negligência; coação para adotar determinada posição; exames excessivos de toque; afastamento de mãe e filho imediatamente logo após o parto… a lista de violências pelas quais as mulheres passam durante o parto é muito extensa. Veja o que algumas delas contam de sua experiência na hora de ter bebê:

KÁSSIA AGUIAR, 29 ANOS, ENGENHEIRA FLORESTAL

“Eu tive um parto muito complicado.Cheguei numa sala, estava lotada de meninas para ter neném. Elas gritavam e choravam de dor. E as enfermeiras só davam atenção para quem não estava ‘fazendo escândalo’. Eu fiquei sozinha na sala, sem ninguém. Fiquei em pânico, cheia de dúvidas e medo. O médico pediu para a enfermeira aplicar um soro (ocitocina, que acelera as contrações) no períneo (região que fica entre o ânus e a vagina), mas não teve resultado. Eu achava tudo estranho, mas diziam que era normal. No final da manhã, depois de mais de 10h de trabalho de parto, eu já estava pedindo uma cirurgia

(3)

cesariana, estava morrendo de medo. A enfermeira negou e tirou o soro do períneo e colocou direto na minha veia. Já estava perdendo as minhas forças, com a cabeça girando. Foi quando me aplicaram uma anestesia sem me avisar, na região do períneo, e do nada me cortou. Fez um corte e pediu para outra enfermeira empurrar a minha barriga. As duas subiram na minha barriga, eu achei isso horrível. Ela empurram até o bebê sair, tanto que a minha bolsa não estourou. A enfermeira estourou a bolsa com uma tesoura e empurraram minha filha. Depois disso, elas me costuraram. Eu levei 8 pontos, coisa que nem uma cesárea leva. A minha filha graças a Deus nasceu saudável, mas tenho certeza de que ela sofreu. Se foi um parto complicado para mim, imagina para ela. Eu achei um parto horrível. Foi uma experiência muito ruim, que me marcou demais. Quando engravidei do meu segundo filho, eu chorava de medo porque não queria viver aquilo de novo. Eu defino isso como um trauma, foi um dos piores dias da minha vida.”

LISLEY PIMENTEL, 26 ANOS, ADMINISTRADORA

“Na primeira contração que eu gritei de dor, a enfermeira mandou que eu não gritasse porque o médico não gostava. E que se continuasse gritando ele ia aparecer para brigar comigo. Foi quando fiquei com medo. Quando fui para a sala de parto, não deixaram ninguém ir comigo. E foi muito ruim. É um momento muito tenso, eu era muito nova, tinha 17 anos. Eu não estava conseguindo colocar força, eu gritava. E ao invés de me orientarem, eles me colocavam medo, diziam que desse jeito nenhum bebê ia nascer, que eu tinha que parar de gritar, que era para eu ‘aprender a ter filho’. Na última contração a enfermeira pegou o braço dela e empurrou a minha barria com força, para a minha filha nascer. Foi uma dor terrível. Aí a minha filha nasceu. Só que quando ela nasceu, a enfermeira não a trouxe para mim, eu não vi a minha filha. Eu pedi para ver, pelo menos olhar o rosto da minha filha, a enfermeira disse que não, que só quando eu saísse eu ia poder ver a minha filha. E levou ela embora. E eu não sabia que ele tinha feito

(4)

um corte em mim. Levei 10 pontos. Passei 40 minutos com o médico me limpando e brigando comigo. Só lembro da dor quando ele me limpava. E toda vez que eu gritava ele me mandava calar a boca, que eu tinha que me controlar. Até hoje tenho sensibilidade muito grande nesse corte. Eu não gosto muito de lembrar do meu parto. Eu estava assustada, com medo, com raiva. Não consigo lembrar do rosto da minha filha quando finalmente pude vê-la”.

VERÔNICA BARBOSA, 30 ANOS, ENGENHEIRA FLORESTAL

“Eu tive minha filha de parto normal, mas foi horrível, pois me cortaram. Para completar, esqueçeram a placenta dentro de mim. Fiquei com infecção generalizada, internada por 15 dias. Era para eu sair no outro dia se não fosse essa crueldade. Fora as coisas horríveis que me falavam durante o parto. A obstetra me chamava de mole, de outras coisas que nem lembro mais. Me trataram tão mal que não pretendendo ser mãe novamente”.

ROSILENE JASTER, 29 ANOS, CONSULTORA DE VENDAS

“No começo, o meu parto foi tranquilo, mas depois que eu tive o bebê, que precisei ficar internada na maternidade durante três dias, eu fui tratada super mal. Uma enfermeira me tratou muito mal. Eu fiquei com a sonda, depois de fazer a cirurgia da cesariana. Ela tirou a sonda como uma brutalidade que eu senti rasgando tudo por dentro. Tirou a sonda com muita força, senti muita dor. Ela queria que tomasse banho meia noite, eu sentia muito dor de cabeça e ela queria que eu tomasse banho de madrugada. Ela ainda me chamou de ‘mole’, de ‘fraca’, que estava fazendo manha”.

JÉSSICA PAES, 29 ANOS, DONA DE CASA

“Uma coisa muito forte para mim foi logo quando meu filho nasceu. As enfermeiras já iam levando ele embora, sem sequer me mostrar se ele estava bem, eu nem ia ver o rosto do meu filho. Isso foi horrível. Eu que tive que chamar elas, que já

(5)

estavam saindo da sala. Perguntei para onde estavam levando e pedi para que me mostrassem um pouco pelo menos, para ver se ele estava bem. Pedi para pegar ele no colo um pouco. Elas não ia nem me deixar ver o meu filho. Também teve a questão do acompanhante. Não me deixaram ficar com acompanhante e não me explicaram o porquê, só disseram que não podia, que o médico não ia gostar. Eu era muito jovem, tinha 19 anos na época, não tinha informação nem conhecimento, não questionei. Também estava muito nervosa, não pude fazer nada. Mas foi ruim. Para quem ia ter filho a primeira vez, nova, foi assustador ficar sozinha a noite e a madrugada toda. Só muito tempo depois é que descobri que eu tinha direito a ter um acompanhante comigo”.

Listamos alguns procedimentos e atitudes que são considerados violência obstétrica, confira:

Negar ou dificultar atendimento à grávida

Cesárea desnecessária e contra a vontade da mãe Não oferecer alívio para a dor

Não informar a mulher sobre algum procedimento durante o parto

Agressão verbal, chacotas, piadas Afastar mãe e filho após o nascimento

Uso inadequado de Ocitocina sintética (utilizada para acelerar o nascimento)

Episiotomia (corte do períneo) sem necessidade ou sem consentimento da mãe

Obrigar a mulher a ficar em uma certa posição

Lavagem intestinal e tricotomia (raspagem dos pelos) Manobras de parto desnecessárias

Ruptura da bolsa forçada pelos profissionais sem necessidade

Exames de toque em excesso

Proibir a entrada de um acompanhante no trabalho de parto e no pós-parto

(6)

Falas infantilizadas para se referir à mulher;

Desrespeito do direito à acessibilidade da informação durante o acompanhamento pré-natal, parto e aborto;

Restrição da participação da mulher no parto; Laqueadura sem consentimento;

Quebra de sigilo e da confidencialidade;

Descaso sobre o direito ao planejamento reprodutivo e prevenção de Infecções Sexualmente Transmissíveis, vírus da imunodeficiência humana (IST/HIV/Aids);

Barreiras físicas para o acesso ao serviço de saúde;

Falta de acessibilidade para marcação de consultas e realização de exames.

Por:Byanka Arruda

Envie vídeos, fotos e sugestões de pauta para a redação do JFP (JORNAL FOLHA DO PROGRESSO) Telefones: WhatsApp (93) 98404 6835- (93) 98117 7649.

“Informação publicada é informação pública. Porém, para chegar até você, um grupo de pessoas trabalhou para isso. Seja ético. Copiou? Informe a fonte.”

Publicado por Jornal Folha do Progresso, Fone para contato 93 981177649 (Tim) WhatsApp:-93- 984046835 (Claro) -Site: W W W . f o l h a d o p r o g r e s s o . c o m . b r E -mail:folhadoprogresso@folhadoprogresso.com.br e/ou e-mail: adeciopiran_12345@hotmail.com

Referências

Documentos relacionados

logo vai passar.. Essa música do Toquinho faz parte de um disco chamado As crianças e seus direitos em 1986. 3.Considerando que estamos no ano de 2020, o disco de Toquinho

17 CORTE IDH. Caso Castañeda Gutman vs.. restrição ao lançamento de uma candidatura a cargo político pode demandar o enfrentamento de temas de ordem histórica, social e política

De seguida, vamos adaptar a nossa demonstrac¸ ˜ao da f ´ormula de M ¨untz, partindo de outras transformadas aritm ´eticas diferentes da transformada de M ¨obius, para dedu-

6 Consideraremos que a narrativa de Lewis Carroll oscila ficcionalmente entre o maravilhoso e o fantástico, chegando mesmo a sugerir-se com aspectos do estranho,

Com o objetivo de compreender como se efetivou a participação das educadoras - Maria Zuíla e Silva Moraes; Minerva Diaz de Sá Barreto - na criação dos diversos

Utilizado para o mapeamento e documentação da rede interna, o sistema também permite documentar todo os detalhes da rede e todas as conexões físicas.. FIGURA 3 –

A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se A espectrofotometria é uma técnica quantitativa e qualitativa, a qual se baseia no fato de que uma

Figura 8 – Isocurvas com valores da Iluminância média para o período da manhã na fachada sudoeste, a primeira para a simulação com brise horizontal e a segunda sem brise