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INFANTICÍDIO: UMA ANÁLISE SOBRE A CONDUTA TÍPICA DO TERCEIRO QUE CONTRIBUI PARA A PRÁTICA DO DELITO

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Academic year: 2021

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PRÁTICA DO DELITO

Eduardo Jorge Mendes1

Nidal Khalil Ahmad2

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo a análise legal, doutrinária e judicial, através de ações ajuizadas nos Estados do Rio Grande do Sul e Paraná e julgadas pelos respectivos Tribunais de Justiça, que tem por objeto os casos de infanticídio envolvendo a coautoria e participação. Dessa forma, abordou-se a origem e a evolução histórica do infanticídio até sua aplicação no direito penal brasileiro. Após, analisou-se a conduta típica do infanticídio e, em especial, a praticada pelo terceiro na condição de coautor ou partícipe, sob o enfoque das teorias adotadas pelo direito penal pátrio, principalmente, a teoria monista ou unitária. Foram analisadas alternativas jurídicas apresentadas por doutrinadores para a tipificação desta conduta. O estudo de caso focou na análise de decisões proferidas pelos Tribunais de Justiça do Rio Grande do Sul e do Paraná, que tinham como objeto a conduta praticada por terceiros para o cometimento do delito de infanticídio. A análise levou em conta as decisões proferidas e seus fundamentos.

Palavras-chave: coautoria - infanticídio –– participação – teoria monista/unitária ABSTRACT

This paper aims to analyze legal doctrine and judicial lawsuits filed by the states of Rio Grande do Sul and Paraná and judged by the respective Courts of Justice, which is the object of infanticide cases involving co-authoring and participation. Thus, we dealt with the origin and historical evolution of infanticide to its application in Brazilian criminal law. After we analyzed the behavior typical of infanticide and, in particular, practiced by the third condition in the coauthor or participant, from the standpoint of the theories adopted by criminal law parental mainly tier or unitary theory. Were analyzed alternatives presented by legal scholars for the characterization of this conduct. The case study focused on the analysis of decisions rendered by the Courts of Justice of Rio Grande do Sul and Paraná, which had as its object the conduct practiced by others for the commission of the offense of infanticide. The analysis took into account the decisions and their foundations.

Key-words: infanticide – co-authoring – participation – tier/unitary theory 1 INTRODUÇÃO

1 Graduando em Direito - Faculdade Dom Alberto.

2Assessor Jurídico do Ministério Público. Professor de Direito Penal e Processo Penal. Mestre em Direitos Sociais e Políticas

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O infanticídio teve diversas considerações durante o passar dos tempos. Importante referir que, em tempos passados, o infanticídio não se diferenciava da figura do homicídio, sendo, inclusive, punido com penas cruéis. Este entendimento somente tomou novos contornos a partir do século XVII, sob a influência do Direito Natural.

No Brasil, estas ideias somente foram aplicadas no ordenamento jurídico pátrio de forma tipificada no Código Criminal Brasileiro de 1830, quando ocorreu o abrandamento da pena do infanticídio. Tal ficou evidenciado no Código Penal de 1940, onde o delito de Infanticídio está tipificado na forma como conhecemos hoje.

O Infanticídio é praticado pela mãe contra seu filho, durante o nascimento deste, ou logo após, estando ela sob influência do estado puerperal. Para alguns autores, trata-se de uma espécie de homicídio doloso privilegiado, uma vez que o privilégio é concedido em virtude da influência do estado puerperal sob o qual deve se encontrar a parturiente. O sujeito ativo é a própria mãe, tratando-se, portanto, de crime próprio, pois o tipo penal exige qualidade especial do sujeito ativo.

Contudo, em relação ao concurso de pessoas, o ordenamento jurídico brasileiro adotou, em regra, a teoria unitária/monista, onde há um único crime para o autor e para o coautor ou para o partícipe, conforme os textos dos artigos 29 e 30 do Código Penal, e, atualmente, tanto o partícipe como o coautor também respondem criminalmente pelo delito de Infanticídio. Esta situação criou uma grande polêmica, pois, quando o infanticídio é cometido em concurso de agentes, partícipe e coautor do Infanticídio poderão ser beneficiados pelo abrandamento direcionado à mãe.

Logo, a busca para encontrar uma alternativa jurídica para tipificar a conduta praticada pelo terceiro, coautor ou partícipe do delito de infanticídio, sem a aplicação da circunstância privilegiadora, é um desafio para juristas e legisladores ao mesmo passo que uma questão que se impõe.

2 ORIGEM E EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DELITO DE INFANTICÍDIO E SUA TIPIFICAÇÃO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

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O infanticídio teve considerações diversas através das diferentes épocas. Em Roma, como pode ser verificado nas Institutas de Justiniano (Liv. IV, Tít. XVIII, §6º), as penas previstas eram extremas. As mães homicidas dos próprios filhos eram condenadas a serem costuradas dentro de um saco com um cão, um galo, uma víbora e uma macaca, e após atirada ao mar ou em um rio (CAPEZ, 2008, p. 109).

Da mesma forma que em Roma, a Carolina (Ordenação Penal de Carlos V), no seu artigo 131, impunha para as mães que matassem o próprio filho penas de extremo rigor, decretando que fossem enterradas vivas, afogadas, empaladas ou dilaceradas com tenazes ardentes, ou seja, o entendimento à época era de que esta conduta figurava entre os crimes mais abominados (CAPEZ, 2008, p. 109).

Este entendimento somente começou a tomar outros contornos a partir do século XVIII, quando passou a ser abrandada a pena para o infanticídio, o que aconteceu sob a influência das ideias dos filósofos adeptos do Direito Natural.

Desde então, quando o infanticídio era praticado, honoris causa, pela mãe ou por parentes, passou a receber o tratamento de homicídio privilegiado.

Os primeiros a conceber a ideia de que o infanticídio tratava-se de um homicídio privilegiado e aplicá-las em um diploma legal foram Beccaria e Feuerbach, no Código Penal Austríaco em 1803. No Brasil, estas ideias foram aplicadas no Código Criminal Brasileiro de 1830, que trazia a tipificação do delito de infanticídio, em seu artigo 198, com a seguinte redação: “Se a própria mãe matar o filho recém

nascido para ocultar sua desonra: pena – de prisão com trabalho por 1 a 3 anos”.

Com o passar dos anos, foi editado o Código Penal de 1890, que, por sua vez, deu ao infanticídio nova tipificação em seu artigo 2983. No século XX, no ano de 1940, foi

elaborado o Código Penal que está vigendo. Durante sua concretização foram elaborados projetos que abordaram o delito de infanticídio de várias formas.

Cabe referir que nem mesmo os doutrinadores da época conseguiam chegar a um consenso sobre a natureza do infanticídio, se estava sendo tratado de um crime autônomo, ou se estava sendo tratado de uma espécie de homicídio privilegiado. Ao final, o Código Penal Brasileiro de 1940 estabeleceu que o delito de

3 Matar recém-nascido, isto é, infante, nos sete primeiros dias do seu nascimento, quer empregando meios diretos e ativos,

quer recusando à victima os cuidados necessários à manutenção da vida e a impedir sua morte: pena – de prisão cellular por seis a vinte e quatro anos. Parágrafo único. Se o crime fôr perpetrado pela mãe, para occultar desonra propria: pena de prisão cellular por tres a nove anos.

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infanticídio seria tipificado com a seguinte redação: “Matar, sob a influência do

estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após”.

O delito de infanticídio pode ser entendido como o aniquilamento da vida do nascente ou do neonatal, pela própria mãe, influenciada pelo estado puerperal, durante o parto ou logo após sua ocorrência. O tipo penal do infanticídio é composto pelo verbo núcleo do tipo “matar” e pelas elementares, “sob a influência do estado puerperal”, “o próprio filho” e “durante o parto ou logo após”, ou seja, a existência do verbo nuclear “matar” sem a caracterização das elementares faz com que seja afastada a conduta do infanticídio, tratando-se, neste caso, de homicídio.

Trata-se de crime próprio, uma vez que somente pode ser cometido pela mãe sob a influência do estado puerperal, simples, de forma livre, doloso, comissivo e omissivo impróprio, pois, o sujeito ativo tem o dever de ser garantidor, de dano, material, instantâneo de efeitos permanentes (GRECO, 2008, p. 218).

O bem jurídico tutelado é a vida humana, em especial, a vida do nascente ou neonatal, ou seja, está se tutelando um período de vida especial, durante ou logo após o nascimento. O sujeito ativo do infanticídio é a mãe atingida pelo estado puerperal, que mata o próprio filho, pois se trata de crime próprio, não podendo ser cometido por qualquer agente, contudo é admitido o concurso de agentes.

O sujeito passivo do delito de infanticídio é o nascente ou neonatal, filho da mãe puérpera. O sujeito passivo será chamado nascente quando o ato for cometido durante o parto, e denominar-se-á neonatal quando o ato for cometido logo após o parto, isto porque quem está nascendo deixa de ser feto e passa a ser pessoa.

O infanticídio pode ser cometido de maneira comissiva ou omissiva imprópria; de maneira comissiva, por exemplo, pode ser por enforcamento, estrangulamento, trauma craniano, afogamento, ou qualquer outra ação que tenha por fim a destruição da vida; na forma omissiva pode ser deixando de alimentar a criança, ou abandonando-a para que morra, ou até se logo após o nascimento notadamente ela precisar de socorro médico e a mãe permanecer inerte objetivando a morte.

A consumação ocorre com a morte do nascente ou neonatal, uma vez que se trata de crime material, e admite-se a tentativa. O elemento subjetivo do delito de infanticídio é o dolo, pois, não existe a modalidade culposa no infanticídio.

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O elemento psicofisiológico do delito de infanticídio é o estado puerperal, que infringe à mulher perturbações, acarretando transtornos de ordem psíquica, produzindo sentimentos de angústia, ódio e/ou desespero (CAPEZ, 2008, p. 113).

Nesse sentido, faz-se necessária a produção de prova da existência do estado puerperal, e, caso seja comprovado que a mãe não se encontrava influenciada pelo estado puerperal, ou, mesmo encontrando-se, este não tenha causado nenhum transtorno, não há que se falar em delito de infanticídio, direcionando o foco para o crime de homicídio. Havendo dúvida sobre a presença de transtorno, o infanticídio não será descaracterizado pela aplicação do princípio do in

dubio pro reo, ou seja, na dúvida prevalece o entendimento mais favorável ao réu.

Ainda, caso a mulher se encontre no estado puerperal, e este lhe cause alterações de ordem psíquica que lhe deixe sem qualquer poder de autodeterminação, deverá entender-se como inimputável (GRECO, 2008, 220).

O elemento temporal descrito no infanticídio refere-se a “durante o parto ou logo após”. A melhor definição de início do parto é quando ocorre a dilatação do colo do útero e o nascente encontra-se ao alcance externo (GRECO, 2008, p. 221/222).

3 A CONDUTA TÍPICA DO TERCEIRO, PARTÍCIPE OU COAUTOR, QUE CONTRIBUI PARA A PRÁTICA DO DELITO DE INFANTICÍDIO

Desde 1984, o código adotou a denominação “concurso de pessoas”, também é conhecido como concurso de agentes, diante da sua aplicação mais abrangente devido à existência de outra forma de concurso chamada de participação. A nova forma adotada abrange a coautoria e a participação (CAPEZ, 2010, p. 359).

Acerca do concurso de pessoas pode-se dizer que a infração penal nem sempre é obra de um só agente. Nesse caso, quando várias pessoas concorrem para a realização da infração penal, fala-se em concurso de agentes ou concurso de delinquentes, sejam coautores ou partícipes (JESUS, 2010, p. 154).

Assim, o autor é aquele que realiza a conduta expressa pelo verbo nuclear do tipo penal, ou se vela de outrem para realizar, assim o autor poderá ser autor executor ou mediato. A autoria mediata, essa é observada quando a conduta é

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praticada por interposta pessoa levada a erro de tipo essencial ou que não tem o necessário discernimento da conduta delitiva (JESUS, 2010, p. 154/155).

A coautoria pode ser entendida como a reunião de autorias, quando várias pessoas realizam as características do tipo com um plano comum de distribuição de atividades, de maneira que o crime constitui consequência das condutas repartidas, produto final da vontade comum. Assim, a coautoria pode ser direta ou parcial/funcional. A participação na conduta delitiva pode ocorrer por indução, instigação e auxilio, que muitas vezes é material (JESUS, 2010, p. 156/157).

Portanto, o concurso de pessoas no direito brasileiro é admitido através de duas figuras, o partícipe e o coautor, sendo que o coautor pratica o verbo nuclear junto com outro ou outros coautor(es) e o partícipe atua de forma auxiliar, contribuindo moral ou materialmente para a prática da conduta delitiva.

No entanto, conforme previsto no artigo 30 do Código penal, as circunstâncias e condições pessoais não se comunicam, salvo quando elementares do crime.

As circunstâncias são dados acessórios, as quais agregadas ao delito tem a função de aumentar ou diminuir a pena aplicada no caso concreto. Não interferem na qualidade do crime, mas afetam sua gravidade (JESUS, 2010, p. 171).

Para Greco, as circunstâncias são dados periféricos, que gravitam ao redor da figura típica, somente interferindo na graduação da pena (GRECO, 2008, p. 468).

Também é importante fazer referência acerca das condições pessoais e das elementares do tipo penal. As condições pessoais são as relações do sujeito com o mundo exterior e com outras pessoas ou coisas. A rigor tais condições já funcionam como circunstâncias na parte geral ou especial do código penal, ou até mesmo, como elementares da figura típica (JESUS, 2010, p. 171).

As circunstâncias podem ser classificadas como objetivas ou subjetivas. Objetivas são aquelas que se relacionam com os meios e modos de realização do delito, tempo, lugar, objeto material e qualidades da vítima. As subjetivas são aquelas que dizem respeito com a pessoa do participante (autor, coautor ou partícipe), sem relação com a materialidade do delito (JESUS, 2010, p. 171).

No que tange à comunicabilidade das circunstâncias é necessário observar as seguintes regras: não se comunicam as circunstâncias de caráter pessoal, salvo quando elementares do tipo penal; a circunstância objetiva não pode ser

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considerada no fato do partícipe ou coautor se não ingressou na esfera de seu conhecimento; e as elementares do tipo penal, sejam de caráter objetivo ou subjetivo/pessoal, comunicam-se entre os fatos cometidos pelos participantes, desde que tenham ingressado na esfera de seu conhecimento (JESUS, 2010, p. 171).

Quanto à incomunicabilidade das circunstâncias de caráter pessoal, verifica-se que no caso de autoria ou participação, os dados inerentes à pessoa de determinado concorrente não se estendem aos fatos cometidos pelos outros participantes, salvo se elementares do tipo penal (JESUS, 2010, p. 172).

No que tange às circunstâncias objetivas, sua comunicabilidade dependerá de que estejam na esfera de conhecimento do terceiro (JESUS, 2010, p. 172).

Estas estão diretamente relacionadas com o fato, e não ao agente, o tempo e o lugar do crime, o modo de execução, os meios empregados para a prática do crime, entre outras. As elementares são componentes básicos e essenciais, abarcando, todos os dados fundamentais para a existência da figura típica, sem os quais essa desaparece. Por isso, são suas elementares (CAPEZ, 2010, p. 380).

Qualquer elemento que integra o fato típico comunica-se a todos os concorrentes, inclusive os pessoais. Para isso é imprescindível que o participante conheça a qualidade pessoal do autor (JESUS, 2010, p. 172).

Segundo a teoria unitária, todos os que contribuem para a integração do delito cometem o mesmo crime, uma vez que há unidade de crime e pluralidade de agentes. É a teoria adotada pelo código penal (JESUS, 2010, p. 158).

No mesmo sentido, Capez refere que todos aqueles que contribuem para a prática do crime cometem o mesmo delito, não havendo distinção quanto ao enquadramento típico entre autor/coautor e partícipe. Daí surge o nome da teoria, pois todos respondem por um crime único (CAPEZ, 2010, p. 366).

Importante referir que existem exceções pluralísticas, expressas, à teoria monista, as quais estão previstas na parte especial do Código Penal. Como exemplo: aquele que pratica aborto consentido responde pelo artigo 126 do Código Penal, já a mulher que consentiu responderá pelo artigo 124 do Código Penal; no caso da corrupção, o particular que oferece ou promete a vantagem indevida

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responde pelo artigo 333 do Código Penal, contudo o funcionário público que aceitou vai responder pelo artigo 317 do Código Penal.

Sobre a possibilidade de ocorrer concurso de agentes no delito de infanticídio, existe uma corrente doutrinária, minoritária, da qual fazia parte Nélson Hungria, mas que, após, reviu posição, que não admite a possibilidade da existência do concurso de agentes por considerar que a “influência do estado puerperal” é uma circunstância personalíssima, e, que não haveria comunicação entre ela e os outros agentes, que deveriam responder por homicídio (BITENCOURT, 2010, p. 152).

Essa controvérsia ganhou um argumento sui generis patrocinado por Nélson Hungria, que “inventou” uma circunstância elementar que não existe no ordenamento jurídico brasileiro, “circunstância personalíssima” e, sustentava que esta não se comunicaria com os outros participantes do delito. Hungria pretendia afastar a aplicação do disposto no artigo 30 do Código Penal, que estabelece que as circunstâncias de caráter pessoal se comunicam quando elementares do tipo penal (BITENCOURT, 2010, p. 152).

Contudo, a corrente majoritária admite a coautoria e a participação no crime de infanticídio, aduzindo que não existem condições personalíssimas. Temos, portanto, as circunstâncias de caráter pessoal que quando são elementares do crime se comunicam e as circunstâncias objetivas que se comunicam mesmo não sendo elementares do crime, desde estejam dentro do conhecimento do terceiro. Como a influência do estado puerperal é elementar, irá se comunicar com os coautores e ou partícipes por força do art. 30, do Código Penal (BITENCOURT, 2010, p. 152).

Nesse diapasão, não se discute que a “influência do estado puerperal” constitui uma elementar típica do delito de infanticídio. E, devido a esta unanimidade sobre a natureza dessa circunstância pessoal que torna vaga a discussão acerca de sua comunicabilidade. Tendo em vista que é elementar do tipo, ela se comunica, e o terceiro que contribuir com a parturiente na morte de seu filho, nas condições descritas no artigo 123 do Código Penal, concorrerá para a prática do infanticídio e não de homicídio, como sugestão de Hungria (BITENCOURT, 2010, p. 152).

Assim, a injustiça ou justiça referente ao abrandamento da punição do terceiro participante no delito de infanticídio é inconsistente para afastar a orientação abraçada pelo Código Penal Brasileiro, que consagrou a teoria monista da ação.

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Esta previsão recebe o complemento do artigo 30 do Código Penal, que determina, de forma expressa, a comunicabilidade das “elementares do crime”, independentemente de se tratar de circunstâncias ou condições pessoais. Desta forma, se o terceiro induz, instiga ou auxilia a parturiente a matar o próprio filho durante ou logo após o parto, participa de um crime de infanticídio, e, se a “influência do estado puerperal” é uma elementar do tipo, comunica-se ao participante, seja coautor ou partícipe, nos termos do artigo 30, do Código Penal (BITENCOURT, 2010, p. 152).

Portanto, para doutrina majoritária, o entendimento sobre a possibilidade do concurso de agentes no delito de infanticídio é possível, desde que a autoria seja da mãe em estado puerperal e o outro agente seja coautor ou partícipe, uma vez que sendo aquele autor e a mãe partícipe, aquele responderá por homicídio.

Não obstante o entendimento da doutrina majoritária, verifica-se também que pela boa técnica e respeito aos princípios e teorias adotados pelo Código Penal, não há como renegar a possibilidade do concurso de agentes no delito de infanticídio, principalmente porque as elementares do tipo penal irão se comunicar aos agentes que praticam a ação, mesmo pessoais, pois são elementares do tipo penal.

4 AS ALTERNATIVAS JURÍDICAS APRESENTADAS PARA A TIPIFICAÇÃO DA CONDUTA DO TERCEIRO, PARTÍCIPE OU COAUTOR, QUE CONTRIBUI PARA A PRÁTICA DO DELITO DE INFANTICÍDIO

Durante muitos anos, uma corrente capitaneada por Nélson Hungria entendeu que o referido “estado puerperal” não se comunicaria tendo em vista que seria uma “circunstância personalíssima”, e, por isso, o terceiro que contribui para a prática do delito deveria responder por homicídio. Para esta corrente, o estado puerperal não se trata de uma questão pessoal, mas, de uma questão personalíssima (BITENCOURT, 2010, p. 152).

Para Bitencourt, a situação deve ser analisada como um todo e nesse sentido o Código Penal fornece elementos de aplicação, que através da interpretação do caso concreto, poderão afastar o abrandamento da punição ao terceiro.

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Quando a mãe e o terceiro praticam a conduta nuclear do tipo, assim está plenamente caracterizada a coautoria. O legislador reconheceu uma diminuição da capacidade da puérpera, admitindo que seu grau de discernimento é sensivelmente menor. O terceiro concorrente, por sua vez, no uso de suas capacidades mentais normais, pode aproveitar-se das condições fragilizadas da puérpera para praticar a ação de matar o filho daquela. Assim, neste caso o terceiro aja com o dolo de matar alguém, age com o dolo de cometer homicídio, utilizando a mãe em estado puerperal para a obtenção do resultado efetivamente pretendido (BITENCOURT, 2010, p. 152/154).

Se o terceiro mata o nascente com a participação acessória da mãe, como o acessório segue o principal, e que o principal neste caso é o homicídio, a participante deve responder pelo mesmo crime. Contudo, o Código Penal adotou a teoria restritiva de autor, fazendo perfeita distinção entre autor e partícipe, que abstratamente incorrem na mesma infração que praticarem. A punibilidade variará de acordo com sua culpabilidade e referente ao partícipe de acordo com a importância casual da sua colaboração. Assim, admite a concepção dualista, mitigada, distinguindo a atuação de autores e partícipes, permitindo uma dosagem de punição mais adequada. Por isso, com estribo neste dispositivo, há desvio subjetivo de condutas, devendo a partícipe responder pelo crime menos grave, do qual quis participar, qual seja, o infanticídio (BITENCOURT, 2010, p. 154/155).

Segundo Bitencourt, esta seria a solução correta, caso contrário, estaria sendo violado o sistema do código, e principalmente o que está previsto no artigo 30 do Código Penal, que as circunstâncias pessoais não se comunicam, salvo se elementares do tipo penal (BITENCOURT, 2010, p. 156).

Segundo entendimento de Bitencourt, para afastar a comunicabilidade da elementar do estado puerperal, seria necessária a atuação dos parlamentares, uma vez que em nosso sistema político a elaboração das normas legais cabe ao Poder Legislativo, e a referida alteração somente poderia ocorrer através da modificação da lei (BITENCOURT, 2010, p. 152/153).

No entendimento de Greco, o infanticídio, na verdade, trata-se de uma modalidade especial de homicídio, que é cometido levando-se em conta determinadas condições particulares do sujeito ativo que atua influenciado pelo

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estado puerperal, em meio a certo espaço de tempo, uma vez que o delito deve ser praticado durante ou logo após o parto. O ideal seria que o infanticídio fosse tratado como um homicídio privilegiado, ficando umbilicalmente ligado ao artigo 121, do Código Penal, por meio de um parágrafo, o que não acontece atualmente. Seguindo a mesma linha de Bitencourt, Greco ensina que para afastar a comunicabilidade das elementares é necessária a atuação do Poder Legislativo, com a transformação do delito autônomo em parágrafo do art. 121, do Código Penal (GRECO, 2008, 217).

Nesse sentido, com o objetivo de evitar que sejam quebradas as normas penais de caráter geral adotadas pelo Código Penal, bem como as teorias e princípios constantes neste, verifica-se que as sugestões de reforma, através de alteração do tipo penal por meio da atuação parlamentar apresentam-se como uma solução pragmática para o problema que se apresenta.

Logo, a sugestão de que o delito de infanticídio deixe de ser um delito autônomo, passando a ser um parágrafo do artigo 121, do Código Penal, homicídio privilegiado, parece ser a melhor medida a ser tomada.

5 PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS

Considerando a necessidade da análise dos julgados em ações de infanticídio, envolvendo a participação de terceiros, para entendimento acerca da tipicidade destas condutas, foram colhidas jurisprudências do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e Tribunal de Justiça do Paraná.

O método adotado foi o dedutivo, e o método de pesquisa jurisprudencial. A pesquisa de campo foi realizada através de pesquisa de jurisprudência no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (www.tj.rs.jus.br) e Tribunal de Justiça do Paraná (www.tj.pr.jus.br), com análise frente aos princípios e regras adotados pelo ordenamento penal brasileiro e aplicados no Código Penal.

Fora adotado o estudo de caso de jurisprudência que trata do crime de infanticídio, com a ocorrência de coautoria ou participação de terceiros, nos Estados do Rio Grande do Sul e do Paraná. A analise foi realizada à luz dos princípios e regras adotados pelo ordenamento penal brasileiro e aplicados no Código Penal.

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6 COLETA E ANÁLISE DE DADOS

Durante a pesquisa, foram analisadas duas decisões jurisprudenciais, uma do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e outra do Tribunal de Justiça do Paraná, proferidas em processos que discutem a ocorrência do crime de infanticídio envolvendo coautoria ou participação.

Na primeira pesquisa, foi localizada uma decisão jurisprudencial no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul 4, a qual trata de um Recurso em Sentido

Estrito que discute a decisão de pronúncia dos três coautores do delito de infanticídio. Importante referir que a decisão do Tribunal Gaúcho ratificou a decisão de pronúncia proferida pelo juízo.

Verifica-se que como se trata de um crime próprio, foi a mãe a autora do delito, que sob a influência do estado puerperal, logo após o parto, matou o próprio filho, completando assim todas as elementares do delito de infanticídio, demonstrando a tipicidade in casu.

A autora contou com a colaboração de seus pais que agiram na condição de coautores do delito de infanticídio, estes beneficiados pelas circunstâncias pessoais da autora, tendo em vista que tais circunstâncias são elementares do tipo penal infanticídio, e, por isso, comunicaram-se com os demais participantes da ação criminosa. Nota-se que, neste caso, o meio consumativo utilizado pelos pronunciados foi o omissivo, ou seja, abandonaram a criança em local ermo, deixando-a a própria sorte, esquivando-se de prestar os devidos cuidados que uma criança recém nascida necessitava, os quais os agentes tinham a obrigação legal de prestar.

Como referido, na decisão foi realizado o exame psicológico que acenou pela presença do estado puerperal, o qual influenciou o estado psicológico da parturiente.

4 RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. INFANTICÍDIO. DECISÃO DE PRONÚNCIA. IRRESIGNAÇÃO. Na espécie, descabe

acolher a insurgência, posto que, ao contrário do que alegaram os recorrentes, há elementos que ensejam a pronúncia. Na esteira do que foi preconizado pela douta Julgadora a quo, apreende-se que há incerteza quanto ao efetivamente ocorrido, o que enseja a mantença da decisão ora recorrida, partindo-se da noção tantas vezes repetida de que nos crimes de competência do Tribunal do Júri, nesta fase processual, vigora o princípio do in dubio pro societate, atribuindo-se à sociedade, por seu instrumento soberano constitucional, a competência para decidir tal controvérsia. Observa-se que pairam dúvidas sobre as condutas dos acusados, assim como no que tange ao eventual animus pelo qual foram norteados, quando dos fatos-evento, impondo-se a pronúncia dos mesmos, tal como foi feito. RECURSO-CRIME IMPROVIDO. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70007737703, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laís Rogéria Alves Barbosa, Julgado em 12/02/2004)

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Agrega-se a isto o fato de que a prática ocorreu logo após o parto, assim, estão presentes, os elementos psicofisiológico e temporal, exigidos para o infanticídio.

Após, foi realizada pesquisa com a utilização do termo “infanticídio”, no site do

Tribunal de Justiça do Paraná5, contemplando um processo julgado onde houve a

ocorrência do concurso de agentes na modalidade de participação. A decisão proferida trata de um Recurso em Sentido Estrito que discute a decisão de pronúncia do partícipe no delito de infanticídio. Importante referir que a decisão do Tribunal Paranaense ratificou a decisão de pronúncia proferida pelo julgador monocrático.

Tendo em vista que o pronunciado participou do delito na condição de partícipe é importante analisar o caso concreto sob a luz das características da participação. Como se trata de um crime próprio, foi a mãe a autora do delito, sob a influência do estado puerperal, logo após o parto, e, matou o próprio filho, completando todas as elementares do infanticídio, presente a tipicidade in casu.

De acordo com a fundamentação do acórdão que confirmou a pronúncia do partícipe, percebe-se que a autora foi instigada a cometer o infanticídio pelo amante que agiu na condição de partícipe do delito, sendo beneficiado pelas circunstâncias pessoais da autora, tendo em vista que tais circunstâncias são elementares do tipo penal infanticídio, e, por isso, comunicaram-se com o partícipe da ação criminosa.

Neste caso, o meio consumativo utilizado pela pronunciada instigada pelo partícipe, foi o comissivo, pois, a mãe envolveu a criança em um plástico e a jogou em uma latrina, onde esta acabou morrendo por asfixia, conforme laudo realizado no corpo de delito. Culminando, assim, com a prática do infanticídio in casu.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

5 EMENTA: PRONÚNCIA - INFANTICÍDIO - INDÍCIOS SUFICIENTES DE PARTICIPAÇÃO - RECURSO EM SENTIDO

ESTRITO NÃO PROVIDO. Se existem indícios suficientes de participação do réu no crime de infanticídio, impõe-se a pronúncia. Eventuais incertezas resolvem-se em favor da sociedade. (Relator: Carlos A. Hoffmann, Processo: 73191-9, Acórdão: 11057, Fonte: 5323, Data Publicação: 08/02/1999, Órgão Julgador: 2ª Câmara Criminal, Data Julgamento: 28/12/1998)

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Diante da necessidade de análise acerca do tema da tipificação da atuação de terceiros como coautores ou partícipes nos delitos de infanticídio, foram considerados dois arestos de decisões dos Tribunais Gaúcho e Paranaense.

A análise dos julgados demonstrou que, seguindo o entendimento adotado pelo Código Penal, aplicação, em regra, da teoria monista/unitária, seja na condição de coautor seja na condição de partícipe o terceiro que contribui para a prática do delito de infanticídio é responsabilizado por tal delito.

Cabe sinalar que, caso o delito de infanticídio fosse previsto apenas como um parágrafo do artigo 121 do Código Penal, conforme é sugerido no presente trabalho, os pais da autora do delito, no primeiro caso, e, o amante da autora do delito, no segundo, beneficiados por mães que mataram o próprio filho, logo após o parto, sob a influência do estado puerperal, seriam, processados por homicídio, possivelmente qualificado, ou seja, com apenamento muito maior do que prevê o artigo 123 do Código Penal.

Contudo, diante das previsões dos artigos 29 e 30 do Código Penal, em vigor, bem como de acordo com a teoria monista/unitária, adotada pelo Código Penal, os pais da autora, que participaram do delito como coautores, no primeiro caso, e, o amante, partícipe, no segundo, são beneficiados pelas circunstâncias pessoais das mães, que irão se comunicar, uma vez que são elementares do tipo penal infanticídio.

Logo, a busca pela alternativa jurídica que preveja uma punição mais justa e adequada para o partícipe e o coautor do infanticídio é uma questão que se impõe.

Neste norte, a sugestão a título de alternativa jurídica que o presente artigo traz é de que o delito de infanticídio deixe de ser um delito autônomo, passando a ser um parágrafo do artigo 121 do Código Penal, homicídio, onde a conduta descrita no caput, do artigo 123 do Código Penal, passaria a ser considerada como homicídio privilegiado, agindo em benefício somente da mãe que se encontre acometida pelo estado puerperal, e, sofrendo os efeitos destes, não havendo mais falar em comunicabilidade de circunstância pessoal.

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Referências

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