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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO MARIA LUIZA ROK S SILVA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA

INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

CURSO DE BACHARELADO EM DIREITO

MARIA LUIZA ROK’S SILVA

CRISE MIGRATÓRIA E SOLIDARIEDADE FEDERATIVA: UMA

ANÁLISE CRÍTICA DA ATUAL CONJECTURA DO ESTADO DE

RORAIMA FACE À CRISE MIGRATÓRIA VENEZUELANA, SOB A

PERSPECTIVA DA AÇÃO CIVIL ORIGINÁRIA Nº 3.121/RR

BOA VISTA – RR

2018

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MARIA LUIZA ROK’S SILVA

CRISE MIGRATÓRIA E SOLIDARIEDADE FEDERATIVA: UMA

ANÁLISE CRÍTICA DA ATUAL CONJECTURA DO ESTADO DE

RORAIMA FACE À CRISE MIGRATÓRIA VENEZUELANA, SOB A

PERSPECTIVA DA AÇÃO CIVIL ORIGINÁRIA Nº 3.121/RR

Monografia apresentada como requisito obrigatório para obtenção do título de Bacharel, no curso de Direito, do Instituto de Ciências Jurídicas, da Universidade Federal de Roraima.

Orientador: Prof. MsC. José Edival Vale Braga. Co-orientadora: Prof. MsC. Priscilla Cardoso Rodrigues.

BOA VISTA-RR

2018

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MARIA LUIZA ROK’S SILVA

CRISE MIGRATÓRIA E SOLIDARIEDADE FEDERATIVA: UMA

ANÁLISE CRÍTICA DA ATUAL CONJECTURA DO ESTADO DE

RORAIMA FACE À CRISE MIGRATÓRIA VENEZUELANA, SOB A

PERSPECTIVA DA AÇÃO CIVIL ORIGINÁRIA Nº 3.121/RR

Monografia apresentada como pré-requisito para a conclusão do Curso de Bacharelado em Direito, da Universidade Federal de Roraima – UFRR. Área de Concentração: Direito Constitucional; Direito Internacional; Direitos; Defendida em 05 de dezembro de 2018 e avaliada pela seguinte banca examinadora:

___________________________________________ Prof. MsC. José Edival Vale Braga.

Orientador - Curso de Direito - UFRR

___________________________________________

Prof. MsC. Priscilla Cardoso Rodrigues. Co-orientadora - Curso de Direito - UFRR

___________________________________________

Prof. MsC.Livia Dutra Barreto Professora - Curso de Direito - UFRR

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar, agradeço a Deus, por sempre iluminar meus passos, me mostrando o melhor caminho a ser seguido.

Agradeço, ainda, a minha mãe, Simone, que me ensinou a correr atrás dos meus sonhos, independente de quais fossem, e faz o possível para que eu possa realiza-los. Obrigada por estar ao meu lado em todos os momentos, sendo a melhor ouvinte, conselheira e incentivadora que alguém poderia ter.

Agradeço, também, a minha avó, Lázara, por todas as orações e frases motivacionais, pelo colo, quando precisei, e, principalmente, por ser a melhor vó do mundo; ao meu pai, Francisco Roque, e a todos meus demais familiares, pelo apoio incondicional.

Sou grata a meu namorado, Fernando, e a todos meu amigos, principalmente, à Brenda e à Isabele, que sempre me apoiaram e me incentivaram a continuar estudando, mesmo quando eu não aguentava mais, e me ajudaram a preservar minha saúde mental em momentos tensos, como da OAB (HAHA).

Por fim, mas não menos importante, agradeço a meus professores, em especial a meu orientador, Edival Braga, e a minha co-orientadora, Priscilla Cardoso, pela paciência e empenho para nos ensinar não só a sermos juristas, mas pessoas melhores.

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RESUMO

As Constituições brasileiras sempre adotaram um viés cooperativo/solidário entre os entes federativos, característica essa que ganhou força com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, mas tem sido colocada à prova face à crise humanitária que passa a Venezuela, que resultou numa explosão emigratória para diversos países como o Brasil. O norte do país, principalmente o Estado de Roraima, vinha suportando sozinho o fluxo migratório, causando um colapso nos serviços públicos básicos. Situação caótica esta que findou na Ação Civil Originária nº 3.121-RR, proposta por Roraima em face da União, cujo pedido mais polêmico diz respeito ao fechamento da fronteira Brasil-Venezuela. Apesar de já decidido pela Ministra Relatora do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, ser incabível obstar o acesso dos venezuelanos ao país, a medida divide opiniões. Em meio aos debates acerca da legalidade desta, surge a interiorização, como uma medida humanitária, a qual vem sendo implementada pelo Governo Federal, juntamente com Organizações Não Governamentais (ONGs) e prefeituras, por meio da qual os imigrantes e refugiados são transferidos para outras cidades, como forma de inseri-los na sociedade nacional, além de oferecer melhores condições de vida ao nacional e aos estrangeiros, e de desafogar os sistemas públicos de Roraima. Frente à discussão apresentada, expõem-se como se deu a crise no país vizinho, as ações adotadas pelo Brasil, destacando os pontos positivos e negativos de cada, tendo como precípuo norte a crise imigratória europeia.

Palavras-chave: Crise imigratória; Solidariedade Federativa; Constituição Federal; Serviços Públicos; Fechamento de Fronteira Brasil-Venezuela; Interiorização.

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ABSTRACT

Brazilian constitutions have always adopted a cooperative/solidarity bias among federative entities, a characteristic that has gained strength with the advent of 1988‟s Constitution of Federative Republic of Brazil, but has been put to the test in light of the humanitarian crisis in Venezuela, which resulted on an emigration explosion for several countries like Brazil. The north of the country, mainly the Roraima State, had been supporting the migratory flow alone, causing a collapse in basic public services. A chaotic situation that ended in Original Civil Action No. 3.121-RR, proposed by Roraima against Union, whose most controversial request concerns the closure of the Brazil-Venezuela border. Although already decided by Supreme Court‟s Minister, Rosa Weber, it is impossible to block Venezuelans' access to the country, the measure divides opinions. Amid debates about the legality of this, internalization arises, as a humanitarian measure, which has been implemented by the Federal Government, together with Non-Governmental Organizations (NGOs) and prefectures, through which immigrants and refugees are transferred to other cities, as a way of inserting them in the national society, in addition to offering better living conditions to the nationals and foreigners, and of unleashing the public systems of Roraima. Ahead the discussion disposed, the actions taken by Brazil, highlighting the positive and negative aspects of each one, are presented as the crisis unfolded in the neighboring country, with the northern pre-eminence of the European immigration crisis

Keywords: Immigration crisis; Federal Solidarity; Federal Constitution; Public services; Closure of Brazil-Venezuela Border; Interiorization.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ACNUR - Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados; ACO – Ação Civil Originária;

ADPITERR - Associação de Desenvolvimento dos Povos Indígenas Taurepangs do Estado de Roraima;

ALIDCIRR - Aliança de Integração e Desenvolvimento das Comunidades Indígenas de Roraima;

Art. – Artigo;

CDHIC - Centro de Direitos Humanos e Cidadania do Imigrante; CF – Constituição Federal;

CNig - Conselho Nacional de Imigração; CONARE - Comitê Nacional para Refugiados; CPF - Cadastro de Pessoa Física;

DESA - Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU; DIDH - Direito Internacional dos Direitos Humanos;

EUA – Estados Unidos da América; FMI – Fundo Monetário Internacional; HGR - Hospital Geral de Roraima;

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano; IMDH - Instituto Migrações e Direitos Humanos; Km – quilômetro;

LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias; LOA - Lei Orçamentária Anual;

MERCOSUL - Mercado Comum do Sul; MEC - Ministério da Educação;

OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico; OIM - Organização Internacional de Migração;

ONG – Organização Não Governamental; ONU - Organização das Nações Unidas;

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; SODIURR - Sociedade de Defesa dos Índios do Norte de Roraima; STF - Supremo Tribunal Federal;

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Unasul – União de Nações Sul-Americanas;

UNFPA - Fundo de População das Nações Unidas; Unicef - Fundo das Nações Unidas para a Infância.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 8

1 FLUXO MIGRATÓRIO ... 12

1.1 Imigrante, Refugiado e Asilado Político ... 13

1.2.1 Panorama internacional ... 15

1.2.2 Análise da crise migratória venezuelana ... 19

1.2.2.1 Atual conjectura do Estado de Roraima face à crise migratória venezuelana ... 22

2 FEDERALISMO ... 34

2.1 Aspectos Gerais ... 34

2.2 Evolução Histórica e o Atual Federalismo Brasileiro ... 35

2.2.1 Solidariedade federativa ... 37

3 AÇÃO CIVIL ORIGINÁRIA Nº 3.121-RR ... 43

3.1 Análise Da ACO Nº 3.121-RR ... 43

3.2 Medidas Adotáveis para Solucionar o Iminente Colapso do Estado de Roraima ... 49

3.2.1 Fechamento da fronteira Brasil-Venezuela ... 49

3.2.2 Interiorização... 54

CONCLUSÃO ... 60

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INTRODUÇÃO

A crise migratória não é um assunto hodierno, mas no Brasil, mormente no estado de Roraima, o aumento do fluxo migratório fez crescer a necessidade de solidariedade entre os entes federativos, com vista a resguardar não só os direitos dos nacionais, mas também, oferecer o mínimo necessário à sobrevivência do estrangeiro.

O federalismo, no Brasil, proclamado em 1889, através do Decreto nº 01/1889, foi implantando com um caráter descentralizador, o qual concede aos estados federados maior autonomia, ao conceder-lhes certa soberania no âmbito de sua competência. Em suma, fez-se “surgir um Estado soberano composto de Estados autônomos” (DE ALMEIDA, 2014, p. 110).

Essa forma de estado passou por várias transformações no decorrer da história, mas, com o advento da Constituição Federal de 1988 seu viés cooperativo/solidário foi ressaltado, uma vez que a Lei Maior incentiva a solidariedade interestatal com o escopo de fomentar políticas públicas e promover os direito fundamentais da população.

Sob essa perspectiva de solidariedade entre os estados brasileiros, não se pode olvidar a omissão dos entes competentes para solucionar o caos que vem se instalando no Brasil, principalmente na região norte, face ao crescente fluxo migratório venezuelano, causado pela crise política, econômica e social que assola aquele país.

O estado de Roraima, o qual faz fronteira com a República Bolivariana, é a região que mais sofre com a chegada desordenada dos imigrantes, recebendo, ao longo dos últimos três anos, mais de 120 mil estrangeiros, chegando uma média de 800 venezuelanos por dia, segundo a Polícia Federal. Entretanto, essa sobrecarga prejudica toda a população roraimense, acentuando o caos dos já vulneráveis sistemas de saúde e educacional, além do aumento da criminalidade.

Destaca-se ser questionável que um estado, com pouco mais de 500 mil habitantes, consiga suportar o aumento considerável de seus habitantes, sem entrar em colapso.

Acerca das tentativas de solucionar o problema em questão, impende destacar a Ação Civil Originária nº 3.121, ainda em trâmite, ajuizada pelo Estado de Roraima em face da União, com o escopo de reconhecer a inação da União em

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promover medidas financeiras, administrativas e fiscalizatórias relacionadas à crise migratória venezuelana.

É certo, contudo, que se faz imprescindível a ação da União, em colaboração com os estados federados, na busca por uma solução viável e eficaz, colimando evitar o crescente caos que se instala no estado roraimense.

Pelo exposto, é indubitável a necessidade de discussão sobre o assunto nas diversas esferas da sociedade, inclusive no meio acadêmico, uma vez que o crescente fluxo migratório afeta a vida de todos os cidadãos, sejam eles nacionais ou estrangeiros. Desta feita, esta monografia visa destacar as consequências da vinda dos venezuelanos para o Brasil, mormente para o estado de Roraima, em contraponto à necessidade de acolhida destes. Ao lado disso, perquirir-se-á possíveis soluções ao problema em questão, tendo como base a ACO nº 3.121.

Levando em consideração o crescente fluxo migratório venezuelano face à atual conjectura do estado de Roraima, consubstanciado pela inação do Poder Público, faz-se necessário levantar o seguinte problema: quais as medidas eficazes aplicáveis por todos estados, com base na solidariedade federativa, a fim resguardar os direitos humanos dos nacionais e estrangeiros? Os pedidos realizados no bojo da ACO nº 3.121 são suficientes para findar ou, ao menos, atenuar os problemas vivenciados pelos roraimenses e venezuelanos residentes neste estado?

É de conhecimento geral a crise política e social que se instalou na Venezuela. O medo de “morrer” de fome, como muitos alegam, foi o que levou o crescimento exorbitante de imigrantes daquele país no Brasil e muitos ingressam por via terrestre, através da cidade de Pacaraima, em Roraima, principal porta de entrada para o país.

Este estado já recebeu, desde o fim do ano de 2015, mais de 120 mil pessoas e, apesar de 60% ter retornado ao seu país de origem ou seguido para outros destinos, o caos continua a se instalar.

Alguns ministros e até mesmo o presidente da República vieram diversas vezes ao território roraimense, chegando a promulgar a Medida Provisória nº 820/2018, a qual foi posteriormente convertida na Lei nº 13.684/2018, que previa “medidas de assistência emergencial para o acolhimento a pessoas em situação de vulnerabilidade decorrente de fluxo migratório provocado por crise humanitária” (BRASIL, 2018). Visava, em suma, o ordenamento da fronteira, a construção de

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abrigos e a interiorização dos imigrantes, metas as quais ainda não foram implementadas de maneira eficaz.

Enquanto nada é feito, torna-se latente e inquestionável o sofrimento dos roraimenses com a superlotação de escolas e hospitais, bem como com o aumento da criminalidade.

As medidas adotadas por Roraima, entretanto, são questionáveis. O decreto nº 25.681/2018 restringe o acesso dos venezuelanos ao sistema de saúde, exigindo a apresentação de passaporte. Outrossim, a Ação Civil Ordinária nº 3.121, requereu o fechamento temporário da fronteira Brasil-Venezuela, pretendendo coibir a fluxo imigratório desordenado.

Pelo exposto, a pesquisa em apreço tornou-se imprescindível, tanto no meio acadêmico quanto no jurídico, exigindo a implementação de soluções, com base na solidariedade federativa, que acolham os estrangeiros, sob a égide dos Direitos Humanos, e deem suporte aos brasileiros, evitando o eminente colapso nos sistemas de saúde e educacional no estado de Roraima.

Sob essa perspectiva, o presente projeto busca sopesar as consequências da explosão imigratória no Brasil, principalmente em Roraima, estado que tem recebido a maior parte dos venezuelanos, com vista a sanar as mazelas vivenciadas tanto pela população nacional quanto pelos estrangeiros, sob a perspectiva dos direitos humanos e da ACO nº 3.121. Assim como, estudar o conceito do federalismo solidário e sua aplicação prática no Brasil, desde sua previsão na Constituição Federal; perquirir o contexto histórico e social que findou no aumento significativo do número de venezuelanos no Brasil. Bem como, destacar as consequências na vida da população brasileira, principalmente dos roraimenses, frente ao crescente fluxo imigratório. Ao lado disso, pontuar as soluções possíveis para o fim ou atenuação das consequências negativas do movimento imigratório em questão. Por fim, verificar os efeitos e implicações da ACO nº 3.141, com enfoque no fechamento da fronteira Brasil-Venezuela.

Quanto ao método de científico, a presente pesquisa será dialética. No que concerne à abordagem, esta será qualitativa, uma vez que serão sopesados conceitos e dados referentes ao tema. Em relação aos seus objetivos, será exploratória, porquanto serão construídas hipóteses para solucionar a crise imigratória. No que diz respeito ao procedimento, a pesquisa será bibliográfica e

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documental, através da coleta dados de materiais já publicados, bem como, daqueles que não receberam tratamento analítico (Prodanov; Freitas, 2013, p. 128).

Para tanto, no primeiro capítulo perquirir-se-á o fluxo migratório de maneira geral, diferenciando imigrante, de refugiado e de asilado político. Após, será analisada a crise migratória, trazendo um panorama internacional em contraponto à diáspora venezuelana e suas consequências, principalmente para o Estado de Roraima.

Em continuidade, o federalismo será imiscuído no segundo capítulo, ressaltando seus aspectos gerais, bem como sua evolução histórica e atual roupagem dada pela Constituição Federal de 1988, com enfoque no viés cooperativo solidário.

Por fim, no terceiro e último capítulo, busca-se analisar a Ação Civil Originária nº 3.121-RR, proposta pelo Estado de Roraima face à União. Ao lado disso, serão detalhadas algumas medidas a serem adotadas com vista a solucionar o iminente colapso que se instala no estado autor da referida ACO, priorizando o fechamento da fronteira Brasil-Venezuela e a interiorização dos imigrantes.

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1 FLUXO MIGRATÓRIO

Para um entendimento holístico do tema do presente trabalho, faz-se necessária uma análise geral dos fluxos migratórios.

Migrar, conforme Dicionário Mini Aurélio (2010, p. 505), é o ato de “mudar de região ou país” e é cediço que a todo momento, milhares de pessoas deixam seus países de origem em busca de melhores condições de vida em outros lugares, seja permanentemente, seja por um período determinado. Segundo o Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU (DESA), o número de migrantes internacionais chegou a 244 milhões em 2015 (International migration flows to and from selected countries: the 2015 revision, 20151).

Esse fenômeno populacional pode ser ocasionado como consequência de desastres ambientais, guerras, perseguições, consistentes em fatores de repulsão, que forçam a saída da população local; quanto pode ser desencadeado por fatores de atração, a qual possui liame direto com as más condições de vida no local de origem do migrante, que são atraídos pelas vantagens presentes em outras regiões. Muitos casos apresentam ambas características.

Importante esclarecer, também, que a emigração, consiste na saída do país de origem; enquanto a imigração é a entrada do estrangeiro no país alienígena.

Outrossim, depreende-se que o fluxo migratório pode ocorrer de maneira voluntária; forçada (imposta), como em casos de perseguições; ou através de mecanismos de controle do poder público, com base em fatores demográficos ou estatísticos.

No que diz respeito aos impactos, a migração internacional tem como principal destino regiões desenvolvidas, como alguns países da Europa Ocidental, Estados Unidos e Japão, onde estão concentrados mais da metade dos migrantes, o que, muitas vezes, é tratado como um problema. Entretanto, o aumento dessa população estrangeira, pode acarretar tanto benefícios quanto malefícios.

Entre os pontos negativos estão os problemas sociais no país de recebimento e a “fuga de cérebros” dos países de envio. Noutro giro, como pontos positivos, os migrantes ajudam na estruturação da economia dos locais de destino,

1

Movimento Migratório Internacional De e Para Países Determinados: Revisão de 2015 (tradução nossa), 2015, Nova Iorque. Disponível em: <http://www.un.org/en/development/desa/population/migration/data/empirical2/docs/migflows2015doc umentation.pdf>. Acesso em: 02 de out. de 2018.

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uma vez que a população economicamente ativa em países desenvolvidos tende a diminuir, tornando-se latente a necessidade de mão de obra jovem; movimentam, ainda, a economia de seus países de origem, devido às remessas consideráveis de dinheiro que enviam àqueles que ficaram. Como bem destaca Wu Hongbo2, subsecretário-geral do DESA até julho de 2017:

O aumento do número de migrantes internacionais [...] tem se tornado uma parte integral das nossas economias e sociedades. A migração bem administrada traz importantes benefícios aos países de origem e destino, bem como para os migrantes e suas famílias.

Sob a óptica jurídica, o crescimento do movimento migratório também afetou a forma como o estrangeiro é visto. No século XIX, muitas legislações tratavam os nacionais e estrangeiros de forma paritária. Com o passar dos anos e o advento das guerras mundiais, muitas restrições foram estabelecidas, dando supremacia ao nacional. Já em um panorama atual, há a volta do tratamento igualitário, com algumas ressalvas, como é o caso do Brasil.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 não distingue brasileiros e estrangeiros, garantindo a todos “a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (BRASIL, 1988). Em contrapartida, garante alguns direitos políticos apenas aos nacionais.

Como se nota, o fluxo migratório influencia diversos aspectos da sociedade e após as palavras de Roberto Marinucci e Rosita Milesi (2011, p.10) de que “essas rápidas reflexões revelam a complexidade do fenômeno migratório e a inconsistência da estigmatização dos migrantes como responsáveis pelas crises sociais dos países de chegada”, destaca-se imprescindível a discussão e clarificação dos assuntos a seguir tratados:

1.1 Imigrante, Refugiado e Asilado Político

Em continuidade, depreende-se que o fenômeno em apreço evoluiu com os anos, adquirindo novas facetas e nuances jurídicos. Nesse diapasão, faz-se mister perquirir a diferença entre imigrante, refugiado e asilado político.

2

POLÍTICA Brasileira de Imigração. Disponível em:

<https://contas.tcu.gov.br/etcu/ObterDocumentoSisdoc?seAbrirDocNoBrowser=true&codArqCataloga do=12543466&codPapelTramitavel=57152448>. Acesso em: 10 de out. de 2018.

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O imigrante é aquele que ingressa voluntariamente em outro país, com animus definitivo ou não, em busca de melhores condições de vida e de trabalho. Salienta-se que, caso queiram, podem retornar ao país de envio. Segundo a legislação pátria, mais especificamente a Lei nº 13.445/2017, denominada Lei de Imigração (BRASIL, 2017), o imigrante é “pessoa nacional de outro país ou apátrida que trabalha ou reside e se estabelece temporária ou definitivamente no Brasil”.

Já o asilado está sendo perseguido em seu país de origem por crenças sociais, religiosas ou políticas. Para que seja concedido o asilo, o requerente não pode ter cometido ou estar respondendo processo pela prática de crime comum.

Ademais, destaca-se que existem duas modalidades de asilo: territorial, que ocorre dentro dos limites do país de acolhida, sendo por este protegido; ou diplomático, ou seja, a pessoa continua em seu país, mas no Consulado ou embaixada de outro país.

Em contraponto ao refúgio, o asilo, instituto com a fonte na Antiguidade Clássica, possui uma roupagem tipicamente política, cabendo apenas ao arbítrio exclusivo do Presidente da República concedê-lo ou não, prescindível o fundamento estritamente legal.

Já o conceito de refugiado passou por um longo processo de alargamento, desde a Convenção de Genebra de 1951, perpassando pela Convenção da então Organização de Unidade Africana de 1969 e pela Declaração de Cartagena sobre Refugiados na América Latina, de 1984, chegando ao entendimento hodierno adotado pelo Brasil, expresso na Lei nº 9.474/1997.

O refúgio, que possui um caráter tipicamente humanitário, será concedido a todos aqueles que saem de seus países de origem com “fundados temores de perseguição por motivo de raça, religião, nacionalidade, grupo social o opiniões políticas” ou, ainda, “devido a grave e generalizada violação de direitos humanos” (BRASIL, 1997).

Tamanha é a situação de vulnerabilidade dos refugiados, que foi acordado na Convenção de Genebra de 1951 (Genebra, 1951, artigo 33)3, o impedimento à devolução dos refugiados a seu país de origem enquanto perdurarem os riscos que

3

CONVENÇÃO de Genebra de 1949. Disponível em:

<http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_civel/normativa_internacional/Sistema_ONU/DH.pdf>. Acesso em: 10 de out. de 2018.

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os motivaram a migrar, segundo a denominada regra de non-refoulement. Conforme o Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), ao final de 2016, havia cerca de 65,6 milhões de refugiados no mundo todo.

Ademais, o número crescente de refugiados apresenta nexo direto com a crise migratória, já considerada um problema mundial pela cúpula do G204, em reunião ocorrida em setembro de 2016, na cidade de Hangzhou, no leste da China.

Em uma perspectiva nacional, após o requerimento do refúgio e recebimento do protocolo provisório, que é válido por um ano ou até o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE) decidir sobre o pedido, o requerente tem os mesmos direitos individuais e sociais que os nacionais. Ademais, segundo os dados do CONARE, o volume de pedidos de refúgio dobrou entre os anos de 2016 e 2017, mormente devido à crise migratória venezuelana.

Impende destacar, também, a existência do visto humanitário no Brasil, que surgiu com o advento da Lei de Imigração de 2017 e de uma nova abordagem de acolhida. Essa modalidade será concedida às vítimas de crise econômica ou ambiental de grande relevância.

Mas não se pode olvidar que, apesar dessas distinções, e, não sendo um Estado obrigado a admitir a entrada de estrangeiros em seu território, uma vez acolhidos, devem ser-lhes concedidos um mínimo existencial, como direito à vida, à integridade física, à liberdade (MAZZUOLI, 2011).

1.2 Crise Migratória

Com essas distinções em mente, urge fazer uma análise da crise migratória que se alastra, hodiernamente, tanto em âmbito internacional quanto nacional.

1.2.1 Panorama internacional

Sabe-se que é natural do ser humano a busca por um melhor lugar para viver e a crise migratória, um problema que não é recente, vem se agravando desde a Segunda Guerra Mundial. Naquele momento tornou-se clara a necessidade de

4

WELLE, Deutsche. G20 reconhece crise migratória como problema mundial. G1, 05 de set. de 2016. Disponível em: <http://g1.globo.com/mundo/noticia/2016/09/g20-reconhece-crise-migratoria-como-problema-mundial.html>. Acesso em: 05 de out. 2016.

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criação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), com vista à “proteção dos refugiados e das populações deslocadas por guerras”5

. Trazendo para uma perspectiva atual, os Estados Unidos, que por muito tempo foi tido como principal destino daqueles que buscam melhores condições de vida, principalmente após a massiva propaganda do “American Way of Life6”, vem ficando em segundo plano em relação à crise migratória atual no continente europeu.

Esta, que teve início em 2011, muito tem a ver com os conflitos no Oriente Médio e no continente africano, o que tem incentivado o fluxo migratório, seja ele legal ou ilegal. Dentre os locais de envio, o Iraque, o Afeganistão e, principalmente, a Síria, são os mais expressivos, porquanto assolados por sérias guerras civis e pelas latentes afrontas aos direitos humanos.

O Sistema de Amparo da União Europeia está prestes a entrar em colapso, tendo recebido, de acordo com os dados coletados pela ACNUR, mais de um milhão de imigrantes, apenas em 2015. Uma das medidas adotadas é a distribuição desses migrantes para outros Estados, como os EUA, que recebeu cem mil pessoas em 2017.

Além dos problemas já vivenciados no país de envio, os refugiados e os imigrantes ainda submetem-se a travessias arriscadas e muitas vezes colocam suas vidas em risco, como aqueles que tentam chegar ao continente europeu através do Mar Mediterrâneo em embarcações precárias. Destaca-se que a travessia é realizada por traficantes, que cobram preços exorbitantes e submetem os tripulantes a abusos e agressões; é estimado que milhares de pessoas já morreram durante esse trajeto.

Um exemplo notório é o de Aylan Kurd, a criança síria que padeceu afogada durante a travessia marítima entre a Turquia e a Grécia, tendo seu corpo sido encontrado na praia do país turco.

Os países de chegada, conhecidos por “linhas de frente”, como Grécia e Itália são os que sofrem com o surto migratório, haja vista que seus centros de acolhimento estão superlotados e o suporte dado pelos demais integrantes da União Europeia é escasso.

5

Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – ACNUR. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/agencia/acnur/>. Acesso em: 04 de out. de 2018.

6

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Toda essa situação tornou obsoleta a abordagem do assunto prevista no Tratado de Dublin de 1990, fazendo com que os Estados posicionem-se sobre o assunto, mormente no sentido de dividir a responsabilidade.

A distribuição justa dos estrangeiros foi sugerida pela Comissão Europeia por meio do estabelecimento de uma cota obrigatória mínima de imigrantes lato sensu, mais especificamente sírios e eritreus que cada um deveria acolher, ideia que ainda não foi aceita por todos os Estados-membros da União Europeia.

Outras soluções levantadas foram políticas de deportação aos países de origem que sejam considerados seguros ou mesmo a orientação de como realizar a entrada legalizada na Europa.

Uma medida a ser reimplantada, suspensa desde 2014, diz respeito à Operação Mare Nostrum, que tinha como escopo a patrulha do Mar Mediterrâneo, a fim de resguardar a integridade e a vida daqueles que se submetem à sobredita rota marítima.

A Alemanha tem sido um exemplo de acolhida, com a abertura de suas fronteiras, em 2015, para os refugiados vindos do Oriente Médio, o que acarretou a entrada de um milhão e meio de imigrantes desde aquele ano. Contudo, à beira do caos e de uma crise política interna, controles fronteiriços tiverem de ser reintroduzidos, mas Angela Merkel, chanceler alemã há quase 12, ainda defende a não imposição de barreiras aos refugiados de guerra.

Não se pode olvidar, contudo, que nem toda a população europeia é benevolente em relação a esse assunto, e o sentimento de xenofobia tem aumentado, sob o argumento de risco de perda da identidade dos países receptores e maior concorrência no mercado de trabalho. Alguns europeus são, inclusive a favor da restrição dos direitos individuais dos estrangeiros que já estão no continente, como uma forma de dissuadir os imigrantes vindouros.

Esse pensamento nacionalista foi o que levou o fechamento das fronteiras de alguns países como a Eslovênia e a Hungria. Este, inclusive, aprovou a polêmica Lei Stop Soros, ou Lei Detenha Soros, a qual criminaliza e apena qualquer indivíduo que auxiliar os imigrantes irregulares.

Sob essa perspectiva, cabe um adendo sobre a política migratória protecionista adotada por alguns Estados, a qual incentiva a migração clandestina, o que só torna mais vulnerável a já frágil situação do refugiado/imigrante

(20)

(MARINUCCI; MILESI, 2011). Teresa Cierco (2017, p.20-21) dispõe sobre o assunto:

O conceito de imigração ilegal só tem sentido quando se estabelecem fronteiras entre estados e que se considere que estas fronteiras representam a proteção das soberanias das nações e, por essa razão, devem ser invioláveis. Este entendimento abre espaços jurídicos para que as pessoas que entram em território alheio sem a devida autorização sejam consideradas imigrantes ilegais e que o processo em si seja considerado imigração ilegal. A imigração ilegal surge quando se atravessa uma fronteira sem respeitar a regulamentação legal estabelecida.

Muito se tem discutido sobre o assunto, mas sem nenhuma solução concreta. A tensão entre os países europeus é crescente, da qual pode decorrer, inclusive, uma crise política.

Impende salientar que “é evidente que essa vitimização dos migrantes não resolve as crises, mas alimenta cada vez mais a espiral da violência” (MARINUCCI; MILESI, 2011), mas também é indubitável que o mínimo existencial, com enfoque no Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH), deve ser oferecido àqueles que saem de seus países de origem em busca de proteção ou melhores condições de vida em outras regiões.

Necessário faz-se também perquirir a crise migratória nos Estados Unidos da América, que apesar da mudança na configuração do fluxo migratório global, ainda foi o país que mais recebeu pedido de asilo em 2017, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). E isso ocorre mesmo com os notórios e reincidentes casos de família separadas na fronteira do México por não portarem documentação.

A atitude de tolerância zero adotada por Donald Trump, presidente à frente dos EUA desde 2016, tem causado revolta no país. A separação de mais de duas mil crianças, em apenas dois meses, culminou em mais de seiscentas manifestações coordenadas com o lema “Mantenha as Famílias Unidas”.

Desta feita, ante a insurgência dos estadunidenses, uma nova abordagem vem sendo empregada desde a assinatura da medida provisória que prevê a não entrega ao sistema judiciário dos imigrantes irregulares, desde que acompanhados de ser filhos menores.

(21)

Ressalta-se que essa mudança ocorreu, conforme Sarah H. Sanders7, porta-voz da Casa Branca, pela falta de recursos, mas não pela mudança de política, enquanto ainda não encontram um meio de processar 100% dos adultos, sem ter que separá-los de seus filhos.

Mas a crise migratória não está adstrita aos países desenvolvidos, como se passa a expor.

1.2.2 Análise da crise migratória venezuelana

Repetindo o padrão europeu, o caos que vem se instalando no continente sul-americano, mais especificamente na Venezuela e países fronteiriços, já passa a ser comparada ao fluxo de refugiados no Mediterrâneo, pela Organização das Nações Unidas (ONU)8.

Conforme a Organização Internacional de Migração (OIM), mais de 2.300.000 (dois milhões e trezentos mi)l venezuelanos deixaram seu país de origem nos últimos três anos, em direção, principalmente, aos Estados vizinhos, enquanto 1.800.000 (um milhão e oitocentos mil) migrantes, advindos do continente africano e asiático, entraram em toda União Europeia em quatro anos.

Os imigrantes venezuelanos almejam fugir da falta de serviços públicos; da hiperinflação, que chegou a 82.000% em 20189; da pobreza, mas, precipuamente, da fome. No mais, a mortalidade infantil aumentou 30,12% apenas em relação aos anos de 2015 e 2016 e a situação nos hospitais é crítica.

Verônica Gonzáles10, venezuelana de 17 anos, conta que para que um parto seja realizado em sua terra natal, é necessária a compra de “gases, toalhas, medicamentos e, até mesmo, a lâmpada da sala do hospital”. E complementa: “Não está fácil achar esses insumos e, quando você encontra, estão caríssimos”.

7 MARS, Amanda. Trump suspende “tolerância zero” na fronteira para evitar a separação de crianças migrantes. El País, 27 de jun. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/06/26/actualidad/1529969595_980961.html>. Acesso em: 10 de out. 2018.

8

ONU diz que crise migratória na Venezuela já está quase no nível de fluxo de refugiados no Mediterâneo. BBC, 25 de ago. de 2018. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-45307311>. Acesso em: 15 de out. de 2018.

9

ONU já compara êxodo venezuelano à crise migratória do Mediterrâneo. O Globo, 26 de ago. de 2018. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/mundo/onu-ja-compara-exodo-venezuelano-crise-migratoria-do-mediterraneo-23007586>. Acesso em: 15 de out. de 2018.

10

MENDONÇA, Heloísa. Cruzar a fronteira para dar à luz. El País, 18 de set. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/09/04/politica/1536079388_175129.html>. Acesso em: 20 de out. de 2018.

(22)

A escassez de direitos e elementos básicos para o mínimo existencial agravou-se desde a ascensão de Nicolás Maduro ao poder, em 2013, sendo a atual conjectura da Venezuela considerada como crise humanitária. Entretanto, a situação foi distorcida e intitulada de “Fake News11” por Jorge Rodríguez, Ministro da Comunicação do Estado vizinho12.

Com vista a desmotivar essa diáspora e atrair de volta os nacionais, Maduro implementou, em 20 de agosto do ano corrente, o programa de “Recuperação Econômica, Crescimento e Prosperidade”. Um duvidoso plano econômico para obstar o aumento desenfreado da inflação, a qual está prevista para chegar a 1.000.000% ainda em 2018, conforme projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI)13. Em suma, o plano criou uma nova moeda, o bolívar soberano, já em circulação, tendo suas taxas ligadas a criptomoeda, variável conforme o preço do petróleo.

Mas enquanto o plano em questão não surte os efeitos desejados, urge destacar que os índices do fluxo migratório só aumentam.

Depreende-se que, inicialmente, o este compreendia pessoas com razoável poder econômico e muitas vezes com curso superior, caracterizando a fuga de cérebros. Entretanto, hodiernamente não há mais um padrão. Pessoas de todas as classes sociais estão buscando melhores condições de vida em outros lugares, muitas vezes a pé, ou por rotas alternativas, uma vez que são exorbitantes os preços de passagens aéreas.

O êxodo em questão tem sido dividido por, basicamente, quatro países, quais sejam, Colômbia, Equador, Peru e Brasil. Mas, uma vez que nenhum destes Estados estava preparados para essa explosão migratória, as condições de acolhida são precárias, ficando alguns refugiados em abrigos, outros acampando em terrenos baldios ou vivendo na rua, mas basicamente vivendo de doações.

Essa crise imigratória sem precedentes na América do Sul associa-se ao caos que vem se instalando na região, com o crescimento da xenofobia e o risco de

11

Notícias falsas (tradução nossa). 12

AFP. Venezuela minimiza crise migratória que atinge a América Latina. Estado de Minas, 29 de

ago. de 2018. Disponível em:

<https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2018/08/29/interna_internacional,984545/venezuela -minimiza-crise-migratoria-que-atinge-a-america-latina.shtml>. Acesso em: 17 de out. de 2018. 13

GUTIERREZ, Miguel. Venezuela. FMI prevê queda de 18% no PIB e inflação de 1.000.000% até final do ano. Observador, 24 de jul. de 2018. Disponível em: <https://observador.pt/2018/07/24/venezuela-fmi-preve-queda-de-18-do-pib-e-inflacao-de-1-000-000-ate-final-do-ano/>. Acesso em: 13 de out. de 2018.

(23)

colapso dos serviços públicos, bem como, incentiva a implantação de políticas mais rigorosas quanto à entrada de imigrantes/refugiados.

O Equador, por exemplo, além de declarar estado de emergência em suas fronteiras, a partir de 18 de agosto deste ano, tentou implementar a exigência de passaporte para a entrada no país. No entanto, a medida foi judicialmente denegada, sob a justificativa de respeito a acordos regionais sobre liberdade de locomoção entre os países do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL).

No Peru, entretanto, esta política migratória restritiva já está em vigor, sendo criticada pelo diretor de Imigração da Colômbia, Christian Krüger, que dispõe: “Sabemos que seu Governo não os está expedindo, pedi-lo seria castigar o povo pelos erros de seus mandatários”14

.

A Nicarágua, por sua vez, impôs visto aos venezuelanos.

Ressalta-se que essa abordagem protecionista adotada pelos Estados, possui liame direto com os surtos xenofóbicos das populações locais, os quais têm se tornado cada vez mais recorrentes.

Em contrapartida, há exemplos de acolhida internacional, como a Colômbia e o Brasil - este será perquirido no próximo tópico.

O primeiro recebeu o maior montante de venezuelanos, chegando a mais de 1.000.000 (um milhão), só nesses últimos 16 meses e Juan Manuel Santos, ex-presidente da Colômbia, não os deixou desamparados. Pelo contrário, implantou um cartão migratório, cujo objetivo, além de permitir uma estimativa de quantos migrantes entram no país, é garantir o acesso regular aos sistemas de mercado de trabalho, educação e saúde.

Nota-se que cada Estado tem adotado uma política diferente com relação ao assunto, mas alguns estudiosos afirmam que apenas a ação conjunta não só dos países fronteiriços, mas de toda a América Latina, com envolvimento da ONU e da ACNUR, poderia minimizar o impacto da crise humanitária que se instalou na Venezuela. A pesquisadora da Brookings Institution, Dany Bahar15, entende que

14

MARCOS, Ana; LAFUENTE, Javier. Migração Venezuelana sobrecarrega os Governos da América Latina. El País, 27 de ago. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/25/internacional/1535150766_438375.html?rel=mas>.

Acesso em: 11 de out. 2016. 15

MARCOS, Ana; LAFUENTE, Javier. Migração Venezuelana sobrecarrega os Governos da América Latina. El País, 27 de ago. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/25/internacional/1535150766_438375.html?rel=mas>.

(24)

Há heterogeneidade e pouca consistência com o que já se fez. [...] a solução para os problemas mais óbvios, como o colapso dos serviços de saúde, vai depender das políticas públicas que forem aplicadas, os Governos têm que olhar as vantagens que a imigração traz.

1.2.2.1 Atual conjectura do Estado de Roraima face à crise migratória venezuelana

Para uma compreensão geral da atual situação nacional, com enfoque em Roraima, far-se-á uma análise de diversas perspectivas da diáspora venezuelana em contraponto ao despreparo do Estado brasileiro face ao exorbitante crescimento do fluxo migratório.

No Brasil, país tido como modelo de acolhida de estrangeiros, entraram, até outubro de 2018, conforme dados da Polícia Federal16, 176.259 (cento e setenta e seis mil duzentos e cinquenta e nove) venezuelanos, dos quais 90.991 (noventa mil novecentos e noventa e um) não estão mais dentro das fronteiras nacionais e 85.268 (oitenta e cinco mil duzentos e sessenta e oito) aqui permanecem. Apesar de parecerem poucos se comparados ao 1.600.000 (um milhão e seiscentos) que deixaram a Venezuela, foram o suficiente para modificar a estrutura do Estado de Roraima, principal porta de entrada dos estrangeiros em questão. É nítido o iminente colapso dos sistemas públicos do pequeno estado, que clama por ajuda.

Sabe-se que alguns desses imigrantes lato sensu vieram ao país em busca de remédios e mantimentos, já escassos na Venezuela; outros passam pelo território como meio de chegar a outros destinos; mas a principal motivação é a busca por melhores condições de vida.

Mas é indubitável que esta unidade da federação, com população total de 522.000 (quinhentos e vinte e dois mil) habitantes, não estava preparada para o caos que vem se instalando, mormente nas cidades que suportam o maior número de não nacionais, como Pacaraima, município que faz fronteira com a Venezuela, e Boa Vista, capital do estado.

Cabe um adendo para explicitar que grande parte dos venezuelanos usa todo seu dinheiro para chegar até Pacaraima, depois sem quaisquer meios de

16

FLUXO Migratório 16/10. Disponível em: <http://www.casacivil.gov.br/operacao-acolhida/documentos/venezuela-apresentacao-dia-16_10_2018-casa-civil-1.pptx/view>. Acesso em: 10 de nov. de 2018.

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chegar a Boa Vista, escolhida como destino final pela maioria, tentam fazer o trajeto de 215 km (duzentos e quinze quilômetros) de distância entre essas duas cidades a pé. Esse trecho passou a ser denominado de rota da fome e dura, em média, quatro ou cinco dias, por uma estrada sem qualquer estrutura, comida ou água.

No mais, a proximidade do caos é tanta que a situação de vulnerabilidade de Roraima, em decorrência do fluxo migratório causado pela crise humanitária no país vizinho, já foi reconhecida por meio do Decreto Federal nº 9.285/2018.

Coadunam com os fatos a explosão do número de solicitações de refúgio por venezuelanos. Em 2016, o requerimento em todos os estados brasileiro e sem distinção de nacionalidade, havia sido apenas 10.357 (dez mil trezentos e cinquenta e sete); já em Roraima, até outubro de 2018, o número de pedidos de refúgio apenas por venezuelanos chegou a 54.100 (cinquenta e quatro mil e cem).17

Com o escopo de desafogar o sistema e potencializar os pedidos de concessão de residência temporária, o Conselho Nacional de Imigração (CNig) aprovou a Resolução Normativa nº 126, de 03 de março de 2017, complementada pela Portaria Interministerial nº 9, de 14 de março de 2018, que preveem, em suma, que o estrangeiro que ingressar no Brasil poderá aqui permanecer por dois anos, podendo a residência temporária ser transmudada em residência por tempo indeterminado. Dispensou, ainda, a certidão apostilada, tornando prescindível a validação consular dos documentos dos migrantes; bem como, determinou a gratuidade da taxa de imigração para os hipossuficientes.

Destaca-se que a partir da concessão de residência, o não nacional passa a ser reconhecido pelo governo, estando sob a égide da legislação pátria e internacional.

Ao mesmo tempo que o Brasil tenta acolher todos os estrangeiros, faz-se necessário mostrar a outra perspectiva da situação, evidenciando o início da crise humanitária em Roraima, que já mostra seus primeiros sinais.

Diariamente, cerca de 800 (oitocentos) venezuelanos cruzam a fronteira nacional por Pacaraima18, principal porta de entrada dos venezuelanos no país e onde um quarto da população passou a ser composta por imigrantes lato sensu.

17

FLUXO Migratório 16/10. Disponível em: <http://www.casacivil.gov.br/operacao-acolhida/documentos/venezuela-apresentacao-dia-16_10_2018-casa-civil-1.pptx/view>. Acesso em: 10 de nov. de 2018.

18

POR dia, 800 venezuelanos entram no Brasil pela cidade de Pacaraima. G1, 19 de fev. de 2018. Disponível em: <http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2018/02/por-dia-800-venezuelanos-entram-no-brasil-pela-cidade-de-pacaraima-rr.html>. Acesso em: 13 de out. de 2018.

(26)

Sem qualquer estrutura, leitos hospitalares e escolas estão superlotadas, a criminalidade acentuou-se, sem falar no surto de malária e sarampo.

Primeiramente, salienta-se a sobrecarga do sistema de saúde. Segundo dados da Secretaria de Saúde, em 2014, o estado atendeu cerca de setecentos imigrantes; com o início da crise imigratória, o aumento foi expressivo, chegando a cinquenta mil, em 2017; e só nos três primeiros meses do ano corrente, foram quarenta e cinco mil. Em Pacaraima, o atendimento aos migrantes nos postos de saúde supera o número de brasileiros, chegando a 63%.19

Hoje, na Maternidade Nossa Senhora de Nazaré, a única do estado, 40% dos partos realizados são de venezuelanas. Conforme Daniela Souza, coordenadora de vigilância em saúde de Roraima, “fomos o único Estado do Brasil que aumentou o número de natalidade, o que está totalmente ligado a chegada de tantas mães venezuelanas que cruzam a fronteira"20. Mesmo com a instalação de cento e cinquenta novos leitos, estes ainda são insuficientes.

Já no Hospital Geral de Roraima (HGR), o atendimento a venezuelanos, de janeiro a julho deste ano, chegou a dez mil e quarenta. Segundo a diretora do hospital, Marcilene da Silva Moura21, medicamentos e insumos, como seringa, soro e dipirona, que teriam durado o ano inteiro, já acabaram.

Não se pode olvidar, ainda, o aumento das ocorrências de doenças como malária e sarampo. Esta há muito erradicada no Brasil, apresentou, só em Roraima, 296 (duzentos e noventa e seis) casos confirmados, sendo 201 (duzentos e um) em venezuelanos22. Os índices são alarmantes, o que torna cada vez mais necessário um controle de vacinação obrigatório. Sobre o assunto, Souza23 destaca:

Há muito tempo o Estado de Roraima insiste na implementação de uma barreira sanitária na fronteira com exigência da vacina. O Governo Federal diz que não é possível, mas tampouco dá uma solução. Ele criou uma sala de vacina na triagem da fronteira, mas ela é opcional.

Com o escopo de desafogar o sistema público de saúde, a governadora do estado de recebimento, Suely Campos, publicou o Decreto nº 25.681/18, de 01 de

19

JUNQUEIRA, Diego; NEVES, Márcio. Único hospital de Pacaraima vira símbolo de descaso em meio à crise. R7, 27 de ago. de 2018. Disponível em: <https://noticias.r7.com/brasil/unico-hospital-de-pacaraima-vira-simbolo-de-descaso-em-meio-a-crise-27082018>. Acesso em: 14 de out. de 2018. 20

MENDONÇA, Heloísa. Cruzar a fronteira para dar à luz. El País, 18 de set. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/09/04/politica/1536079388_175129.html>. Acesso em: 20 de out. de 2018. 21 ______. 22 ______. 23 ______.

(27)

agosto de 2018, o qual restringia o atendimento hospitalar àqueles que apresentassem passaporte válido, salvo em caso de urgência e emergência. Mas o disposto não mais subsiste, em conformidade à Recomendação feita pelo Ministério Público Federal em Roraima24, que ressaltou a possibilidade de tal medida obstar todo e qualquer atendimento, uma vez que a grande maioria dos venezuelanos entra nas fronteiras nacionais sem qualquer documentação.

Outra medida implantada foi a vinda de 36 (trinta e seis) médicos, enviados pelo governo federal, no final de agosto do ano corrente, para uma semana de atendimentos de ginecologia e obstetrícia, oftalmologia, infectologia e pediatria, nos abrigos de acolhimento tanto da capital do estado quanto de Pacaraima. Precipuamente buscando a prevenção de doenças, as consultas consistiram em identificação e tratamento de doenças, além de vacinação, priorizando os venezuelanos em processo de interiorização25.

Outro ponto que merece destaque é a situação rede pública de ensino, que, com mais de 1.800 (mil e oitocentos) alunos venezuelanos26, apenas nas escolas municipais de Boa Vista, já sofre falta de vagas.

Diante da situação, o governo federal fez o repasse de verbas à Prefeitura de Boa Vista para que aulas fossem ministradas em contêineres27. Algumas instituições, inclusive, buscaram pessoas habilitadas para facilitar a articulação entre os professores e os novos alunos; outras, passaram a utilizar legendas em espanhol em murais, banheiros e refeitórios.

A superlotação também atinge as escolas de Pacaraima, que conta com apenas três escolas, as quais dobraram o número de alunos, sendo boa parte de venezuelanos. Ressalta-se que atendendo um número muito maior de crianças

24

G1 RR. MPF recomenda que governo de Roraima revogue decreto que veta atendimento a venezuelanos. G1, 02 de ago. de 2018. Disponível em: <https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2018/08/02/mpf-recomenda-que-governo-de-roraima-revogue-decreto-que-veta-atendimento-a-venezuelanos.ghtml>. Acesso em: 14 de out. de 2018.

25

______. Profissionais da saúde chegam a Roraima para atender venezuelanos. G1, 26 de ago. de 2018. Disponível em: <https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2018/08/26/profissionais-da-saude-chegam-a-roraima-para-atender-venezuelanos.ghtml>. Acesso em: 16 de out. de 2018.

26

AFP. Quintuplica total de venezuelanos em escolas de Roraima, e já faltam vagas. Folha de São

Paulo, 22 de abr. de 2018. Disponível em:

<https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/04/quintuplica-total-de-venezuelanos-em-escolas-de-roraima-e-ja-faltam-vagas.shtml>. Acesso em: 17 de out. de 2018.

27

MELLO, Patrícia Campos; PRADO, Avener. Venezuelanos sobrecarregam serviços públicos em RR, que vive crise fiscal. Folha de São Paulo, 26 de ago. de 2018. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/08/venezuelanos-sobrecarregam-servicos-publicos-em-rr-que-vive-crise-fiscal.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa>. Acesso em: 17 de out. 2016.

(28)

suportadas, o município tem feito adequações em salas de aula, mas a estrutura física local impede que mais alunos sejam matriculados.

Agamenon Rodrigues, secretário municipal de educação, encaminhou relatório ao Ministério da Educação (MEC) requerendo medidas emergenciais, mas em agosto ainda não havia recebido qualquer resposta28.

Apesar dos esforços estatais, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), 63,5% das crianças que se encontram em Roraima não frequentam a escola29, alegando, principalmente, falta de vaga, distância e altos custos da documentação necessária. Outras reclamações frequentes dizem respeito à dificuldade na comunicação e à discrepância entre as grades de matéria brasileira e venezuelana30.

Com vista a solucionar estes últimos dois problemas, a Secretaria de Educação de Roraima utiliza-se da matrícula extraordinária, por meio da Resolução nº 54/0331. Em suma, esta permite que o aluno estrangeiro, durante o prazo de sessenta dias, passa por uma imersão na língua portuguesa e realiza uma prova de nivelamento para a inserção na série correta, considerando sua idade.

Quanto aos valores dispendidos, uma vez que necessária a tradução juramentada dos documentos para a efetivação da matrícula, urge avultar a Recomendação nº 10/2017 do Ministério Público Federal. Por meio desta, o Parquet sugeriu a realização da matrícula de todos os menores estrangeiros, independente da apresentação da documentação, em respeito a diversos tratados internacionais e legislação pátria, sob pena de responsabilização em caso de descumprimento. Denota-se que a medida está em vigor e surtiu o efeito almejado.

28

MELITO, Leandro. Escolas de Pacaraima têm superlotação com entrada de venezuelanos. EBC, 22 de ago. de 2018. Disponível em: < http://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2018-08/escolas-de-pacaraima-tem-superlotacao-com-entrada-de-venezuelanos>. Acesso em: 15 de out. de 2018.

29

TRAIANO, Heloísa. Unicef estima que 63% dos menores venezuelanos estejam fora da escola em Roraima. O Globo, 02 de out. de 2018. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/mundo/unicef-estima-que-63-dos-menores-venezuelanos-estejam-fora-da-escola-em-roraima-23120691>. Acesso em: 18 de out. de 2018.

30

______. 31

RORAIMA. Resolução nº 54, de 18 de novembro de 2003. Institui normas para a efetivação da matrícula extraordinária, nas Escolas Públicas do Sistema Estadual de Educação do Estado de Roraima e dá outras providências. Diário Oficial [do] Estado de Roraima, Boa Vista, RR, 18 nov. 2003. Disponível em: < https://www.jusbrasil.com.br/diarios/5892062/pg-9-diario-oficial-do-estado-de-roraima-doerr-de-27-11-2003>. Acesso em: 27 de out. de 2018.

(29)

Outra perspectiva da nova realidade roraimense trata do aumento de crimes cometidos por venezuelanos, consistente em 1.306%, de 2015 a 201732, dados também preocupam. Segundo a Polícia Militar, o número de ocorrências passou de 428 (quatrocentos e vinte e oito) para 1.660 (mil seiscentos e sessenta). E a tendência é agravar a situação, uma vez que no primeiro trimestre do ano corrente foram registrados 991 (novecentos e noventa e um) boletins de ocorrência envolvendo esses estrangeiros33.

O número de armas apreendidas triplicou, assim como o tráfico de droga cresceu, mormente ante a facilidade de contrabandear esses objetos nos 2.000 km (dois mil quilômetros) de fronteira Brasil-Venezuela34.

Na cidade de Pacaraima, a situação é ainda mais crítica. O aumento da criminalidade chegou a 65%, apenas no início do ano de 201835.

Colaborando com as estatísticas, os policiais reclamam sobre a falta de apoio do governo federal, principalmente com relação à pouca quantidade de viaturas e munições, dentre outros objetos necessários para atender o aumento das ocorrências36.

A prostituição também merece destaque. Depreende-se que até 2015, era quase inexistente a prostituição de rua, antes concentrada em bares e boates. Hodiernamente, chega a 600 (seiscentas) pessoas, quase em sua totalidade venezuelanas, conhecidas como “oitchenta”, valor cobrado pelo serviço37

.

32

CARVALHO, Paola. Roubos e furtos envolvendo imigrantes aumentam 1.300%. Folha de Boa Vista, 19 de mai. de 2018. Disponível em: <https://www.folhabv.com.br/noticia/Roubos-e-furtos-envolvendo-imigrantes-aumentam-1-300-/40019>. Acesso em: 25 de out. de 2018.

33

______. 34

______. 35

BRITO, Débora; CAMARGO, Marcelo. Em Pacaraima, presença dos imigrantes divide opiniões. EBC, 28 de ago. de 2018. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-08/em-pacaraima-presenca-dos-imigrantes-divide-opinioes>. Acesso em: 27 de out. de 2018.

36

CARVALHO, Paola. Roubos e furtos envolvendo imigrantes aumentam 1.300%. Folha de Boa Vista, 19 de mai. de 2018. Disponível em: <https://www.folhabv.com.br/noticia/Roubos-e-furtos-envolvendo-imigrantes-aumentam-1-300-/40019>. Acesso em: 25 de out. de 2018.

37

MELLO, Patrícia Campos; PRADO, Avener. Venezuelanos sobrecarregam serviços públicos em RR, que vive crise fiscal. Folha de São Paulo, 26 de ago. de 2018. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2018/08/venezuelanos-sobrecarregam-servicos-publicos-em-rr-que-vive-crise-fiscal.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa>. Acesso em: 17 de out. 2016.

(30)

Faz-se mister frisar, como bem expõe o Comandante da Polícia Militar de Roraima, Coronel Edison Prola38, que nem todos os venezuelanos chegam no Brasil como criminosos, mas muitos imigrantes acabaram tornando-se, devido à necessidade, ante a falta de emprego, alimento e moradia.

É evidente que os roraimenses ressentem a crise dos já vulneráveis sistemas de saúde e educação e o aumento da criminalidade, o que só reforça o sentimento xenofóbico. Estima-se que cerca de 1.200 (mil e duzentos) venezuelanos retornaram ao seu país de origem39, motivados pelo medo.

Ocorrência que merece destaque foi o ataque a acampamentos improvisados de centenas de imigrantes e refugiados em Pacaraima, tendo como estopim o assalto ao comerciante brasileiro, Raimundo Nonato, roubado e espancado por quatro venezuelanos. Aproximadamente mil e duzentos imigrantes lato sensu retornaram a Venezuela, após serem expulsos e terem seus pertences queimados por nativos, ao som do hino nacional40.

Embora este tenha sido o mais grave, não é um evento isolado. Os episódios de preconceito são recorrentes, o que tem causado receio nos venezuelanos vindouros e naqueles que aqui já se fixaram. Moradores do município fronteiriço fizeram uma carreata pela paz, na qual alguns carros estampavam frases como: "Não somos xenófobos. E se fosse sua família espancada?".

Após o supracitado ataque aos acampamentos, a União determinou o envio de 120 (cento e vinte) agentes das Forças Armadas nacionais para a cidade, que agiram tanto na faixa de fronteira quando nas rodovias federais, até dia 12 de setembro de 201841, medida esta que colimou desincentivar atos de violência e imigração ilegal, bem como a prevenir e repreender o tráfico internacional de armas

38

CARVALHO, Paola. Roubos e furtos envolvendo imigrantes aumentam 1.300%. Folha de Boa Vista, 19 de mai. de 2018. Disponível em: <https://www.folhabv.com.br/noticia/Roubos-e-furtos-envolvendo-imigrantes-aumentam-1-300-/40019>. Acesso em: 25 de out. de 2018.

39MENDONÇA, Heloísa. O “monstro da xenofobia” ronda a porta de entrada de venezuelanos no Brasil. El País, 27 de ago. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/17/politica/1534459908_846691.html>. Acesso em: 14 de out. 2016.

40

COSTA, Antonio Luiz M. C. Ataque a venezuelanos em Roraima mostra como a xenofobia se alimenta. Carta Capital, 24 de ago. de 2018. Disponível em: < https://www.cartacapital.com.br/revista/1018/ataques-a-venezuelanos-em-roraima-mostram-como-a-xenofobia-se-alimenta>. Acesso em: 30 de out. de 2018.

41

MENDONÇA, Heloísa. Temer fala em senha para regular entrada de venezuelanos e depois retifica. El País, 29 de ago. de 2018. Disponível em: <https://brasil.elpais.com/brasil/2018/08/29/politica/1535496222_378989.html>. Acesso em: 14 de out. 2018.

(31)

e drogas. A capital do estado também recebeu sessenta homens para reforçar o policiamento.

Aproveitando-se da situação e do crescente sentimento de aversão, a retórica xenofóbica nas campanhas eleitorais baseou-se na questão do fechamento das fronteiras, hipótese já descartada pelo governo do Presidente Michel Temer, também rechaçada pela Prefeita de Boa Vista, Teresa Surita, que defende ser necessário o oferecimento do mínimo de condições para o imigrante e o refugiado, mas que “essa conta tem de ser dividida pelo Brasil. Não é só de Roraima”42

.

Em contrapartida, a Governadora do Estado de Roraima, Suely Campos43, apresentou seus argumentos, no sentido de que nenhum tratado internacional ou lei pátria seriam desrespeitados, haja vista que o fechamento da fronteira seria temporário. Ao lado disso, ressaltou que a explosão migratória obstou o oferecimento adequado do mínimo existencial tanto ao brasileiro quanto ao venezuelano, não havendo outra solução. Ademais, sobre o posicionamento de Temer, ela aduz, na mesma declaração: “É muito legal sair pelo mundo todo e vender o Brasil como um país que recebe imigrante. É muito legal eles quererem manter esse status, mas o dia a dia dessa crise eles não estão vivendo”.

Insta salientar que Roraima vem arcando com as despesas com pouca ajuda financeira da União, o que acarretou na Ação Civil Originária nº 3.121/RR, mais a frente perquirida, por meio da qual o governo do Estado requer o ressarcimento de R$ 184.000.000 (cento e oitenta e quatro milhões de reais) pelos gastos, além, dentre outros, do fechamento da fronteira Brasil-Venezuela. Este último pedido, contudo, já foi refutado judicialmente.

No que diz respeito à forma de acolhida e alocação dos imigrantes e refugiados, com um único abrigo em construção em Pacaraima, a vinda para Boa Vista é incentivada, uma vez que na cidade existe relativa melhor estrutura,

42

RAMOS, Murilo. "Eu não sei mais o que fazer", diz Teresa Surita, prefeita de Boa Vista, sobre chegada de venezuelanos. Época, São Paulo, 26 ago. 2018. Disponível em: <https://epoca.globo.com/eu-nao-sei-mais-que-fazer-diz-teresa-surita-prefeita-de-boa-vista-sobre-

chegada-de-venezuelanos-23009375?utm_source=Facebook&utm_medium=Social&utm_campaign=O%20Globo>. Acesso em: 29 de ago. de 2018.

43

PRAZERES, Leandro. “Não posso deixar que Roraima vire um campo de concentração”, diz governadora sobre venezuelanos. UOL Notícias, 18 de abr. de 2018. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2018/04/18/nao-posso-deixar-que-roraima-vire-um-campo-de-concentracao-diz-governadora-sobre-venezuelanos.htm>. Acesso em: 14 de out. de 2018.

(32)

possuindo mais abrigos, já superlotados, os quais são administrados pelo Exército, pela ACNUR e por ONGs.

Segundo informações da Casa Civil acerca das ações em curso, foram abertos cinco novos abrigos e qualificados os quatro já existentes, com o total de 3.800 (três mil e oitocentas) vagas, com a previsão de abertura de novas três unidades, com capacidade para 1.500 (mil e quinhentas) vagas. Ademais, conforme números atualizados em 10 de setembro de 2018, a distribuição ocorrerá da seguinte forma44:

Operação Acolhida: implantação de 12 abrigos para acolhimento de venezuelanos em situação de vulnerabilidade.

 Tancredo Neves (Boa Vista) - 293 abrigados  Pintolândia (Boa Vista) - 607 abrigados  Hélio Campos (Boa Vista) - 302 abrigados  Jardim Floresta (Boa Vista) - 600 abrigados  São Vicente (Boa Vista) - 382 abrigados  Nova Canaã (Boa Vista) - 404 abrigados  Latife Salomão (Boa Vista) - 508 abrigados  Santa Teresa (Boa Vista) - 470 abrigados  Janokoida (Pacaraima) - 397 abrigados  Rondon 1 (Boa Vista) - 727 abrigados  Rondon 2 (Boa Vista) - 202*

 BV 8 (Pacaraima) - 114*

* Os abrigos Rondon 2 e BV 8 têm uso diferenciado. O Rondon 2 é usado para transição, com venezuelanos prontos para interiorização. O BV 8 tem uso misto (acolhimento e transição).

É nítido, contudo, que o número de abrigados é inferior aos imigrantes e refugiados que entram no Brasil todos os dias, o que, num estado como Roraima, tem aumentado nitidamente o número de moradores de rua, chegando a 2.500 (dois mil e quinhentos), realidade antes quase inexistente.

A quantidade de campings e barracos de estruturas improvisadas é crescente, onde centenas de pessoas estão vivendo em instalações precárias, sem acesso a água, comida ou banheiro.

Impende enfatizar que a falta de cooperação entre as esferas municipais, estaduais e federais, na busca por obstar o iminente caos no estado, é aterradora. A União, constitucionalmente responsável por implantar políticas públicas nesses

44

FONSECA, Carlos Eduardo. Casa Civil, 2018. Operação acolhida. Disponível em: <http://www.casacivil.gov.br/operacao-acolhida/historico>. Acesso em: 26 de out. de 2018.

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